Casa, Vivi

— Eu preciso ver ele, preciso falar com ele.

— Você precisa deixar ele descansar, Alice.

— Eu quero vê-lo!

— Ele também quer te ver, acredite em mim, mas está medicado e tem que descansar. Ele passou por muita coisa.

— Eu sei, mas pai, por favor.— ela suplica.— É o Vince. O senhor falou com ele...

— Não conversamos muito....

Minha mente está nublada. Há neblina para todo lado. Não tenho certeza se estou sonhando, meu corpo formiga, as vozes dos Saltzman estão abafadas e distantes. Agora ambos meus olhos estão fechados e eu não consigo abrir nenhum, mas queria.

Quero ver Alice, mas não estou muito bem agora que Oliver me deu exatamente a droga que eu precisava.

— Eu vou vê-lo.

— Você vai para casa. Está aqui há muito tempo, vá. Tome um banho, se alimente direito. Quando ele acordar, eu te chamo.

— Eu não quero ir para casa, não quero ter que pensar em outras coisas além dele. Se eu for para casa eu vou ficar repassando tudo que aconteceu nas últimas horas, terei mais tempo para me lembrar que você me deixou sozinha por uma vaca qualquer.

Alice. — o tom era de alerta, mas teve pouca eficácia, aparentemente.

— Sai da minha frente, pai.— ela responde como se estivesse cansada de brigar. Eu queria saber o que estava acontecendo, mas aí o velho Freud me chamou para uma dança e eu fui.

[...]

No primeiro momento foi incômodo, depois ligeiramente engraçado receber cócegas no meu pulso. Senti que brincavam com a minha pulseira e entendi que deveria ser um carinho, mas de qualquer forma, recolhi minha mão e virei para o outro lado com o corpo pesado e dormente.

— Vince?— o chamado alarmado fez com que meus olhos se agitassem sob as pálpebras.

— Ali.— murmurei.

— É!— sua voz é cheia de emoção e suas mãos encontram as minhas- Está acordado mesmo?

Engulo em seco e luto para abrir o olho. É como se o sol tivesse vindo direto até mim e me iluminasse com o seu sorriso, queimando minhas pupilas diante da força do seu brilho. Não sei como, mas ela conseguiu me arrancar um sorriso. Foi como se eu pudesse respirar outra vez só de ver o seu rosto; um alívio sem comparações.

— Alice.

— Oi.— ela disse chorosa, aproximando-se mais um pouco e tocando o lado menos fodido do meu rosto com a ponta dos dedos.— Oi, meu amor.

— Você está péssima.— digo mal conseguindo manter o olho aberto. Me requer muito esforço.

Ela consegue rir, mas sei que ela está chorando. Espero que seja de alívio.

— Você pode ter certeza que eu estou muito melhor que você.— ela passa a mão na minha cabeça, no meu pescoço, no meu peitoral e para sobre o meu coração. Parece até que ela quer ter certeza de que eu estou vivo.

— Au. Isso doeu.— ela tira a mão de mim imediatamente e eu abro o olho para encará-la, seus cabelos louros bagunçados e o seu rosto inchado. Não sei que horas são ou que dia é hoje. É como se meu corpo estivesse coma. Eu não sinto nada.— Não isso.

Ela olha no fundo do meu olho e me magoa ver a sua mágoa. Ah, ver o seu sorriso me ilumina, mas quando ela chora é tão ruim.

— Eu... me desculpa, Vincent.— ela segura a minha mão com força.

— Pelo quê, exatamente?— pergunto sonolento. Minhas piscadas são lentas e apesar disso, fico curioso porque ela não me diz mais nada— Alice, ou eu estou muito dopado ou você não me respondeu.— a encaro e ela continua com os lábios selados.

— Ficamos muito preocupados com você.— ela sussurra para mim e eu assinto, virando o rosto para encarar o teto.

— Mas eu estou inteiro. Ou quase.— aponto meu braço quebrado— Não queria, mas prossigo no mundo dos vivos.

— Não fala desse jeito.— a forma que ela me repreendeu me obrigou a encará-la de novo.

— Você sabe que eu estou brincando.— digo. Ela seca uma lágrima no canto do olho bruscamente.— Cedo demais?— pergunto. Alice balança a cabeça como se fosse inacreditável, mas ela já devia ter se acostumado com meu senso de humor a esta altura.

— Você se lembra de alguma coisa?

— Não.— admito após uma breve revirada no meu subconsciente.— Nem acho que eu queira me lembrar.

Alice balançou a cabeça em concordância.

— Sim, você está certo.

O silêncio formou um casulo ao nosso redor, mas eu o rompi minutos mais tarde, apertando a mão dela de volta.

— Acho que ouvi você e Oliver discutindo mais cedo.

Ela balança a cabeça negativamente.

— Isso não é nada. Não precisamos falar disso agora.

— Que que houve, Alice?— eu quero saber mesmo assim. A loira fungou e baixou a cabeça, vindo se sentar na minha maca.

— Eu só descobri que você estava aqui porque estava desconfiada do meu pai. Ele agiu como se fosse trabalhar, mas estava indo ver uma mulher...— ela morde o lábio e balança a cabeça.— Em um dia só descubro que meu pai está superando minha mãe e que meu melhor amigo sofreu um traumatismo.— sua voz se torna embargada, ela faz carinhos ansiosos em minhas mãos— Sei que pode soar idiota, mas.... eu meio que senti que perdi os dois de uma só vez.— ela chora e volta a me encarar.— Eu entrei em pânico.

— Não chore por isso.— balanço a cabeça lentamente e ergo a mão para secar a lágrima que desceu pela sua bochecha corada.

— Você vai ficar bem?— ela me pergunta. Fico em silêncio por um tempo.

— Eu não sei.— sou sincero. Realmente não faço a mínima ideia. Queria que fosse mais simples.

Alice se debruçou na minha direção, acariciou minha cabeça enfaixada e ficou com o rosto bem pertinho do meu.

— Eu queria poder te ajudar a se sentir melhor.— ela me confessa em um sussurro. Eu sorrio, concentrando-me naqueles seus olhos azuis. Me sinto muito mais calmo com ela aqui. Era disso que eu estava precisando.

Não é porque ela é uma das minhas favoritas e minha melhor amiga. É porque ela me ama e me deixa ver isso na sua vulnerabilidade, seu carinho. E eu a amo também. A amo tanto que chega a me dar ânsia. Graças a Deus ela está aqui. Comprimo os lábios e abro um sorriso amarelo, tocando seu rosto.

— Você já ajuda.— murmuro e ela cola sua testa a minha, nós fechamos os olhos e assim ficamos. Sinto minha respiração ficar mais lenta e meu coração se acalenta. Sinto meus dedos correndo pela sua nuca, emaranhando-se nos seus fios e agarrando uma porção deles. Aqueles fios de ouro que me acompanham em meus sonhos mais bonitos.

É a Alice. Minha complicada e descomplicada Alice. Minha doce Alice.

Eu sou apaixonado por ela.

— Casa, Vivi.— seu hálito faz cócegas no meu rosto e ela se afasta um pouquinho para que eu encoste meu indicador ao seu. Mas estou com outra coisa em mente.

Eu fui detonado. Espancado, pisoteado e tudo mais que for sinônimo para agredido. Estou com dor, meu corpo todo dói para um caralho, só que mesmo assim eu me sento, aperto a nuca dela e a beijo. Meus lábios estão ressecados e frios, enquanto os dela estão macios. Quentes.

Eu a quero. Só tinha que ser ela. Ela retribui o beijo e segura meu rosto como se eu fosse feito de vidro. Talvez seja uma reação adequada.

Quando nos separamos, não quero nunca que ela vá embora.

— Você tem gosto de casa.— lhe segredo. Alice me abraça e eu tenho certeza de que vou ficar bem, desde que ela esteja comigo.

Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top