Capítulo 18

Confesso que toda essa história do livro sobre os portais é interessante, em contrapartida, a linguagem utilizada é arcaica e de difícil compreensão. Isso faz com que demore pelo menos duas horas para conseguir compreender apenas um dos capítulos. É claro que já é um grande milagre que consiga sequer entender aquele latim. O latim é uma língua muito bonita, mas também complicada de se entender. Os fundadores me explicaram que o sangue mágico que Ária me emprestou ainda em Fantasy era o que me fazia capaz de entender "milagrosamente" o que estava lendo.

Já havia conseguido um grande progresso com os capítulos, embora continuasse sem entender o porquê de terem me deixado traduzir o livro. Qualquer outra pessoa poderia fazer o serviço mais rápido e com mais eficiência. A desculpa é que deveria treinar esse dialeto e sua compreensão caso quisesse governar Magic futuramente.

Mas o fato é que eu não queria governar Magic futuramente. Isso parecia uma possibilidade inviável, mesmo que Ária estivesse um pouco incapacitada de exercer seu papel como rainha, levando em consideração suas atuais faculdades mentais. Acreditava que não estar preparada para exercer um cargo de tamanha importância como o de uma rainha. Esperava de verdade que, caso isso acontecesse, demorasse a acontecer.

Ária... ficaria completamente louca se descobrisse que saí do castelo sem avisar ninguém e que me embrenhei na floresta sozinha. Pelo menos agora estava tendo acessos de loucura menos frequentes e não estava mais tentando me matar. Aliás, nenhum dos fundadores conseguiu explicar o motivo de ter feito aquilo antes, nem mesmo Luzia e Cristian, que têm uma espécie de poder para entender a alma das criaturas.

Ultimamente, estou criando o hábito de fugir do castelo e da vila para ler sozinha e em paz no meio da floresta. Os ataques das feras estão raros e só atacam durante a noite, fora que meu amigo híbrido, Ruy, quando percebe minha presença na floresta, fica rondando o lugar onde estou para me proteger de possíveis ameaças.

Apesar de sua aparência peculiar e assustadora, nos tornamos amigos, mesmo que os outros híbridos (aqueles que se tornaram espécies de quimeras) tenham inveja e raiva de mim por não ter me tornado um monstro como eles. Ruy não abriga esse sentimento. É gentil e demonstra felicidade por não ter me transformado num ser como ele. Em nossas conversas, tentei de todas as maneiras fazê-lo sentir-se melhor, mas a situação é delicada.

Tenho tentado visitar Undine mais vezes, porém, com ela, não tenho paz e silêncio para ler e sempre que a encontro quer apenas conversar e conversar. Não é como Ruy, que sabe esperar o momento certo. Luzia e Ivan pediram para que visitasse Ária e tentasse falar com ela nos últimos dias, talvez assim, de acordo com eles, percebesse que não precisava me matar e que poderia confiar em mim.

Deixei até que visse o livro de portais e minhas anotações para demonstrar que confiava nela e que podia confiar em mim também. Fiquei feliz de perceber que seu quadro estava melhorando consideravelmente, embora ninguém tenha conseguido entender ou sequer descobrir a raiz do problema que a levou à insanidade.

Terminei de ler outro dos capítulos e de fazer sua interpretação maçante, quando Ruy apareceu para saber como estava indo meu trabalho e se estava bem. Disse que estava com um aspecto exausto e que parecia estar com sono e com fome. Concordei em todos os pontos e sabia que precisava de um descanso mental.

No instante em que decidi descansar por alguns dias, mesmo sabendo da urgência em ler e entender aquele livro, o mesmo começou a se folhear sozinho no chão, onde o deixei repousando. Não havia vento. Não havia ao menos uma leve brisa.

— Ruy? Foi você? — Olhei assustada para a criatura, que estava deitada sobre um dos raios de luz que conseguia ultrapassar a barreira formada pelas copas das árvores.

"Eu o que"? A quimera virou seu rosto para mim com uma expressão sonolenta.

— Quem fez as páginas dos livros se folhearem.

Negou com a cabeça e uma expressão de desconfiança se formou. Peguei o livro novamente e observei a página na qual parou. Estava em branco. Em branco? Por que havia páginas em branco? Passei os dedos delicadamente sobre a superfície da folha, deixando minha mente vagar em devaneios sobre a razão pela qual as páginas estavam assim, quando algo realmente mágico aconteceu.

Por onde passava os dedos na folha, uma mensagem ia se formando. Letras em uma língua diferente de todas as que já havia visto. Não era latim, mas mesmo sem nunca ter visto aqueles caracteres, conseguia decifrá-los. Formavam uma mensagem, que informava que o livro só poderia ser lido por completo durante as noites de lua cheia e em um local aberto.

— Então, é por isso que o livro parece estar em branco! Está enfeitiçado!

"Por isso o que"? Ruy já estava ao meu lado, olhando para o livro com uma expressão confusa.

— Aqui! Leia! — Deixei o livro mais a mostra para que conseguisse ler.

"Alessia... não há nada nessas páginas."

— Como não? Não está conseguindo ler?

"Não é que não consiga ler, Alessia, o fato é que não há nada para ser lido."

— Eu consigo... — olhei para o livro com uma expressão intrigada.

"Creio que está encantado. Você deveria perguntar ao dono como conseguiu este livro."

— É um livro de escola. Acho que todos que estudavam no mesmo ano receberam um desses....

"Faça o que te aconselhei. Pergunte."

— Certo. Farei isso assim que encontrar Lewis. — Levantei-me e segui em direção a uma das trilhas que peguei para chegar ali.

"Até mais e, por favor, quando descobrir a origem desse livro, venha me contar". E partiu para o topo das árvores com uma batida de suas enormes asas de dragão.

— Prometo que contarei. — Acenei e segui meu caminho.

Assim que cheguei ao castelo e ouvi novamente o sermão de Ivan e Leon sobre ter saído sem avisar, segui diretamente para onde imaginei que encontraria Lewis. Infelizmente, não estava em seu quarto ou na biblioteca, por isso fui obrigada a sair perguntando para todos se o haviam visto em algum lugar.

Disseram-me que estava no jardim de trás do castelo. Segui para lá imediatamente e depois de algum tempo admirando e imaginando as belezas daquele jardim que outrora fora bem cuidado, finalmente voltei ao mundo real para encontrar Lewis, Cameron e Ethan conversando em pé, ao lado de uma fonte destruída, mas que ainda jorrava água. Talvez por mágica.

— Finalmente te encontrei!

— Alessia? — Cameron se virou e sorriu para mim. — Como você está?

— Estava me procurando? — Ethan sorriu de um jeito galanteador.

— Não. Estava procurando Lewis. — E lancei um sorriso metido. — Lewis, precisamos conversar.

— Olá, Alessia. Claro, podemos conversar. Seria sobre o que? — E se aproximou um pouco mais.

— Sobre o seu livro. Aquele que trouxe de Fantasy pelo portal.

— Você está com dificuldade para traduzir alguma coisa?

— Não. Não é isso. Quero saber como você o conseguiu, ou onde o conseguiu.

— Por que quer saber isso? — Cameron se intrometeu na conversa.

— Estava lendo o livro e fazendo a tradução como andei fazendo ultimamente, então deixei o livro de lado por um instante e ele começou a se folhear sozinho. Quando isso aconteceu, não estava ventando nem nada. O livro parou nas páginas em branco e notei que alguns capítulos mais para o fim estão em branco. — Disse um pouco rápido demais. — Passei os dedos pela página em que havia parado e letras estranhas se revelaram, dizendo que o livro teria que ser lido em um local aberto e em noites de lua cheia. Estava com meu amigo Ruy, a quimera, que não conseguiu ler a mensagem. O livro está encantado.

— Encantado? — Cameron olhou para mim, surpreso.

— Você chegou a terminar de ler o livro, Fantasma? — Ethan lançou um olhar sério.

— Não. Nunca passei nem da metade. — Deu de ombros, meio envergonhado.

— Precisamos mostrar essa parte do livro para os fundadores e ver se algum deles consegue ler. — Cameron nos encarou um por um.

— Espere! Lewis, como conseguiu este livro? Você não me respondeu ainda!

— Bem... admito que não fazia parte do meu material. Nunca fez, na verdade. Eu.... Tudo bem, confesso, roubei o livro da biblioteca particular da Rainha Antonieta.

Como você fez isso? — Cameron o encarou, incrédulo.

— Gostei. Agora o bom fantasma usa seus poderes para atividades ilícitas também? — Ethan arqueou a sobrancelha e deu um meio sorriso.

— Ignore os dois. Então, a Rainha Antonieta tinha em sua biblioteca particular um livro que falava sobre Portais e que estava enfeitiçado. Será que foi ela quem o enfeitiçou?

— Se tivesse feito isso, saberia os segredos por trás dos portais e não se contentaria em dominar apenas Fantasy. Provavelmente não leu o livro, só o guardou por causa do título intrigante. É uma linguagem realmente misteriosa a que está sendo utilizada nele. — Lewis ponderou.

— Mas se não foi ela quem o enfeitiçou, quem foi? — Encarei o livro em minhas mãos.

— Acho que não importa muito no momento, contanto que você consiga ler essas páginas ocultas. — Cameron entrou novamente na discussão.

— Está bem. Quando será a próxima lua cheia?

— Daqui a uma semana, acho. — Falou. — Aqui em Magic, o ciclo da lua é alterado e você terá por volta de cinco a dez dias para ler essas páginas, Alessia.

— Tudo bem. Espero que consiga decifrá-las como fiz com o restante do livro. — E soltei um suspiro frustrado.

— Já terminou o resto? — Lewis me olhou surpreso.

— Ainda não. Falta um pouco.

— Então aproveite essa semana para tentar terminar. — Cameron sugeriu.

— Acredito que precise mesmo é descansar um pouco. — Ethan se intrometeu, aproximando-se de mim. — Vejam bem. Olhem sua aparência abatida, está mais pálida do que nunca e seus olhos estão com um aspecto cansado e com olheiras profundas.

— Besteira. Estou bem.

— Alessia, ele tem razão. Você não está bem. Está dormindo pouco e mal descansa a mente. — Lewis me lançou um olhar repreensivo.

— Mas não temos tempo para descanso!

— Isso é verdade, Alessia, mas se continuar assim seu progresso será prejudicado pelo cansaço. — Cameron disse com um suspiro. — Vou conversar com os demais fundadores e com Ária. Faça assim, tente descansar até a próxima lua cheia, depois retome o trabalho.

— Mas...!

— Não. Sem questionamentos. Descanse. — Cameron me lançou um olhar severo, novamente agindo como um irmão mais velho. — Vou confiscar o livro para que não tenha perigo de se sentir tentada a lê-lo durante seu período de "férias".

Ethan concordou e o olhei irritada. Sabia que não teria escolha além de descansar um pouco e por isso desisti de argumentar. Suspirei e resolvi dar uma volta pelo jardim dos fundos, já que nunca havia estado ali antes. Cameron e Lewis entraram para comunicar os fundadores sobre minha folga forçada e minha descoberta. Ethan me seguiu sem se dar ao trabalho de perguntar se queria companhia, apenas me acompanhou em silêncio por um tempo. No entanto, depois de alguns minutos de paz, não aguentou e teve que fazer algum tipo de comentário.

— Você está passando muito tempo com esse seu amigo Ruy.

— Está com ciúmes?

— Por que estaria? Duvido que se apaixone por uma quimera.

— Por que não poderia?

— Sinceramente, Alessia, olhe para aquele monstro!

— Aparências não tem grande importância, Ethan. O que importa é a alma de cada criatura. Mas se te tranquilizar, não estou apaixonada por ele. Além do mais, me contou que teve um grande amor quando era humano e que embora ela já tenha morrido com o passar dos anos, ainda não a esqueceu.

— Não deixou de amá-la, mas o que o impede de se apaixonar de novo?

— Acredita em almas gêmeas e reencarnações. Ainda tem esperança de que voltem a se encontrar. — Não consegui disfarçar o tom de tristeza na minha voz.

— Ei... o que foi? Desculpa se te chateei. — E segurou uma de minhas mãos delicadamente.

— Realmente não sei como poderiam se reencontrar. Ele está preso aqui! E o que impediria a alma de sua amada de ter reencarnado humana? Nada. Podem simplesmente nunca mais se ver.... — Senti lágrimas brotarem em meus olhos. Ethan me obrigou a parar de andar e me abraçou com cuidado.

— Você acredita em reencarnação?

Você acredita?

— Talvez.

— Está sendo evasivo. Acredita ou não?

— Acho que não. Uma vez que alguém morre, está morto. Acabou. — Talvez fosse só minha imaginação, mas seu tom de voz pareceu sombrio.

— Você já amou alguém? — Não resisti.

— Sim. Duas vezes. Até prometer que jamais iria amar alguém de novo.

— Ela não te amava?

— Na primeira vez a garota morreu e agora que voltou... parece não estar muito a fim de encontrar um novo amor.

— Você a encontrou de novo? Não entendo... como pode não acreditar em almas gêmeas e reencarnação? — Ergui a cabeça para olhá-lo nos olhos. Também olhava para mim, mas em seu olhar havia um brilho brincalhão de quem sabe algo que o outro não sabe.

— Pense bem... como as minhas duas respostas poderiam se encaixar sem se tornar um paradoxo?

— Eu... não sei.

— A primeira pessoa por quem me apaixonei foi uma garota que vi morrer pelas mãos de alguém que acreditava que ela amava, e essa mesma pessoa a fez ressuscitar, perdendo a própria vida no processo. — Ethan sorria, mas era um sorriso triste.

Foram necessários apenas alguns instantes para que compreendesse suas palavras e decifrasse o enigma que meu coração talvez já tivesse decifrado muito tempo antes de mim. Não me dei conta quando minha expressão mudou de confusão para surpresa e depois para alegria. Também não sei quando o abraço apertado que lhe dei se transformou em um beijo apaixonado.

Posso jurar que o tempo parou no instante que compreendi que a única garota que amou era eu. Parecia até clichê de filme romântico, mas a sinceridade em seu olhar e a maneira como me abraçava, me beijava, me protegia de tudo que representasse perigo, era inquestionável. Ele... até ele achou que eu amava o Mestre das Sombras.

Não. Não pensaria nisso agora. Se o amei ou não era irrelevante. Como Ethan disse, estava morto e fazia parte do passado. Tinha alguém em meus braços agora, alguém que me amava e que me amou por todo esse tempo, mesmo acreditando que eu amava outro.

— Como fui idiota. — Admiti, ao sair de seus braços, enquanto caminhávamos juntos de volta ao castelo.

— Concordo. — Disse com seu sorriso em modo sedutor. Dei um tapa de brincadeira em seu braço e ele fingiu que doeu. — Ai, ai.

...

Concordamos que ninguém precisava saber de nossa, digamos... relação. As criaturas já nos viam juntos antes e não havia necessidade de oficializar nada. Manteríamos tudo em segredo, afinal, Ária já estava planejando um baile especial para comemorar a escolha de Ethan para futuro príncipe de Magic. Se descobrisse que nos acertamos amorosamente, provavelmente marcaria um casamento. Esse pensamento me fez rir e foi nesse momento que Ruy me encontrou, enquanto caminhava por uma das trilhas da floresta em meu terceiro dia de "folga".

— O que é tão engraçado?

— Ah. Nada... estava mesmo te procurando. Não descobri muita coisa sobre a origem do livro, só sei que Lewis o roubou da antiga rainha dos vampiros, a Antonieta.

— Antiga?

— Ah, sim. Não sei se você se recorda de uma mulher chamada Leslie.... Bem, se tornou o braço direito da rainha Antonieta quando estavam em Fantasy e depois a matou para roubar seu cargo e seu poder.

— Depois dizem que os híbridos é que são monstros....

— Não o vejo como um monstro. — Tentei fazê-lo se sentir melhor e realmente não achava que era um monstro.

— Obrigado, menina Alessia. — E esboçou um sorriso. Pelo menos achei que fosse um sorriso a julgar por seu olhar. — Mas minha aparência física não nega minha natureza monstruosa.

— Acredito que seu físico não importe quando seu espírito é bom.

— Você ainda se lembra daquela moça que disse amar? — Seu tom era triste.

— Claro que sim. Você falou bastante dela. — Sorri compreensiva.

— Você ainda acha que, se por consequência do destino, voltássemos a nos ver, ela... ainda iria gostar de mim? — A tristeza e a preocupação em seus olhos eram visíveis.

— Eu acho que....

— Seja sincera! Tenho muitos anos de experiência e preciso de um choque de realidade.

— Ruy... não sou a pessoa certa para falar com você sobre realidade.

— Por que não?

— Sempre vivi no mundo da fantasia. — Meu sorriso foi melancólico, mas não estava triste.

— Ainda assim quero ouvir sua opinião.

— Certo. Responda-me, ela te amava antes?

— Sim.

— Então ainda vai amá-lo, independentemente de sua aparência.

— Obrigado. — Sorria com o olhar, mas algo ainda o preocupava. — Você acha que voltaremos a nos encontrar?

— Eu... não sei, Ruy. Não posso dizer isso. Não consigo ver o futuro... — nesse momento, lembrei de uma pessoa que era capaz de fazer isso. — Ruy! Conheço alguém que pode ver o futuro.

— Conhece? Quem? Alessia, por favor, não brinque comigo assim! Você pode consultar essa pessoa? Não precisa dizer nada além da informação de que vou ou não encontrar minha amada novamente. — Havia desespero em sua voz e em seu olhar. De repente, me arrependi de ter mencionado isso. Não sabia se as Sombras aceitariam revelar essa informação.

— Vou tentar imediatamente, mas não posso garantir nada. Você sabe que o futuro é incerto até para quem pode prevê-lo, certo?

— Sim, tenho consciência disso.

— Está bem. Não se assuste, vou chamar as Sombras e pedir para que vejam o seu futuro. — Assentiu e fechei os olhos para me concentrar.

"Olá, Alessia. Quanto tempo..." A voz das Sombras ecoou em minha mente no momento em que pensei em chamá-las. Comecei a me perguntar o porquê não havia conversado muito com elas ultimamente.

"Sinto muito. Sei que abandonei vocês ultimamente. Vocês estão bem"? Achei necessário perguntar isso, mesmo sabendo que deveriam estar sedentas por energia, poder ou sangue. Qualquer coisa que pudesse alimentá-las.

"Nós somos um elemento. Estamos bem, apesar de estarmos nos virando muito mal sem um mestre que possa satisfazer o nosso cardápio peculiar." E senti-me ainda mais culpada por tê-las abandonado.

"Realmente sinto muito. Sou uma péssima mestra. Vocês poderiam me perdoar?"

"Claro que sim, Alessia. Você ainda é nossa mestra. Mas se vai nos pedir um favor, nos alimente antes."

"Certo. O que querem?"

"Poderíamos nos servir de um pouco do seu sangue? E talvez de um pouco da sua energia também...."'

"Tudo bem. Só esperem avisar meu amigo Ruy para que não se assuste se começar a gritar."

"Avise-o."

— Ruy? — Abri os olhos rapidamente. — Por favor, não se assuste se começar a gritar e sangrar. Preciso alimentar as Sombras antes que façam qualquer favor. Estão famintas porque as abandonei nos últimos dias.

— Alessia... se terá que fazer algo assim é melhor não pedir qualquer favor. Posso conviver com a incerteza do reencontro com minha amada. — Tentou esconder, mas percebi como as palavras que disse eram todas forçadas. Não passava de uma mentira, porque estava preocupado de eu me machucar.

— Está tudo bem. Já fiz isso uma vez. — Tentei passar-lhe confiança. — Será rápido.

"Tudo bem. Acho que aceitou." E fechei os olhos novamente para me concentrar. Como Ruy ficara em silêncio, imaginei que tivesse aceitado a proposta.

"Prepare-se, Alessia."

Comecei a sentir um frio repentino, que logo foi substituído pela sensação de várias pequenas lâminas cortando minha pele. Era horrível, mas me obriguei o quanto aguentei a não gritar. Não sei se era o esforço para não demonstrar ao Ruy o quanto isso doía, mas parecia que minhas energias estavam sendo sugadas de mim. Talvez realmente estivessem, porque as Sombras comentaram algo sobre precisar da minha energia também.

Quando finalmente acabou, caí de joelhos no chão. Abri meus olhos e vi a névoa das Sombras me rodeando. Não pude evitar me lembrar do Mestre das Sombras. Parecia que meu coração havia se comprimido ao lembrar dele e tentei afastar a memória rapidamente.

— Alessia, você está bem? — Ruy me olhava assustado.

— Estou. — Me sentia fraca e tonta, o mundo estava girando lentamente.

"Sombras! Antes que desmaie, por favor, vocês poderiam ver o futuro de meu amigo Ruy para saber se vai ou não reencontrar sua amada? É apenas isso que quer saber, se vai ou não a encontrar novamente."

"Alessia... não podemos informar isso. Esse fato será de grande importância para as decisões que terá de tomar no futuro e essa informação alteraria o que está por vir."

"Posso ao menos dizer isso para ele?"

"Sim, diga, mas tome cuidado com suas palavras."

— Ruy... — ainda me sentia fraca. Ele se aproximou e a névoa foi embora.

— Elas aceitaram?

— Disseram que essa informação será de grande importância no seu futuro e que não podem revelá-la, porque alteraria a ordem natural de suas futuras decisões. — Terminei a frase com um olhar de sinto muito.

— Tudo bem. Eu entendo. — Tentou demonstrar força, mas percebi e senti em sua alma o quanto estava decepcionado. Realmente não deveria ter lhe dado uma falsa esperança. — Você está bem?

— Estou me sentindo fraca e um pouco tonta, mas vai melhorar. E como você está?

— Normal. — E tentou sorrir. — Só preciso continuar a viver como antes, sem me importar com essa coisa de ver ou não o futuro. Apenas aguardando o que reservou para mim com paciência.

— Sábias palavras, mas sei como você está se sentindo.

— Sei disso. Nossa conexão psíquica não nos deixa mentir. — E sorriu com um pouco mais de sinceridade dessa vez. — Também sei que você não está bem. Consegue montar em minhas costas para levá-la de volta ao castelo?

— Ficou louco? Leon iria matá-lo! Ele não se importa se você é meu amigo ou não. Mandaria os guardas te aniquilarem.

— Onde posso te deixar? — E abaixou para que pudesse subir em suas costas.

— Na vila. No restaurante das irmãs fadas onde minha amiga Julie trabalha. Deixe-me na porta dos fundos. — Abracei seu pescoço enquanto alçava voo.

Ruy me deixou onde havia pedido e coincidência ou não, Julie estava saindo pela porta dos fundos quando pousou. Correu até mim e perguntou o que havia acontecido, com sua voz transbordando de preocupação. Expliquei resumidamente e depois de me chamar várias vezes de louca, me deixou entrar e me levou para a cozinha do restaurante, onde as irmãs fadas me receberam e alimentaram.

Elas me ofereceram um quarto novamente e enquanto recuperava as forças, Julie foi pedir para algum dos guardas de Leon avisar que passaria a noite na vila. Adoraria dizer que minha noite foi tranquila e sem sonhos, mas parece que voltar a falar com as Sombras me trouxe de volta os pesadelos e sonhos estranhos com seu antigo mestre.

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