COLLIN
༒
Com o quarto escuro, Collin não enxergava os ponteiros do relógio na parede, mas conseguia imaginar em qual número estariam. Ele sempre acordava todos os dias, no mesmo horário. Preferia acreditar que aquilo era cientificamente possível, em vez de tentar deduzir qual seria a razão da sua insônia e de sempre despertar faltando cinco segundos para às oito da manhã.
Quando os cinco esperados "tic-tacs" do relógio foram dados, seu despertador tocou anunciando as horas. Embora estivesse cansado, seria inútil tentar dormir novamente, nunca conseguiria, então decide se levantar.
O piso gelado de madeira arrepiou-lhe os pelos das pernas quando andou descalço até o banheiro. Adorava a sensação. O frio o fazia se sentir vivo. Sua pele estava sempre fria, como um morto, mas o modo o agradava de maneiras que ninguém entenderia.
Sorriu para o reflexo estranho no espelho sujo de seu banheiro. Indivíduo formado por camada de pele branca e pálida, músculos secos e murchos, e cascatas de cabelos pretos desbotados e desengrenhados. Ah, e as marcas. Linhas tortas e grossas no seu estágio de regeneração, uma maior que outra; umas mais avermelhadas e profundas, e outras razoáveis e agoniantes. Collin estava acostumado com elas, e sentia falta de quanto eram feitas. Corte após corte, sentia-se transcendido.
Saindo de seu quarto escuro e frio, havia uma sala de estar também fria, mas com maior incidência de luz. Seus olhos ardem com ela, franzem e piscam algumas vezes até estarem habituados.
O desconforto estomacal pela fome é sentido, e com ela uma lembrança alastrante vem à sua mente o fazendo travar o corpo e olhar fixamente para a porta cor-de-líbano que ficava em frente à de seu quarto. Estava entreaberta, sujestiva, assustadora. Rangia com o balançar do vento que entrava pela janela do quarto de sua falecida mãe, janela esta que não havia sido fechada nunca mais, não depois daquele corpo putrefato ser encontrado embaixo da cama.
Collin ainda podia sentir o cheiro...
Carne, sangue e suor.
Mas não sabia ao certo se eram de sua mãe ou seus.
Foram dez longos anos sem viver uma vida considerada normal, um "sonho americano", ou qualquer outra droga que seja.
Sua vida estava longe de ser perfeita, ou no mínimo suportável.
Não seria enquanto ela estivesse viva.
Verdade seja dita, a mãe de Collin nunca esteve lúcida.
A loucura a tomou nos primeiros meses de abandono, rendendo-se ao álcool, aos remédios obtidos sem prescrição médica a sede de sangue. Sede de Collin, seu filho de nove anos.
Facas, tesouras, chaves de fenda... Ela tinha muitas delas, e só de ver o pequeno garoto estremecia, sentia medo, aversão, náuseas e tonteiras. A mãe estava louca, e não havia nada que ele pudesse fazer para mudar isso.
Não poderia fugir, não poderia abandoná-la, e não poderia continuar suportando aquilo.
Aos dezoito anos, Collin era um jovem totalmente cético, mas mesmo assim, implorou a qualquer força superior para que sua mãe morresse, e quando aconteceu, não pôde se sentir mais aliviado. Sentia que não precisaria mais viver com medo.
Mas estava errado.
Onde quer que estivesse ele a temia, como se estivesse realmente viva, só que dentro dele.
Sua casa estava sendo rodeada por um fantasma. Não que Collin acreditasse nesse absurdo. Não existem fantasmas. Mas então por quê? Não conseguia viver depois de um ano que sua mãe se suicidou. Não conseguia entrar no antigo quarto dela e fechar de vez as malditas janelas.
Tudo estava errado.
Não deveria ser desse jeito.
Não deveria ter medo.
FIQUE E SUPERE SEUS MAIORES MEDOS
McKamey Hills é o lugar para você se divertir com seus medos!
Inscreva-se
Na tela de seu smartphone o anúncio brilhava convidativo.
Sentado no chão de seu quarto, ele explorava o próprio celular no qual não mexia há alguns dias. Sempre preferiu sustentar sua mente com os livros e enciclopédias que costumava ler, tanto em casa como nos intervalos de seu trabalho de meio período, pois raramente se sentia confortável conectado às redes; esta vez foi a primeira.
Olá curiosa vítima! Seja bem-vindo(a) ao questionário virtual para a inscrição de inauguração da McKamey Hills. Criada com o objetivo de proporcionar a melhor experiência de terror para você poder superar seus maiores medos.
Deseja continuar?
Sim Não
O garoto não hesitou em clicar, curioso ao imaginar o quão falso aquilo poderia ser.
A partir de agora, você responderá algumas perguntas de alternativa e dados pessoais.
Lembramos que todas as respostas devem ser feitas com sinceridade obrigatoriamente para que sua inscrição seja aceita.
Collin franze a testa ao ver a quantidade de perguntas pessoais a serem respondidas; ainda que tivesse, inicialmente, a plena certeza que aquilo era algum tipo sujo de golpe, estranhou todas elas. Coisas como: nome, idade, cidade onde mora e maior medo. Nada de contas bancárias e endereço completo. Ainda incrédulo, se sentiu desafiado a entrar na brincadeira, identificando-se com o "curiosa vítima" no lugar do pronome de tratamento.
Hesitou ao escrever com poucas palavras o que mais lhe assustava, mas cedeu confiando na possibilidade daquilo não ser levado a sério.
Respondeu o questionário principal, que perguntava se entre uma coisa e outra, qual lhe assustava mais. Ao final, sua inscrição foi aprovada, e ele recebeu um link que direcionava para algum vídeo do YouTube.
O youtuber criador da haunted house se chamava Ross McKamey, e seu canal era só de vídeos sobre acontecimentos paranormais e históricas consideradas macabras. Parecia ser um homem normal na casa dos 30, uma face simpática e viva — foi o que Collin notou após ver alguns vídeos.
Porém, mesmo que tivesse uma aparência comum, Ross era estranho em sua personalidade, deixando o telespectador desconfortável com suas expressões faciais.
Como alguém poderia acreditar nessas histórias? Se perguntou. Mas quando olhou bem nas íris esverdeadas de McKamey soube exatamente do que se tratava.
Aquele não era um homem normal.
Seu trajeto até Canyon Valley não durara mais que duas horas. Era esperado, considerando que na carta que recebera de Ross McKamey, as informações eram estas. Teria todas as despesas pagas apenas para entrar em uma casa velha, provar para si mesmo algo que nem ele sabia.
O youtuber esquisito — não que Collin fosse de fato normal — se achava capaz de assustá-lo, capaz de fazê-lo enfrentar seu maior medo, e isso o instigou a aceitar os termos e condições da viagem que estava prestes a fazer.
TERMOS E CONDIÇÕES
Olá curiosa vítima! Você foi selecionado com sucesso para nosso show de inauguração da McKamey Hills. Mas, antes de comemorar, deve estar ciente dos nossos termos e condições:
(1) A viagem será uma cortesia, todas as suas despesas serão pagas.
(2) Concordando com a sua entrada na mansão, deverá estar ciente de que poderá se submeter a violências extremas, torturas, falta de alimento e condições básicas ao entrar. Não nos responsabilizaremos por qualquer dano físico ou mental.
(3) Para sair da casa você precisará fazer apenas 3 coisas: Superar seu medo, encontrar uma peça de decoração que lhe será pedida, e arriscar sua vida uma vez. (tópico 4)
(4) Ao falar o nome do proprietário, você receberá gratuitamente um perseguidor que tentará tirar sua vida. Se conseguir se safar dele, terá mais chances de sair.
(5) Ao aceitar a viagem e a entrada, deve estar ciente de que não nos responsabilizamos pela sua morte.
(6) Aqueles que conseguirem sair da mansão, receberão um prêmio do proprietário.
(7) A sua estadia durará apenas 8 horas, até que o período acabe, ninguém sai
Collin passara a viagem toda repassando aquelas palavras em sua cabeça, criando teorias do que poderia significar a falta de decoro nas palavras do proprietário. Teria sido ele escolhido por não temer a morte? Por não ter ninguém que o queira em vida? Seria um truque de McKamey para assassinar pessoas a seu gosto? Ou quem sabe, enganá-las? Era agoniante não se obter respostas, por isso quando desceu do ônibus, Collin determinou que faria de tudo para desmascarar a realidade que lhe estava sendo oferecida.
Descobriria a verdade sobre McKamey Hills e sairia de lá, ileso.
O rapaz, assim que desceu do ônibus, foi levado até Canyon Valley por um taxista barbudo com um sotaque estrangeiro que ele não soube identificar. O trajeto inteiro havia sido desconfortável para ele ao ver a sujeira que habitava o carro, sem contar as bitucas de cigarro no cinzeiro no lugar do porta-copos. Odiava o cheiro de cigarro. Acreditava que se um ser humano estava disposto a se agarrar a um vício mortal pro resto da vida, seria melhor que a tirasse logo, poupando pessoas como ele de inalar substâncias tóxicas sem querer.
O ambiente que antes era repleto de prédios e outras construções, agora jazia vazio de tais coisas, comportando apenas uma floresta de pinheiros ao pé da colina de Valley — como chamavam os moradores da região. Collin analisou bem o lugar ao descer do carro, e solta um palavrão ao pisar numa poça de lama ao fazê-lo. Ao que aparentava, havia chovido há pouco tempo e o cheiro de terra molhada em companhia com a brisa fria que soprava folhas para longe o deixa mais desconfortável.
Arrastando os pés no chão para se livrar da sujeira acumulada nas solas, o rapaz ajeita as alças da mochila nos ombros e parte sem se despedir do motorista barbudo. Segue a trilha na mata em passos cautelosos e se depara com um pequeno vilarejo abandonado às ruínas.
As casas eram na maioria de madeira, não havia pavimento, pessoas, e nem um só ruído sequer. As ruas enlameadas não foram nada atrativas ao seu ver, no entando, Collin não se importou em sujar mais os tênis surrados ao ver que ao longe, no fim da rua, estava uma mansão divergente no meio do vilarejo. Seguiu para lá, só agora em passos mais apressados, ansioso ao saber que logo desmascararia McKamey Hills.
Virando a avenida, lá estava ela, a mansão com arquitetura vitoriana rodeada por árvores em seu estado outonal.
A casa era enorme e apesar de não estar bem conservada, ganhava das outras que Collin tinha visto. Do lado de fora, algo vermelho chama sua atenção. Agaixou-se perto e pega em sua mãos uma embalagem que julgou ser de chocolate, e não se surpreende ao inspecionar o local com mais atenção vendo muito lixo jogado pelo vilarejo. Turistas. Imagina, jogando o plástico onde estava em seguida.
A porta da McKamey Hills era preta e grande com guarnições de madeira que complementavam a arquitetura. No meio dela, estava um arco dourado já com tinta desbotada que serviria como campainha se Collin estivesse na era medieval. Sua atenção não permanece nela por muito tempo ao ver que havia algo escrito perto do arco, aparentemente fora riscado na madeira com algum objeto pontiagudo.
"Deixe tudo na caixa"
— RM
Com o cenho franzido o rapaz percorre os olhos pelo chão localizando um caixote de madeira que não havia percebido antes. Riu-se da mensagem na porta e questiona internamente do que se tratava aquele pedido, mesmo já tendo uma noção do que poderia ser. Suas coisas. Todas ficariam do lado de fora, impossibilitando qualquer auxílio ou segurança. Relutou. Mas após uma reflexão básica, Collin decide que para cumprir seu objetivo, precisaria seguir as regras do jogo de McKamey. Não deveria esperar que fosse tão simples assim entrar naquela casa caindo aos pedaços.
Num ato rápido, ele arranca a mochila das costas e joga dentro do caixote, junto com seu celular e o acordo assinado. Ao fazer isso, ouve a porta destrancar com um estalo repentino que lhe arrepiar os pelos da nuca. O ranger o deixa estático por um tempo, até que seus olhos encontram uma parte do interior da casa.
Repassa em alguns instantes todas as informações que havia recebido daquela carta do proprietário. Sem delongas maiores, deu os passos que faltavam para passar da porta para dentro.
Mal havia entrado e já cogitava a ideia de sair dali sem nenhum fio de cabelo fora do lugar, e sabia que para isso, bastava encontrar a peça de decoração, enfrentar seu medo e arriscar sua vida uma vez, não necessariamente nessa ordem.
Um rangido grotesco é escutado e logo a luz que estrava do lado de fora da casa foi sumindo a medida que a porta se fechava. Collin ouviu um barulho de tranca automática e se surpreende ao ver que a porta vitoriana de McKamey era na verdade completamente moderna pelo lado de dentro. Tanto que ele se sentiu em um cofre e não numa casa aos pedaços.
A iluminação se torna precária em instantes, resumindo suas origens de algumas velas e lâmpadas fracas. Logo no hall ele sentiu a brisa gelada e medonha da mansão, porém, aquilo não o assustou mais que a possibilidade de algum assassino tentar matá-lo logo de cara. Morrer ali não era o objetivo. Sacode a cabeça espantando tais pensamentos e caminha até a parte mais iluminada da casa, no cômodo que julgou ser a cozinha.
Atravessou a sala de estar mal iluminada e reparou nas janelas tampadas por tábuas de madeira; durante o percurso lento sentiu que estava sendo observado o tempo todo e riu de forma irônica ao notar os olhos vermelhos e vidrados o observando nos cantos do teto. Seja lá quem for o proprietário, sabia bem o que estava fazendo.
A cozinha parecia ter sido visitada a pouco tempo, nota vendo que um sanduíche fumaçava em cima da mesa, com um prato de porcelana sob ele. Ao lado, estava um copo descartável de água com seu topo tampado por uma folha de papel dobrada, anunciando na parte exposta a frase "Leia em voz alta".
— "Seja bem vindo, Collin Harper! Hoje é um dia especial para você..." — Collin lê já sentindo aversão ao sorriso doentio de Ross que surge na sua mente. — "... McKamey Hills esconde uma caixinha de música muito importante para mim, se encontrá-la, prometo te recompensar. Fique atento, o amor de mãe pode ser destruidor, mas ainda que ela não o ame..."
— Eu o amarei.
Seu coração salta ao ouvir uma voz feminina completar a última frase de repente.
Collin olha ao redor exasperado e se depara com o mesmo vazio de quando entrara, mas desta vez, havia uma presença, não apenas a dos olhos vermelhos que o observavam de vários cantos da casa, e sim de algo familiar. Materno.
O fantasma de quem tinha medo, seria ele? Bobagem. Fantasmas não existem. Collin não acreditava naquela baboseira.
Seus olhos voltaram para a mesa e ele encarou o sanduíche acompanhado do copo de água. Não sentia fome, mas após respirar o ar bolorizado do ambiente, sentiu sua garganta secar, então bebe a água.
Seu paladar sente a água adocicada, e isso o faz analisar com cuidado o interior do copo questionando se havia ali algum veneno que pudesse matá-lo. Logo as regras se repassam em sua mente outra vez, só que com mais clareza.
— Achar a peça de decoração, enfrentar meu maior medo e arriscar minha vida uma vez, para enfim sair da casa — anuncia em voz alta, e tem a impressão de que aquele olhos concordam com cada palavra dita.
Sente sua língua formigar ao pensar no nome de Ross McKamey, e em como ele poderia ser poderoso o suficiente para um assassino resurgir querendo a sua vida. Era esperto o suficiente para não cometer esse erro logo de cara, afinal, ainda precisava enfrentar seu maior medo. O fantasma estava esperando por ele, acompanhava seus passos, sussurrava em seu ouvido e arranhava suas costas causando o desconforto que ele já esperava.
Collin se sentiu livre para andar pelo local a procura da caixinha de música. Passou pelas escadas, mas evitou-as ao máximo sabendo que mais olhos vermelhos o esperavam no andar de cima, e quem sabe, a dona da voz.
O lugar além de caindo ao pedaços também estava empoeirado e habitado por aranhas pequenas e algumas baratas que ele não se preocupou em matar. O cheiro de mofo ardia seu olfato e aturdia seus olhos com a mesma ardência que os fizeram lacrimejar. Os passos se multiplicaram com a extensão do primeiro andar da casa, fazendo o rapaz percorrer ambientes ainda mais escuros, como a sala de jantar, sala de estar, cozinha e escritório. Ambos sem graça nenhuma, propícios ao terror, mas sem graça nenhuma.
Refaz os passos e ao passar pelas escadas novamente ouve um som peculiar que atrai seus olhos para cima.
Além do ranger da madeira, assobios gerados pelo vento que adentrava violentamente pelas frestas das janelas, e sussurros incompreensíveis tocava uma música no andar de cima, uma canção lenta como uma sonata no piano. Não era fã de música, então não sabia com o quê relacionar aquele som além da peça de decoração que deveria encontrar.
Ainda que um instinto humano o quisesse prender no chão, Collin sobre as escadas atento para não tropeçar nos próprios pés. O número de degraus era grande e só de olhar para baixo no hall de entrada, sente seu estômago revirar com a fobia de altura. Chegando ao topo se depara com inúmeras portas que o fazem notar o quão grande a mansão poderia ser. A música parara de tocar e resta apenas o som de sua respiração, com os assobios, sem os sussurros.
Uma armadilha para atraí-lo para cima.
— Collin... — a voz feminina cantarola animada do andar de baixo.
O rapaz volta seus olhos para as escadas e avista lá seu medo personificado, uma mulher com a pele branca-azulada, vestindo um vestido florido e espingado do sangue que escorria de seu pescoço mutilado. A mesma era muito semelhante a sua falecida mãe, e podia até jurar de pés juntos que se tratava da mesma. Os cabelos estavam desengrenhados e compridos de forma que tampassem metade de seu rosto, possibilitando a visão macabra de um sorriso materno maldoso e de um corte que expunha a carne viva de seu pescoço.
— Mamãe — uma lágrima cai de seu olho direito.
A mulher sorri pendendo a cabeça para o lado e logo começa a subir as escadas, arranhando a ponta da chave de fenda que segurava no corrimão.
Ver aquele objeto causa calafrios em Collin o acordando de uma possível visão inexistente. Ela estava morta, deveria estar depois de tudo que fez o filho passar.
O fantasma se curva ao subir como se estivesse se preparando para correr na direção dele, e Collin ao perceber aquilo recua alguns passos sem desviar seu olhar da criatura. Logo, retém os tremores de seu corpo e corre o mais rápido que pode até a porta aberta mais próxima ouvindo o grito estridente de sua mãe ao perseguí-lo na mesma rapidez e numa até maior que a dele.
Antes que chegasse até um lugar seguro, ele tropeça em algo que não vê e seu corpo cai de frente no chão de madeira, dando a chance maior de ser alcançado pelo seu pior pesadelo. A mulher por sua vez, não diminui a velocidade e conforme se aproxima, curva ainda mais o corpo como se estivesse se deslocando para uma posição mais favorável para assassinar sua vítima.
O corpo de Collin é alcançado e sua mãe avança sobre ele com os olhos raivosos e dentes pontiagudos cobertos por uma seiva esverdeada, que o lembrava do cheiro fétido do corpo dela ao ser encontrada morta. A chave de fenda é direcionada para seu peito, mas ele consegue impedir segurando as mãos dela ainda que com dificuldade pelo seu corpo estar totalmente escorregadio.
— Collin. Collin. Collin. Collin. Collin. — sussurra rapidamente entre risos a cada estocada que tenta dar com a arma em suas mãos.
A visão parece se distorcer e a cena de um projeto zumbificado de sua mãe tentando assassiná-lo mescla entre o vazio do andar de cima. Dando um empurrão, consegue movê-la para longe e se colocar de pé para voltar a fugir.
Entra em um cômodo aleatório e fecha a porta com toda força possível, e ao procurar com os olhos por uma alternativa fácil de trancar, percebe uma tábua de madeira que mandeira a porta fechada a moda antiga.
— Collin abre a porta — a voz que antes estava carregada de furor se normaliza drasticamente fazendo o rapaz dar passos para trás ao ouvir ela arranhar a porta com a chave de fenda. — ABRE!
Em êxtase pela forma que seu medo foi incitado, Collin mal repara no ambiente em que está. Olhou ao redor e nota que era um quarto de bebê, com berço e uma cadeira de balanço que se balançava involuntariamente rangendo mais que o chão sob seus pés.
Irônico.
Ri tonteando.
Estava preso em um pesadelo que não teria fim a não ser que ele superasse seu maior medo, ou talvez não precisasse de fato superar. Acabar com ele. Sim. Acabar com seu medo de forma que ele não retornasse, enfrentá-lo sem que uma porta velha os separasse. Ross havia conseguido reviver um sentimento que Collin tinha certeza que não existia. Com o suicídio de sua mãe, o alívio que esperava não foi alcançado, mas sim, alcançara o auge do medo dela ser ainda viva dentro de si. Agora com as pulsações aceleradas ele se sentia tão alterado emocionalmente como a criatura do lado de fora que socava a porta aos gritos de desespero.
Seus pés se locomovem pelo quarto iluminado apenas por dois abajures com luzes fracas, e ele procura por algo que pudesse usar como arma. Não encontrando, respira fundo se dando conta de que a tábua de madeira que antes impedia a porta de ser aberta agora se partia em duas, anunciando a chegada de sua mãe no quarto do bebê.
— Collin... — chama com um fio de voz.
O chamado permanece imóvel no meio do cômodo e morde com força o interior da bochecha esquerda, até que sente o gosto metálico do sangue atingir seu paladar.
A dor e o frio. Estava mais vivo do que nunca.
Um choro de criança o tira de seu devaneio ao olhar nas esclerótidas avermelhadas da mulher, e o atrai até o berço.
Seus pensamentos regressam até anos atrás. Se vê a beira da morte e desespero como aquele bebê estranho que surgira de repente. O ódio crescente em seu peito o fez jurar, jurar que desta vez não morreria.
Quando voltou em si, a mulher banhada em sangue o pressiona contra a parede próxima ao berço, apertando seu pescoço de forma que as unhas penetram a sua pele. Um gemido de dor escapa de sua boca e aumenta o sorriso sádico do espectro. A proximidade entre seus rostos torna possível a visão do corte no pescoço dela, fora a saliva grudenta que pingava de sua boca sedenta no chão. Sabendo que não poderia tirar a mãos fortes da mulher de seu pescoço, Collin agarra o dela, mutilado. Aperta com todas as forças que lhe restam sentindo as artérias cortarem e os ossos quebrarem com um estalo.
De onde vinha essa força sobrenatural?
— Meu filho... — o monstro recua caindo no chão com uma face de espasmo.
— Você está morta. — Se limitou a dizer jogando seu corpo sobre ela, desferindo socos em seu rosto com o choro do bebê preenchendo o quarto.
Deveria tê-la matado e não esperado ela morrer sozinha.
Transcende mais uma vez, com o sangue da mulher que chamava de mãe outrora em mãos.
Com a porta aberta, Collin tem a perfeita visão dos olhos vermelhos que observavam cautelosos toda a cena.
Quando seus punhos sentem a dureza dos ossos daquela face sob eles, a imagem some.
Collin se encontra sentado no chão do quarto, sem bebê e sem mulher alguma, apenas a chave de fenda, do que tinha tanta repugnância.
Se levanta com dificuldade pela dor nas pernas e encara aqueles olhos que se mostraram reais mesmo diante da ilusão recente.
— Você conseguiu, — encara a ferramenta em sua mão e depois volta a olhas as orbes vermelhas no canto do teto do quarto. — e eu também.
༒
Nome: Collin Harper
Maior medo: Mãe (aniquilado)
PRIMEIRA FASE CONCLUÍDA
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