Capítulo 16 - Positivo
No dia seguinte de manhã bem cedo.
Lyara está dormindo numa espreguiçadeira próxima à piscina. Lacerda se aproxima e chama a atenção:
- Lya! Acorda Lya! - Ele se abaixa e acaricia os cabelos dela. - Bom dia, Lya!
A índia acorda de mau humor e vira o rosto, indicando para ele não tocá-la.
- Primeiramente, eu gostaria de me desculpar - fala o diretor, sentando-se na ponta da espreguiçadeira. - Eu bebi demais e surtei com a história daquela tal de Larissa, mas eu sei que nada justifica a minha atitude. Eu não deveria ter gritado com você e nem falado aquelas coisas absurdas. - Ele retira um pacote de jujubas de dentro do bolso da calça e pergunta: - Você me perdoa?
- Está perdoado. - Ela avança no pacote e o abre, engolindo todas as jujubas de uma vez só. - Sinto muito por ter entrado no banheiro na hora em que você estava tomando banho - desculpa-se de boca cheia. - E foi mal por ter olhado para o seu bumbum.
- Está me deixando constrangido novamente - disse Lacerda, corando. - Lya, eu estou indo ao laboratório fazer o exame de DNA com a Larissa, tem certeza que não quer vir junto?
- Não! - responde decidida.
- Ok! Que tal um abraço?
Ela sorri e pula sobre ele, que a envolve em seus braços fortes. Nesse instante, uma ideia surge: arrancar alguns fios de cabelo de Lyara para utilizar no exame de DNA. Num rápido gesto ele arranca uma mecha do cabelo preto da índia.
- Ai! Por que puxou o meu cabelo?
- Eu não puxei... prendeu no meu relógio de pulso. Desculpe! - Ele disfarça e guarda os fios de cabelo no bolso do paletó. - Lya, eu pedi para o Robson instalar uma rede no quarto ao lado do meu e a Marta vai levar suas roupas pra lá.
- Beleza - concorda, emburrada.
- Vai ser melhor assim. Estamos precisando de um pouco de privacidade. Agora eu preciso ir. Até mais tarde, Lya!
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No dia seguinte.
O diretor retorna de seu trabalho no final da tarde e encontra Lyara tomando banho na piscina. Ela está vestida com uma das camisetas dele. Uma camiseta branca. Quando percebe a aproximação de Lacerda, ela começa a nadar de costas para provocar, deixando em evidência suas curvas, através da transparência da camiseta molhada.
- Oi, Cael!
- Oi, Lya! A Marta me disse que você não quis comer nada hoje. Posso saber o motivo dessa greve de fome?
- O que importa? Tem uma nova filha pra cuidar. Eu não sou nada pra você.
- Para de drama, Lya. Sabe que eu me importo com o seu bem-estar. Por favor, sai dessa piscina, vem comer alguma coisa e, pelo amor de Deus, veste uma roupa.
- Tá! Ajuda aqui - fala Lyara, estendendo a mão na direção dele.
O empresário se agacha próximo à borda da piscina e segura na mão dela na intenção de puxá-la para a superfície, porém é ele quem acaba sendo puxado para dentro da água. Lacerda, de terno e gravata, cai dentro da piscina. Lyara começa a rir.
- Você é uma brincante, Lya. Eu tinha quase certeza que você faria algo desse tipo. Olha só o que você fez: molhou a minha carteira, os meus documentos, o meu celular... - fala aborrecido, tirando os objetos dos bolsos e colocando na borda da piscina.
- Tão rabugento! - reclama, tirando a gravata dele. - Que tal uma corrida? Vou deixar você ganhar dessa vez.
- Eu não perdi, você que roubou - disse ele sorrindo, tirando o paletó.
- Que calúnia!
- Lacerda, o que está acontecendo aqui? - grita Valéria, chegando à área da piscina.
- Não está acontecendo nada. Eu escorreguei e caí - responde, saindo de dentro da piscina.
- Escorregou? Sei!
- O que é dessa vez, Valéria?
- O resultado do exame de DNA chegou - revela, entregando um envelope lacrado a Lacerda.
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Na requintada sala de jantar da mansão, uma mesa retangular de vidro com doze cadeiras brancas. Todos estão sentados à mesa, Lacerda, Lyara, Lucas, Alice e Valéria. Sobre a mesa o envelope ainda lacrado, aguardando o momento de ser aberto após a chegada de Larissa.
- Boa noite! - disse a jovem morena de vestido jeans. - Eu preciso de dinheiro pra pagar o táxi.
- Aff! - exclama, revirando os olhos. - Pode deixar comigo - fala a secretária, levantando-se e saindo da sala.
- Obrigado, Valéria! - agradece a atitude. Nervoso ele continua: - Sente-se, Larissa. Bem... Agora que você finalmente chegou eu vou abrir o envelope e esclarecer essa confusão de uma vez por todas.
Larissa senta-se na cadeira de frente para Lyara. Lacerda está sentado na cabeceira da mesa, é possível notar as mãos trêmulas dele ao abrir o envelope. Todos estão em silêncio, inclusive alguns dos empregados da casa, que se espreitam para ouvir o parecer.
- Positivo? - indaga incrédulo, lendo o papel em suas mãos. - O resultado do exame de DNA deu positivo. A Larissa é a minha filha - conclui boquiaberto.
- É bom fazer outro exame, tio. Pode ser um falso positivo - comenta Lucas.
- Fica quieto, Luquinhas - ordena Alice.
- Só estou dando uma luz para o tio.
- E você por acaso trabalha na companhia elétrica pra dar luz? - questiona Alice, irritada. - Além do mais, o laboratório da minha amiga é um dos melhores do país, se nesse papel está escrito positivo é porque a... Como é mesmo o seu nome?
- Larissa, mas pode me chamar de Maria Julia, titia Alice - responde, com um sorriso de satisfação no canto da boca. - Quando eu posso me mudar?
- Mu... Mu... Mudar? - gagueja o diretor.
- Sim, papai. Quero vir morar aqui com o senhor.
- Cof! Cof! Cof!
- Aceita um copo d'água, diretor? - grita Marta, ao ouvir a tosse repentina do patrão.
- Água não. Traz um uísque duplo.
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Durante a madrugada.
O diretor anda em círculos dentro de seu quarto, sem conseguir dormir. Ele pega as duas folhas de papel e as lê pela milésima vez. Nos papéis os resultados de dois exames diferentes de DNA, sendo que no exame consentido de Larissa está escrito positivo e no exame que ele fez secretamente com os cabelos de Lyara, está escrito negativo.
A confusa e absurda situação o faz perder completamente o sono, então ele decide ir até a cozinha para comer algo.
Já na cozinha ele encontra Lyara sentada no balcão, com um pote de sorvete e uma colher na mão. Kanauã está ao seu lado comendo as maçãs da fruteira. Lacerda aparece de pijama listrado e pergunta:
- Também não conseguiu dormir?
- Não. Tinha um barulho me incomodando - responde, abrindo o pote de sorvete.
- Que barulho?
- O estômago do Kanauã roncando. Ele estava com medo de vir sozinho no escuro até a cozinha, então eu vim com ele. - Ela encara o macaco e comenta: - Você é medroso sim.
- E você não tem medo do escuro? - questiona, pegando uma colher na gaveta.
- Eu não tenho medo de escuro, nem de bicho, nem de homem, nem de nada. Sou muito corajosa - disse a índia, comendo uma colherada no sorvete.
- Quando eu era jovem eu também era muito corajoso, mas agora tenho muitos medos. Posso? - pergunta, colocando a sua colher no pote de sorvete dela.
- Pode - oferece, sorridente. - Pensei que homens brancos não tivessem medo de nada. Você tem medo de quê?
- Tenho medo de lagartas, medo de trovões e medo de ficar careca - confessa, enquanto toma sorvete.
- As lagartas são tão pequenas e depois de um tempo transformam-se em lindas borboletas. O trovão é o som que Tupã faz quando quer falar com a gente. E você tem cabelo demais, nunca vai ficar careca. Não precisa ter medo dessas coisas, Cael... Eu tenho uma solução para espantar o medo, funciona assim: quando você estiver com muito medo, você toma um banho bem gelado que aí o medo vai ficar com frio e vai embora... nessa hora a coragem vai vir te aquecer.
- É uma boa dica, vou tomar banhos gelados com mais frequência - comenta, encantado com a sabedoria e simplicidade do conselho da índia. Ele coloca a colher sobre o balcão, respira fundo e fala: - Lya, você não queria fazer o exame de DNA, por saber que não era a minha filha?
- Eu falei pra você que o meu pai é o pajé Yanomaká. Você que inventou essa história de eu ser sua filha. Mas a Larissa também não é a sua filha.
- Eu tenho um documento que prova o contrário.
- Uma folha de papel nem sempre fala a verdade. Prefiro confiar no que o vento diz.
- Por isso você é uma cabeça de vento - brinca, tirando risadas dela. - Lya, eu gosto da sua companhia. É bom ter alguém pra conversar no meio da noite, pra dividir um pote de sorvete, ter alguém pra contar meus medos... Infelizmente, você não é a minha filha, mas eu quero que saiba que pode ficar aqui em casa pelo tempo que quiser. E pode contar comigo para o que precisar.
- Tá bom! - responde, com a boca cheia de sorvete.
- Você é uma figura - disse rindo. - Num minuto fala coisas tão maduras e no minuto seguinte se baba toda de sorvete como uma criancinha.
- Você também tá todo sujo de sorvete.
- Onde? - pergunta, analisando seu pijama.
- Aqui - responde ela, sujando a barba dele de sorvete.
- Eu não acredito que você fez isso - repreende, limpando a barba com um guardanapo.
- Culpa sua. Quem mandou me chamar de criancinha?
- E você acha que sujar os outros de sorvete é coisa de uma mulher adulta?
- Desculpa! - disse cabisbaixa.
- Eu não vou desculpar... - Ele se aproxima do rosto dela e continua: - Eu vou me vingar. - Lacerda enfia a mão dentro do pote, segura um punhado de sorvete e esfrega na cara da índia.
- Por Tupã! Tá muito gelado! - reclama, suja de sorvete da testa ao queixo.
- Foi você que começou - declara o diretor, lambendo os dedos.
O macaco atira uma maçã mordida, acertando a cabeça de Lacerda.
- Ai! Você quer também, Kanauã? Então toma!
O empresário enfia a mão no pote mais uma vez e lança uma bola de sorvete na direção do macaco. Os três iniciam uma batalha com bombas de sorvete e frutas, transformando a cozinha em uma divertida zona de guerra.
***
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