3 - QUATRO

𝗙𝗔𝗦𝗘 𝟭 — 𝗗𝗜𝗩𝗘𝗥𝗚𝗘𝗡𝗧𝗘
𝙇𝙤𝙘𝙖𝙡𝙞𝙯𝙖𝙘̧𝙖̃𝙤: 𝘈𝘶𝘥𝘢́𝘤𝘪𝘢

Alguns audaciosos me encararam conforme passamos por eles. Eric de cabeça erguida, sendo o líder. Eu andei ao seu lado, o que estranharam. Parecia que ninguém já esteve tão próximo a ele sem ser morto antes.

O refeitório era uma bagunça. Quase todas as mesas estavam lotadas por comidas que uns jogavam nos outros. Enquanto uma música alta e animada fora colocada, muito gritavam conforme seu ritmo mudava. Eric disse que deveria ir falar com Max.

Quando me aproximei da mesa, havia mais quatro iniciados ao seu lado, entre eles Beatrice. Eles discutiam sobre como a Abnegação não comia carne e a inteligência da Erudição sobre os fatos, até que Tobias interviu, direto e frio.

— Não quero ouvir sobre suas antigas facções — disse ele, dando um gole em seja lá o que bebia. — São da Audácia agora.

— Também foi transferido? — Perguntou Beatrice, se arriscando. — Ou nasceu na Audácia?

Tobias pousou a caneca metálica na mesa, encarando a garota com desinteresse.

— Está brincando? Por que acha que pode falar comigo?

Os outros dali me encararam quando eu me aproximei, alguns surpresos e nervosos pela minha presença. Todos me conheciam. A preço de ser a melhor era esse: não ter privacidade.

Me sentei ao lado de Tobias, entre ele e Beatrice, ela meio desconfortável comigo ali. O olhar que ela dava a ele indicava o motivo.

— Deve ser porque você é tão receptivo — respondi.

No mesmo instante, ele me abraçou apertado, me levantando de onde eu estava sentada. Tobias sorriu, feliz em me ver.

— Caramba! O que foi que você e a praga do Eric andaram tomando? Me conte, é tudo anabolizante, não é?

— Olha para você! Não é como se você fosse igual à aquela garotinha do ano passado.

— Eu cresci um pouco, está bem? Dois centímetros.

— Nossa! Quanto! Deve ser bem mais fácil alcançar a prateleira de cima agora.

Ha, ha. Como você é engraçado — zombei. — Soube que não é para eu te chamar pelo seu verdadeiro nome — falei, os outros prestando atenção em nós. — Do que eu te chamo agora?

— Quatro.

— Tipo o número? — Ele assentiu. — Por quê? O um, dois e três já estavam sendo usados?

A garota de pele morena segurou uma risada, junto dos amigos. Quatro me encarou irritado. Não entendi o que eu havia feito de errado.

— Não vai me apresentar? — Perguntei.

Conforme Quatro virou a cabeça para encarar os iniciados e me falar seus nomes, apoiei o braço no ombro dele, vendo qual a reação de Beatrice. Ela encarou o movimento constrangida.

— Esses são Christina, Al, Will e Tris...

— Você eu conheço — revelei, em direção a última mencionada. — Beatrice, você nos surpreendeu quando não escolheu a Abnegação. Não te culpamos, afinal, seu irmão nos escolheu...

— É uma honra conhecê-la — disse Will, me cortando. — Eu li toda a sua pesquisa sobre as células tronco que retirou daquela mulher.

— Fala sobre a do cadáver? — Ele assentiu. — Você era da Erudição, não é?

— Sim — respondeu. — Nós tínhamos aula de matemática juntos. Como fez para retirá-las? A mulher estava morta mesmo?

Ah, foi um susto enorme, a princípio. Eu estava supervisionando os experimentos da área médica, e a mulher já era voluntária a doação de medula.

— De novo, eu não quero ouvir sobre suas antigas facções — reclamou Quatro.

— Eu não sou da Audácia, então eu posso continuar falando — retruquei. — Continuando, parece que a mulher teve uma reação alérgica ao medicamento durante a noite. O pior é que não haviam médicos no andar, estavam numa reunião.

— E o que você fez?

— Eu não tinha acesso aos medicamentos para converter o quadro, a única coisa que eu tinha em mente eram as células tronco. Eu sei que é maldade pensar primeiro em si próprio do que nos outros, mas você me entende, aposto.

— Entendo completamente.

— Não alimente o ego dela — mandou Quatro. — Fica insuportável de aturar depois.

Bati em seu ombro, brincando. Beatrice acompanhou atentamente a relação que eu tinha com Quatro.

— Você é insuportável — retruquei, passando as pernas para o lado de dentro do banco.

Ignoramos os olhares que eram dirigidos a nós.

— Tive que amarrar a mulher na maca, antes que ela machucasse a si própria. Eu imagino que a adrenalina estivesse a mil em mim, porque eu só me lembro de virá-la, pegar a seringa e fazer a coleta. Quando tirei agulha, ela deu seu último grito e morreu.

— E você fala com essa naturalidade? — Perguntou Christina, assustada. — Isso aí está mais para história de terror do que pesquisa científica.

— Há histórias bem piores que essa. Teve uma vez, durante uma noite chuvosa, em que chegou um cara com a mão dissipada...

— E agora você fala como uma diplomática — comentou, bebendo seja lá o que estivesse na xícara metálica.

— Primeiro, eu sou diplomática. Segundo, vai se ferrar!

— Já começaram a discutir? — Perguntou Eric, atrás de mim.

Os iniciados gelaram, com medo da presença ameaçadora de Eric. Eu os entendia, sabia bem o medo que um líder poderia causar.

— Não estávamos discutindo — falei. — Era apenas uma controversa de fatos distintos, ou seja, eu estou agindo como uma diplomática da Erudição. Eu escolhi a Erudição, Quatro, esperava que eu agisse como caridosa e pensasse primeiro nos mais necessitados?

Eu sei que foi maldoso de minha parte me referir indiretamente a Abnegação, principalmente por ser a antiga facção de Beatrice. Entretanto, eu também poderia insultar com classe as outras facções, com exceção da minha, é claro.

Eric sorriu com a minha resposta. Ele cruzou os braços, encarando os iniciados ao meu lado.

— Não vai me apresentar? — Perguntou para Quatro, mas fui eu que respondi.

— Christina e Albert, da Franqueza; Will da Erudição; E Beatrice, da Abnegação. Uma classe bem misturada que vocês têm aqui, não concordam?

— Mais do que esperávamos — admitiu à contra gosto. Eric se curvou sobre mim, parando na altura do meu ombro. — Um veículo já está preparado para levá-la.

— Esse é o seu jeito de se livrar de mim?

Pelo canto de minha visão, vi as caretas que Quatro fazia, irritado com Eric e comigo — muito mais com o Eric. A competitividade entre eles sempre existiu, pelo menos isso não havia mudado com os anos que passei longe. Eric, percebendo que eu o encarava, mudou o foco.

— Vamos ver quanto tempo vai durar, careta — disse ele para Beatrice. — Não muito. — Eric se sentou ao lado de Quatro, ignorando a irritação dele. — O que tem feito, Quatro?

— Nada demais — respondeu.

— Mas me disse que ele está tentando falar com você há tempos, mas que você nunca deu as caras. Ele me pediu para ver o que está acontecendo.

Quatro o encarou, olho a olho, antes de dizer:

— Diga a ele que estou satisfeito no meu emprego.

— Max quer te oferecer um novo cargo? — Pergunto, espantada. — E você está desprezando isso?

— Há dois ano desprezo isso.

— Levou tanta surra que ficou idiota? — Perguntei, recebendo xingamentos dele.

Então as pessoas começaram a bater os punhos e canecas nas mesas, o refeitório inteiro se calou. No mezanino, Max se apoiou nas grades, acompanhado de outros membros que deveriam ser importantes aqui. Então esse seria seu grande discurso.

— Iniciados, levantem-se. — Todos os novados o fizeram. — Vocês escolheram se juntar a facção guerreira, encarregada da segurança da cidade e de seus habitantes. Acreditamos em atos simples de bravura e na coragem que faz uma pessoa defender a outra. Além disso, durante sua iniciação, teremos a honra da presença da sucessora da Erudição, e eu só lhes aviso de uma coisa: não mexam com ela.

Com o fim de seu discurso, todos aplaudiram, alguns outros olhares tornados a mim. Os iniciados foram levantados no alto, passando sobre todos em uma onda. Imaginei se fosse eu ali, no lugar deles e senti inveja por saber que nunca teria aquilo.

Agarrei meu casaco para fechá-lo mais em meu corpo. Segui para as portas que davam aos inúmeros corredores da Audácia, sendo guiada por um deles que estava ali e me viu sair. Eric nem Quatro reparam na minha saída. Felizmente, logo eu já estava a caminho da Erudição.

Passei pelos portões scaner, aparecendo as faixas azuis o meu nome, facção e liberação de acesso. Os guardas por onde passei assentiram para mim. Subi todos os andares até os chegar ao laboratório, onde Jeanine disse que me esperaria.

— Como foi na Audácia?

— Tedioso — respondi. — Apesar dos iniciados serem bem distintos.

— Achei que ficaria feliz por poder ver novamente Eric e Tobias — disse ela, programando algum sistema. — Me enganei.

— Fiquei surpresa, é claro. Faz pouco mais de um ano que não os vejo.

— Notou muitas mudanças?

— Ninguém muda, só revelam o que sempre foram.

Jeanine me encarou, sorrindo pela minha resposta.

— Os programadores precisam de sua ajuda lá embaixo.

— Por quê?

— Os códigos genéticos do seu projeto sofreram alteração enquanto esteve fora — respondeu, me passando seu tablet.

— Como assim? — Perguntei alarmada.

— Um iniciado entrou no sistema de energia e abaixou a temperatura das salas do sexto andar.

— Patético — reclamei. — Vou trocar a segurança dos controles, colocar senhas mais complexas, talvez identificação por retina ou digital.

— Faça o que achar melhor, mas resolva o problema dos códigos antes. Não vamos perder todo o trabalho que tivemos.

— Claro.

Adormeci no laboratório, mas tinha resolvido o problema causado pelo novato. Tive que reprogramar os sistemas para suportar a alteração genética e depois trocar a segurança. Ainda tive que fazer o relatório diário da Audácia, mesmo com tão poucas informações.

Vieram me chamar antes das três da manhã.

Eu havia adormeci às duas.


𝐍𝐎𝐓𝐀𝐒 𝐅𝐈𝐍𝐀𝐈𝐒:

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