Capítulo 37 👑

⚠Atenção . Esta história contém cenas de sexo e violência, o que não são indicadas para menores de 18 anos🔞. Não é permitido nenhum tipo de plágio. Não se esqueçam de votar, comentar e partilhar!
Boa leitura.

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Depois de uma hora hesitante, acabo por entrar na cozinha e pronta para preparar algo para consumir, mesmo que seja apenas um chá, ou um leite desnatado, ou qualquer outra bebida quente que me dê mais espaço para pensar. Desta vez calço minhas meias com meus chinelos relembrando-me do episódio de dois dias atrás e deparo-me com a cozinha limpa, sem panelas ou bules às vistas. Harry perde muito tempo ultimamente para limpar a casa, principalmente quando ainda estou a dormir e hoje que ele está em casa, não sai do quarto de bebé onde está a aspirar o chão. Havia uma música antiga tocando na televisão, quis repeti-la mais e mais vezes até realmente compreendê-la. Parece falar de dores imagináveis, pela qual cada indivíduo passa sem exageros, mesmo após qualquer perda, acho que é assim, perco-me nas letras e na parte final não acabo ouvindo nada por conta do aspirador que vem do outro quarto.

Deslizo o olhar pelo escorredor de pratos e olho para uma caneca florida que está lá, uma que já foi minha preferida nas minhas primeiras semanas na cidade e encaro-a assim como se não a visse há anos. E como se todos os momentos iniciais de lembrança aqui viessem junto com a caneca. Mas pensando de outra forma, se tivéssemos morado aqui com mais calma, sem a questão que envolvia esta pequena fuga que poderia colocar nossas vidas em risco, estaríamos bem e felizes, contemplantes na nossa nova vida. Quando estou perto o suficiente, agarro a caneca e contemplo os desenhos nela. Gosto dela por ter flores rabiscados de um aspeto diferente, são grandes e em cima delas estão escritas letras tracejadas em branco que me lembra sempre em " atenção vida". Harry desliga o aspirador e abaixo a caneca levantando a cabeça para observar os armários cheios por cima. Ele faz questão de ter tudo em casa, organizado por produto, por cor, com uma certa conveniência da direita para a esquerda, exatamente como a Gina sempre fazia. Em segundos decido por um chá e encontro dois pacotes diferentes e coloco-as sobre a mesa. Na televisão ouço a música de novo.

" Toda a vez que eu pensei que já o tinha feito, pareceu que o gosto não estava muito doce, então virei a mim mesmo para enfrentar-me, mas nunca tive um vislumbre de como os outros devem ver o falsificador"

Não consegui entender o restante da música quando minha mente parou na última palavra, e fiquei em modo paralisante com ela, como se ela estivesse ali todo este tempo, esperando e tocando mais de uma vez para ser desvendada. De todas as formas, eu já não consigo pensar tanto, como se estivesse sendo encurralada dentro da cozinha com um elefante, e ela estivesse apertando-me mais e mais ali dentro, deixando-me o ar preso nos pulmões. E o pânico começa aumentando aos poucos. Sinto-me insegura, como se estivesse de novo dentro daquele sonho de lembranças, e olho para a porta, esperando que a fumaça surja mostrando- me algo. Mas ela não aparece, e estou revivendo o presente. A cada segundo que passa, eu vivo uma agonia, lesionada pelo que fiz, que eu confiei e acabei enterrando o que eu tinha. Minha felicidade, meu filho por causa de algo bobo. Desta vez agacho-me perto da bancada da cozinha, as nádegas nos tornozelos e abraço a minha caneca, gritando em silêncio. Tudo foi uma mentira, não é?

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Era um feliz dia numa madrugada na nova cidade quando recebi uma chamada e acordei assustada pensando que poderia ser minha chefe e ouvindo Harry resmungando e revirando-se na cama, levantei o tronco para olhar o número que aparecia na tela do telemóvel. Acabei por citar dia feliz, mas foi uma maneira mais correta de começar a explicar sobre um novo dia, quase cinco da manhã, em uma cidade que parecia amanhecer tarde e nem se ouvia os ruídos pela noite, ou talvez um automóvel ou outro na estrada. Encarei aquele número ali e mesmo não tendo reconhecimento nos meus contatos, percebi que já tinha chamadas provenientes dele faziam semanas. Encontrava a chamada perdida, e essa era a primeira vez que eu via a chamada entrar. Tive a chance de atender, e fiquei vendo aqueles números nacionais brilharam na tela, com o som alto vibrando dentro do quarto até parar e a tela fechar e eu ficar no escuro, como se não tivesse compreendido. Harry já estaria a dormir de costas para mim e na primeira vez em semanas vivendo na nova cidade que ouvi um carro passando na frente do nosso prédio naquelas horas da madrugada, conduzindo suas luzes dos faróis diretamente para os apartamentos. Não movi um músculo e apenas fiquei ali, respirando em silêncio ouvindo o Harry começando a ressonar baixo e observando as luzes dos faróis que ficaram acesos por mais de 10 minutos para o nosso segundo andar. Quando o carro se moveu e fiquei outra vez na escuridão que permiti-me mover e colocar o telemóvel na banca e encostar a cabeça para tentar dormir. Que eu sabia que já estava em perigo. E aquilo não melhorou desde então.

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Ainda estou abaixada ouvindo o toque das músicas que vêm da televisão desde a sala e Harry liga repentinamente o aspirador e continua com ela movendo pelo quarto de Jimmy. O meu pequeno menino que não teve a oportunidade de usufruir das cores que quisemos deixar para ele. Tudo junto com suas roupas, seus brinquedos e a imagem real que criamos com ele. Por mais um pouco, ele teria vivido tudo isso, de certeza que mais ninguém o tiraria isso. Permiti-me tomar antidepressivos por tantos dias que levaram as lembranças para longe e ainda estou tentando compor tudo. A minha mente já não dorme mais e fico agora em estado alerta.

" Por favor, mostra-me o que fizemos. Por favor, eu preciso saber daquilo que fiz. " Sussurro para mim mesma, esperando uma resposta dentro de minha cabeça. Sei que foi algo ruim, que custou a vida do meu filho.

Levanto-me e pouso a caneca sobre a pia e sem querer secar o rosto e por baixo do som do aspirador, melhor por não ouvir mais nada de música, começo a arrastar os pés para a sala com uma pequena e nova oscilação. O lar que foi criado para que pudéssemos receber o Jimmy para mim parecia ser perfeito. Os dois seriam pais incríveis, pais de primeira viagem, com um novo membro para o meio dessa nova animação e seríamos bastante adaptativos. O que poderia dar de errado? Alguém querer tomar o Jimmy de nós? Com os braços abaixados, sinto-me uma figura pesada e sombria no meio da sala e com os olhos baixos, avisto as chaves do Harry. Porque a polícia ainda não está envolvida nisto tudo? Porque ficamos assim? Pego nas chaves e lembro das minhas e do meu telemóvel que não estão em minha posse desde o meu/ nosso acidente. Talvez tenham-se perdido como acontece em muitos acidentes. Ser assaltada enquanto estou ferida e com uma criança morrendo em meu útero é uma ideia bastante desagradável. Até agora sei que preciso de algo que me dê muito mais. Imediato e rápido busco a saída para fora do apartamento, abafada pelo barulho do aspirador que tanto trabalha.

Desde que tinha visto as luzes dos faróis pararem na direção do nosso apartamento que não deixei de pensar nisso e nem na sua ligação com a chamada de segundos anteriores. Mais uma vez e como sempre, não comentei com o Harry, que dormiu bem até seu despertador brandir em nossos ouvidos. Na altura, já estava quase nas 25 semanas de gestação e ele parecia ter aceitado melhor que iria ser pai do filho da jovem com quem quisera fugir para outra cidade. Sua esposa. Não fazia ideia se havia arrependimento envolvente e preferi nem pensar nisso. Estávamos ali e juntos no momento. Estava a viver bem do seu lado, e pelo menos havia harmonia dentro da casa e divisão das tarefas entre nós. Havia harmonia. Havia tensão. Havia harmonia. Havia tensão. E estávamos a viver com isso, ou pelo menos é o que se acha. E ali estava eu achando que tinha algo a faltar. Talvez fosse informação. E eu vi-me procurando por ela. E acabei descobrindo demais.

No trabalho no restaurante, comecei aos poucos me acostumando com os clientes usuais, com o tempo já sabia o nome de todos e quantos eram. Vinte e três no único restaurante da cidade pequena. O resto preferia seu almoço em casa ou em bar de fritos e bolinhos. Três eram crianças, dez idosos e o resto eram jovens. Não vi nenhuma mulher adulta. Talvez elas trabalhassem ou apenas cozinhassem em suas casas. Jovens mais novos que eu, tanta conversa entre si, mas pouca tesão existente e eu sentia tudo de meu canto. Em um dia qualquer decidi que poderia fazer algum amigo entre eles, e quando aproximei-me de duas mesas ocupadas por jovens, acabei por ser uma incógnita de pé. Um ser invisível com um feto crescente e ninguém para notar. Voltei para o balcão tão rápido e troquei um pequeno olhar com o meu colega, que nem respondeu. Uma cidade de merda, eu pensei e quis terminar meu turno ali e regressar para o apartamento. Eu já não queria estar presente. Para mim já era horrível o suficiente. Afinal estava fugindo pela segunda vez na vida. E pela segunda vez, dera errado.

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Consigo energia para correr para fora do pequeno prédio e tanto quanto posso, estou a redobrar peso descendo as escadas, meus chinelos derrapando em cada degrau como se estivesse tão exausto quanto meu fôlego. Lembro-me do dia que saí do apartamento que vivi durante 2 anos em Savannah, e relembrando pequenas coisas, seja capaz de trazer tudo de volta. Tudo menos minhas lembranças do acidente. De chinelos, calça longa de pijama e blusa confortáveis de algodão, saio para a rua e consigo parar para observar, como se fosse minha primeira vez, naquela rua nova em minha vida. Tudo está lá, em um formato diferente. Aperto as chaves dentro da palma de minha mão, e encaminho-me na direção oposta do prédio, passando pelo pequeno estacionamento onde o carro poderá ter estacionado e brilhado seus faróis para nosso apartamento. Diretamente para nosso quarto. Quase tropeço em uma das calçadas altas e em passos largos, avanço para a rua abaixo, refazendo o caminho para o restaurante que fica do outro lado da estrada maior, parecendo tão longe desta vez. Harry poderá ficar um tempo entretido dentro do quarto de Jimmy que nem dará por minha ausência, recentemente tenho andado extremamente silenciosa dentro do apartamento, então tudo bem.

Como se começasse a sentir formigamento nas pernas, estou cada vez mais perto da estrada maior e do seu movimento costumeiro. Tento relembrar-me da última vez que conduzi e que levou direto ao meu/ nosso acidente. Quando a garganta pensa em apertar, estou a reforçar a respiração, prevendo tudo. Do embaçamento que surge a minha frente, balançando para dois lados opostos como se estivesse sendo açoitando pelo vento, e alguma coisa é notória. Minha cabeça está cheia e preenchida e quando passa um carro veloz, sinto-me inebriada e respirando bem, como se precisasse mesmo sair de casa. E tudo poderia começar a acontecer, de novo, ali na minha cabeça, naquela estrada, em uma tarde como aquela. Sinto-me bem por não sentir mais os efeitos dos antidepressivos e permaneço ali, obcecada com qualquer ideia ou movimento, como se tudo fosse um jogo em campo, mecanizado para ser assim. A espera de uma surpresa. Para me dizer que não fiz aquilo. Que não fizemos nada de errado. 

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