Visita Inesperada

— Feito! — Exclamei aliviada, fechando as páginas dos capítulos que a editora havia me dado para ler.

Eles não fizeram grandes mudanças além de trocar algumas expressões para adaptar ao dialeto estadunidense. Então para mim estava ótimo. Lindsay havia me mandado uma mensagem no dia anterior para perguntar se eu já havia lido, uma cobrança camuflada. É verdade, eu demorei mais do que o esperado, mas fora uma semana singular. Estava em um novo país, era difícil me manter trancada num quarto sem ir explorar a cidade.

Na segunda-feira apreciamos o Gaslamp Quarter, uma região repleta de restaurantes, baladas e bares. Andamos nas ruas deslumbrados até escolher um restaurante de massa esplêndido. Ao que parece aquelas ruas eram um grande polo turístico, devido a grande circulação de pessoas, até mesmo aos residentes locais, que andavam a passos mais determinados sabendo o que procuravam, sem se distrair com as demais luzes.

A praia Pacific Beach foi nosso alvo no dia seguinte, corremos pela areia observando com olhos desejosos o mar límpido, de um azul indescritível, mas impedidos de nadar em razão do clima frio. Lara gostou bastante da vista particularmente por outros motivos também.

— Lindos, Ju! Você não acha? O que eu preciso fazer para algum deles me dar bola? — Ela passou a mão em seu cabelo para conferir se estava comportado, um vinco de preocupação no meio da testa.

Fisicamente, Lara era quase meu oposto, com uma pele mais clara, a ponto de ter bochechas naturalmente rosadas, um cabelo liso castanho e olhos perfeitos que não precisavam de olhos para leitura. Seu rosto mais oval deixava bem claro que ela puxara os traços de nosso pai. E eu não tinha dúvidas de que era linda, qualquer um dos seus contatos de estimação na faculdade não teriam problemas em confirmar isso. O assunto acabou quando meu pai chegou perto querendo entrar na conversa.

E então o grande ápice da semana na quarta-feira, as entrevistas. Recebemos os jornalistas em nossa casa, na sala, e eu fiquei aliviada pela coisa toda não envolver câmeras, com exceção de uma foto que tirei sozinha — bastante constrangedora — segurando o livro em português perto da lareira, e a outra em família.

Fani havia ensaiado comigo possíveis perguntas algumas horas antes, então não foi tão ruim assim.

— Sim, eu o escrevi sozinha... Não, não me inspirei em experiências pessoais quanto ao romance... Fã desde os 11 anos... Já fui em dois shows no Brasil... Não tive a oportunidade de conhecê-lo pessoalmente... Seria uma honra, e não sei exatamente qual seria a minha reação.

Visitamos o zoológico mais tarde, que contava com mais de 4 mil animais de 650 espécies diferentes. Tirei muitas fotos e enviei aos meus maiores amigos — para não dizer únicos — Danilo e Isis, comparando-os com alguns dos bichinhos. Além de momentos de pura tortura, a escola me agregara aqueles dois como um presente inesperado. Eles compreendiam minhas ausências, até as presenciais, ignorando minha falta de tato para interação social presencial e tecnológica.

Depois, precisei assumir a responsabilidade de uma escritora. Eu não estava exatamente de férias, e mal tinha lido dois capítulos. Portanto, me tranquei no quarto na quinta-feira — com exceção da hora do jantar porque todos somos filhos de Deus — e usei a manhã inteira daquela sexta também.

Repassei o arquivo no notebook para me certificar de que havia feito as modificações que anotara no papel — tendo em vista que eu preferia ler no papel em detrimento dos pixels de um eletrônico. Inclusive, minhas histórias eram escritas em parte no papel, porque eu amava sentir o contato do grafite com a folha, uma das sensações mais prazerosas da vida.

Tinha acabado de enviar para o e-mail da Lindsay com um elogio elaborado — eu esperava — sobre o seu trabalho quando Lara entrou de supetão no quarto.

— Você já leu?! — Perguntou com os olhos arregalados de animação. Estava com seu celular desbloqueado na mão.

— Já... — respondi cautelosa, imaginando que ela estava ansiosa para conhecermos algum local novo quando eu terminasse o trabalho — acabei de enviar para Lindsay.

— Não isso. — Descartou a ideia, correndo para o meu lado — A matéria da Entertainment Magazine!

— Saiu?! Eu não achei que sairia tão cedo!

Sentamo-nos juntas na cama, encolhidas para ler em seu celular. Minha foto com o livro estava logo no começo e escondi meu rosto com as mãos, gemendo de vergonha. Ai não, se porventura Justin tivesse acesso àquela publicação, eu não desejaria que aquela fosse a primeira imagem que tivesse de mim. Eram baixas as possibilidades, claro, porém, eu que não queria arriscar.

— Para com isso, está linda!

Em um vestido amarelo rodado até os joelhos e meia calça preta, eu estava deslocada e envergonhada, e um pouco vesga. Não precisava de muito para perceber.

O título da matéria dizia:

De belieber à escritora: a jovem que ganhou as prateleiras do Brasil e está prestes a conquistar o mundo.

Curvei a boca para baixo, numa expressão perplexa e elogiosa.

— Muito generosos.

— Realistas! — Lara corrigiu-me, começando a ler o conteúdo em voz alta.

Eu não me lembrava de dar respostas tão claras e eficientes, mas fiquei contente com o resultado. Eles me relatavam realmente como uma escritora promissora, o que era bastante encorajador. Torci fervorosamente que não os decepcionasse.

— Eu tenho tanto orgulho da minha caçulinha! — Lara me juntou num abraço, esfregando meu couro cabeludo com os nós dos dedos da mão direita.

Eu ri, tentando me desvencilhar. Quando consegui, sorri com sinceridade para ela.

— Muito obrigada, Lara. Significa muito para mim.

— Pois bem, e como vamos comemorar a primeira entrevista internacional de muitas? Ainda faltam publicar a do jornal, aliás. — Pontuou, erguendo um dedo — E o que acha do Shopping Fashion Valley Mall? Creio que é melhor deixar o Belmornt Park para amanhã mesmo, precisamos de um dia todo para as atrações.

Eu e Lara esperávamos ansiosamente por esse parque a beira mar desde que planejamos vir à San Diego. Parques de diversão eram assunto sério para nós duas, viciadas em adrenalina como éramos. Só de pensar na montanha russa gigante de madeira, praticamente ao lado do mar, delirávamos.

Pulei da cama.

— De acordo! Vou me vestir bem, um centro comercial é ainda mais provável de se esbarrar em certas pessoas — arqueei minhas sobrancelhas sugestivamente.

Lara apressou-se em me ajudar, concordando com meu argumento. O frio não era minha estação favorita para escolha de roupas, por outro lado, eu possuía um bom e novo arsenal de roupas de inverno. Combinamos uma calça jeans clara com coturno bege, camiseta branca simples, sobretudo de um bege mais claro, cachecol cinza e uma touca na mesma cor de pelinhos com um pompom atrás.

Estendi os braços e olhei para cima esperando elogios quando desci as escadas. Compelidos, meus pais não economizaram nas palavras, seguidos por Lara, orgulhosa do nosso trabalho.

— É hoje que ela desencalha!

Eu ri convulsivamente quando nosso pai, Daniel, lhe deu um peteleco na orelha.

— Pode isso, Estela? — ele olhou para nossa mãe, buscando reforços.

Os dois eram os verdadeiros amores da minha vida. Meu pai era um pouco mais estressado, em seus 50 anos de vida, pele bronzeada e cabelos grisalhos, transpassava experiência nos olhos castanhos. Minha mãe era um pouco mais baixa do que ele, da mesma idade, praticamente do meu tamanho, ostentando cabelos pretos tingidos e encaracolados na altura do ombro, de pele morena brilhante e olhos sábios igualmente escuros. Juntos, representavam minha meta de relacionamento, bem humorados e muito unidos até mesmo depois de algumas brigas.

Andamos pelo shopping em sintonia, entrando em várias lojas para bisbilhotar. Nos divertimos experimentando roupas e eu insisti em comprar uma combinação para cada. A entrevista me deixara um pouco mais confiante e eu tinha a impressão de que podia sim dar certo. Quem sabe conseguia levar a história para os cinemas? Sonho.

Passamos algumas horas ali, já emendando em um jantar antecipado. Eu havia acabado de comer o meu hambúrguer quando recebi uma mensagem no celular.

Onde você está? Estou aqui na porta da sua casa, precisamos conversar.

Estranhei, perguntando-me o que Fani poderia querer comigo que fosse tão sério para aquela escolha formal de palavras.

— Hm, gente, a Fani está em frente a casa e disse que precisamos conversar. Falo pra ela vir aqui ou vamos embora?

O que eu tinha feito de errado? Talvez anexara um e-mail diverso para a editora. Ou eles não gostaram das minhas pequenas intervenções. Ou haviam mudado de ideia quanto à publicação. A simples ideia me dava enjoo.

— Nós vamos, Ju. Ela adiantou sobre o que se trata? — minha mãe indagou, já começando a se levantar e pegar a bolsa.

— Não.

— Talvez não seja nada demais. Só alguns detalhes — Lara comentou, tentando apaziguar um clima de tensão que surgia.

Assenti, quase não prestando atenção, formulando teorias da conspiração em minha cabeça. Por isso, o trajeto de volta à casa parecera eterno, e quase não consegui esperar o carro parar completamente para pular fora. Fani saiu do próprio veículo estacionado logo em frente e esboçou um sorriso de cumprimento, um pouco tenso, percebi. Eu podia estar vendo coisas pela minha própria tensão também.

— Oi, Ju! Estavam se divertindo? — Ela se encolheu no casaco, protegendo-se da brisa fria — A matéria saiu mesmo excelente.

— Sim, estávamos no shopping — pensei em atirar a pergunta logo em seguida, contudo, também estava com receio de saber o assunto. Tínhamos um problema, eu sentia em minhas entranhas.

Meu pai abriu a porta enquanto aconteciam os cumprimentos restantes e adentramos ao calor aconchegante do imóvel. Penduramos os casacos ao lado da porta e minha mãe gesticulou para sentarmos no sofá.

— E então? Alguma novidade? — Perguntou, tomando as rédeas da situação.

Fani passou a mão no queixo e então a expressão até o momento tensa se transformou em expectativa. Bateu as mãos na coxa como um tambor. Espera. Era bom ou ruim?

— Vocês não vão acreditar em quem entrou em contato comigo — ela parecia espantada.

Ficamos quietos, esperando, a curiosidade emitindo ondas de nossos corpos. Arqueei a sobrancelha, quase irritada pelo suspense.

— Scoo-ter Bra-un — disse o nome devagar, separando cada sílaba com assombro.

Parei de respirar.

— Você diz... o empresário do Justin? — Minha voz subiu uma oitava.

Ela moveu a cabeça lentamente para que absorvêssemos o impacto. Ouvi várias exclamações perplexas, e uma podia muito bem ser a minha.

— E o que ele disse? — Eu parecia histérica aos meus próprios ouvidos, então respirei para tentar me tranquilizar, sentindo um zunido nos ouvidos.

— Bom... — ela franziu o cenho, decidindo se demonstrava empolgação ou preocupação. Não chegou a um consenso e acabou parando no meio termo — Ele quer conversar com a gente pessoalmente hoje à noite. Pediu o endereço da sua casa.

Senti-me extasiada, imaginando Scooter entrando na minha casa — não minha literalmente — e... Meu Deus, será que traria Justin junto?!?!

— Certo. Ele não tem um escritório? — Meu pai parecia mais cético, não soube dizer se pelas intenções de Scooter ou se duvidava que fosse ele mesmo.

— Tem, mas gostaria de manter o encontro privado.

— Você tem certeza de que é ele? — Insistiu.

— Sim, foi por chamada de vídeo. Posso passar o endereço?

Coloquei a mão no coração, impedindo que pulasse para fora.

— Ele... vai trazer o Justin? — Minha voz tremeu e eu pigarreei, alvo de quatro pares de olhos.

— Pelo que eu entendi, não — deu um meio sorriso que pedia desculpas — Eu não faço a menor ideia do que ele quer. — Por isso ela não me dava a notícia em puro êxtase, considerava no fundo a possibilidade de ser algo ruim. E ruim nesse caso poderia ser...

Respirei fundo outra vez. Eu não precisava surtar, Justin não viria, dava para manter a sanidade quase estável. E tentar adivinhar o que Scooter — caramba, Scooter?! — diria me deixaria louca.

— Pode passar o endereço. — Dei uma pausa no intuito de dar a oportunidade do meu pai contestar, como não aconteceu, continuei — Que horas ele vem? — olhei em meu celular que marcava 18:30 p.m.

— Vamos ver... — ela digitou no celular e eu corri para o seu lado a fim de ver. Era mensagem de texto.

Scooter era uma ponte direta ao Justin, se ele viesse eram dois tempos até eu conseguir acesso ao meu cantor favorito de anos! Eu precisaria me beliscar para conferir se não estava sonhando.

Ele respondeu quase imediatamente, marcando para às 19:30. Uma hora que se arrastaria lentamente, eu tinha certeza. Andei em volta da mesa do centro enquanto todos cogitavam o tema da conversa, Lara mostrava-se muito otimista.

— É óbvio que ele ficou sabendo da história, disso não duvidamos... — se ele sabia... Justin sabia? Ai meu Deus, meu intestino grosso se contorceu. Ambos sabiam meu nome??? — Pode ser muito bem que veio parabenizar pelo trabalho, que gostou do livro, e quer fazer algum tipo de parceria, ajudar a divulgar, coisas assim! — Ela sorriu para mim, cheia de expectativas.

Primeiro, eu precisava lidar com o fato de que Scooter Braun estava vindo para a minha casa.

— É possível. — Fani concordou, deixando claro que era aquilo que desejava também — Como também é possível que queiram alguma modificação na história... Uma parte dos lucros...

— Mas não há nenhuma referência a eles nos livros! Não há relação jurídica para esses pedidos — meu pai discordou.

— Bom, Júlia já disse que inicialmente a história era uma fanfic, uma história inspirada no Justin, tudo é possível. Agora quanto a relação jurídica, devo concordar com o senhor, mas também não sou uma especialista em Direito para saber se o pedido é ou não cabível. — Fani ponderou, me dando uma olhadinha de esguelha. Ela não queria me preocupar, porém não queria que eu tivesse surpresas desagradáveis.

Eles se retesaram, pensando.

— Júlia, querida, você pode se sentar um pouco conosco? — minha mãe pediu, começando a ficar inquieta com meu circuito.

— Impossível — neguei. Tinha a impressão de que se parasse de me movimentar, poderia explodir.

— Você entende, Ju? — Fani se dirigiu a mim — Eu só quero esquadrinhar todas as possibilidades para podermos nos preparar. Mas não temos certeza de nada, então pode ser que estejamos exagerando também. Considero as possibilidades negativas porque ele não quis me adiantar o assunto.

Mexi a cabeça para mostrar que estava ouvindo, mordendo a boca.

Minha mãe suspirou.

— Bom, com notícias boas ou não, precisamos dar uma boa hospitalidade. Quer vir me ajudar na cozinha, Ju?

Não seria de muita utilidade formar um buraco no chão pelo andar constante, então fui satisfeita atrás dela, ansiosa para tentar distrair-me.

Preparamos um chá, suco, separamos bolachas e biscoitos. Apenas uns aperitivos, minha mãe disse. O que era uma pena, não tinha muito que fazer. Deixamos tudo na mesa da copa e ouvimos meu pai opinando:

— Devemos levá-lo ao escritório subterrâneo, se quisermos demonstrar seriedade.

— Hmm... Creio que seria melhor trazê-lo para a copa mesmo, deixá-lo confortável para se sentir mais a vontade conosco. Talvez o deixe até mais simpático.

— Scooter já é simpático. — Acrescentei — Mas talvez mamãe esteja certa.

Todos concordaram e eu já tamborilava meus dedos na mesa.

— Quanto tempo mais?

— Falta meia hora ainda, querida. — ela disse, olhando-me com pesar.

Expirei, como se aquilo pudesse atenuar a tensão dos ombros. Não adiantou. Voltei a andar pela casa. Levei meu casaco para cima e tirei o cachecol e a touca. Depois coloquei de volta a touca e passei um gloss nos lábios. Então tirei o gloss e passei um batom nude. Peguei meu celular para ligar a alguém e desisti.

— Você vai conhecer o Scooter Braun, Júlia. Pode acreditar nisso? — Lara apareceu repentinamente na porta, honrada com o meu privilégio de conhecer o empresário do meu ídolo de infância. Ela com certeza não pensava que ele poderia trazer más notícias, e para falar a verdade, minha maior preocupação, tirando toda a emoção que estava sentindo, era saber se não haviam gostado da história.

E como saberiam o teor dela? Claro, a revista deixara a Sinopse do livro na entrevista, mas a publicação fora feita hoje. Eles eram tão rápidos assim?

— Não. Não consigo acreditar.

Ela chacoalhou meus ombros.

— Pois acredite!

Abri a boca para dizer alguma coisa e ouvimos batidas na porta. Arregalamos os olhos uma para a outra e eu desci as escadas como uma jato, tremendo mais intensamente agora. Lá embaixo os três me olharam, fazendo gestos simultâneos de calma. Remexi as mãos nervosa, tentando passar a mensagem de que estava tudo sob controle pela expressão. Não sei se funcionou.

Minha mãe foi quem abriu a porta, sorridente e simpática. Ergui-me nas pontas dos pés para espiar sobre o ombro dela.

— Boa noite, senhora. Sou Scooter Braun, creio que você deve ser a mãe de Julia?

Eu cairia para trás se Lara não estivesse ali segurando meu cotovelo. Sim, de fato era ele. O cabelo escuro e curto, com entradas anunciando uma calvície futura que deixava a mostra boa parte de sua testa. A barba por fazer no rosto oval se tratava de uma característica comum, emendando com o bigode. Usava uma camiseta preta simples e jeans, como se não fosse rico o bastante para comprar um estado inteiro.

Ele cumprimentou todos os presentes de maneira bastante educada, até chegar a mim, ainda parada aos pés da escada.

— Julia, certo? Prazer, Scooter. — Ele sorriu para mim, falando naquela sua forma tranquila, estendendo-me a mão.

Todos os olhos estavam voltados a mim, tensos com a minha reação. Pigarreei, arrumando uma inspiração profissional.

— O prazer é todo meu. Tudo bem? — Eu disse, bastante controlada, mas tinha noção dos meus olhos levemente arregalados e o sorriso que ameaçava pular do rosto.

Ele pareceu lisonjeado com minha expressão.

— Bem, sim. Podemos conversar um pouco?

— Claro! — Imaginei se eu poderia convencê-lo a fazer uma chamada de vídeo com Justin e nos apresentar, e mordi minha língua para não pedir. Não ainda.

— Por aqui. — Minha mãe indicou a copa.

Previsivelmente para mim todos se sentaram junto, com os olhos atentos nele, que parecia ligeiramente curioso com a plateia.

— Vamos direto ao assunto, Julia. — Ele cruzou as mãos na mesa, aceitando uma xícara de chá que minha mãe serviu. Decidiu ignorar os outros presentes, direcionando seus olhos para mim e de modo furtivo à Fani — Fiquei sabendo que lançou um livro no Brasil, não é? November?

— Sim. — Engoli em seco. Ele odiara, ah sim, odiara.

— Parabéns por isso! Você deve saber que eu sou um empresário — uma olhadela para Fani — e admiro bastante quem tem essa capacidade de desempenhar um trabalho por conta própria, digamos. Admiro você.

— Obrigada. — Agradeci, ainda que desconfiada com o seu tom de que precedia um "mas".

— Não por isso. E agora, conforme ficamos sabendo — aquele plural envolvia o Justin?! — vai lançar aqui também. Estou certo? — Gesticulou com as mãos, como se aquilo fosse uma catapulta às suas palavras.

— Sim.

— É impressionante que tenha conseguido esse feito, de verdade. — Olhou no fundo dos meus olhos, tentando passar a sinceridade com que dizia. Eu sorri sem muito ânimo, sentindo que o "mas" estava mais próximo. — E fiquei sabendo também que a história era originalmente uma fanfic, sim? É assim que vocês chamam? Fanfic?

Eu dei uma risadinha sem graça, mordendo o lábio de nervoso.

— Bem, novamente devo dizer que é impressionante o quanto alcançou. — Desviou os olhos e cruzou as mãos, apoiando a boca nelas enquanto pensava em como dizer aquilo — Eu sei que foi e está sendo trabalhoso para você... e... você é fã do Justin, certo? — olhou-me de novo, esboçando um sorrisinho.

Assenti energeticamente.

— Muito — enfatizei a palavra.

Ele riu.

— Muito bem. Pudemos notar, é claro, certas semelhanças com a trajetória dele mesmo... Inclusive coisas de uma época meio difícil, digamos...

Sim, eu escrevera sobre o momento em que ele estava praticamente perdido, abusando do uso de drogas, sendo desrespeitoso com tudo e todos, exagerando nas bebidas e descartando mulheres como se fossem objeto, aliás, traindo sua namorada. A personagem principal teve uma participação essencial nesse momento, ajudando-o a encontrar o centro de novo, lembrando-o de quem ele era. E aí acontecia o que toda fanfic que se preze tem: romance.

— Notamos que você até mudou os nomes... Mas, de qualquer forma, já declarou publicamente que a história foi inspirada nele — ele tomou um gole de chá, sem pressa para continuar falando até que estivesse com todas as palavras preparadas — Veja, Julia, você sabe que Justin agora está tentando deixar tudo isso para trás, não é? — Concordei com a cabeça, prevendo com certo medo o que ele diria — Então tememos que isso acabe desenterrando tudo de novo. Já vai ser difícil ter um recomeço, ter um livro sobre isso, além de ser um lembrete constante a ele, será para as outras pessoas, entende? — Não concordei dessa vez, embora fosse uma linha de pensamento um tanto lógica. Apesar disso, ele continuou — Portanto, Justin e eu concordamos que seria melhor se o livro não fosse publicado. Você poderia fazer isso? Deixar de publicar?

Tive algumas percepções aos mesmo tempo: sim, Justin conhecia a história — pelo menos o teor dela — e sabia quem tinha escrito — eu, no caso —, o que por si só já era insano e poderia ser extremamente prazeroso. O porém vinha com a segunda percepção: ele não aprovara. E a terceira: eles realmente queriam que eu não a publicasse nos Estados Unidos. O sangue congelou em minhas veias.

— Bem, Scooter, você notou então que está tudo sendo feito dentro da lei, certo? Não há uma menção à ele no livro, o personagem não tem o mesmo nome, não é como se estivéssemos infringindo os direitos autorais. — Fani se pronunciou com firmeza.

— Foi exatamente o que eu disse — ele se direcionou a ela —, mas, é de conhecimento público que a história foi baseada nele e Justin precisa e quer mais do que tudo deixar isso para trás.

Fani deu um sorriso duro.

— Compreendo, mas você entende que está pedindo que ela interrompa o próprio trabalho por um capricho de vocês? Aliás, eternizar os erros que ele possa ter cometido mais do que a mídia mundial já fez não é muito possível. E não são muitas pessoas que querem saber o que há por trás da história de um livro.

— Eu sei, mas...

— E se você ainda não sabe posso te dar um spoiler: no final Justin volta a ser uma pessoa boa, abandonando todos os problemas com a ajuda da personagem principal.

— Sim, não estou questionando isso. Não muda o fato de descrever os erros que ele quer esquecer.

Não vi a expressão de Fani, eu estava olhando fixamente para a mesa, mas ela parecia aborrecida quando respondeu.

— Me diz uma coisa, senhor Scooter, Justin já não escreveu músicas sobre os relacionamentos que teve e lançou? Mesmo que não tenha usado os nomes das namoradas, todos sabiam qual fora a inspiração porque ele disse na mídia, não?

Scooter respirou fundo.

— Não é disso que se trata, senhorita Sthefani. Não queremos prejudicar vocês, de forma alguma. É um simples apelo que vim fazer para não recorrer a outros meios — Fani exprimiu um tom de indignação diante da ameaça velada — Veja, Julia, eu sei que você não quer prejudicá-lo, disse-me que ainda é fã dele. Poderia pensar com carinho nisso? — Pediu-me e eu vi a súplica muito clara em seus olhos.

— Você está usando de chantagem emocional. A resposta é não. — Fani retrucou em meu lugar.

— Não há como você conversar com o garoto sobre isso, senhor Scooter? É o sonho dela e realmente não há nenhuma má intenção nele — meu pai se manifestou, intercedendo.

— Bem... — Scooter começou a se levantar — Justin foi muito claro no pedido, e não posso discordar dele porque vejo uma justa motivação. Então eu gostaria de pedir que vocês considerassem retroceder, não queremos criar nenhum conflito.

E depois, eu estava triste demais para prestar atenção em qualquer outra coisa. 

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Olá, amadas! Estou aqui para dar uma informação necessária. Essa fic citada, November, existe sim. Eu fiz ela há mUITO tempo atrás, acho que em 2013, então vocês devem ter uma noção da minha condição na escrita e desenvolvimento de história (pitoresco demais). Então, se alguma de vocês se aventurar a lê-la, tenha essa noção e não me julgue hahahah Coloquei ela como o livro a ser publicado porque realmente é o enredo que eu precisava para essa história e confesso que é o meu amorzinho, embora não muito bem escrita. 

Obrigada por estarem se divertindo comigo!

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