Valente

Eu já estava deitada na cama encarando o teto há horas pelo jeito, mas não conseguia pregar o olho. Antes de me deitar, havia finalizado mais uma dezena de capítulos revisados e enviado à Lindsay. Precisávamos nos apressar para fazer tudo a tempo, então logo ela me retornara com os dez restantes. Para me incentivar, prometeu que me enviaria o esboço final da capa assim que recebesse minha correção.

Mas a animação não era a única coisa a me manter acordada. Eu estava com medo, por mais positivas que fossem as esperanças do advogado — que agora eu sabia se tratar da pessoa do Doutor Russell —, de perdermos o processo. E do processo em si também, num geral, do efeito que aquilo teria à imagem do livro e a minha. Para acrescentar, como uma bola de canhão triunfante no meio de uma batalha já complicada demais, havia a bendita festa beneficente que eu deveria comparecer no dia seguinte.

Começava a me acovardar da escolha. Inventei mil desculpas em segundos para faltar. De fato, a saúde pode ficar ruim de uma hora para a outra, nunca se sabe quando seremos atacados por uma gripe ou virose. Bem como, realmente existem melhoras milagrosas no dia seguinte ao adoecimento, veja bem! E eu ainda poderia evangelizar falando sobre como a mão de Deus é poderosa na cura. Só não sei bem se Ele ficaria muito satisfeito com a mentira que ensejaria a pregação.

Meu peito já estava pesado e tive impressão de que o oxigênio não chegava aos pulmões, então respirei pela boca, irrequieta. Você está respirando, Júlia, se acalme. Soltei o ar devagar e tentei concentrar meus pensamentos em coisas mais tranquilas, como minha estante de livros no Brasil. Sim, nada me acalmava mais do que pensar nela, os exemplares organizados, os meus preferidos um pouco surrados e portadores de uma tranquilidade sobrenatural.

Eu quase podia ver Crepúsculo, minha maior inspiração e verdadeira razão pela qual me apaixonara pela vida literária. Sorri, lembrando-me do meu casal de ficção favorito, embora Bella claramente não mereça a perfeição altruísta de Edward. Como ela pode traí-lo? Duas noites após ter ficado noiva do vampiro mais cobiçado?! Eu nunca entenderia. Jacob, por sinal, tinha toda a minha desaprovação moral. Manipulador, insensível e irritante, eram três palavras adequadíssimas para classificá-lo. A bem da verdade, a descrição servia muito bem para certas pessoas que eu conhecera recentemente.

Fechei a cara, a aparência de pitel pouco podia fazer pelo caráter de abacaxi estragado vomitado por um rinoceronte. Segurei as pontas do cobertor com as mãos em punho. Podia visualizar o quanto sofreria na sua mão na noite seguinte. Mas eu não deixaria barato.

E lá fui eu de novo arquitetar as discussões acaloradas que Justin e eu teríamos no local....


— E mais! — Lara exclamou atrás de mim — Justin Bieber não gosta de November - A thread.

Gemi, enxaguando o copo — abençoados sejam os inventores da torneira aquecida.

— Ai, muita visibilidade? — Coloquei o copo no escorredor e parti para o garfo.

— Hmm... Quinhentos Rt's e mil e pouquinho de likes está bom para você?

Ah, minha nossa.

— Se esse fosse o único tweet sobre o assunto não seria tão ruim assim. — Eu disse, repassando em minha mente os resultados de nossa pesquisa nas redes sociais sobre Justin e eu. Claramente todo mundo suspeitava de que havia algo de errado acontecendo, e recebi milhares de perguntas sobre isso em minhas contas. Uma hora ou outra eu seria obrigada a me pronunciar.

Minha vontade, entretanto, era abafar o problema o máximo possível para que desaparecesse. Como se fosse simples assim. Com uma dor de barriga súbita pensei que esta noite reabasteceria as suspeitas com outro comportamento bizarro em público. Isso se ele viesse mesmo. Se fosse mais esperto me evitaria.

— Pelo menos tem muita gente defendendo o seu lado. — Lara argumentou.

Era verdade, pelo menos a maioria que eu vira achava um exagero se ele estivesse criando caso por isso. Ainda assim, toda a situação era incômoda.

— É. — Desliguei a torneira após enxaguar o prato.

— Terminou? — Ela já havia saltado da cadeira, animada.

Havíamos combinado de comprar roupa para a festa de hoje depois do almoço, já que na minha busca prévia ao guarda roupa não encontrei nada adequado. O famigerado surto de "NÃO TENHO NADA PARA VESTIR!".

— Sim. Vamos lá.

Fani havia se responsabilizado por nos levar, dando aos meus pais a oportunidade de curtir uma tarde como um casal de férias. Ademais, Fani tinha uma ideia melhor do que usar nessas ocasiões. Da nossa parte, Lara e eu fizemos uma pesquisa no google imagens para ajudar nas ideias — "roupa para festa beneficente" —, mas eu bati o pé para não ser nada muito chamativo. A última coisa que eu precisava era atrair olhos para mim, independentemente do motivo.

— Com toda certeza não. — Rejeitei o vestido vermelho vivo tomara que caia com abertura ousadíssima da cintura aos pés na perna direita.

E então Lara surgiu com a perfeição em forma de vestido, depois de estar quase zureta com tantas peças estudadas. Por decisão unânime, foi taxado como "minha cara".

— Só tem uma coisa... Será que eles tem outra cor? — Indaguei crítica, já imaginando as mil e uma formas com que eu poderia sujar o tecido cor de leite.

Para alívio da plateia, e preservação da minha dignidade, sim, havia um irmão gêmeo na cor preta. Eu e preto nos dávamos muito bem, uma vez que além de ser uma tonalidade magnífica, combina com TUDO e ainda é resistente às aventuras dos mais desleixados e desatentos — eu. Ser gótica quase era uma obrigação para mim.

Tendo concordado com o vestido mais simples, Fani fez questão de arranjar um colar extravagante, mas descartou brincos e pulseiras para que eu tivesse um ar de "realeza das fadas" — quê?. Consegui barganhar para uma sandália prata não muito alta, deixando claro que reconheço a majestade do bom e velho salto, mas não tenho a coordenação compatível.

Mal pegamos um milk shake, exuberantes com a vitória, e Fani nos atirou de volta ao carro com um olhar atento às horas. Havíamos andado incansavelmente pelo shopping a busca do traje perfeito e já era quase três da tarde. Ela havia contratado maquiadora e cabeleireira para me atender no conforto de casa — estratégia excelente levando-se em conta minha falta de apreço à salões de beleza e suas torturas — e ambas chegariam às 3:30. Nosso tempo estava mesmo curto.

Acrescente a falta de tempo com a dor de barriga previsível antes de me enfiar debaixo do chuveiro e teremos uma Júlia atrasada. A ideia de deixar Justin esperando na sala soltando fogo pelas ventas quase me fez esquecer de passar o condicionador nas madeixas. Não que ele não merecesse passar estresse — que inclusive era minha motivação primordial para aceitar esse programa —, mas eu não poderia abusar de sua quota como meu acompanhante num mar de desconhecidos.

Meu acompanhante. Dei três tapinhas em cada bochecha quando a onda de frio percorreu meu sangue e me fez tremer de nervoso. Franzi o cenho para mim mesma no reflexo do espelho, perguntando-me se eu estava acordada. Ou se por um acaso virara viciada em drogas e estava muito chapada para inventar os últimos acontecimentos da minha vida.

A vibração do meu aparelho celular em cima da pia me despertou do transe poético. Era uma mensagem de Isis:

"FOTOS, EU QUERO FOTOS! MUITAS FOTOS! Ele é um ordinário, mas é lindo, então as fotos ficarão ótimas! Não esqueça de mandar o mais rápido possível!".

Quase ri ao me imaginar pedindo isso a ele:

— Então, eu sei que a gente no momento se odeia, mas podemos tirar uma foto pra mandar pra minha melhor amiga?

Captei o horário no visor e dei um salto: 3:35.

Vesti minha lingerie e moletom, recordando-me que o vestido seria a última coisa a colocar. Fazia sentido, até porque eu havia acabado de sair do banho, não estava com calor, mas tinha noção da agitação em minhas glândulas sudoríparas. Sintoma recorrente para a ansiedade.

Lara já estava no meu quarto prestes a bater na porta do banheiro para anunciar meu atraso. Percebi quando Fani subiu com as duas profissionais de maletinhas nas mãos que eu não era a única sofrendo por antecipação. O quarto se preenchia de uma excitação quase palpável. E piorou quando meus pais chegaram e estagnaram por alguns minutos no quarto. Eu já estava sufocada.

Não foi uma superprodução, conforme solicitado por mim e ratificado por Fani. Recusei o coque que sugeriram — para ser sincera, me parece um desperdício de produção, aliás, nada me frustrava mais num casamento do que uma noiva de coque, inúmeros penteados para no fim aprisionar os fios de forma cruel! — e acatei a brilhante ideia de Lara. A cabeleireira alisou meu cabelo todo — e eu suei frio com a temível chapinha terrorista do couro cabeludo e orelhas desavisadas — só para cacheá-lo novamente com modelador. Separou duas mechas, uma de cada lado, trançou-as e puxou para uni-las atrás. Um semi-preso bem elaborado.

Por sua vez, a maquiadora me pintou com um delineado de gatinho bem simples, rímel — insisti bravamente para não colar cílios postiço, uma das coisas mais desagradáveis de se usar —, sombra prata bem leve com esfumado preto na ponta e o bom e velho batom nude matte. Recebi muitos elogios por parte de todas, e eu mesma havia gostado do resultado. Aprovei ao me olhar no espelho, pensando que talvez naquele dia minha autoestima resolveria dar as caras.

Lara entrou no banheiro comigo para me auxiliar a colocar o vestido, me espremi o máximo possível para não arruinar o trabalho feito. O vestido longo tinha alça larga que se abria em V para um decote não tão profundo assim — o que não me deixaria confortável —, acinturado, uma faixa em torno da cintura que fazia o restante do tecido cair levemente franzido até meus pés. Muito elegante sem precisar abusar da extravagância. Do colar prateado em formato de V caiam diversas pedrinhas de strass, mais concentradas na ponta, Lara encaixou o fecho na minha nuca.

— Júlia, eu sinceramente te daria o mundo agora. — Ela disse com entonação perplexa, arqueando a boca para baixo num claro sinal de aprovação à minha aparência.

Eu ri um pouco sem graça e me apressei para olhar no espelho grande do guarda roupa. As mulheres do quarto soltaram altos suspiros com a visão, amaciando meu ego com palavras de aprovação. Eu tinha que ser sincera, praticamente não me reconhecia. Já que não tinha paciência nem eventos para me arrumar tanto assim, o resultado impressionava. Esse tipo de produção no meu mundo se limitava à bailes de formatura e casamentos.

O vestido caía como uma luva em meu corpo, valorizando meus quadris largos e denunciando a falta de seios fartos, tinha o bastante apenas para anunciar sua existência, e para mim era o suficiente. As cores casavam em perfeita harmonia, meus olhos castanhos destacados com a arte de Janet — a maquiadora baixinha comunicativa —, a sombra prata destacando o colar e a sandália, meus cabelos e pele quase tom sobre tom do vestido.

Alertada pela comoção, minha mãe apareceu logo em seguida, desfiando orgulhosamente elogios para sua cria. Me fez dar uma voltinha e assoviou baixo, os olhos arregalados de tanta euforia. Eu me deixei distrair totalmente pelo momento modelo, então foi quase um baque quando ela disse hesitante:

— Eu vim dizer que ele chegou. Não desceu do carro, o motorista que bateu na porta. — Revirou os olhos e depois deu um sorrisinho maldoso — Claro que isso não impediu seu pai de ir até a janela, bater até ele descer o vidro e listar suas recomendações.

Muitas informações em poucos segundos. Senti meu estômago desabar — ou meu coração? — e pensei que precisaria vomitar. Mas, a ideia de deixar meu pai por mais tempo "conversando" com Justin, me fez segurar as pontas. E se eles começassem uma briga bem em frente a casa? E se meu pai agredisse o salafrário e ganhássemos mais um processo? Além do mais, eu precisava que Justin ainda estivesse com a paciência carregada para eu tirar camada por camada, devagar e precisamente durante a noite. Fani precisou correr atrás de mim para me entregar a bolsinha de mão prata quadrada que só cabia meu celular e meu documento — eu já previa que a esqueceria em algum lugar — enquanto Lara colocava a echarpe grafite em meus ombros depois que agradeci as meninas e corri escada a fora.

Chegamos em comitiva na porta aberta, meu pai estava ali de braços cruzados e cenho franzido, encarando a janela fechada do carro preto chato, mas quando nos ouviu abriu um sorriso imediato para mim.

— Filha, você está maravilhosa... — Piscou seus olhos brilhantes.

Todos estavam muito inseguros em me confiar nas mãos daquele gringo rabugento e recebi altas recomendações de ter sempre o celular a mão para ligar caso precisasse. Recebi a garantia de que a cavalaria partiria ao resgate no mesmo instante. Instruções para não aceitar bebida de ninguém, não sair de perto do Justin porque ele sabia muito bem que se algo de ruim me acontecesse seria estripado com uma foice — a olhadela do meu pai ao carro me deu a garantia de que Justin já fora avisado da possibilidade. E por fim: divirta-se! Gente rica, famosa, comida boa e música boa, provavelmente a melhor festa que eu compareceria na vida, não podia desperdiçar. Lara pareceu tentada a se enfiar no porta-malas para ir comigo, e eu ajudaria com prazer, gostaria que ela fosse comigo....

Com um último aceno ao meu porto seguro me direcionei a porta traseira que o motorista, um sujeito baixinho de pele translúcida e cabelo escuro pequeno de terno preto simples abriu para mim. Ele me cumprimentou com um aceno de cabeça e hesitei um pouco antes de adentrar o buraco. Tive visão primeiro do sapato social preto que reluzia, depois da calça social no mesmo tom — o tecido havia se acumulado um pouco nas canelas, o terrível e conhecido caso das roupas maiores que o dono —, e então seus braços tatuados descansando nas pernas. Usava um relógio de ouro no direito, a manga da camisa branca e do paletó puxados até os cotovelos, o paletó em si possuía três botões de cada lado na parte da frente, e apenas dois eram usados para abotoar o tecido, posicionados de modo que o tecido parecia abraçar seu tronco, uma parte em cima da outra até o meio da barriga. Então havia a usual abertura para deixar a mostra a gravata.

Por fim, a pior parte. Ambas as orelhas se enfeitavam com brincos prata argolinha, e o cabelo da cor de seus olhos meticulosamente penteado para trás, pendendo levemente para a direita. Ele não havia raspado seu projeto de bigode, fino acima da boca em formato de coração. No momento, estava contraída de desagrado, e eu tinha certeza de que ele não me olharia se eu não tivesse me atrapalhado tanto em minha entrada. Sua beleza estupenda e inumana me deixara nervosa e eu tropecei quando tentei enfiar o pé dentro do carro. O motorista agarrou meu cotovelo para me firmar e só me soltou quando consegui me sentar em segurança com o rosto queimando.

— Com licença. — Eu disse, tarde demais.

Tive a impressão de que seus olhos me analisavam e contorci as mãos no colo, queria encolher no banco até desaparecer. Minha autoestima já estava fazendo as malas, intimidada demais para ter certeza de que eu podia mesmo estar bonita. Concluí que ele já passara tempo demais com aquela liberdade, tomei um lufada de coragem e me virei para encará-lo. Péssima ideia, ele estava apertando o lábio inferior distraidamente entre os dedos e eu engasguei com a saliva. A parte boa foi que seus olhos insondáveis pararam nos meus.

Não tão boa assim, percebi quando minha axila coçou de suor.

Diga alguma coisa, Júlia!

Ele pigarreou.

— Seu pai é... Interessante. — Repuxou o canto da boca com ironia. Fiquei surpresa ao ouvir sua voz, como se ele fosse mesmo uma miragem.

Brevemente receosa de que estivesse sem voz, tentei responder:

— Você não viu nada.

Ele assentiu uma vez, me descreditando, e voltou o rosto para a frente. "Paciência", estava escrito em pé na lateral do seu pescoço, e precisaríamos de muita se quiséssemos sobreviver àquela noite na presença um do outro. Seu nariz reto estava empinado, mas até assim seu perfil era inexplicável. Parecia que o maldito havia roubado toda a beleza do mundo. O que era ainda mais injusto se ele fosse gastar o dom sendo tão petulante.

— Lá vai ter algum tapete de fotos ou coisa assim? — Perguntei, temerosa.

No caso dele, seria um desperdício se não tivesse.

— Provavelmente sim. — Respondeu áspero.

— Não é todo mundo que tem que tirar, não é? Porque se tiver, já aviso que não tirarei. — Eu não sabia tirar foto, esse era um fato, pior ainda quando alguém tirava de mim. Me esforçando muito eu conseguia dar um sorriso sem graça que raras vezes parecia apresentável, e como eu sabia que odiaria o resultado depois, preferia evitar essas situações.

Ele me olhou vincando o cenho.

— Não vai querer tirar foto? — Indagou confuso.

— Ah, não. — Então vi Isis fazendo uma cara bem feia para mim em minha mente — Pelo menos... não ali, assim... um monte de câmeras e pessoas... olhando. — Estremeci.

— Achei que fosse gostar dos holofotes.

Fechei a cara para seu sorrisinho sarcástico.

— Prefiro deixá-lo inteiramente para você que adora tanto se ver em tudo.

Ele ficou sério, fazendo um biquinho sem perceber. Contive o riso da infantilidade e virei o rosto para a janela, aproveitando enquanto ainda estava por cima, estava claro que teríamos vários rounds durante a noite. Ouvi seu suspiro enfadado, e concluí que ele pensava a mesma coisa.

Mordi a língua para não ficar perguntando se já estávamos chegando, ansiosa para o evento tanto quanto um pouco claustrofóbica naquele carro fechado. O ar era preenchido em sua maior parte pelo cheiro que ele exalava, aquela mistura excêntrica de sua própria pele — eu podia jurar que se assemelhava ao aroma de bebês — e a colônia levemente doce que usava. A despeito de mim mesma, evitei sabiamente passar qualquer uma das três fragrâncias que eu tinha de sua linha — Someday, Girlfriend e The key — porque não queria que ele os identificasse e ficasse se achando, embora eu os usasse sempre em algum evento importante — praticamente um ritual que me fazia um pouco de falta naquele momento.

Fiquei bem aliviada quando vi a plaquinha escrita em vermelho the BEVERLY HILTON e depois fiquei mais aflita ao ver a estrutura enorme e branca — que me lembrou muito um hospital — alguns coqueiros e pequenas árvores plantadas na frente. Um tapete vermelho nos recebia na entrada, fotógrafos atentos dos dois lados, inclinando-se o máximo que podiam sem pisar no caminho, aquele burburinho caótico ao visualizarem o mais novo convidado a chegar. Não havia ninguém ocupando a passarela no momento, mas eu via pelas janelas e porta de vidro que havia alguma aglomeração lá dentro, provavelmente a parada para tirar fotos que eu havia perguntado.

Fiquei petrificada ao perceber que eu estava sentada na porta paralela ao meio fio. Eu teria que descer primeiro?! Pai Eterno que no Céu habita! Logo eu, uma zé ninguém?! Seria vaiada, sim, eu tinha certeza. Engoli em seco e recuei diante dos olhares sedentos de ao menos uma duzia de fotógrafos. Agradeci pelo insulfilm ser escuro o bastante para não ser vista.

Justin pigarreou.

— Você não quer.... hm, tem razão, acho que eu tenho que descer primeiro. Pode deixar, Jimmy, eu abro para ela. — Ele disse, contrariado, e antes que eu pudesse me manifestar saiu pela sua porta, direcionada para a rua.

— Ei, o que você acha de irmos embora, tipo, agora? Eu te explico como voltar para casa. — Eu disse ao motorista, Jimmy, com uma esperança quase desesperada para escapar. Já podia ouvir o nome de Justin gritado quando apareceu no campo de visão dos profissionais.

Jimmy me olhou sobre o banco, achando graça.

— Tenha uma ótima festa, senhorita.

Naquele momento, minha porta foi aberta, resisti ao impulso de pular para trás enquanto Justin me estendia sua mão, a expressão gentil visivelmente forçada.

— Giulia. — Inclinou a cabeça, me convidando a descer.

Respirei fundo com os olhos fixos nele. Agarrei seus dedos, paralelamente surpresa em como a pele era macia, dei um apertão maldoso e desci um pé de cada vez, agora realmente precisando do apoio para ter certeza de que me firmara no chão. Os flashes me cegaram instantaneamente e fiquei apavorada com a ideia de que me abandonasse desnorteada no meio dos tubarões. Focalizei seus olhos e ameacei, numa súplica velada, quase sem mover os lábios:

— Não ouse me deixa sozinha.

Seu sorriso em resposta era audacioso ao passo que se desvencilhou da minha mão. Já estava no meio de um xingamento mental quando me ofereceu seu braço e, mais rápido do que deveria, aceitei a oferta. Os fotógrafos gritavam diversas perguntas que não consegui muito bem distinguir por estar ouvindo meu coração bater nos ouvidos.

— Não parece tão valente agora, huh? — Ele parecia bem satisfeito com a constatação.

Lhe dei um sorrisinho falso, claramente em desvantagem para fazer qualquer outra coisa. Voltando-se para o tapete, começou a me guinchar junto, acenando a mão livre para as câmeras com um sorriso muito adorável para alguém que desfrutava das minhas desgraças. Imaginei que esse era um dos motivos para a expressão surgir tão naturalmente.

— Sorria para eles, Giulia. — Instruiu-me, inclinando a cabeça levemente em minha direção.

Achei muito difícil levantar os olhos dos meus pés, certa de que tropeçaria se não mantivesse minha atenção neles, mas o obedeci, esticando os lábios totalmente sem jeito. Justin deu uma risadinha baixa.

— Parece que você está com dor de barriga.

Dane-se, ele ultrapassou os limites. Pisei em seu pé de propósito e ao ouvir o gemido provocado consegui de fato mostrar os dentes, bem mais animada.

— Justin! É sua namorada? — Distingui a pergunta de um dos homens à esquerda.

Bufamos baixinho ao mesmo tempo, trocando um olhar de desprezo recíproco, e seguimos o caminho. Ele não parecia muito propício a responder nenhuma das perguntas, e eu agradeci por isso, passamos reto até a porta, dispensando sorrisos e acenos breves, muito tímidos da minha parte. Estagnei quando chegamos, o painel para fotos estava à direita no lobby muito elegante do hotel revestido de mármore, mas a confusão não me deixou prestar muita atenção além dos lustres que pareciam aquelas lanternas de papel, emitindo uma luz amarelada. Ali dentro, os fotógrafos abriam espaço para as estrelas fazerem suas poses, e eu podia jurar que Jennifer Lopez acabava de sair de lá em um vestido de tule rosa.

Soltei seu braço, voltando-me ao fotógrafos a fim de me juntar a eles atrás da linha dos holofotes. Com Justin Bieber na frente ninguém prestaria atenção em mim. Ele me olhou curioso antes de identificar minha intenção, e eu sinalizei atrapalhada que o veria no fim do caminho. Sem lhe dar muita escolha, me escondi covardemente em meu lugar ao passo que o via desfilar para o centro das atenções, conduzido por uma organizadora de eventos de crachá vermelho e trajes escuros.

Sendo chamado por todos os lados, Justin parou bem no meio do painel, posando de um modo tão natural que parecia ser modelo, não cantor. Ele colocou as mãos no bolso, abriu um pouco a boca e levantou o cenho. Cruzei os braços. Mexeu na gravata, levantou o queixo e travou o maxilar. Pigarreei. Cruzou as mãos na frente do corpo e baixou os olhos para elas. Massageei meus ombros tensos. Posicionou um pé na frente do outro, como se fosse caminhar, mas paralisou com um olhar penetrante para o lado. Será que mais alguém estava com calor?

Justin uniu as mãos em prece com aquela cara de sofreguidão que adorava fazer e eu não consegui evitar o sorriso involuntário apesar de morder o lábio nessa tentativa. A maioria de suas fotos atualmente eram com aquela expressão, salvei diversas mídias assim. Infortunadamente, seus olhos pararam em mim naquele instante, intrigados. O sangue subiu para minhas bochechas e ele deu um sorrisinho zombeteiro. A próxima pose foi um sorriso reluzente, que brilhava tanto quanto seu cabelo sob aquelas luzes brancas intermitentes. A luminosidade destacava a harmonia perfeita da cor de seus olhos com as mechas, pedaço vivo de tentação.

Quero dizer.... Lembrei-me de respirar.

Ele me olhou e sinalizou com a cabeça para o lado e paralelamente nos direcionamos ao final do corredor humano, a próxima vítima dos profissionais estava chegando, mas não consegui me virar para olhar. Justin me ofereceu o braço de novo, o sorriso presunçoso estampado no rosto. Passou a língua nos lábios para falar:

— Impressionei, não?

Justin não precisava que eu respondesse, conseguia ler bem em meus olhos o que eu me recusaria a dizer. Aquele maldito sabia que era bonito e quase não podia evitar de jogar seu charme por aí.

De repente eu tinha mais uma preocupação para aquela noite: esperava que meus hormônios sobrevivessem. 

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