Substância Química
A porta foi aberta assim que coloquei meus pés na calçada, minha mãe e Lara atrás do meu pai, ansiosos e quase severos. Fui até eles sem olhar para trás, contrariando minha vontade. Eu queria me virar e acenar quando ouvi o carro se distanciando. Fora muita gentiliza da parte do Justin querer me acompanhar até a porta de casa com um Uber sendo que eu podia simplesmente vir sozinha. Mas ele me garantira que não era tão ruim a ponto de me deixar "desprotegida" daquele modo com um estrangeiro.
— Eu não conto como estrangeiro, é claro — ele piscou para mim, astuto.
— Claro.
Dei um sorrisinho ao me lembrar sem perceber que o faria. Minha família estreitou os olhos para mim.
— E então? — Meu pai perguntou, na expectativa.
Lara estava cobrindo a boca com a mão e eu tinha a impressão de que segurava uma risada.
Fiquei momentaneamente inexpressiva, tentando me lembrar o que queria saber. Lara virou de costas, seus ombros tremiam um pouco.
— Ele ofereceu algum acordo? — Minha mãe me incentivou impaciente.
— Ah! — Claro, o processo, ele havia me levado para uma conversa logo após a audiência de conciliação.
Entrei em casa primeiro e fechei a porta, usando os movimentos como desculpa para meu silêncio. Na verdade eu tentava me lembrar o que havíamos conversado sobre o processo... Parecia uma realidade quase distinta da que vivi nas últimas horas, o prazer de vê-lo produzir no estúdio, dar uma volta em seu jatinho particular, conversas amigáveis...
— Sim, isso. Consegui convencê-lo a ler o livro, vou enviar para ele no e-mail. Ele não prometeu nada, mas disse que vai dar uma chance. Também me contou que não é nada pessoal, é só um consenso geral de que pode ser um livro prejudicial à sua carreira — bufei com a ideia, eu nunca representaria uma ameaça para ele, tão insignificante quanto sou —, mas conseguimos tratar o assunto de forma mais pacífica. Creio que conseguiremos entrar num acordo.
Encostei-me nas costas do sofá, alvo dos olhos atentos da minha família. Meu pai ergueu uma sobrancelha.
— Foi um meio termo complicado de se encontrar? Você demorou tanto que pensei que ele havia solucionado a questão te esquartejando e jogando os pedaços no mar.
Revirei os olhos de forma cômica para o exagero.
— Ah, sim. Conversamos bastante, não consegui que encerrasse o processo, mas se seguirmos nesse caminho pode ser que dê certo.
Ele cruzou os braços, ainda inquisidor.
— Vocês conversaram esse tempo todo só sobre isso? Para onde foram?
Pulei imediatamente para a defensiva, uma reação reflexa. O que eu poderia dizer? Será que ele ficaria bravo se eu contasse que estava em Los Angeles? Lembrei-me da ligação de Danilo e soube que não poderia mentir sendo que a qualquer momento saberiam a verdade. Isso se já não soubessem, meu pai adora jogar verde para colher maduro.
— Bom... Ele acabou me levando no estúdio dele para mostrar uma música, então falamos um pouco sobre isso também — e sobre pesquisas de fórmulas para pessoas se apaixonarem, acrescentei mentalmente, lembrando-me do momento tenso.
Óbvio que ele não precisava se esforçar para aquilo, eu já era apaixonada por ele há anos, como toda fã que se preze. A paixão em seu sentido pleno de "excesso de admiração". Com ele ao vivo e a cores o sentimento só se ampliaria — se e quando ele não estivesse tentando ser um babaca comigo. Aliás, como concluí naquela tarde, não havia uma só coisa que ele fazia que eu não admirava. Ninguém era tão bom quanto ele em nada.
— Te levou ao estúdio? — Lara arfou.
— Sim — senti meus olhos se arregalando de empolgação, o fanatismo se debatendo dentro de mim para ser externado —, foi sensacional! Todos aquela aparelhagem e o talento dele... Lara, tem um novo álbum vindo aí e a qualidade está de primeira! — Uni as mãos como portadora das boas novas. Eu precisava surtar sobre aquilo, só precisava do mínimo incentivo que garantia ser território seguro.
Meus pais se entreolharam, mas Lara esboçou um sorriso enorme e veio me abraçar de lado.
— Tenho certeza que foi incrível. Ele finalmente te tratou como uma fã merece, não é?
Coloquei a mão no peito solenemente, obrigada a reconhecer.
— Sim!
Depois de uma retrospectiva breve em minha mente do que fora aquela tarde, saída diretamente dos meus sonhos mais lindos, comecei a me sentir meio melancólica. Eu não queria que tivesse chegado ao fim. Quando o veria de novo? Como poderia ter certeza de que estaríamos num relacionamento tão bom quanto experimentáramos naquele dia? E como poderia passar tanto tempo assim com ele? Tinha a vaga impressão de que quanto mais eu o visse, mais precisaria vê-lo.
É uma situação parecida ouvir suas músicas. Quanto mais eu ouço, mais quero e preciso ouvir. Justin Bieber sempre fora minha substância química viciante, claro que quanto mais eu recebesse dele, mais quereria.
— Ju, você precisa tomar muito cuidado com ele — minha mãe me puxou de volta a conversa, o rosto distorcido em desconfiança —, gente rica e famosa faz o que for preciso para atingir seus objetivos. Eles se tornam mimados e não conseguem receber uma negativa. Principalmente os homens — alertou-me.
Ela recebeu um breve olhar de censura do meu pai pela última frase, mas, ele decidiu que concordava e me lançou a mesma expressão de alerta.
— Sua mãe tem razão. Está na sua cara que você tem um coração muito bom, é ingênua e fã dele, ele sabe seus pontos fracos e vai usar contra você.
Balancei a cabeça, resignada.
— Está tudo bem, não vou deixar ele me manipular, sei muito bem o que eu quero.
Está certo que pensei em desistir de publicar o livro por duas vezes naquele dia, mas eu não tinha realmente aquela intenção. Por outro lado, pensei sobre o que eu queria. Por anos tudo o que mais quis foi a presença dele, o sonho de publicar um livro veio inclusive como consequência a essa necessidade de falar dele o tempo todo — é claro que agora era mais do que isso, mas eu não negava minhas raízes. Coloquei os dois pesos na balança. E se os dois desejos não fossem conciliáveis? E se eu pudesse ter apenas um deles? Qual lado pesaria mais?
Me dei um peteleco mental. Claramente devia ser a minha profissão. Aliás, por mais que me sugerira ser meu amigo, ele era de um mundo quase completamente diferente do meu, não manteríamos contato por muito tempo — e aquilo me deixava muito mais triste do que deveria. A publicação do meu livro seria eterna e grande propulsora da minha vida toda. Não havia uma escolha a ser feita ali. Não devia haver.
— Só tome cuidado, querida — minha mãe afagou meu rosto, os olhos grandes e amorosos pareciam imersos no desejo de me colocar dentro da barriga novamente para que pudesse me proteger.
Eu sorri e assenti antes de usar as palavras mágicas:
— O que vamos jantar?
Com um período de estadia temporário no exterior, sabiamente decidimos comer fora. Meu pai nos conduziu ao George's at the Cove, um restaurante com visão privilegiada para o mar, de três andares. Escolhemos a mesa mais próxima da ponta, na parte externa, o ambiente todo era composto por cores neutras para não ofuscar a beleza natural. As cadeiras e mesas simples cobertas com guarda sol branco. As lâmpadas distribuídas com muita sutiliza para aproveitar o máximo da luz da lua e estrelas. Quase me senti em casa, sua semelhança com os restaurantes a beira mar do Brasil é notável, e imediatamente fiquei mais relaxada.
Sentei-me ao lado de Lara, de frente para os meus pais, ouvindo minha mãe relembrar com nostalgia mais uma das peripécias de seus antigos alunos. Com 25 anos na profissão, suas histórias nunca tinham fim. Às vezes acabava repetindo algumas, mas adorávamos ouvi-la contando com toda a emoção que impregnava nelas.
— ... e ele disse, "pro, você tem que comer alface pra ficar 'sadá' " — ela riu, divertindo-se. Acompanhamos o riso por um momento e ela se virou ao meu pai de repente — Você se lembra que a Júlia costumava chupar as folhas de alface para provar do tempero e depois jogava fora?
Mais uma rodada de risinhos.
— O Walter me contou que a filha dele faz a mesma coisa... — meu pai começou, aproveitando a linha para emendar outra história.
Como ele se virava para minha mãe e vez ou outra nos olhava para compartilhar o assunto, Lara se aproveitou de um dos momentos de sua distração para me cutucar discretamente. Ela pousou o rosto na mão e se virou ligeiramente para mim.
— Me conta como foi! — Seu tom de voz era baixo o bastante para que só eu ouvisse, não combinava com a animação que eu via em seus olhos.
Eu estava um pouco hesitante de compartilhar a história, mas em seus olhos não havia julgamentos, não que eu pudesse ver, então me lancei com vontade a descrição, naquela mesma alegria quando ela me perguntara sobre o estúdio.
— Bom, ele me levou num lugar caríssimo para almoçar, com uma vista maravilhosa da cidade e do mar — imagine só, eu vi até um avião muito perto! Então foi uma sorte que ele se dispôs a pagar. Tudo bem que no momento eu estava tão brava que queria pedir o prato mais ridiculamente caro do cardápio, mas eu tenho modos — nós duas rimos com maldade — No começo eu estava muito resistente, mas ele já havia me mostrado duas músicas novas — arregalei os olhos, demonstrando o quanto aquilo era excepcional — então eu não estava mais com tanta raiva quando conversamos. Foi basicamente o que eu disse aos nossos pais, ele me contou sobre se sentir mal com seu passado e querer apagá-lo e blá blá, e eu pedindo para que lesse meu livro, e ele concordando. E depois.... — fiz uma pausa para tomar fôlego.
— E depois? — Me incentivou, aproximando-se um pouco mais com interesse.
— Depois ele me levou na Lamborghini, meu Deus aquele carro é incrível, ....
— Espera! — Interrompeu-me, colocando a mão livre no meu ombro — Você tem que se tornar amiga dele para pedir que me deixe dar uma volta — Implorou, unindo as mãos e franzindo o rosto.
— Você tem noção do prejuízo que vai dar se bater um carro daqueles? — Perguntei cética, esquivando-me da linha de pensamento de nós dois amigos. Segundo ele, já éramos.
Ela sorriu com presunção.
— Mas eu não vou bater. De qualquer forma, se ele quiser pode dirigir e me levar no banco do carona — deu a ideia, como se fosse um gênio. Então arqueou uma sobrancelha — Se ele quiser posso retribuir de outra maneira — ela piscou com malícia —, ele está solteiro e até que é um brotinho.
Fechei a cara para minha irmã mais velha. Ela só era um ano mais nova do que ele. Não que isso fosse fazer alguma diferença. O que é a diferença de idade? Nada. Nunca achei grandes coisas. Dois adultos sabem muito bem o que querem.
— Ele não é um dos seus contatinhos, Lara.
Lara arqueou as sobrancelhas duas vezes.
— Mas pode ser.
Fiquei ainda mais carrancuda e ergui um dedo de alerta.
— Você nem ouse.
Ele não teria nem chances se ela resolvesse jogar seu charme, óbvio que ficara com todo o gene bom da família e resultara numa criatura perfeita. Justin ficaria caidinho por ela se ela lhe desse um mísero sorriso. Bom, se ele fosse meu cunhado eu o teria para sempre na minha vida, como eu queria, não?
Rejeitei a imagem no mesmo momento em que a pintei, Justin na minha casa com os braços ao redor da cintura dela, sorrindo para ela, beijando a boca dela.
Argh. Não. Eu era uma fã muito ciumenta para aguentar aquilo.
Surpreendendo-me, Lara gargalhou, o que atraiu os olhares dos meus pais também. Ela abanou a mão indicando que não era nada e eles logo voltaram a nos ignorar, imersos no meio de um raciocínio. Lara abraçou meus ombros rígidos.
— Eu estou te provocando, como você não percebe?
— Sei — resmunguei.
Lara me deu um tapinha na braço, que só me deixou mais irritada, seu sorriso presunçoso no rosto não deixava nada melhor.
— Continue a história, Ju.
Respirei fundo com um beicinho, mas meio segundo depois eu voltei a contar, ainda que rabugenta no início.
— Ele me levou até Los Angeles, ao estúdio. Conheci o produtor dele e o vi gravar uma música muito tocante — essa nova imagem em minha mente melhorou meu humor quase na mesma hora. Dei um sorrisinho — Ele é deslumbrante. Foi ainda melhor do que ouvir as músicas dele. É uma experiência que toda fã deveria experimentar. Numa comparação um pouco herética, foi como ver Deus criando o mundo. Ele não parecia apenas mais um de nós, criatura, mas de alguma forma um criador, num nível muito mais baixo que Deus, claro, mas ainda assim superior a gente. Deus com certeza mergulhou ele no pote do talento. Melhor, afogou. Foi a... melhor coisa, humanamente falando, que eu já presenciei — Deus, todos os meus momentos com Você são superiores a qualquer coisa, estou falando de experiências mundanas, tudo bem? Esclareci ao Pai antes que tomasse uma bronca feia.
— Hmm... E o que mais? — Lara tinha um sorriso na voz.
— Depois... Bom, o Danilo ligou, viu uma notícia de que estávamos juntos no estúdio, vocês não viram isso?
Ela negou rapidamente, surpresa.
— Seus amigos estão mesmo te rastreando.
— Ele estava com a mesma preocupação que vocês, sobre ele estar se aproveitando de mim. Mas, enfim, Justin chegou e conversamos um pouco depois que Danilo desligou.... — ele testou seus dotes de sedução comigo e você me salvou com uma ligação, quis contar — e então ele me trouxe de volta no jato particular dele — o queixo de Lara caiu — Sim, eu sei. Esse homem tem tanto dinheiro que não posso nem imaginar. Ele foi muito prestativo tentando me acalmar por causa do meu medo de avião — estremeci ao me lembrar das 12 horas de voo do Brasil até ali, umas das piores da minha vida com certeza. Contudo, eu soube que se ele estivesse naquele avião, as coisas teriam sido melhores. Senti um calorzinho agradável no peito ao pensar em como ele segurara minha mão no jato — E me trouxe de Uber até em casa. Fim.
Eu terminara o relato como se fosse insignificante, mas para mim, era digno de palmas. Lara não parecia ter um pensamento tão diferente. Seu rosto denunciava um assombro fascinado.
— Como escritora de fanfics você tem que admitir que acabou de viver uma.
Sorri com conspiração para ela por um momento, depois dei de ombros.
— Tirando a parte de que acaba em romance, sim, eu vivi parte de uma fanfic. Acho que nunca nada vai me fazer tão feliz.
Lara mordeu a boca, segurando parte do sorriso. Será que ela ficaria assim presunçosa o restante da noite?!
— Você tem uma mente bem limitada às vezes, Ju.
Tive certeza de que eu não ia querer saber o que ela estava pensando exatamente, então apenas revirei os olhos e olhei por sobre o ombro para o mar que se tangia de um azul tão escuro pela ausência do sol. Eu podia sentir o ar mais úmido ali, a brisa quase salgada tocando meu rosto. Revigorador. Contemplei uma paisagem natural pela segunda vez no dia, e me perguntei se Justin já havia jantado naquele restaurante. Ele dissera que o Mister A's à noite proporcionava um belo encontro, George's at the Cove não ficava muito atrás.
Provavelmente ele sabia disso, e já teria feito um encontro aqui também. Tentei imaginar quantos encontros ele havia tido na vida e fiquei desconfortável instantaneamente com minha falta de experiência para comparar. Para mim dois já seriam muitos.
Chacoalhei a cabeça. Besteira. Aquilo nunca me incomodara. O amor continuava superestimado. O amor romântico, pelo menos. Podíamos muito bem viver sem ele. E se sua ausência fosse a causa da extinção da humanidade.... bem, mais conveniente ainda. Uma humanidade que destrói seu próprio meio ambiente e maltrata seres tão puros quanto animais não pode viver muito mais. Uma hora ou outra acabaríamos nos destruindo com bombas atômicas ou doenças criadas em laboratórios.
Dessa vez não fiquei satisfeita com minha linha de raciocínio. O fim. Todos nós temos um prazo de validade, não é segredo e quase nunca podemos prever quando este se encerra. Eu podia morrer naquele exato segundo, vítima de uma bala perdida, um ataque no coração, engasgada com a saliva... Não me incomodava tanto assim. Mas, Justin também é um ser humano, tão frágil quanto qualquer um, igualmente suscetível de morrer.
Fiquei desnecessariamente ansiosa para vê-lo de novo. Eu queria ter certeza de que ele estava bem. De alguma forma, o mundo precisava que ele existisse — ou eu precisava que ele existisse nesse mundo? Eu tinha uma órbita própria ao redor dele desde que me encantei por aquele sorriso travesso e radiante, não podia admitir qualquer causa fatal que o levasse da terra.
Eu não sabia se ele havia chegado com segurança ao estúdio de novo. Ele voltaria para Los Angeles com seu jatinho, sozinho com o piloto. Tudo bem que ter mais alguém não mudaria a possibilidade da aeronave cair. Argh. Eu precisava me certificar de que não havia caído. Minha desconfiança com pássaros voantes de metal não estava menor.
Batuquei os dedos na mesa, ponderando a conveniência de...
— Aqui está — o garçom chegou na nossa mesa, baixando nossos pratos com meticulosidade.
Encostei-me na cadeira, experimentando aquele desconforto de ser servida. Parecia errado alguém ser obrigado a trazer meu prato bem debaixo do meu nariz, como se eu fosse uma preguiçosa mesquinha.
— Obrigada — agradeci e distraidamente peguei meu celular.
O roteiro se formou naturalmente na minha cabeça. Antes que eu tomasse uma decisão, porém, o aparelho vibrou.
"Saindo do estúdio agora. Acabei de ver seu e-mail. Só queria dizer que o recebi"
Meu coração disparou de susto. Que coincidência. E que prazer saber que havia chegado são e salvo.
Fiz uma careta para mim mesma, minha irritação e raiva com sua pessoa realmente haviam sido chutadas para longe.
"Mas já saindo? Aliás, faça uma boa leitura, você vai adorar ;)"
Breves segundos depois recebi a resposta.
"Obrigado, mas lembre-se de que sou um péssimo leitor. Posso demorar um pouco"
Suspirei. Ele precisava ler rápido para que aquele processo não destruísse minha publicação.
"Se eu pedir por favor você acelera essa leitura?"
"Preciso de um incentivo maior do que esse, Lia."
Apertei os olhos de desconfiança.
"O que você pode querer de uma reles mortal?"
— Ju, você não vai comer? — Meu pai questionou, me olhando por cima da mesa.
Abaixei o celular para o meu colo.
— Ah sim, claro.
Eu não queria que ele perguntasse com quem eu estava falando, então peguei o garfo e coloquei a comida na boca, sem reparar muito bem no que comia enquanto bisbilhotava o celular disfarçadamente quando ele vibrou de novo.
"Muitas coisas. Algumas você não está de acordo. Mas, no momento, um pequeno favor"
Muitas coisas? Que muitas coisas? Certamente uma delas era não publicar o livro. Na verdade, a única que eu conseguia pensar. Digitei com uma mão só.
"Diga e verei o que posso fazer por você".
Encontrei o olhar de Lara quando ergui os olhos. "É ele?", movimentou os lábios sem emitir som, a empolgação retornando ao seu rosto. Aquiesci uma vez sem exagerar no movimento.
"Você é uma pessoa curiosa, Lia?"
Aquele provocadorzinho duma figa. Contive um resmungo.
"O que você acha?"
— Não está bom? — Minha mãe perguntou, levei alguns segundos para perceber que era comigo.
— Hã, sim, sim está — eu na verdade não sabia dizer, mas não havia nada fora do comum me deixando enojada. Olhei para o meu prato. Ah, agora eu me lembrava, salmão grelhado acompanhado de tomate, azeitona, milho e sabe Deus mais o quê.
— Você fez uma careta engraçada — ela se justificou, talvez esperando que eu completasse minha resposta.
Dei uma risadinha e procurei desviar a atenção de mim.
— E o prato de vocês está bom? — Perguntei, mas estava muito distante quando responderam.
"Sim, você é. Vou te deixar refletir um pouco. Te conto amanhã então."
Revirei os olhos.
"Idiota."
"Boa noite, Lia. Obrigado pela companhia hoje."
Eu tinha que confessar, ter um motivo para falar com ele no dia seguinte me deixou um pouco contente, portanto, não fiquei tão irritada quanto ele parecia querer.
"Eu quem agradeço, por ora. Boa noite, Justin."
Lara me acotovelou e eu levantei a cabeça sobressaltada, os três me olhavam como se esperassem alguma coisa.
— Hã... O quê?
— Melhor nem perguntar — minha mãe murmurou, estreitando os olhos para mim.
Lara deu uma risadinha, me deu uma olhadinha conspiratória e disse:
— Deixa eu mostrar as programações que imaginei para esse fim de semana. — era uma estratégia eficiente para me tirar do centro das atenções, e mesmo que aquilo fosse me custar suas próprias dúvidas do meu comportamento naquela noite, fiquei extremamente grata.
Fiz o meu melhor em demonstrar um comportamento normal durante o restante do jantar, mas eu quase não podia conter meus devaneios. Em um momento estava presente na conversa, no outro pensava o que Justin poderia querer de mim como favor. Eu não tinha nada a oferecer. Como esperado, assim que voltamos para casa e eu entrei no meu quarto, Lara veio atrás, cochichando.
— Você estava conversando com ele, não estava?
Assenti com relutância.
— Ele me disse que pode se apressar para ler a história se eu lhe fizer um favor.
Lara se encostou no batente da porta e cruzou os braços, um meio sorriso sugestivo nos lábios.
— Que tipo de favor?
Ignorei as segundas intenções.
— Não sei, não me disse, para me deixar curiosa — revirei os olhos — Só vai me dizer amanhã.
Tirei minhas botas, sentando na cama. Logo em seguida cheirei minhas axilas. Não estava mal, eu havia tomado um banho para ir ao restaurante, não queria tomar outro. A preguiça às vezes pode ser benéfica para o meio ambiente.
— Hm... Misterioso. Gosto assim.
Olhei sério para ela, arrancando-lhe uma risada.
— Ele gosta de me irritar isso sim.
— E ele consegue mesmo te tirar do sério, não é, Ju?
Fui em direção ao guarda roupa, escolhendo um pijama velho e confortável enquanto respondia na maior paz:
— Ah, sim, ele tem muitos dons, ser irritante é um deles.
— Tenho certeza que tem — me virei para seu tom de voz petulante e ela me mandou um beijo com a mão — Boa noite, Julinha, se quiser conversar sabe onde me encontrar — e deu as costas.
Apertei os olhos para sua figura sinuosa se esgueirando pelo corredor. O que ela estava aprontando? O que queria de mim? Bem, talvez eu tivesse uma vaga ideia, e por essa razão não seria nem louca de questionar suas insinuações.
Antes de dormir, ainda troquei mensagens com Isis e Danilo. Meu amigo lhe mostrara a matéria e ela estava ansiosa esperando minhas atualizações. Relatei praticamente o mesmo que relatei a Lara, e Isis se mostrou igualmente empolgada com nossa evolução, ela não estava tão desconfiada quanto Danilo, confiava no meu autocontrole e julgamento, aliás aquela era a ideia inicial, não? Me aproximar dele e lhe mostrar que não era uma história perigosa à sua reputação.
— Vocês estão tranquilas porque são meninas. Eu sou um homem, estou infiltrado na seita — Danilo retrucara e frisara que eu deveria tomar cuidado.
Depois tive que ligar para Fani e contar mais ou menos a mesma coisa. Ela pareceu um pouquinho decepcionada por não ter conseguido acabar com tudo, mas, se animou um pouco com a novidade da sua disposição a ler.
E então eu estava pronta para dormir.
Mas estar pronta não me ajudou a conseguir de fato. Involuntariamente passei um bom tempo repassando os acontecimentos do dia, me revirando embaixo do cobertor como uma lombriga. Dessa vez, porém, eu estava feliz. Mais feliz do que qualquer dia que eu passara naquele país. Quando Justin esquecesse aquele processo, eu saltitaria pelas ruas como um cabrito. Quase já podia fazer isso.
A bem da verdade, eu tinha que admitir que todo o dilema com o livro pouco tinha a ver com minha euforia, embora ocupasse uma parcela significante dela. O que estimulava um sorriso fixo em meu rosto era aquela voz melodiosa na acústica impecável do estúdio ressoando em minhas memórias, seus sorrisos tão espontâneos e chamativos que eram quase indecentes, e seus toques, tanto os gentis quanto os inapropriados e provocadores.
Justin nunca parecera tão real e ao mesmo tempo imaginário quanto naquele dia. Eu pude vê-lo, respirar seu perfume e senti-lo fisicamente, mas sua presença me deslumbrava tanto que mal podia acreditar nos meus sentidos para confirmar que ele realmente existia no mesmo plano que eu.
De repente, me lembrei dos alertas de Danilo e fechei a cara. Eu queria acreditar que era forte o suficiente para resistir as vontades egoístas de Justin. Mas a verdade é que era bem mais fácil quando ele estava sendo um ogro insensível. Como resistir a seus olhos brilhantes e profundos acompanhados do sorriso ingênuo e pidoncho?
Eu acordei completamente desorientada no dia seguinte. Em um momento, o sol escaldante brilhava em meus olhos, lançando seus raios sobre o mar azul cintilante que lambia a areia branca e quente sob meus pés. A natureza toda parecia se comunicar comigo, prometendo conforto. A sensação abrasadora se reforçava pelo conhecimento de quem estava ao meu lado, Justin, acariciando minha mão distraidamente. E então abri meus olhos e estava em meu quarto, escuro devido a janela fechada, mas tímidos raios de sol se infiltravam pelas frestas.
Gemi e rolei na cama, preguiçosa. Não se passara de um sonho, claro. Justin ocupava muito mais meus sonhos agora, e eram bem mais nítidos do que quando eu ainda não o conhecia. Pelo menos aquele não fora tão... intenso. Permaneci naquele limbo ocioso por pouco tempo já que meu celular vibrou entre os lençóis. Eu não havia me esquecido de que estava esperando uma resposta, apesar da confusão mental breve. Ansiosa ao extremo, tateei a cama em busca do aparelho e não soltei a respiração enquanto lia das próprias notificações, sem aguentar esperar.
"Bom dia, Lia. Já se corroeu o bastante de curiosidade?"
Senti o sorriso se alargando em meu rosto apesar de revirar os olhos ao mesmo tempo.
"Bom dia, Justin, vai ter que trabalhar bastante para me fazer me corroer"
Uma mentira lavada da qual ambos tínhamos conhecimento.
"Hmmm, vou me esforçar. Preciso saber se tem planos para hoje para ver se pode me fazer aquele favor"
Meu coração saltou no peito com a possibilidade que passou imediatamente na minha mente. Seu favor envolvia vê-lo?
Pelo que eu me lembrava só no dia seguinte deveria ir a editora, depois mais uma entrevista na quinta e outra na sexta. E então, o grande dia, segunda feira eu tinha uma pauta quilométrica em livrarias, e durante o resto da semana também. Aquele devia ser meu último dia tranquilo. Senti o famigerado frio na barriga ao pensar que o livro seria publicado dali alguns dias, menos de uma semana. Eu estava tão focada com toda a situação entre Justin e eu que mal pudera ver a proximidade do dia, já que temia que o processo em si acabasse com meus planos. Mas ali estávamos nós, firmes e fortes. Eu precisaria me preparar mentalmente para o evento.
"Creio que não tenho planos para hoje. Como posso ajudar?"
Espreguicei-me, como se me preparasse para pular da cama e atender ao seu chamado. Recebi uma reprimenda do fundo da minha consciência por isso.
"Preciso da sua opinião em outra música. Posso te buscar para vir ao estúdio comigo?"
Sentei-me num átimo, os olhos saltaram das órbitas, acomodando-se na tela do celular para reler a frase inacreditável. Ele estava mesmo me convidando para ir ao estúdio outra vez? O grito histérico silencioso arranhou minha garganta.
"Você está falando sério?"
Contei as batidas mais rápidas do meu coração, esperando a resposta dele.
"Estou. É um trato. Você vem e eu leio mais rápido. Topa?"
Eu não precisava de incentivo nenhum para estar com aquele Justin — o que parecia ignorar nosso processo judicial ou fingia esquecer —, que dirá acompanhá-lo durante uma gravação. Ajoelhei-me no colchão, dando pulinhos entusiasmados com o plano.
Contudo, não podia perder meu charme.
"Hm.... que horas?"
Mordisquei o lábio com aflição. Ele não demorara tanto para responder antes. Preocupei-me que desistisse da ideia. Afinal, que utilidade eu teria em seu processo de composição? Aquela não era minha profissão. Eu já tinha escrito algumas músicas, mas poucas e sem compromisso algum — e que eu não mostraria a ninguém, principalmente.
"A qualquer hora que você puder, Lia. É só avisar que te busco"
A vontade que eu tinha era de pedir que aparecesse imediatamente, porém, eu ainda nem sabia sobre minha real disponibilidade, teria que confirmar os planos com minha família e Fani.
"Já te confirmo."
Pulei da cama, apressando-me para escovar os dentes e lavar o rosto em tempo recorde. Visualizei a reação da minha família quando eu dissesse que Justin queria me ver hoje também, depois de passar a tarde toda com ele ontem, e estremeci. Lara ficaria feliz demais, mas meus pais exibiriam aquela desconfiança exagerada. Bem, talvez eu pudesse inventar uma boa desculpa.... Ou omitir algumas coisas. Fani podia me levar com a desculpa de que tínhamos uma reunião...
Mas eu nunca gostara de mentir. Nunca fui boa mentirosa também. Minha mentiras vinham acompanhadas de um desviar claro de olhos e voz fraca. Nada convincente.
Suspirei, eu ainda não havia chegado em uma conclusão enquanto descia aos pulos da escada. Minha mãe imediatamente me olhou, parando no meio do caminho da cozinha para sorrir pra mim.
— Bom dia! Está animada hoje, Ju — abriu os braços, esperando que eu me encaixasse ali.
Embora eu nunca fosse admitir em voz alta, minha mãe é minha pessoa preferida no mundo inteiro. Devia ter algo a ver com compartilhar um cordão umbilical com ela por nove meses e receber todo o seu amor por mais dezoito anos. Estar junto dela sempre me fez sentir amada e verdadeiramente segura. A abracei com um apertão e ela deu um grunhido de esforço, depois me deu um tapinha no ombro de repreensão, brincando.
— Menina!
Eu ri.
— Bom dia, mamãe. Como você está?
— Bem — ela se afastou para me olhar com ternura por um momento — e você? — seus olhos castanhos em mim não perdiam nada.
— Ótima! O que tem para o café?
Ela respondeu ao mesmo tempo que eu via. A mesa de jantar estava posta com o café da manhã, algumas frutas na fruteira, pão, ovos mexidos, bacon e manteiga. Eu peguei um pedaço de pão e o enchi com ovos mexidos e bacon. Sentei-me em uma das cadeiras, praticamente engolindo a comida sem mastigar.
— Algum motivo especial para essa animação toda? — Minha mãe se sentou bem na minha frente, ainda analisando, mexia em seus cachos para mantê-los definidos mais como um costume do que vaidade.
Mantive os olhos no prato, fingindo precisar de atenção.
— Não tenho nenhum motivo para não estar animada. Onde estão Lara e papai? — emendei, para desviá-la.
— Hm.. Sua irmã ainda deve estar dormindo e seu pai no banheiro — respondeu vagamente — Pensou alguma programação para hoje? A partir de amanhã a agenda estará cheia.
Merda.
— Ah, tenho que checar com Fani, mas acho que tenho uma reunião — falei como se o assunto não tivesse muita importância — E aí, o que fizeram ontem a tarde?
Tentei inventar os assuntos mais banais enquanto terminava de comer, procurando mantê-la longe do caminho indesejado enquanto eu ainda não decidira como anunciar que tinha sim planos para aquele dia e que, não, não envolvia eles. Depois me levantei depressa para ligar para Fani e me abriguei na sala de estar, perto da lareira, para o fazer.
— Que bom que você ligou, Ju, temos que conversar sobre suas redes sociais — ela foi logo anunciando, o que atrapalhou um pouco minha linha de raciocínio.
— Ah, é? O que tem elas? — perguntei surpresa, quase temerosa com seu tom de voz ansioso.
— Você não tem entrado muito, não é? As coisas estão um pouco movimentadas. Você tem recebido muitas mensagens.
Fani tem minha senha das redes, justamente porque sempre fui desnaturada com essas coisas, eu não consigo alimentar uma vida virtual quando tenho tanta coisa a ver e fazer no mundo real. Principalmente nesses dias não havia muito que eu podia dizer, vivendo meu drama diário que passava de pesadelo a fanfic em dois segundos.
Mas a forma que ela havia dito "muitas mensagens" me deixou imediatamente desconfiada.
— Hm, que tipo de mensagens?
— Bom, podemos conversar pessoalmente? Vou aí na sua casa e podemos fazer alguma coisa para nos divertirmos depois também.
Choraminguei internamente, sentindo quase uma dor física ao pensar que poderia perder a oportunidade que me surgira ao acordar. Meu peito apertou, desconfortável.
Olhei para os lados, garantindo que estava sozinha ou ao menos uma distância considerável de ouvidos curiosos.
— Na verdade, Fani... É tão urgente assim? Pode ser mais tarde? — pedi, baixo.
— Tudo bem, pode ser umas duas horas?
Pensei em Josh, o produtor, dizendo o quanto Justin é perfeccionista com as músicas e que demora horas em um mesmo verso as vezes.
— Um pouco mais tarde que isso. No começo da noite? — Negociei.
— Ah! Sim, tudo bem então, podemos até ir numa festinha depois do jantar — planejou — Tem algo importante para fazer hoje?
Por que era tão difícil tomar minhas decisões sem ter que explicar para alguém o que eu ia fazer?! Ugh. Pensei um pouco antes de responder, organizando as palavras.
— Então, na verdade sim. Eu te disse que consegui convencer Justin a ler o livro, certo? E hoje vamos meio que falar sobre isso? — A hesitação estava notável em minha voz, o que acabou transformando minha fala final numa pergunta. Não era exatamente o que iríamos fazer, mas a motivação era relacionada, pelo menos.
— Ah! — Fani se surpreendeu outra vez — Justin? Bem... — Ela processou a novidade — isso é bom, eu acho. Acredito que você é uma mulher muito forte e convincente. Vai conseguir mudar aquela cabeça dura dele.
— Sim, obrigada, eu realmente acho que podemos entrar num consenso — não exatamente naquele dia, minha ansiedade se concentrava toda em vê-lo cantar de novo. A curiosidade sobre minhas redes sociais podia ficar para depois, a menos que eu espiasse antes...
Por outro lado, meu espírito se animou de novo, agora eu só precisava lidar com mais alguns empecilhos antes que confirmasse com ele para me buscar.
— Tudo bem, Ju, vai me mantendo informada então, ok? Qualquer coisa me liga.
Eu tinha gostado da minha argumentação, e agora tinha Fani como álibi. Assim, mal havia desligado e já tinha corrido para a cozinha, onde estava minha mãe guardando um copo no armário. Tomei ar assim que ela me olhou, planejando falar tudo de uma vez antes que me acovardasse.
— Mamãe, tenho uma reunião com o Justin daqui a pouco. Mais um passo na negociação, estava falando com a Fani sobre. Ele vai vir me buscar, então só vou me trocar. E não sei quanto tempo vou demorar, mas mantenho vocês informados — eu falei tão rápido que não tive certeza de que ela havia me entendido.
Ela arregalou os olhos com a avalanche de informações.
— Tem certeza de que é o melhor?
— Temos — usei o plural, tentando indicar que a ideia também era de Fani. Bom, ela não havia se oposto.
E antes que pudesse acrescentar algo a mais, corri escada acima ao meu quarto.
"Oi, Justin. A hora que você quiser pode vir, abri um espaço na minha agenda pra você. Seja grato"
Minha bochecha começou a doer repentinamente e só por isso percebi que estava sorrindo como uma idiota, a alegria transbordava de mim como nunca. A sensação era ainda melhor das que eu tinha ao ir em seus shows e o motivo era bem claro. Ir ao estúdio com ele parecia um show particular com direito a visita nos bastidores e abraços. Naquele momento eu já estava completamente tomada pela emoção fanática que ele despertava em mim. Processo? Nunca nem vi.
"É uma honra, Lia. Estou indo. Meia hora no máximo".
Meia hora? Só podia ser o jatinho. Minha cara desabou um pouco de nervoso. Eu estava mesmo brincando com a morte.
"Jatinho de novo?"
"Não fique preocupada, estarei bem ao seu lado."
Um novo medo me fez tremer. Minha cabeça começou a rodar até que eu percebesse não estar respirando. Inspirei.
"Ufa, já até posso sentir a imortalidade"
De fato ele parecia ter algum poder sobrenatural, para ser mais específica sobre o tempo, já que estar ao seu lado fazia as horas passarem num minuto.
Joguei o celular na cama, tentando me concentrar a escolher uma roupa. Eu nunca me preocupara tanto com o que ia usar quanto no momento. Impaciente, fui jogando as peças de roupa por minha cabeça enquanto as descartava. De repente todas pareciam desinteressantes e inadequadas, mas eu sabia que só podia se impressão. Todas aquelas roupas e nenhuma servia!
— Qual é o grande evento? — Lara falou às minhas costas, sobressaltando-me.
Seu cabelo já estava preso num coque, o rosto ainda amassado e os olhos pequenos de quem acabara de acordar. Ela parecia confusa demais para fazer suposições.
— Tenho uma reunião. — Respondi na defensiva.
Não parecendo notar meu espírito, adentrou o quarto, revirando a pilha que eu já havia jogado na cama.
— Ah, é simples. Você pode usar essa camisa branca lisa com esse blazer preto e...
— Bom, não é uma reunião tão social assim. — Interrompi. Eu devia ir extremamente arrumada para um estúdio?
Lara coçou o olho, me olhando.
— Tudo bem, é com a Fani?
Estreitei os olhos e contraí a boca antes de contar.
— Com o Justin. Ele me chamou para ir ao estúdio, esse é o favor, ajudá-lo com uma música, ao que parece.
O sorriso de Lara me fez corar.
— Não acredito! Vamos dar seguimento a fanfic! — Fiz uma careta para ela — Isso com certeza muda a escolha de roupa — e se enfiou na pilha de novo — Não quero que você mostre demais, mas não de menos também. Não tão séria, mas não tão menina... — ela falava consigo mesma, descartando algumas opções.
— Você fala como se eu fosse sua boneca — eu ri dos comentários.
Ela me jogou um olhar bem humorado.
— Sempre foi — piscou — Aqui, tenta essa — enfiou as roupas na minha mão.
Fiquei um segundo decidindo se deveria tomar banho até concluir que sim, eu queria estar renovada. Fiz o trabalho mais rápido que pude, mas acabei lavando o cabelo também, ele deveria estar cheiroso. Isso porque Justin às vezes ficava muito perto de mim, e eu tinha pudor suficiente para querer exalar limpeza. Ele estava sempre tão cheiroso, não seria justo.
Vesti o suéter creme felpudo de gola V e a calça jeans clara cintura alta, mas assim que saí para o quarto Lara não havia terminado, ela me mandou enfiar o suéter dentro da calça e me passou um cinto preto "mais por questões de moda". Depois, me disse para vestir a bota preta sem salto de cano alto. Abri os braços e girei para ela.
— Ótimo! Só faltou estar com um Starbucks na mão.
Nós duas rimos. Não é que Lara lesse fanfics, aliás ela só leu minha história depois que já era um livro, mas os memes são conhecidos.
Enquanto eu secava o cabelo, Lara pegou um perfume em meu guarda roupa e o borrifou em mim. Retesei os músculos assim que senti o aroma doce, me virando para ela de olhos arregalados.
— Lara! — Então olhei a fragrância em sua mão, só para confirmar o que já sabia: O frasco alongado em formato de coração. Girlfriend. Gemi.
— O que? Ele não pode saber que você tem um perfume dele? — Questionou perplexa.
— Eu não quero deixá-lo mais presunçoso do que já é.
Ela deu uma risadinha, balançando a cabeça.
— Vai ficar tudo bem, talvez ele nem reconheça.
Choraminguei mais um pouquinho, mas tentei ser positiva. Talvez ele não reconhecesse mesmo, ou nem sentisse o cheiro em si. Depois que meus cabelos estavam apenas úmidos e penteados, e minha boca pintada com um batom nude, decidimos que eu estava pronta. As peças de roupa escolhidas por Lara pareciam mesmo convenientes, nada demais e nada de menos. Ela me recomendou a bolsa transversal preta e coloquei minha carteira e celular ali.
Só havia levado pouco mais que vinte minutos, mas me lembrei de que eu ainda não avisara meu pai. Qual seria sua expressão quando ele abrisse a porta e desse de cara com o canadense descarado? Torci que minha mãe já tivesse avisado para me poupar o trabalho.
Descemos juntas na escada e ela parecia tão radiante quanto eu.
— Então tem outra tentativa de acordo hoje, hein? — Meu pai disse da cadeira da sala de jantar, as sobrancelhas franzidas. Minha mãe estava sentada ao seu lado.
Recompus minha expressão, me lembrando da desculpa que dera para minha mãe. Lancei um olhar disfarçado de advertência para Lara, já que havia me esquecido de avisar a ela sobre.
— Ah sim, Fani e eu achamos que seria adequado. Ele parece estar aberto a um entendimento — agarrar-se a pontos de verdade para não parecer mentira, era minha melhor estratégia. Mesmo assim, meus ombros estavam tensos.
O vinco na sua testa se aprofundou.
— Aberto, é?
Ignorei o comentário.
— Eu vou manter vocês informados.
Ele grunhiu, ainda desconfiado. Comecei a ponderar se devia pedir que me levassem ao aeroporto, se pedia um uber até lá ou se devia esperar. E como se reconhecesse a deixa, recebi uma mensagem do criador de confusão.
"Estou na sua porta, Lia".
Dei um pulo de susto e animação sem perceber que o faria e acenei rapidamente na direção deles.
— Ele chegou. Beijo, tchau, amo vocês! — e disparei para a porta, não querendo que me seguissem.
Claro que quanto a Lara não havia muito que eu pudesse fazer, ela estava logo no meu encalço, provavelmente ansiosa para ver a Lamborghini de novo — ou a cara do proprietário do carro, já que ele "dava pro gasto", em suas palavras. Ele não viria com a Lamborghini, que estava em Los Angeles, pelo que eu achava, mas não perderia tempo discutindo com ela.
Dito e feito, o carro a porta era um sedan de cor escura e foi a única coisa que pude identificar sem ler sua marca. Justin estava encostado na porta de trás, trajando tênis branco, calça preta um tanto justa e uma camisa simples cinza de manga longa que se moldava com perfeição ao corpo esbelto dele. Suas mãos descansavam nos bolsos da frente da calça, e nos lábios, um sorriso faiscante se estendeu. A claridade do dia deixava seus olhos e cabelo mais claros e muito chamativos. Parecia um modelo recém saído de uma revista cara. Tão brilhante quanto um próprio raio de sol personificado.
E ele estava ali me esperando.
Lara assoviou baixinho enquanto eu tentava respirar.
— Uau.
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EU SEI, eu demorei, mas tenho boas desculpas que não foi por preguiça. To tentando conciliar minha vida profissional com minhas leituras e a escrita, e tá complicado, mas seguimos. COMO RECOMPENSA, você ganharam um capítulo ainda MAIOR do que o MAIOR que escrevi. Ou seja, agora esse é o maior capítulo que já escrevi na vida hahahah E para mim sinceramente não parece. Talvez eu tenha escrito os fatos até rápidos e superficiais demais, fica aí o questionamento: quem está mais ansiosa pra ver o Justin, Júlia ou eu? AHAHHAHAHVou tentar melhorar, juro.
SOBRE A IMAGEM INICIAL: GENTE, EU JURO. Uma das leitoras comentou que para ela era muito ruim imaginar uma personagem preta, que sempre que imaginava a imaginava como branca e me pediu para dar uma imagem de como seria a Julia. Quem é minha leitora de eras sabe que eu nunca gostei de dar uma cara de alguma pessoa para a personagem principal por achar que tornava mais fácil a imaginar como queria (embora eu descreva as caracteriscas fisicas dela), sao meus restos de imagine belieber hahahah MAS, quando a leitora linda disse isso eu pensei, nada mais do que justo. Então, dia 10 de setembro fui atrás da atriz para a Júlia hahah eu juro que eu pesquisei MUITO, passei acho que umas duas horas pesquisando e quando estava quase desistindo, achei num site a Ryan Destiny. Gostei. Fui no instagram dela (e me surpreendi ao ver que era seguida pela Hailey, mas como ambas sao modelos pensei que ah, normal), tirei vários prints, vi ensaios dela e concluí: será a Ryan então e ia anunciar pra vocês quando postasse esse capiítulo. IMAGINA MEU CHOQUE quando Justin publicou prévia de Holy, eu olhei "MANO É A RYAN?????" aí alguém estava marcando ela nos comentários, e eu "COMO É POSSÍVEL QUE SEJA A RYAN?????????????????", e no fim, foi a Ryan mesmo. Vidente eu? Eu diria que sim HAHAHAHAHAH Fiquei super feliz porque ela traz uma puta representatividade pra gente, E traz uma imagem melhor agora pra vocês de como é ela e o Justin como um casal. QUEM AMOU?????? Ainda to pasma hahaha Inclusive, quem acompanha o twitter da fic ( @litigiouslovefi) acompanhou meu surto iosjdoisjdoisj
POR FIM, me perdoem por não ter saído um capítulo tão bom quanto vocês mereciam, mas espero que tenham gostado um pouquinho. Vou tentar não demorar, tudo bem? Não prometo muito hahaha
Me digam as teorias de vocês sobre o capítulo e esses dois, EU AMO LÊ-LAS!!!! E me deixem estrelinhas porque eu também gosto, por favor, obrigada rsrs
SE CUIDEM, beijinho e até a próxima!
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