Mimado
— Ele nem me conhece ainda e com certeza já me odeia, Lara — anunciei amuada, chutando uma folha caída na calçada.
Eu não conseguia arrumar ânimo para escrever, muito menos para revisar os capítulos que a editora me enviara, então pedi a Lara que desse uma volta no quarteirão comigo. Ventava um pouco, mas pelo menos não chovia, ainda. Depois da visita de Scooter na sexta os planos para o final de semana foram cancelados. Ao invés de diversão, nos reunimos com Josh para atualizá-lo sobre o problema e ele imediatamente convocou o advogado da editora para a conversa.
— Eles podem querer discutir, é um país livre, mas a chance de êxito é mínima, da parte deles, claro.
E então todos estavam dispostos a arriscar o descontentamento de Scooter Braun e seu pupilo. Revoltavam-se com a sugestão de que não publicássemos e a alegada chantagem emocional que Scooter fez com o pedido.
E eu? Queria publicar um livro para me lançar internacionalmente correndo riscos de aborrecer meu cantor favorito?
— Ele sempre foi mimado. E se te odiar vai ser por conta própria. — Lara retrucou, parecendo bastante aborrecida. Afastou os cabelos soltos do rosto num movimento rápido — Eles estão caçando pelo em ovo, Ju. Justin deveria entender o que é ir atrás de um sonho.
Enfiei mais fundo as mãos nos bolsos do meu casaco de pelo sintético bege, contrariada. Sim, ele deveria entender. Talvez a sugestão de pedir para não publicar a história tenha partido de Scooter, Justin devia saber pouco sobre o assunto, e como empresário Scoot pensou ser o melhor a se fazer. Aquela era uma possibilidade plausível.
— Será que Fani já avisou Scooter? — Arregalei os olhos para Lara.
"Bom... eu não sei, vamos ver", fora minha brilhante resposta quando perguntaram minha opinião. Deixei que Fani mandasse uma mensagem para Scooter informando que preferíamos manter o projeto, e depois... Bom, dependendo do que viesse, eu pensaria melhor. Deixei nas mãos da minha empresária até eu precisar realmente me posicionar, Justin poderia muito bem estar fazendo o mesmo, apesar do que Scooter dissera.
— Agora ele vai ver que o mundo não gira ao redor dele. — Lara pareceu bem rancorosa.
Direcionei-lhe um olhar curioso.
— Você realmente está com raiva dele. É alguma questão pessoal que eu não tenha notado? — Pelo que me constava, Lara até gostava de algumas músicas dele e inclusive foi minha companhia nos shows.
Ela fechou as mãos em punho, estalando os dedos. Apertou os olhos para o horizonte.
— É o que acontece quando mexem com minha irmã caçula. Eles estão te entristecendo em uma coisa que era pra ser só explosões de felicidade pra você — ela balançou a cabeça — Não vai ficar barato.
Eu ri, percebendo que parecia fisicamente pronta para uma luta corporal, e se fosse haver uma briga, eu tinha certeza de que não seria daquele tipo.
— Respira, Robin, talvez eles aceitem numa boa.
Ela me olhou com a sobrancelha arqueada. Numa boa era o oposto de "conflito", a palavra que Scooter usara como uma possível consequência caso não quiséssemos retroceder. Gemi.
— Ou não. — Senti meu estômago se revirar — E aí as pessoas que compraram o livro no Brasil vão usá-lo para fazer uma fogueira e me jogar nela por irritar o queridinho do Canadá.
Lara empurrou meu ombro com o seu.
— Não exagera.
Respirei fundo.
— Você não acha que até o céu aqui parece um pouco diferente? — Aquela era uma clara tentativa de puxar um assunto que me distraísse, mas quando olhei para cima só vi uma imensidão de cinza. Claro, estava nublado, para variar com meu humor.
— Ah sim, claro. — Concordei vagamente.
— O bom é que aqui não tem mudanças climáticas muito extremas. Em San Diego, digo. Foi o que Ricardo me disse, quando comentei que viríamos para cá.... — Lara foi tecendo uma teia de raciocínio interminável. Ela era a melhor pessoa para tagarelar sobre qualquer coisa a qualquer hora, e usava seu talento com muita naturalidade quando sentia que era necessário.
Prestei o máximo de atenção possível, desejava realmente escapar da massa de pessimismo e medo que ameaçava tomar conta dos meus pensamentos. Estávamos quase em frente à casa de novo, prontas para mais uma volta no quarteirão quando um carro turquesa, que mais parecia uma nave espacial de rodas gigantes, passou devagar ao nosso lado. Lara assoviou baixo.
— É uma Lamborghini Aventador. — Cochichou para mim. — Nada que alguns milhões não comprem.
Espiei disfarçadamente o veículo ao notar que parava um pouco mais a nossa frente. Não conseguia ter um ângulo bom para ver o motorista.
— Hm, acho que esse não é um bairro tão rico assim para ter esse tipo de gente andando à toa por aqui. — Lara murmurou, desconfiada. — Ou isso é comum nos Estados Unidos? Primeiro mundo, sabe como é.
Não, não era possível. A ideia me paralisou no meio da calçada.
— Você acha.... — Comecei a dizer e parei. Parecia uma coisa absurda de se dizer. Mas, nas circunstâncias atuais, não tão absurda assim. Ela me entendeu.
— Não... Quer dizer... — Gaguejou. Se fosse, era uma péssima hora para perder sua compostura de lutadora em minha defesa.
Fani teria me avisado, eu tinha certeza. Olhei meu celular para confirmar que nenhuma mensagem havia chegado sem que tivesse notado. Nada. Contive-me para não subir nas pontas dos pés quando a porta se abriu e imaginei qual desculpa eu daria a um motorista desconhecido quando ele nos flagrasse encarando.
O boné preto de beisebol foi a primeira coisa que vi, seguido por costas largas abrigadas em uma jaqueta grossa azul. Ele deu meia volta para fechar a porta e eu o vi de perfil. Lara agarrou meu braço como se precisasse de apoio, sendo que quem precisava era eu. O nariz reto inconfundível não demorou a se voltar em nossa direção e eu senti que prenderia a respiração se ainda estivesse respirando.
A aba do boné fazia uma sombra em seu rosto, mas eu podia ver claramente suas sobrancelhas escuras, mais escassas e bagunçadas nas pontas, destacando seus olhos cobertos por cílios grandes. A luminosidade do dia deixava sua íris cor de mel um pouco mais escura do que eu vira em algumas fotos. Mas a boca cor de rosa permanecia a mesma, pequena no comprimento, mas atrativamente carnuda o bastante. A um dedo e meio de seus lábios, do lado esquerdo, uma pintinha escura se destacava em sua pele branca como marfim. Notei que a face estava recém depilada, e no meio deste caminho, marcas em sua expressão deram vida à um sorrisinho de canto contido.
— Boa tarde, meninas. Vocês moram aqui? — O som rouco de sua voz, produzido pelo fundo da garganta, daquele seu jeito característico preguiçoso de falar, viajou rapidamente pelo ar até atingir meus ouvidos receptivos e gratos. Mais uma percepção sensorial foi o bastante para que eu cogitasse a realidade do momento e ao mesmo tempo colocasse em cheque minha sanidade.
— Sim! — Lara respondeu logo após um traço de impaciência permear sua expressão.
— Julia, então...? — Ele apontou entre nós duas, em dúvida e eu quase cai dura no chão. O sotaque só tornou a situação toda mais delirante, uma vez que ele disse o começo do meu nome como se fosse o seu, Giulia.
— JUlia. — Lara corrigiu, apontando para mim, ainda paralisada, entalada de emoção.
Ele se aproximou de nós duas, e eu tive a impressão de que andava em câmara lenta, como nos filmes. O ar balançando a sua volta, as piscadas longas e inocentemente sedutoras, velhinhas desmaiando dentro de suas casas, uma menina qualquer andando de patins no meio da rua e caindo de cara no chão. E claro, eu, babando copiosamente como uma idiota.
Lara tomou a frente, agarrando a mão dele com uma força um pouco maior do que a necessária quando ele a ofereceu, a um metro de distância. Uma proximidade fácil e irreal comparando com o lugar que ficamos no show, em que ele estava nítido, porém, não o bastante. Dali eu tinha certeza de que poderia diferenciar suas tatuagens se não estivessem cobertas.
— Prazer, Justin. — Justin, de Justin ABENÇOADO Bieber. Ninguém mais ninguém menos do que o cantor pelo qual eu morria há sete anos, o responsável por estarmos ali, para começo de conversa.
Meu coração bateu fundo em meu peito. Seria possível quebrar as costelas assim?
— Lara. — Minha irmã assentiu, um sorriso empolgado quase pulando fora do rosto. No próximo momento, eu era o centro das atenções. Com os olhos esbugalhados, Lara fez sinal para que eu pegasse a mão que ele me oferecia.
Não, ele não estava me olhando.
Sim, ele com certeza estava me olhando.
Talvez eu fosse desmaiar.
Ou não. Não poderia imaginar meu corpo abrindo mão da benção que era ser alvo do seu olhar hipnótico. A mistura das cores dançava ao redor das pupilas.
Faça alguma coisa, Julia. De fato, ele está te olhando.
Tentei respirar e meu corpo relaxou um pouco por estar em contato com o oxigênio de novo. Estendi uma mão trêmula e ridiculamente fria para segurar a sua.
— Tudo bem? — Consegui dizer. Quis rir, se alguém precisava responder essa pergunta era eu, e a forma estrangulada como soara confirmava isso.
A mão que eu segurei, de dedos longos, estava quente, macia e viva na minha, com ossos e tudo. De um ser humano real.
— Ouvi dizer que é uma fã? — Arriscou, estreitando os olhos. Fã? Era uma forma amena de dizer. Assenti rápido demais. — Quer um abraço? — Abriu o braço livre e percebi que ainda não o libertara.
Não calculei o movimento, sua frase me pegou desprevenida, e vergonhosamente eu esmaguei suas costelas entre meus braços. Ouvi seu gemido de esforço quando ficou ligeiramente sem ar e afrouxei um pouco o aperto. Ele tinha aroma de amaciante, pele limpa e colônia masculina, tudo misturado numa combinação perfeita que me lacrimejou os olhos. Aquela não era a reação que eu tinha ensaiado, mas sabia que no fundo permanecia com minhas raízes de fã surtada. Bem, pensando assim poderia ser até que pior.
Senti quando ele se retraiu, a fim de desfazer o abraço, e relutante, o soltei. Lembrando-me de pessoas acometidas do mal de Parkinson tentei limpar o rosto úmido e ri de mim mesma com a noção de que havia dois pares de olhos em mim.
— Sempre foi um sonho te conhecer. Eu admiro muito o seu trabalho há vários anos. Então isso está sendo insano — desculpei-me, olhando para o chão durante o discurso, surpresa que conseguisse desviar meus olhos dele, mas logo o espreitei para averiguar sua reação.
Justin cruzara os braços numa postura relaxada de quem está disposto a ouvir — ou de quem não tem o que fazer a não ser ouvir — a expressão mais suavizada e empática. "Sim, eu imagino que me conhecer deve ser ótimo" parecia dizer.
— Eu agradeço por isso. É um prazer te conhecer. — A frase saiu naturalmente de seus lábios. Já devia ser uma fala decorada, ele lidava com aquele tipo de emoção que causava nas pessoas o tempo todo.
Pensei nas mil e uma coisas que eu me imaginara dizendo a ele, que eu jurava capaz de tornar o encontro memorável, diferente das outras. Não queria que fosse apenas mais uma. Minha mente, contudo, parecia uma ala de hospital vazia e branca. Corri atrás de linhas de pensamento lógicas que se divertiam muito escondendo-se de mim.
— Você... hm... Quer entrar? — Lara cortou o silêncio esquisito, indecisa com a pergunta.
— Sim, por favor. Preciso conversar com você J... — parou, lembrando-se da pronúncia — Ju-lia. — Seus lábios projetaram-se para a frente, formando um biquinho involuntário na tentativa de acertar meu nome.
Nem tentei conter o sorriso por achar aquilo extremamente fofo. Ao mesmo tempo, um canto da minha mente se lisonjeava — e temia — sua intenção de dirigir-se à minha casa alugada para falar comigo. Estonteante e apavorante.
Mantive um olho no caminho — para garantir que não cairia — e outro nele, para ter certeza de que não desapareceria. A voz covarde soprou em meu ouvido que, dependendo do que ele fosse dizer, seria melhor que desaparecesse. A repreendi severamente. Eu preferia acreditar em sua sensibilidade, depois daquele abraço nutríamos mais forte o vínculo entre fã e ídolo. Ou eu estava me iludindo de uma forma diferente. Mas só a chance de estar ali com ele fazia valer a pena. ERA A DROGA DO MEU SONHO.
— Mãe, pai, temos visita! — Lara anunciou ao abrir a porta, um aviso para saírem da bolha de conforto privado à publicidade.
Justin comprimiu os lábios com um sorrisinho e arqueou as sobrancelhas rapidamente para mim, numa conversa silenciosa de amenidades que preenche espaços desconfortáveis. Provavelmente eu o estava encarando o tempo inteiro, não vou mentir, gravando em minha memória seus detalhes. Eu gostaria que tirasse o boné para contemplar seu cabelo.
Qual seria a possibilidade de ele cantar alguma música que eu pedisse?
— Ah! — Mamãe, vindo da cozinha, arquejou, estupefata — Justin Bieber! — Quase cantou, direcionando seus olhos arregalados para mim a fim de garantir que eu ainda não enfartara.
— Prazer, senhora... — estendeu a mão.
Ela limpou as mãos nas calças antes de aceitar o cumprimento.
— Estela. — Esclareceu — É um prazer. Minha filha te adora! — Deu uma olhada sobre o ombro dele, procurando por Scooter, talvez?
Meu pai deu a volta no sofá, um sorriso cordial nos lábios contrastando com a desconfiança e a perplexidade expressa em sua face.
— Tudo bem? Sou Daniel, pai dessas duas. — Outro aperto de mãos.
A atmosfera, até agora extasiante, diluiu-se em algo mais, a velha e péssima tensão, provocando os nervos de todos, na expectativa do que viria a seguir e suas consequências. Nós imaginávamos muito bem o motivo da sua — MAIS DO QUE — ilustre presença. Senti-me como numa novela mexicana, aquele era o momento em que tocaria a música dramática ao passo que a câmera focava alternadamente no rosto dos atores. Pelo menos na televisão havia a pausa para os comerciais.
— Podemos conversar? — Seu corpo voltou-se totalmente para mim, num aviso corporal de que o assunto era privado.
Cortei a ilusão antes mesmo que rolasse solta nos assuntos privados que sempre quis ter com ele. Externamente, assenti de pronto. A sala e a copa eram lugares públicos demais, os quartos uma promessa de que meus pais nos assassinariam se eu sugerisse, então...
— Tem um escritório lá embaixo, se achar melhor... — disse, meio em dúvida do que os presentes pensariam.
Scooter preferira uma conversa clara com todos, aparentemente amistosa e pública. Justin escolhera me abordar sozinha. Planejava me deixar desprotegida? Usaria da técnica da sedução? Se fosse esse último caso, eu gostaria de vê-lo tentando.
Quis estapear minha face, meus pensamentos estavam descontrolados perto daquela escultura humana.
Minha família pareceu não ter gostado do isolamento e eu os presenciei travarem batalhas silenciosas entre si para decidir se permitiram aquilo enquanto Justin aceitava meu convite.
— Qualquer coisa, me chame Julia, estarei bem aqui. — Meu pai disse, prestativo e claramente ameaçador.
Assenti e apontei o caminho para Justin. Ele me seguiu desinibido, como se não estivesse se direcionando ao subterrâneo de uma casa de pessoas desconhecidas. Não deveria me impressionar, ele era mesmo orgulhoso, metido a corajoso e meio sem noção.
Abri a porta e direcionei um olhar incerto aos meus, tendo a certeza de que eu transmitia ansiedade, empolgação e nervoso.
Me desejem sorte. Eu sentia que começaria a chorar de novo.
— Então.... Você tem meus Cd's? — Ele puxou o assunto enquanto descíamos as escadas, os meus passos justificadamente meio trôpegos.
— Ah sim, todos — Gabei-me, orgulhosa do meu arsenal conquistado com muita honra — implorando de joelhos à minha mãe.
O cômodo ali embaixo era simples, confortável e bem privado, guardando como móveis apenas a mesa preta com a cadeira estofada executiva atrás e duas mais modestas na frente, um sofá marrom compacto de dois lugares e a estante na parede esquerda — no momento vazia. Estava um pouco mais frio lá embaixo, embora a lâmpada emanasse uma luz amarela semelhante aos raios de sol.
Não planejei ser muito formal, para falar a verdade meus planos envolviam abraçar ele de novo e chorar, contudo, Justin escolheu se sentar na cadeira de frente para a mesa. Travei por um instante até ele me olhar, esperando. Tudo bem, isso me tornava a chefe da reunião. Sentei-me de frente para ele, achando aquela cadeira grande demais para mim.
Sua íris mel se fixara em meu rosto e eu imaginei se era mesmo seu intuito me intimidar. Eu não conseguia parar de tremer, vivendo naquilo limbo de realidade irreal. Ele tirou sua jaqueta, exibindo uma camiseta preta simples bem moldada ao seu corpo. Não era segredo que ele prezava por manter o corpo em forma, uma vez que sua imagem também era parte do seu sustento. Porém, eu não estava pronta para ver aquilo pessoalmente. Músculos bem desenhados e expostos nos braços tatuados — AH! AS TATUAGENS —, ombros e peitoral igualmente fortes escondidos pelo tecido.
Deus, ele era ainda mais bonito pessoalmente. Meus olhos lacrimejaram.
Inclinando-se para frente, Justin cruzou as mãos sobre a mesa, ainda simpático, mas determinado. E então cortou meu clima:
— Scooter me contou que conversou com vocês na sexta-feira. — Começou e me esperou manifestar, como se quisesse minha versão dos fatos.
— Sim... — Engoli em seco. Precisávamos falar de trabalho agora? Eu queria aproveitar meu momento de tiete. E se fosse caso de negócios, precisava que Fani estivesse ali. — Ele parecia não estar de acordo com um livro que estou prestes a publicar aqui. — Minhas bochechas queimaram. Escrever uma história de romance sobre ele e encará-lo para contar sobre era desconcertante, como se eu lhe revelasse páginas do meu diário.
— Baseada em mim, não? — Molhou os lábios. Com certeza partira para a técnica da sedução.
Engasguei.
— Pode-se dizer que... sim. Era uma fanfic. Fiz todos os ajustes necessários para torná-la um livro sem infringir direitos autorais. — Apressei-me a acrescentar a última parte.
Ele concordou com a cabeça, abstraído em seus próprios pensamentos. Tive a impressão de que me manipulava na conversa, traçando uma rota para a conclusão desejada através das perguntas que já sabia a resposta. Enquanto eu só queria conseguir controlar meu coração para que ele não pulasse da garganta.
— E ainda assim as pessoas podem e vão relacioná-la a mim, não? Aliás, algumas das experiências ruins ali eu realmente passei. — Falou, impassível.
Era o ápice da armadilha. Pensei um pouco para responder, a fim de me esquivar. Estava sob o domínio de fortes emoções perto dele, não podia passar ilesa de um interrogatório.
— Bem... Sim, é possível. — Admiti, relutante.
Justin moveu a cabeça devagar, quase um hipnólogo nato.
— Então você entende o motivo pelo qual o livro não pode ser publicado, não é? Como uma fã, sabe que estou reconstruindo minha reputação. — Todos os traços de seu rosto se esforçavam para me atingir, tanto que me vi quase concordando involuntariamente.
— Sim, eu sei que você está reconstruindo sua reputação. E está indo muito bem, mesmo, estou orgulhosa... — dizia sorrindo.
— Então você entende. — Interrompeu-me, forçando um pouco mais de persuasão.
— Eu entendo que esteja preocupado. — Pontuei — Mas, não acho que seria um problema. Mesmo que as pessoas o relacionassem com você, não é nenhuma novidade o que aconteceu, as notícias foram espalhadas pelo mundo todo e...
— Sim, e não precisamos relembrá-los agora. Os mesmos erros na berlinda outra vez. Estamos num período de difícil reparação e esquecimento. As pessoas sentem prazer em te condenar por um deslize repetidas vezes, não importa o que faça.
— Mas, Justin, o foco da história não são seus erros. Creio que você ainda não teve a oportunidade de lê-lo, não é?
Ele fechou os olhos e descansou a testa na mão, os dedos massageando as têmporas. A paciência se esvaia de seus poros. Meu coração gelou. Eu não queria magoá-lo, muito menos que entrasse em sua defensiva, eu já vira nas revistas como isso podia terminar mal.
— Julia, você já teve o que queria, convenhamos. Já vendeu seus livros no Brasil e eu estou aqui. Teve a oportunidade de me conhecer. — Abriu os olhos, encarando-me com certa frieza — Te dei um abraço. Se quiser uma foto, tudo bem, tiramos uma foto, mas não precisa continuar se promovendo com minha a imagem.
É o quê?!
— Espera aí, você acha...
— Um fã, como você se diz ser, deve saber que crescer em detrimento da reputação do seu próprio ídolo não é um caminho honrado. Você já tem reconhecimento no seu país, seja criativa, crie novos livros e os lance.
Ainda por cima, ele estava colocando em cheque minha carteirinha de fã clube na minha cara?!
Afastei a cadeira, esboçando uma carranca irritadiça. Tentei controlar meu gênio, eu não podia perder a paciência. De fato, ele não me conhecia, era de se esperar que não confiasse em mim.
— Como você pode pensar que...
— Se for uma fã mesmo você vai se contentar com essa visita.
O sangue subiu. Justin Bieber estava me chamando de oportunista sem o menor pudor!
— Você acha mesmo que é só isso que me importa na vida? Não passou pela sua cabeça que eu quero seguir uma carreira de escritora? Mas é claro que eu não...
— Que seja, mas não subindo nas minhas costas. — Recostou-se, batendo o dedo indicador na mesa para enfatizar.
E não me deixava concluir uma frase!
Inspirei pelo nariz e soltei o ar pela boca.
— Justin, você não está me ouvindo. — Usei o tom de voz mais delicado que consegui resgatar do fundo das minhas entranhas — Por favor, entenda, não estou tentando te prejudicar. Meu livro não vai te prejudicar. Compare com o lançamento no Brasil, te trouxe algum problema? Não. Ninguém está falando mais mal de você por isso. Não vai ser diferente aqui. — Argumentei. — E eu NUNCA tentaria me aproveitar de você.
Foi como se eu tivesse falado com uma parede, com o maxilar travado e os olhos duros, ele não demonstrou o mínimo sinal de compreensão. Pelo contrário, levantou-se, apoiou-se na mesa e se inclinou na minha direção.
— Julia, você não está entendendo. Eu não quero esse livro publicado. E não há o que você diga que possa mudar minha opinião. É a minha vida. Você não vai publicar. — Disse com muita calma, porém, com palavras cortantes.
Cortantes o bastante para partirem meu coração e atingirem meu sistema nervoso. Encolhi-me brevemente, ferida.
Tudo bem, foi ele quem pediu.
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