Maldição

Petrificada eu observei Justin se inclinar na minha direção, assustada com a velocidade alta e surreal das minhas batidas cardíacas. A respiração dele já batia em meus lábios trêmulos e antes que eu pudesse dar um sentido estratosférico para essa proximidade ele se abaixou mais um pouco para beijar meu queixo de modo lento. O contato doce da sua boca em minha pele me fez desvanecer, ampliado pela região sensível que alcançava. Era como apertasse um interruptor diretamente ligado a pisca-piscas em meu organismo. Engoli em seco e usei todo meu autocontrole para manter minhas mãos imóveis onde estavam, praticamente suando frio. Sabia que a menor das distrações me faria agarrar seu cabelo e puxar seu rosto um pouco mais para cima onde eu poderia...

Não, Júlia, nem imagine uma coisa dessas.

Mas por que eu não poderia? Ele estava mesmo abusando da própria sorte. E me dava a impressão de que não me rejeitaria caso eu...

E se ele estivesse apenas zombando da minha cara?

Eu quase não tinha mais forças quando ele se afastou abruptamente de olhos fechados, deixando-me fragilizada e insatisfeita. Deveria admitir ao menos para mim mesma, Danilo estava certo, eu corria certos riscos de perder o controle da situação.

— Vamos descer antes que eu tome atitudes demais — murmurou em voz baixa, de forma que eu não soube se queria mesmo que eu ouvisse aquilo. Então abriu a porta, enquanto eu sentia um calafrio descer alegremente por minha espinha. Atitudes demais?

Expirei. De fato, um ar me faria bem, ali naquele espaço pequeno tudo o que eu sentia era o seu cheiro.

Assim que um pouco do ar fresco de fora acariciou meu rosto, já me senti melhor — ignorei com fervor o arrepio de frio —, ao menos lúcida, embora o momento utópico de outrora repasse incessantemente em minha memória. Sua proximidade, a respiração quente e entrecortada... Balancei a cabeça, me concentrando nos meus pés. Tinha a impressão de que deveria usá-los para correr para bem longe.

— É, então... — ele começou a dizer desconcertado — Ei, Scoot! — aumentou o tom de voz.

Senti uma nova e diferente onda de nervosismo ao ver Scooter Braun travando seu carro — preto com cara daqueles automóveis vivos de filmes que são brabos — estacionado em uma das vagas do outro lado do estacionamento. Ele se virou para nós dois e abriu um meio sorriso, levantando uma sacola nas mãos para nos mostrar, provavelmente as trocas de roupa que Justin pedira. Reparei que deu uma avaliada rápida no que eu trajava.

— Justin... Tem certeza de que ele não vai se incomodar por eu estar aqui? — convergi, ainda trêmula, para o lado dele, nada disposta a estar sozinha assim que chegasse na nossa frente.

De fato, talvez eu devesse mesmo ficar um pouco longe de Justin no momento.

— Tenho. Ele sabe que você está aqui.

Estreitei os olhos para ele, desconfiada, mas não havia mais tempo de dizer nada, Scooter chegara na nossa frente.

— Olá, Julia, tudo bem? — Acenou com a cabeça para mim ao passo que entregava a sacola para Justin.

Eu uni as mãos nas costas, sem jeito e aquiesci.

— Muito bem, e você?

— Ótimo, obrigado por perguntar. E aí, JB, resolveu dar um mergulho no meio do expediente hoje? — Arqueou a sobrancelha. Captei a curvinha que seu lábio fez para baixo e para mim só podia significar repreensão velada. Contorci os dedos.

— Eu precisava mostrar Venice para a Lia, zelar pelo nosso patrimônio, sabe como é — lançou-me um sorriso de camaradagem. Perdi o ar.

— Lia, huh? — Scooter se virou para mim com gentileza, curioso com o apelido.

— Justin acha muito difícil falar Júlia, então ele criou esse apelido para não me aborrecer — expliquei desajeitada. Será que eu parecia tão fôlego para eles quanto me sentia?

Seus olhos se arregalaram levemente e ele jogou um olhar curioso ao Justin.

— Entendo. E então, o que você achou de Venice? Se divertiu? — De volta a mim.

— Sim, é bem bonita — gaguejei, relembrando do quanto foi divertida. Scooter provavelmente não gostaria nada daquilo, e era bem possível que saíssem fotos. Gemi mentalmente, fotos.

— Ótimo. Podemos entrar então? — Apontou para a escada que levava a porta.

Concordei e saí na frente, ansiosa para obedecer. Scooter estava sendo perfeitamente polido, e de alguma forma sua formalidade era inquietante.

Justin começou a conversar com ele sem desconforto algum, antecipando a música que pretendia lhe mostrar, ele estava muito animado com isso. Fiquei um pouco aborrecida e envergonhada com o fato de estar tão abalada pelos minutos anteriores. Meu rosto ainda afogueado enquanto Justin não parecia estar nada afetado.

Pisei duro, andando mais rápido. Claro, e por que deveria estar?

Ignorei as vozes masculinas atrás de mim, muito concentrada no meu destino para não pensar no papel de idiota que eu devia estar pagando. Tão volátil às suas mãos ágeis, tão desejosa do seu contato e atenção. Eu nunca me sentira vulnerável dessa maneira, perdida por completo dentro da minha razão. E isso começou a me assustar. Não podia ser que...

Antes que eu pudesse empurrar a porta preta final para chegar a Josh, Justin segurou meu pulso. O toque inofensivo acelerou minha pulsação, eletrizada por uma corrente disparada pela ponta dos seus dedos. Quase me retraí com a intensidade.

— Lia, essa porta aqui atrás é do banheiro. Se já quiser tomar banho — estendeu-me um montinho de tecido. Com aquela expressão tão inofensiva nem parecia ser o grande causador da destruição de todas minhas células.

Expirei pela boca devagar, sem alarde e assenti. Isso, eu precisava de um tempo comigo e aposto que Scooter queria um momento a sós com ele para desfiar broncas, era o que me dizia a tensão em suas sobrancelhas.

Entrei no banheiro médio com um aceno de cabeça e assim que fechei a porta consegui soltar o alto suspiro que continha. Encostei-me na porta, abraçando suas roupas contra o peito e vislumbrei os detalhes insignificantes do cômodo. O chão e a pia eram de mármore claro. Uma privada e um box de vidro com o chuveiro de taco de golf prateado. Havia um compartimento branco embaixo da pia e um espelho quadrado acima dela me encarava. Observei nele a figura escura de cabelos endurecidos da água salgada, como se algas marinhas espessas caíssem do couro cabeludo. Fiz uma careta para minhas bochechas coradas e os olhos grandes brilhosos, então levantei um dedo de alerta para mim mesma.

— Você não ouse — repreendi-me num sussurro, severa.

A determinação durou meio minuto, então esmoreci, choramingando. Fechei os olhos, tentando respirar enquanto me lembrava sem querer outra vez de sua proximidade quente, a sensação dos lábios macios na minha pele, o desejo ardente de que tomasse uma direção um pouco mais acima... Eu tinha certeza de que essa recordação me assombraria para o resto da minha vida. Tão boa quando terrível. Uma maldição.

Inalei suas novas roupas destinadas a mim, e apesar de terem seu delicioso cheiro mesclado com limpeza não podia ser tão pungente quanto a camisa que eu vestia. Mais uma vez me deprimi por ter que me livrar dela. Afinal, qual explicação poderia lhe dar por ter rejeitado a camisa nova para ficar com a suja sem parecer uma obcecada sem controle?

Dessa vez, eu ganhara uma blusa de moletom preta e uma calça de moletom parecida com a que eu estava, mas preta também. Fiquei contente que também tivesse as cordinhas para ajustar a cintura. Abri a porta do armário e encontrei lá uma caixa de sabonete e os preciosos shampoo e condicionador. No mais, só toalhas brancas de rosto e corpo.

Inspirei uma última vez a camisa que vestia e me despedi lentamente, muito distraída com as cenas em retrospectiva na minha mente. Eu estava fazendo uma análise consciente de todas nossas ações e motivações por trás delas como se fosse uma terceira pessoa onisciente. Esfreguei meu couro cabeludo com um pouco mais de força ao projetar as pessoas que fariam igual juízo de valor. Seria abusar muito da sorte esperar que nenhuma câmera houvesse flagrado algumas coisas. Isso porque eu temia ser meramente vista ao seu lado e me esforcei para não nos encostarmos no calçadão.

Onde foi que eu perdi essa determinação segura?!

Perdi-me no meio de um discurso mental super sensato sobre aparências e responsabilidade de imagem quando um sorrisinho escapou por meus lábios. De fato fora um dia inesquecível, eu deveria mesmo ser grata por ter tido tantos privilégios de uma vez e lidar com a consequência depois. Perdi o compasso da respiração assim que refiz sua silhueta parcialmente despida e escorrendo água a centímetros de mim.

Balancei a cabeça, indignada. Sua existência era um exagero. Eu mal podia acreditar que era real. Talvez estivesse mesmo imaginando coisas. Fiz todo o processo tão envolta em meus próprios pensamentos que só notei que já havia encerrado o banho quando peguei as roupas para vestir e tenho certeza de que só acordei porque eram as roupas dele. Suspirei de felicidade ao passar os tecidos por minha pele limpa e renovada. Sequei o máximo que podia dos cabelos e os penteei com meticuloso cuidado.

Quase pronta a sair, pensei que estaria presa com Josh, Poo Bear e Scooter enquanto Justin gravava do outro lado e enrolei mais um pouco por isso. Poo Bear sempre me parecera muito simpático, mas meu ser antissocial não se importava tanto com isso. Respirei fundo algumas vezes antes de tomar coragem de abrir a porta.

Minutos depois eu estava sentada no banco encostado a parede do estúdio, atrás de todos eles, não tão amuada quanto pensei que estaria. Poo Bear, um homem grande, de pele escura e roliço, olhos grandes e cabelo preso num rabinho de cavalo, era mais gentil do que eu esperava. Ele sorriu para mim e pegou minha mão de modo muito cortês enquanto Scooter conversava com Josh que murmurou um "bem vinda de volta, Julia", assim que teve oportunidade.

Justin se encostava, parcialmente sentado, em uma das mesas, com seu caderno em mãos. Vestia uma calça escura slim e jaqueta de malha manga longa cinza, a touca pendendo nas costas. Seu cabelo bagunçado me parecia um pouco úmido e tive um desejo quase irresistível de tocá-lo. Como da outra vez, ele analisou o caimento de suas roupas em mim e me deu uma piscadela de aprovação em conjunto com seu melhor sorriso de lado.

Felizmente sobrevivi para esse relato, um testemunho digno de se dar na igreja.

Todos eles estavam discutindo sobre a letra e Justin e Poo Bear cantarolavam suas inspirações. Eles estavam de acordo: aquela era uma das melhores de todos os tempos, e seus olhos saltados de empolgação deixava claro o pensamento. Eu cruzei as pernas e observei em silêncio, fascinada, pelo que me pareceram minutos, mas foram horas, como percebi depois. Justin mostrou ainda um pouco da sua ideia no piano e eu os segui com muita desconfiança para lá, não me esquecera de que ele dissera sobre querer me ouvir cantar e temi que tentasse me obrigar ali, na frente dos outros.

Para meu alívio, ou compaixão de sua parte, ele não fez menção de fazê-lo. Tudo bem, acho que o fato se devia a minha cara de pavor combinada com a ameaça velada saltando dos olhos. Justin só precisou me dar uma olhadinha para identificar o recado, e contendo uma risada, debruçou-se nas opiniões de Poo Bear. Mas eu sabia que não escaparia para sempre.

Era uma dinâmica muito interessante de se presenciar, a vida no estúdio, o intelectual em um conjunto tão concreto com o físico. Eles adquiriam olhares vazios quando se retraiam ao próprio cérebro para ter alguma ideia, e eu me identifiquei ali, tinha a mesma expressão vaga quando buscava minhas inspirações na escrita. Lara achava hilário.

Poo Bear era o que mais viajava e de repente ele estava falando sobre outra "epifania" que tivera e que "tinha que mencionar ou ela com certeza fugiria da sua cabeça". Alguma coisa com "não quero que nós percamos o que somos". Justin ouviu os versos que ele improvisava com um microfone ligado diretamente na caixa de som e fez um beicinho, balançando a cabeça no ritmo do som. Essa parecia mais R&B. Eu dei uma risada abafada da sua energia, achando adorável demais.

— Snyder, com certeza ele vai dar uma polida em Purpose — Scooter concordou com Josh depois que Poo Bear retornara ao foco inicial e gravara suas ideias mescladas com as de Justin no piano. Justin havia acabado de registrar os primeiros vocais.

Eles não pareceram nada surpresos quando perguntaram o que eu achava e tive que ser muito honesta ao dizer "eu nunca ouvi nada mais lindo na minha vida" com muita devoção. As risadinhas não me davam muito crédito, mas Justin me agradeceu com a aparição de suas covinhas.

— Gosto de trabalhar com ele, tenho certeza de que James também pode ajudar. Se quiserem eu posso mandar uma mensagem para eles virem para cá agora — Poo Bear sugeriu, já pegando o celular do bolso da calça larga bege.

Apertei os olhos para enxergar o horário no relógio da parede e fiquei estupefata ao perceber que faltava cinco minutos para as seis da tarde. Se eles fossem chamar pessoas para começar a produção naquele momento.... E eu havia marcado uma reunião com Fani. Fiz uma careta para os fatos. Eu teria que dar um jeito de ir embora sozinha, Justin não podia me acompanhar.

— Hmm... Na verdade, rapazes, eu não vou poder agora. Se quiserem ir conversando sem mim tudo bem. Preciso ir para San Diego agora — Justin ajeitou a blusa, endireitando-se.

Imaginei que ele tivesse visto minha expressão para o relógio e me adiantei em liberá-lo do encargo, por mais que aquela missão me fosse amarga:

— Ah, por favor, não se preocupe comigo ­— coloquei-me em pé, ajeitando minha bolsa no ombro — Eu posso ir embora sozinha — afirmei muito confiante, apesar de já ter assistido Missão Implacável algumas vezes — da garota de dezoito anos que foi raptada para tráfico em sua primeira viagem internacional sozinha com a amiga — e ter uma cota de pavor por isso.

— Isso não está em discussão, Lia — lançou-me um olhar de repreensão e depois se voltou aos homens — Se vocês quiserem ficar, a vontade.

Poo Bear levantou um ombro.

— Vou ligar para eles, se puderem vir eu fico por aqui então, melhor ir adiantando as coisas. Se estiver tudo bem para você Josh — ele parou com o celular desbloqueado, para consultar o dito cujo.

Josh abanou uma mão, despreocupado.

— Não tem problema, Bieber sabe que gosto das horas extras.

Eles deram risada e eu contorci as mãos de onde estava, muito desconfortável por ter atrapalhado o processo de criação. Scooter me consideraria bem menos agora.

— Bom, eu vou embora também, então — disse o alvo da minha preocupação, sem inflexão alguma de raiva na voz pelo menos.

Começou todo o ritual de despedidas, apertos de mãos e derivados. Josh me disse outra vez para "voltar sempre". Ele começaria a se arrepender se tornássemos aquilo um costume — e como eu desejava que fosse. Então, Justin, Scooter e eu nos encaminhamos juntos para a saída. Eu ainda me sentia descolocada como se o empresário fosse me acusar de roubar a produtividade do seu pupilo, mas os dois mantinham uma conversa saudável ainda sobre Purpose e a nova invenção de Poo Bear.

— Teremos muito material se conseguirmos colocar todas as ideias em prática — Scooter comentou quando já estávamos ao ar livre.

Encolhi-me com a temperatura ainda mais baixa no cair do dia. Eu não estava exatamente passando frio com as roupas de Justin, mas podia senti-lo tentando me pegar através do tecido. Os dois estrangeiros ao meu lado não pareciam nada incomodados com o ambiente, totalmente confortáveis em seu habitat natural.

— Sim, eu quero que tenhamos o máximo de opções possíveis, para ter certeza de que vamos entregar um álbum impecável. Precisamos de uma volta dessas — Justin concordou, as mãos no bolso da frente de sua calça.

— Vocês vão adorar, Julia — Scooter piscou para mim com expectativa, brincando com a chave do seu carro nas mãos.

Senti-me lisonjeada por ser incluída na legião de fãs outra vez,

— Tenho certeza que sim. E não só pela fé que tenho no trabalho dele — indiquei Justin com a cabeça — mas também por esse acesso privilegiado que tive ontem e hoje.

Scooter esticou os lábios numa sugestão de sorriso, dessa vez bem menos animado.

— Certo. Então, até breve — acenou antes de se voltar para o seu carro.

O dever me chamou pela segunda vez:

— Sério, você não precisa me levar embora, eu posso muito bem me virar sozinha. Você pode ficar — insisti para Justin, ainda me sentindo muito culpada pela situação.

Ele revirou os olhos e destravou o veículo.

— Entre no carro, Lia.

Suspirei, externamente frustrada com sua teimosia, internamente reconfortada que não aceitasse a oferta.

— Imagino que sua família já esteja atrás de você então? Vocês têm alguma programação para agora a noite? — Ele conversou assim que fechamos a porta.

Desatenta, não previ que retornar horas depois a mesma posição, outrora crítica, em que estivera, teria reações físicas desagradáveis em mim. Enrijeci no banco, tentando evitar as imagens que poluíam meu cérebro desde o momento em que tudo ocorrera. Estar isolada assim com seu aroma era muito nocivo.

— Fani quer nos levar para jantar e depois procurar uma "festinha" para distrair — eu começava a suar só de imaginar o teor da nossa conversa no jantar. As mensagens em minhas mídias sociais. Provavelmente estariam pior depois desse dia, motivo pelo qual deixei o celular no silencioso e muito bem guardado em minha bolsa.

— Hmm... — o carro mal estava em movimento e já tivemos que parar no primeiro sinal — Eu conheço os melhores lugares para festas por aqui — ele batucou no volante, olhando-me com especulação.

Tive uma imagem bem clara dos vídeos e fotos que vazavam dele em alguns eventos suspeitos.

— Eu imagino que sim. Só não sei se seu termo de "festa" é igual ao nosso.

Justin bufou.

— Festa é festa, subdividida para todos os gostos e idades. Eu sei de qual vocês gostariam, conheço também alguns lugares ótimos para unir o jantar com uma dança.

— Estou escutando — incentivei-o, relutante.

Ele deu seta e se atentou aos retrovisores para fazer a curva com muita concentração.

— Posso fazer uma lista mental para você, se me der um segundo.

— Tudo bem — concordei, mantendo eu mesma os olhos na estrada. Não conseguia explicar o quanto ele ficava incoerentemente mais atraente dirigindo. Alguma coisa no modo como segurava o volante e destacava as veias em suas mãos, na seriedade responsável enrijecendo os cantos de sua boca e as sobrancelhas de modo sutil.

Justin ligou o rádio para preencher o silêncio que suas maquinações deixavam, o som em altura ambiente denunciava as músicas mais pedidas de Pop no momento. Embalada nas canções, apreciei o caminho. A estrada de Los Angeles é encantadora, larga, adornada com altas e rústicas palmeiras. O céu aquela altura não deixava a desejar, contemplei deslumbrada a transição da tarde para a noite, a cor amarelada definhava até o rosa meio alaranjado para um azul fosco.

Aquela imagem pedia uma foto.

Peguei o aparelho celular e ignorei todas as notificações, arrastando a tela para ir direto a câmera. Enquadrei o ângulo através do retrovisor de forma que incluísse o céu, as palmeiras e as ruas.

— Também me surpreendo com essa beleza todos os dias — Justin comentou, vendo pelo rabo de olho o que eu fazia.

Sorri abertamente para ele, contrapondo sua presença imponente e radiante à pintura real, e o mais fugaz pensamento se passou em minha mente. Abafei a verdade para mim mesma, mas não relutei em aceita-la: Justin Bieber é a paisagem mais espetacular que já vi.

— Eu nunca me acostumaria com isso — concordei, e as palavras serviam para qualquer uma daquelas pinturas extraordinárias de Deus. Pablo Picasso, Leonardo Da Vinci e Michelangelo nunca chegariam aos pés.

Como confirmação, ele me exibiu suas covinhas.

Estávamos quase na pista de voo particular quando minha música — uma delas — começou a tocar de súbito na rádio. Eu ofeguei de alegria por puro instinto e Justin deu uma risadinha.

As Long As You Love Me é uma das minhas preferidas — o cantor da música, que estava ao meu lado, por alguma anomalia da vida, disse em compaixão ao meu estado.

Ruborizei, mas tive que olhar para ele e constatar que de fato estava a poucos centímetros de mim. Cruzei as mãos no colo ao sentir a necessidade de tocá-lo também. Deveria me contentar ao júbilo arrebatador de mirá-lo.

Justin esperou estarmos dentro do jato, com o cinto devidamente afivelado, lado a lado — da minha parte com as pernas fracas de medo — para retomar o assunto das festas. Eu estava mordendo o lábio inferior, decidida a não me sujeitar ao papel de covarde, os dedos muito bem entrelaçados em meu colo.

— Bom... Eu posso ter algumas ideias... — começou ele, desfazendo o nó que eu havia feito com minhas mãos para segurar uma delas firmemente.

O aperto em meu peito serviu para me distrair um pouco do barulho da aeronave entrando para o mundo dos vivos. Mordi a parte interna das minhas bochechas para impedir o sorriso abobado que surgiria em meu rosto. Esse movimento projetou meus lábios para frente, num beicinho curioso de peixe. Justin parou no meio da frase, olhando a contração em meu rosto com indiscrição.

— Se você puder me ajudar a me concentrar, por favor — suplicou.

— O quê? — perguntei confusa.

— Assim está melhor, obrigado. Como eu dizia, tenho algumas ideias... — ele estava sugerindo que minha boca o distraia? Só podia ser porque lhe dava vontade de rir — Posso mostrar os lugares a vocês, tenho acesso VIP a todos e estou me sentindo muito generoso para compartilhar isso hoje.

— Há há — ironizei.

— Estou falando sério, Lia. Quero acompanhar vocês — Justin se inclinou para mim, ornamentando cada palavra com sinceridade.

Retesei-me, cética e resistente à influência de sua proximidade.

— Eu achei que... Você voltaria para o estúdio ou... Não tem planos melhores? — gaguejei.

Seus lábios se contraíram por um momento e ele me fitou enquanto pensava na própria resposta. Eu vi quando a camada de dúvida se esvaiu dos seus olhos e assumiu uma distinta intensidade que me derreteu os ossos. As palavras saíram quase sôfregas da sua língua:

— Não quero ficar longe de você, Lia. Não acho que eu possa mais — murmurou, piscando os cílios longos para mim.

Uma batedeira elétrica assumiu o encargo de bombear meu sangue para o organismo. A rapidez do transporte restou na deficiência de levar oxigênio e nutrientes para as células. Do mesmo modo, prejudicou meu sistema cognitivo e fiquei sem fala. Como se já não estivesse difícil o bastante ficar perto dele depois de nossa experiência no carro.

Justin me deu um meio sorriso.

— Também acho que já está na hora de conhecer Lara de verdade. Sinto que eu e ela nos daremos bem. Você disse que ela gosta de carros, certo?

Acho que assenti.

— E ela não vai se importar com sua pronúncia — de onde saiu isso? Há algum espaço no meu cérebro em funcionamento depois do atentado?

— Minha pronúncia?

— O nome dela é Lara, não Lawra. Mas está tudo bem, fica até bonitinho do jeito que você fala — ao que parece o filtro de decência também estava comprometido.

Olá, covinhas.

— Isso quer dizer que posso ir com você? — arqueou a sobrancelha.

— Ah... O... Você não precisa de um segurança?

Agora ele usava os dois dedões para massagear as costas da minha mão. Seus dentes faiscaram para mim.

— Acho que posso contar com você para cobrir meus flancos — piscou.

Se ele estivesse mesmo tentando me matar, não podia fazer isso de modo mais direto e simples? Precisava mesmo abusar de métodos de tortura modernos e degradantes?

— Se você diz — levantei um ombro. Ótimo, meu sistema nervoso estava bem.

Justin crespou o rosto para mim.

— Seu suspense está me matando, Lia. Você me aceita essa noite ou não?

Se eu o aceitava só naquela noite? Em todas, de pronto, sem pensar duas vezes. A noite, a tarde, de manhã, todas as minhas horas poderiam ser dele.

Recebi um peteleco mental de mim mesma e estava lutando para não rir por isso quando o respondi:

— Te aceito, Justin, porque estou me sentindo muito generosa.

Ele revirou os olhos para mim, achando graça.

— Você acha que podemos convidar Ryan também? Ele está em San Diego para umas fotos hoje.

Arregalei os olhos.

— Ryan Good? Butler?

— Butler — disse ele hesitante.

Coloquei a mão livre na boca, impactada com a possibilidade de conhecer RYAN BUTLER, seu amigo de infância dos olhos azuis e cabelo louro. Justin estreitou os olhos.

— Você parece mais empolgada para conhecê-lo do que quando ficou ao me conhecer — acusou-me.

— Bem, você já chegou com um processo na mão para interromper meus surtos, então a culpa não é minha. Ryan não quer me processar por nada, não é? — Fingi preocupação.

Ele me mostrou a língua e eu ri.

— Ryan é muito gente boa. Vou mandar uma mensagem para ele agora pedindo que nos encontre lá — pegou o celular do bolso com a mão livre, já digitando.

— Lá onde?

— Vocês verão — falou ele, cheio de suspense.

O plural me trouxe a baila uma preocupação que não cogitei antes de aceitar sua proposta: Justin poderia escutar o que Fani queria me dizer em reunião? Talvez ela não fosse ficar feliz com sua presença ali. Bem, ele poderia nos dar licença por alguns minutos enquanto conversávamos. Se era tão íntimo do lugar não encontraria óbices em se distrair. De qualquer forma, imaginar sua expressão quando o trouxesse como uma mala me fez mordiscar a unha. Sem contar o fato de que ele teria que ir a minha casa para que eu trocasse de roupa, e a última e primeira vez que entrou nela não deixou boas memórias para minha família.

Apesar de toda a argumentação tecida, qualquer uma dessas adversidades, até as duas juntas, não seriam tão ruins quanto a opção de dispensá-lo. Eu queria, com certeza mais do que ele, que me fizesse companhia. Não foi preciso muito de sua boa vontade para me fazer apegar a ele mais do que eu poderia imaginar. A despeito de todo o amor platônico de anos como sua fã, senti como se nunca tivesse gostado tanto dele quanto agora. E isso não podia ser considerado muito saudável.

Ruminei tudo isso, antecipando e temendo reações durante todo o caminho do jato até o carro, formulando boas desculpas para tê-lo junto a mim esta noite. Eu podia dizer que havíamos feito um acordo? Que fazia parte do trato? Que ele ainda não havia terminado nossas negociações?

— Seus pais são cristãos como você, certo? — Justin perguntou quando estávamos chegando em casa de Uber.

Eu tinha ouvido ele contar sobre seus tempos de escola com Ryan em interesse genuíno, a despeito de minhas estratégias para justificar sua presença num jantar com minha empresária. Óbvio que eu arrastaria Lara junto. Mas como faria esse meio de campo? Como garantiria que meu pai não o estriparia com a faca da cozinha enquanto eu trocava de roupa?

— Sim, eles são.

— Então eles não tentariam fraturar meus ossos com o atiçador da lareira se eu entrasse na casa de vocês hoje?

Eu dei uma risadinha, muito tensa para ser totalmente descontraída.

— Bobagem. Eles nunca tiveram passagem pela polícia — pontuei.

Justin inclinou a cabeça, em dúvida.

— Certo. De qualquer forma talvez fosse melhor pouparmos ataques de nervos. Então, por que você não se troca e conversa com quem tiver de conversar, e nos encontramos direto em território neutro? Eu te mando o endereço. Vou encontrar o Ryan agora.

O motorista encostou no meio fio em frente a casa acesa que me aguardava. O carro descansava em sua devida vaga. Todos deveriam estar ali prontos para pegar no meu pescoço, já que eu sumira por um dia inteiro sem nem ao menos mandar notícias pelo celular.

— Tudo bem — fitei-o diretamente à meia luz dos postes, de repente aflita — Mas não esqueça de enviar o endereço. Esperarei.

A necessidade de me afastar dele pelo menor tempo que fosse me deprimia. Seria bem pior se ele não cumprisse com a palavra e decidisse ir embora. E se concluísse que de fato havia coisas muito mais interessantes a se fazer?

— Não me esquecerei. E você me avise quando estiver a caminho para que eu te recepcione na porta.

— Combinado.

Suspirei em desânimo e coloquei a mão na maçaneta mais lenta do que o normal.

— Lia — chamou-me e eu me virei ansiosa, satisfeita por ganhar mais alguns segundos. Sua expressão estava ligeiramente grave — Até daqui a pouco. Tente não sentir muito minha falta, sim?

Pisquei os olhos e estiquei os lábios com tédio forçado para seu divertimento. Ele não fazia ideia do quanto estava certo.

— Verei o que posso fazer.

Seus olhos se iluminaram de diversão.

— Estarei ansioso para saber o que seus pais acharam das minhas roupas em você — disse com travessura.

Fiz uma careta ao me examinar. Eu não havia pensado nessa parte.

— Ótimo — grunhi. Justin riu — Te vejo daqui a pouco, se eu sobreviver — a fadiga me ajudou a tomar coragem de abrir a porta.

— Exagerada — desdenhou enquanto eu descia.

Dei uma última olhada na escultura viva e ele acenou, muito animado para minha morte eminente. Isso fez meu aceno não ser muito simpático. Senti-me desamparada assim que fechei a porta, mas eu sabia que deveria passar por essa sozinha. Tentei me consolar: Talvez eles não fossem pegar muito no pé.

Mudei de ideia assim que passei pela porta, Lara e minha mãe saltaram dos sofás em minha direção, os olhos esbugalhados varrendo minha aparência.

— O que aconteceu com suas roupas e seu celular? — Minha mãe foi a primeira a falar, exasperada.

Dei um sorrisinho amarelo.

— Meu celular está bem, imagino. Minhas roupas estão na sacola — levantei a sacola como demonstração.

Minha mãe cruzou os braços, impaciente.

— Estão imprestáveis? Você não mandou notícias o dia inteiro. E que roupas são essas?

Lara comprimia os lábios, os braços entrelaçados atrás das costas. Sua postura indicava-me que ela possuía informações sobre mim e não compartilhara com meus pais por questões de lealdade. Provavelmente só ela vira a matéria.

— Bem, eu confesso que não dei muita atenção ao celular. E acabei molhando minhas roupas então... Justin me emprestou as dele.

Lara levou as duas mãos a boca, contendo qualquer manifestação efusiva. Minha mãe estreitou os olhos como a Rochelle de Todo Mundo Odeia o Chris, farejando informações não compartilhadas.

— Molhou suas roupas, hein?

Lutei contra o rubor.

— Mas então, eu tenho uma reunião agora com a Fani, vou só me trocar, ela já deve estar vindo — blefei, abrindo espaço para escapar ao meu quarto. Se Fani tivesse se comunicado com eles, minha farsa urgente estaria acabada.

— Você não vai ao menos me contar o que andou aprontando de tão importante para não mandar notícias e precisar trocar de roupa? — repreendeu-me antes que eu pudesse subir a escada. Parei com a mão no corrimão e me voltei a ela suplicante.

— Eu prometo contar tudo assim que eu puder, mas realmente estou atrasada para encontrar a Fani.

Ela repuxou o canto da boca em desagrado.

— Seu pai está no escritório, é bom dar uma passada para falar com ele, pelo menos. Nós estávamos preocupados, Júlia, você pode não desaparecer mais assim, por favor? Estamos no exterior, praticamente não conhecemos ninguém, é muito pior não ter qualquer notícia de vocês — usou seu tom de voz cansado típico de mãe lidando com adolescentes.

Levantei a mão solenemente.

— Vou falar com ele assim que me arrumar — eu não daria chance de duplas interpretações quando ele visse o que eu estava vestindo — E não os deixarei mais preocupados — mandei um beijinho no ar e corri escada acima antes que ela pudesse rebater.

Peguei o celular para solicitar a presença imediata de Fani ao meu resgate e assim que olhei verdadeiramente a tela me choquei com as notificações. Muitas ligações de Lara, Fani, Danilo e Isis. Depois uma chuva de mensagens, e as mais notáveis tinham o seguinte teor:

Fani: "Assim que possível pare TUDO o que está fazendo e me ligue. É URGENTE".

Lara: "JÚLIA DO CÉU!!!!!!!!!" e um link do site TMZ.

Gemi, havia sim virado notícia então.

Danilo: "Estou sentindo que você está em perigo, Júlia! Pensando em te ligar até te vencer pelo cansaço outra vez".

Isis: "JUSSOHDFSPJFAOPJAAAPSJDSIDFEÇMFEINGUPH MEUDCHFND EO CEU ÇJDSIJDSIJFISJF O QYR TA DCONTECEFNDO."

Contive o riso histérico.

Outra da Fani: "Se você planeja não me atender ou me responder e está lendo essas mensagens eu peço apenas para: PARAR DE SE EXPOR".

Encolhi-me, meu destino era pior do que eu imaginava, Fani devia estar querendo me matar a essa altura. A realidade imita o ditado: se ficar o bicho pega se correr o bicho come. Resignada, cliquei para chamar o número dela. Já estava dentro do quarto com a porta do guarda roupa aberta quando ela atendeu.

Júlia Souza, você pode me explicar...

— Oi, Fani, você já está vindo? Estou terminando de me arrumar aqui — interrompi seu discurso autoritário como se não tivesse lhe ouvido.

Apoiei o celular entre o ombro e a orelha e comecei a vasculhar minhas gavetas e cabides.

Ah, agora você está disponível para mim? Ótimo, é bom mesmo conversarmos pessoalmente então — grunhiu.

— Claro, Fani, já sei também um ótimo lugar para jantarmos, podemos conversar lá. Lara vai junto — respondi calmamente, ignorando seu tom de voz assassino.

— Hm, quinze minutos no máximo estarei aí. Até daqui a pouco.

Estava decidido, eu não contaria que Justin se juntaria a nós esta noite, agiria como se fosse um encontro do destino. Fani não concordaria que ele estivesse presente, e eu não lhe daria a oportunidade de me negar aquilo. Ela poderia me contar o que quisesse no caminho ou na manhã seguinte, eu não me importava. Minha curiosidade nesse caso se soterrava pelo receio e as necessidades mais proeminentes.

— Aonde vocês vão? Ou nós vamos? — Lara surgiu no meu quarto, assustando-me.

Dei um pulinho antes de olhar por sobre o ombro.

— Tipo um jantar, e você está convidada. Se puder se arrumar em menos de quinze minutos, por favor.

— Tipo? Que espécie de lugar é?

Eu não sabia com certeza ainda, mas tinha alguma informação.

— Do tipo que janta e dança.

— Tudo bem. Calça jeans escura e jaqueta de couro preta, blusa de gola alta branca e o coturno preto de couro com salto para você — aconselhou.

Virei-me intrigada para ela.

— Como você conhece meu guarda roupa melhor do que eu mesma?

Lara uniu as mãos e moveu a cabeça ligeiramente.

— Eu sou sua estilista particular, não sou? — ela olhou para trás de si e quando voltou a me olhar pipocava de expectativa — Você tem que me contar TUDO o que aconteceu, eu estou surtando aqui.

Ocupei-me de buscar as roupas que ela havia instruído, satisfeita por poder prolongar aquilo mais um pouco.

— Primeiro temos que nos aprontar para não deixar Fani um pouco mais irritada do que já está.

Lara riu.

— Certo, me aguarde.

Eu já havia tomado um banho no estúdio, é verdade, mas resolvi jogar outra água no corpo só para garantir que estaria limpa. Despedi-me das roupas de Justin com a famigerada tristeza, mas me confortei pelo fato de não poder devolvê-las ainda, eu teria que lavá-las, nada mais do que justo. Enrolei os cabelos num coque, livrando-os de outra lavação e esfreguei minha pele com o sabonete macio e cheiroso no tempo mais breve que pude. Fani é extremamente pontual.

Levei minutos para sair do box enrolada na toalha e mais alguns minutos para vestir as roupas escolhidas por Lara. Ela me economizara muito tempo de crise existencial, eu sempre confiava em suas tendências da moda e nunca me decepcionava. Dessa vez não foi diferente. Olhando-me no espelho, acrescentei os detalhes finais, batom nude, rímel e um brinco de pérola. Joguei meu cabelo para o lado e que Deus nos ajude.

Enrosquei a bolsa transversal no meu ombro quando recebi uma mensagem. Parecia ridículo um disparo cardíaco apenas por isso, mas o alívio podia ser lógico. Então ele não fugira de mim.

"905 4th Ave., San Diego CA, 92101. Já estou a caminho, me avise assim que chegar".

Ponderei um pouco antes de responder, cutucada por uma ideia:

"Claro, estou quase saindo. E se por um acaso fizéssemos parecer que nos encontramos sem querer?"

Apertei os lábios entre meus dedos enquanto o aguardava, ansiosa.

Felizmente, não demorou:

"A conversa foi tão ruim assim? Para sua sorte eu sou um ótimo ator."

Apertei os olhos. Sim, ele atuava muito bem. Assustava-me saber o quanto e a frequência em que atuava.

Lara chegou na porta do meu quarto ao mesmo tempo em que Fani me enviou uma mensagem avisando que já havia chegado, assim não teve oportunidade para seu interrogatório já preparado. Descemos juntas para encontrar nossos pais na sala. Os dois me olharam torto.

— Júlia, eu sei que você é grande o bastante, mas seria tão incômodo assim nos deixar a par do que está acontecendo? — as palavras sérias do meu pai me fizeram congelar na sala. Eu estava prestes a beijar a testa de cada um.

— Hã, você diz...

— Não nos deixar preocupados sem saber onde e como está por um dia inteiro.

Voltei a respirar, ele não devia estar falando das notícias.

— Não me incomodo, vou tomar mais cuidado da próxima vez. Podemos conversar quando eu voltar? Fani vai nos levar a um lugar para conversar. Ela está aqui na frente.

Meu pai suspirou, insatisfeito. Aproveitei a falta de palavras para prosseguir com meus objetivos, beijei-lhes e me despedi, quase atropelando as palavras.

— Não vou demorar. Amo vocês! — Saí pela porta antes que Lara houvesse terminado as despedidas e corri para o carro de Fani no meio fio.

Parei ao colocar a mão na maçaneta, a mesma sensação de que trocava seis por meia dúzia de broncas. Suspirei uma golfada de coragem e abri a porta do carona.

Fani me deu um sorriso que dizia: "oi, bom te ver, mas você andou aprontando".

Aconcheguei-me no banco com outro sorriso: "eu sei que você vai brigar comigo, mas juro que não pensei estar fazendo nada errado".

— E então, Júlia, como foi o seu dia? — disse em tom cordial.

— Muito bem, obrigada, e o seu? — devolvi na mesma educação.

— Um pouco tenso — franziu as sobrancelhas para mim.

Lara abriu a porta traseira nesse momento, entrando junto com uma corrente de ar frio.

— Oi, Fani! Como está?

Fani sorriu de verdade para ela, olhando-a sobre o ombro por um momento.

— Oi, irmã Souza que tem juízo. Estou bem e você?

Lara riu e eu revirei os olhos.

— Depois de um elogio desses ninguém poderia ficar mal.

Fani se ajeitou no banco, ligando o carro.

— Para onde, pupila desgarrada?

— 905 4th Ave., San Diego CA, 92101, mamãe na menopausa.

O carro se sacudiu com as gargalhadas de Lara, Fani e eu não pudemos deixar de acompanhá-la com menos energia.

— Espero que seja realmente um lugar propício para conversarmos, mocinha, temos várias coisas a dizer.

Ela provavelmente não acharia nada propícia a presença de Justin. Engoli em seco.

— Ah sim, você vai gostar. Achei na internet.

Fani me olhou de rabo de olho, desconfiada.

— Tudo bem, podemos conversar agora sobre como falta pouco tempo para irmos embora e praticamente não vimos nada? Hoje visitamos La Jolla, Júlia, você ia adorar. É uma pequena comunidade a beira-mar, com várias praiazinhas — Lara desatou a tagarelar, sua especificidade para me salvar — A minha preferida foi Black's Beach, tem altos cliffs e a água é tão azul! Como os olhos de Fani. O acesso é meio difícil porque tem uma trilha muito íngreme. Eu quase cai. Mas é indescritível a visão. Eu vou mostrar uma foto. É incrível também porque há várias atividades esportivas, muitos surfistas — usou um tom malicioso, arrancando nossas risadas — Mas o mais engraçado foi encontrar dois doidos relaxando na areia nus! Nesse frio! Você acredita nisso? Imagina a cara da sua mãe! Depois encontramos um fiscal que disse que essa prática é proibida aqui mas vira e mexe aparecem alguns adeptos ao nudismo.

Lara seguiu mostrando fotos e relatando detalhes por todo o caminho, com seu toque cômico realmente serviu para nos distrair do meu eminente drama e o ambiente ficou muito mais leve. Fiquei um pouco pesarosa por ter perdido o passeio, admito, mas não me arrependia de ter passado o dia todo em Los Angeles com o cantor que só me metia em problemas desde antes de me conhecer. Já me rendera muitas brigas na escola.

Então entramos na Gaslamp Quarter e Fani diminuiu a velocidade, buscando uma vaga para estacionar.

— É bem nessa rua. Podemos descer e ir a pé — sugeriu.

Concordamos e eu peguei o celular disfarçadamente para mandar uma mensagem ao Justin no mesmo teor.

Encontramos uma vaga entre dois carros e descemos para a noite gélida. Eu tentei manter a aparência tranquila, a fim de não me denunciar sobre a possível armada. As mãos suavam de nervosismo disputando com a ansiedade de rever o ponto central das minhas contendas. Eu não estava longe dele nem há uma hora e sua ausência já me deixara com saudade.

Ugh. Topetudo metido a besta tóxico.

Lara e eu andamos de braços dados pela calçada — a disparidade entre a vontade de correr para chegar logo e dar meia volta me deixava meio zonza — até que Fani parasse na frente de um estabelecimento.

— É aqui. AD — ela estudou a placa a nossa direita. A fachada toda dourada, uma porta ornamental na mesma cor, do estilo catedral, servia como entrada, de lá saíam cores diversificadas quando o segurança abria portas. E a fila estava enorme, como eu devia esperar — Realmente parece coisa das boas se levarmos em conta o número de pessoas. Talvez ano que vem estaremos lá dentro.

Eu estava olhando para os lados a procura dele, do modo mais sutil possível, quando o mesmo apareceu na porta de entrada como o rei da cocada preta, ladeado por ninguém mais ninguém menos que Ryan Butler, no seu melhor estilo gangster. Justin também havia trocado de roupa, a qual não faço ideia de onde ele arranjou, substituíra sua blusa por uma camisa preta simples e, coincidentemente, jaqueta de couro preta. Não me surpreendi que o couro ficasse melhor nele do que em qualquer outra pessoa do planeta. Como consequência, meu queixo podia estar no chão naquele momento.

Assim que me localizou, ele abriu seu sorriso de mil estrelas e levantou a mão sobre a cabeça.

— Lia!

Embora me chamasse, praticamente todas as pessoas pararam para olhá-lo ao passo que ele se inclinava para falar ao segurança sem tirar os olhos de mim. Este, um homem médio de cabelo cacheado preto assentiu e fez um sinal para que eu me aproximasse.

Fani e Lara espiavam entre nós dois com clara desconfiança e eu ouvi muito bem Fani praguejando baixo.

— Era só o que me faltava. 


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MENINAS Não é fácil ser pós graduanda, advogada e escritora, sabe? AHAHHAHAHA eu tentando conciliar tudo parece gente fazendo malabarismo com as bolinhas caindo toda hora na cara. LAMENTO MAS, me comprometo a postar mais um capítulo ainda esse mês!!! Darei meu sangue por isso, pois vocês mal podem esperar por esse jantar ka ka ka e quero que esse seja meu presente de natal para vcs.Não sei se consegui descrever tudo direito, porque eu to muito ansiosa para uns fatos HAHAHAHAH mas é isso, muito obrigada pela presença e por todo o apoio E VAMOS TORCER PRA EU CHEGAR ANTES DO NATAL Por isso nem desejarei feliz natal ainda, apenas: demonstrem muito amor a todas as pessoas nessa época (sem aglomeração e contato físico com quem não é de casa ka :( ) porque Jesus vai nascerrrr. Se cuidem do coronavirus que a vacina já ta na nossa porta, nada de morrer na areia!!!Um beijo e abraço a cada uma, vocês são tudo!


Ps: nossa playlist estará no link externo, ela é tudo pra mim e não escrevo sem ouvi-la.

ps 2: me contem suas teorias para o próximo capítulo 

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