Comemorações
— Liguei para o Matheus ontem — Lara admitiu para mim e Danilo enquanto estávamos em frente a pintura de uma vaca em pé numa cama desarrumada. Mais uma das obras surrealistas de Tim Cantor. Minha mãe achara a galeria de arte uma ótima programação para aquela segunda feira. E estávamos gostando.
Olhamos para ela em silêncio, esperando o desenvolvimento da novidade completamente inesperada. Lara continuava fitando o quadro quando continuou:
— Foi... interessante. Ele disse que sentia minha falta depois dos nossos cumprimentos sem jeito. Eu disse que em breve voltaria. E ele pediu que marcássemos uma saída.
Permanecemos sem palavras até que ela finalmente nos olhou e leu as perguntas em nossas testas. Entrelaçou os braços atrás das costas e deu de ombros.
— O quê? Talvez o romancinho da minha irmã ontem tenha me feito sentir falta do meu — disse, na defensiva.
Fiz uma careta.
— Não fiquei de romancinho, muito pelo contrário — era o que eu queria, mas, após minutos de beijos que não chegaram perto de me saciar, Justin nos levou de volta a parte central do estúdio e fez questão de apresentar como as coisas funcionavam para todos. Ele até deixou Danilo dar uma de produtor enquanto gravava um trecho da música que ele chamou de Children. Outra faixa absurdamente sensacional, diga-se de passagem.
Mudamos para a próxima pintura, corvos saiam do peito de um rapaz vestido apenas com um manto. Lara empurrou meu ombro com o seu.
— O jeito que vocês se olhavam dava a impressão de que estávamos atrapalhando alguma coisa.
Danilo aquiesceu efusivamente.
— Quase sugeri que fôssemos dar uma volta para deixar os dois sozinhos.
Revirei os olhos, tentando não transparecer o quanto aquilo teria me agrado.
— Voltemos ao foco. E aí, Lara, você aceitou?
Finalmente filtrei a parte em que ela chamara Matheus de "seu romancinho". Resolvi não fazer alarde para que não espanasse e me deixasse sem novidade alguma.
Ela sorriu e moveu a cabeça de modo afirmativo.
— Acho que o tempo que estamos passando longe está servindo para dar um destaque na importância que ele tem para mim — confessou, franzindo a testa.
Ora, ora, enfim uma admissão! Sendo bem honesta conosco, eu estava um pouco empolgada com a ideia de que algo acontecesse entre ela e Ryan, mas era tempo demais esperando o desenrolar de sua relação com Matheus para trocar minha lealdade em semanas.
Eu abracei seus ombros, sorrindo. Precisava da exclusividade entre os dois logo! Já podia ver Matheus almoçando aos domingos na nossa casa.
— Que bom, irmã! Não sabe como isso alegra meu coração!
Ela riu, abraçando minhas costas e deitou a cabeça em meu ombro.
— Acho que sinto falta dele.
Afaguei seu braço em um ganido comovido.
— Não se preocupe. Daqui a pouco estaremos de volta.
Quando percebi o que havia dito, porém, certo incômodo subiu pela ponta dos meus dedos. Voltar ao Brasil teria consequências gravosas para mim. Quanto mais ficávamos neste país, mais profundas. E nada tinha a ver com o ambiente em si, as lindas paisagens e o estilo de vida "sonho americano". Na verdade, estava mais para sonho canadense...
O vibrar do meu celular em meu bolso cortou o momento e felizmente a linha desanimadora de pensamentos. Parei de respirar quando vi o identificador de chamadas. Dr. Russel. Atendi no mesmo instante.
— Oi, doutor!
Danilo e Lara arregalaram os olhos para mim.
— Senhorita Souza, ótimas notícias! Milagrosamente o juiz proferiu hoje a sentença de encerramento do processo sem julgamento de mérito. Ou seja, você já pode publicar o livro! Acabou!
Milagrosamente? Justin havia cumprido com a promessa e pedido ao seu advogado para interferir?!
As palavras soavam como canto de sereia para mim. Soltei um grito de pura felicidade perplexa, segurando meu peito para o coração não pular para fora.
— Queria te contar pessoalmente e junto com todo o pessoal, mas fiquei empolgado demais para aguardar. Vou repassar a novidade para a editora e sua empresária agora. Parabéns, senhorita! — Ele disse, a voz verdadeiramente animada. Seu alívio me mostrava o quanto estivemos próximos de fins desastrosos.
— Sim, sim! Muito obrigada, de coração, doutor!
Recebi os abraços antes mesmo de desligar de fato o celular. Meus pais haviam se aproximado ao ver a comoção e, sem mais palavras, todos já sabiam o que aquela ligação significava. Estávamos pulando no chão como criancinhas na manhã de Natal, e em meio à confusão de palavras felizes saindo da boca de todos ao mesmo tempo, Fani me ligou. Primeiro ouvi seu grito e depois as palavras atropeladas de que fôssemos imediatamente para a editora.
Parecia cômico que a primeira pessoa que me passou na cabeça para avisar a novidade foi Justin, o responsável por aquela confusão.
"Deu certo! Posso publicar o livro!" — Digitei enquanto entrava no carro.
Não demorou para que ele respondesse.
"Já era hora! Você merece, Lia. Todo sucesso do mundo. Tenho muito orgulho de você. Há tanto a dizer..., mas não vamos transformar isso numa carta. Você tem muito a resolver, imagino. Podemos comemorar?"
O sorriso em meu rosto ficou maior.
"O que tem em mente?"
"Para ser honesto, você".
Me derreti, momentaneamente sem palavras.
— Você está pronta, irmãzinha?! Sua vida definitivamente muda a partir de hoje! Quero dizer, mais um pouco — Lara segurou minha mão, tão animada quanto eu.
— Sempre soube que esse mundo era pequeno demais pra você, Ju! — Meu pai disse, olhando-me pelo retrovisor.
Minha mãe virou no banco e segurou meu joelho, a felicidade estampada no rosto.
— Ela já nasceu uma estrela.
— É um privilégio ser seu amigo, Juli — Danilo se inclinou sobre Lara para sorrir para mim.
O carro não parecia espaçoso o suficiente para conter tamanha alegria e amor. E apesar de ser uma das melhores notícias que eu havia recebido na vida, nada se equiparava àquela sensação de me sentir tão amada. Ainda que nada desse certo, eu tinha certeza de que eles me apoiariam.
Foi tudo muito rápido e confuso. Todos tinham alguma coisa a dizer, num geral, resumia-se a fantasias sobre o futuro e minha carreira internacional. Logo já estávamos atravessando as portas da editora. Fui recebida com palmas e senti que estava flutuando ao invés de caminhar.
Josh transformou nosso abraço numa condução à sala de reunião. Estavam todos a postos. Fani se sentou ao meu lado, do outro lado da mesa oval estavam o advogado, dois responsáveis pelo marketing — só me lembrava do nome da mulher, Sophie —, Travis, que parecia ser um tipo de assistente particular, e Lexa, a responsável pela diagramação.
Josh estava em pé ao lado de uma lousa flip chart e destampou o canetão.
— Certo, time! Temos trabalho pela frente. Já havíamos cogitado estratégias para essa hipótese e pensamos que a data ideal seja nesta sexta feira — ele escreveu a data em vermelho no papel e circulou — Já temos tudo pronto. Os livros já foram distribuídos, os materiais de divulgação foram elaborados e os veículos de comunicação já foram pagos. Não precisamos fazer mais nada do que espalhar a palavra. Para isso, teremos esses quatro dias. Todos de acordo? Julia? — Ele perguntou acelerado, quase quicava de empolgação.
Palavras de afirmação foram ditas ao mesmo tempo e os olhares se voltaram para mim e Fani a fim de garantir a harmonia.
— Ótimo! Com isso deixo Sophie nos apresentar suas estratégias, por favor — ele estendeu a mão como uma introdução para ela.
De imediato, Sophie se levantou. Usava um terninho básico preto e branco que lhe conferiam credibilidade. O cabelo cacheado castanho estava preso em um coque. Ela ajeitou o óculos no nariz longo e se voltou para o projetor que havia atrás da lousa. Com um clique no controle em sua mão o material apareceu na tela. As janelas estavam parcialmente cobertas pela cortina, então não foi difícil de ver as imagens. Fixei os olhos na informação.
— Certo. Organizei algumas coisas que pudemos verificar na nossa trajetória até agora e não vou me ater a termos técnicos que são desnecessários para a reunião. Temos uma parceria com algumas livrarias na cidade para exposição em ilhas com pilhas de litros, display de gondola em todas, e faremos uma manhã e uma tarde de autógrafos no dia do lançamento nas duas maiores livrarias da cidade. Uma é a do shopping — ela dizia enquanto passava as imagens com a identificação das livrarias e dos instrumentos utilizados — O marcador de páginas já vem incluso na capa do livro. Teremos ao menos dois funcionários com camisetas de November, amanhã te entregaremos a sua, Julia! — Ela piscou para mim — Pagamos a divulgação do Google, Amazon, Facebook, Instagram, além dessas revistas e jornais. Teremos a contagem regressiva do lançamento em alguns deles, tenho todos os nomes aqui e enviarei para a Sthefani — assentiu para minha empresária.
Tomei um gole de água por ela, a torrente de palavras saindo da sua boca me deram sede.
— Temos três influencers para enviar o livro que estão responsáveis por falar dele praticamente todos os dias até dois depois do lançamento. O maior deles é Kylie Jenner — ela se virou para nós ao dizer o nome, como quem dá uma notícia estratosférica. Ouvi algumas exclamações e até palmas empolgadas e eu apenas arregalei os olhos. Justin sabia disso? Ela sabia que o livro era meu? Sabendo da minha bronca, Lara me olhou de rabo de olho, contendo um riso incrédulo e cômico — Podemos marcar duas entrevistas para essa semana, eles estão apenas esperando minha ligação para agendar. Pensei em fazer o Good Morning America da Abc na quarta de manhã e... — ela fez suspense antes de passar para o próximo slide, simplesmente Ellen ocupou toda a tela — E The Ellen DeGeneres Show na sexta antes da manhã de autógrafos.
Os urros de empolgação dessa vez foram maiores e várias mãos me tocaram para compartilhar tamanha felicidade. No que se referia a mim, eu estava presa num choque de irrealidade que contaminava minha vibração. Minha mente fez cálculos lógicos e a conta não parecia fechar. Levantei a mão e Sophie sorriu para mim, concedendo-me a palavra. Todos se silenciaram para me ouvir falar.
— Sophie, eu realmente agradeço tudo isso, mas não consigo imaginar como é... — comecei a dizer, com cuidado. Sabia quanto eu tinha de arrecadação com os meus livros e a estimativa que me apresentaram com as vendas nos Estados Unidos era boa, mas não o suficiente para os gastos que eu via com essas estratégias.
— Possível? — Ela completou para mim e ampliou seu sorriso — Essa é a outra parte que gostaria de apresentar — pulou para um slide de gráficos — Julia, desde sua chegada ao país sua popularidade cresceu em praticamente dez vezes. Seu nome está entre um dos dez mais pesquisados do mundo — destacou a palavra — no google neste mês, seus seguidores das redes sociais e os acessos às suas contas aumentaram na mesma proporção e, o melhor, seu livro é um dos mais esperados do momento segundo pesquisas da mídia. Nossa expectativa de vendas é infinitamente superior agora, então a editora está disposta a investir o quanto for necessário. Além do mais, acredite ou não, a própria Ellen nos contatou para fazer o convite ao programa. Não desembolsamos nada.
Recostei-me na cadeira, perplexa. Não tinha administrado as informações o suficiente para chegar a conclusões como essas. O fato de ter sido perseguida por paparazzi e sair em algumas matérias de fofoca não poderia ter me dado uma dica tão estratosférica assim. Talvez se eu acompanhasse mais as redes sociais..., mas ainda assim. Não conseguia acreditar. Uma mão se apoiou em meu ombro e, no estado em que estava, nem pensei em olhar de quem era.
Sophie passou ao próximo slide. Matérias relacionadas ao processo judicial e alguns desentendimentos visíveis fotografados que tive com Justin.
— Sabemos que ele não tinha essa intenção, mas Justin Bieber trouxe um destaque descomunal para o seu livro. O mundo não consome nada como um drama. Todos estão esperando ansiosamente para descobrir o que foi capaz de desagradá-lo a tal ponto. E mais, tivemos que derrubar algumas traduções não autorizadas em alguns sites.
Bom, se antes ele queria desaparecer com minha história...
— E falando nisso... — a voz dela assumiu um tom vacilante — Vimos que vocês recentemente se encontraram em um restaurante mexicano, e que aparentemente estão se dando bem. O que quero dizer é, manter sua imagem atrelada a ele, apesar de toda a confusão inicial, agora vai ser benéfico para a divulgação. O povo quer saber mais disso. Melhor ainda se conseguisse com que ele mesmo divulgasse o livro e... quem sabe... — saltou uma imagem dele me olhando tirar uma foto na Disney, um sorriso afável pairando no rosto, podia sentir sua ternura expressa já no olhar. Ao lado da imagem, uma simulação de crescimento nos gráficos com o nome "relacionamento estratégico".
Senti-me constrangida de imediato.
— Vocês estão brincando? — Meu pai questionou, irritado.
Josh se apressou em responder:
— Isso não é exatamente...
— É a minha vida — rebati, firme, enfim assimilando a sugestão — E eu já disse a ele, como digo a vocês, nunca quis e nem vou usá-lo como trampolim para nada.
— Você acha que ele não aceitaria... — Sophie começou a perguntar com calma.
— Esqueça, Sophie. Não vou envolvê-lo nisso — cortei, dotando as palavras de perpetuidade.
Justin havia pensado que eu só queria me aproveitar dele e essa foi a razão de termos brigado no início. Nada que remetesse minimamente a esse teor era do meu interesse. Ainda que, por uma razão ilógica e inexistente, ele mesmo me propusesse. Não queria que ele tivesse essa imagem de mim, nunca. A palavra relacionamento entre nós dois era sagrada para mim. Mesmo que não se concretizasse pela impossibilidade factícia. O que acontecia entre ele e eu não tinha nome e não era da conta de mais ninguém.
Ela levantou as mãos na defensiva e fechou a apresentação.
— Tudo bem. Não quis ofender vocês, era uma possibilidade que eu precisava mencionar, é uma prática comum no mercado. Me desculpem.
Segundos tensos se seguiram em que ninguém parecia saber o que dizer, então Fani uniu as palmas e sorriu, diplomática.
— Muito bem. Agora que estamos conversados — lançou um olhar para Sophie que dizia claramente para não mencionar mais aquele assunto — podem confirmar essas entrevistas, certo, Ju?
Limitei-me a assentir, me esforçando para deixar o aborrecimento de lado. Será que eles também pensavam que eu era capaz disso? Me aproveitar dele?
— E agora, o que acham de almoçarmos juntos como comemoração? — Fani sugeriu — Muito bom trabalho, gente — iniciou palmas para o alto, incluindo a todos na congratulação. Aos poucos, nos juntamos a ela.
As conversas a caminho do restaurante estavam animadas, a êxtase em se livrar da tensão que nos trouxera as últimas semanas e a expectativa para um futuro promissor era inebriante. Danilo abraçou meus ombros.
— Tudo bem?
A pergunta era específica e eu não precisava de mais para entender. Lara se juntou a nós, enlaçando meu braço livre.
— Fiquei irritada no começo, acho que agora passou. Falta de noção mesmo — segredei, franzindo a testa ao me lembrar da sugestão de Sophie.
Como ela havia dito, era prática no mercado, eu não deveria ficar tão irritada, era sua função mencioná-la. Ainda assim...
Lara estalou a língua.
— Esse povo só visa o lucro, mas nós vamos apresentar qual é nossa cara e pronto.
Além de que, essa seria uma ideia que ele mesmo repudiaria. Lembrava-me muito bem dos boatos de seu relacionamento com Selena ser marketing, mas não acreditava que ele faria isso. Muito menos comigo. Na verdade, duvidava muito que ele quisesse qualquer tipo de relacionamento entre nós. O que estávamos vivendo era muito mais do que eu esperava e tinha quase certeza de que era o máximo que eu teria.
Reconheci uma pontadinha de tristeza e de imediato me frustrei comigo mesma. O que raios eu estava esperando?
E então entendi que parte da irritação que Sophie me despertara tinha muito a ver também com pintar essa ideia na minha cabeça. Como se eu precisasse de mais essa.
— Vamos ligar para Maddie e contar as novidades? Ela vai amar saber! — Lara me tirou do caminho tortuoso — Danilo você vai adorar nossas novas amigas americanas.
O gritinho da Maddie confirmou nossas suspeitas e ela prometeu que juntaria todas as garotas para a manhã de autógrafos, em suas palavras, todas gostariam de uma cópia com uma dedicatória exclusiva. E eu percebi o quanto seria importante para mim tê-las ali, ainda que não suprissem a ausência dos meus outros amigos e familiares. Se eu pudesse, traria todos comigo.
Durante o almoço, tive dificuldades em digerir meu lanche e tantas palavras brotando de todos os presentes. Não dava para acompanhar. A velocidade com que meus pensamentos rodavam já era demais para assimilar. Com tamanha empolgação, meus pais começaram a fazer chamada de vídeo com meus avós e tios para contar a nova data da publicação e isso atrasou até mesmo o término das batatas fritas, que eu sempre elimino em tempo recorde.
O dia foi um furacão de emoções. Sorri tanto que minhas bochechas estavam doloridas. No final da tarde eu estava praticamente rouca, estirada na cama, os olhos no teto, sentindo as energias restantes deslizarem do colchão até o piso.
Danilo segurou minha mão e eu me voltei pra ele, deitado ao meu lado.
— Fico feliz por poder estar presente na publicação.
Apertei seus dedos.
— Eu também. Não seria o mesmo sem você.
Ele sorriu e voltou a olhar pra cima. Pude ver as engrenagens em sua cabeça trabalhando.
— Acha que ele vai querer ir?
Torci a boca.
— Não sei. Não sei nem se seria bom ele estar lá.
— Pelo que aquela tal de Sophie disse...
Fiz uma careta e ele deu uma risadinha. Era ridículo mesmo.
— Ele deve saber como isso seria importante pra você. E se ele se importar de verdade...
Não queria pensar na importância que eu tinha na vida de Justin, então descartei essa linha inquietante de raciocínio.
— Imagina a confusão que seria? Provavelmente as pessoas ficariam lá atrás dele e não ligariam para mim coisa nenhuma. Eu mal conseguiria assinar livro algum.
Danilo levantou o indicador.
— Você tem um ponto. Talvez deva desconvidá-lo então.
Eu ri.
— Não o convidei. E acho que ele pensaria a mesma coisa.
— Então concluímos que se ele se importar de verdade, não vai? — Franziu o cenho — Misericórdia, é muita complicação pra duas pessoas só.
— Isso se chama vida.
Ele concordou, relutante, e voltou a olhar para o nada. Não tentei adivinhar em que pensava e apenas vegetei antes que ele dissesse as próximas palavras.
— Você vai voltar ao Brasil, certo? — Abri a boca para responder de imediato, mas ele se adiantou — Digo, não pensa em se mudar pra cá? Se as coisas saírem ainda melhor do que o esperado. Quer dizer, eles querem a sequência do livro, não é?
Parei para pensar. Eu conseguiria me mudar de país? Cortar minhas origens assim para ficar em uma terra desconhecida? E sozinha, provavelmente. Meu pai tinha o próprio emprego e Lara estava na faculdade. Ainda que minha mãe fosse aposentada, duvidava que conseguisse se distanciar do meu pai. Talvez Fani se mudasse comigo, mas...
— É uma mudança muito radical — disse.
Danilo estreitou os olhos.
— Isso não foi uma negativa — rebateu, censurando-me com humor.
Balancei a cabeça.
— Nós temos que concordar que se eu tivesse uma oportunidade dessas... — deixei a frase aberta tecer as inúmeras realizações que eu teria ao conseguir um feito desses. Talvez um passo mais perto para o sonho de ter meu livro nas telonas.
— Eu sofreria em plena agonia sem você por perto — queixou-se. Deitei a cabeça em seu ombro, num consolo mútuo hipotético — Mas, ficaria feliz por você. Claro, dependendo das companhias que arranjasse. Não pense que eu não compraria uma passagem de avião repentina só para vir socar a cara de alguém.
Não precisava de muito para entender a quem ele se referia. Eu ri.
— Por essas e outras eu amo você. Acho que poderíamos nos mudar nós três pra cá. O que acha? Ísis amaria esse friozinho do cão.
Ele aquiesceu, dando uma risadinha.
— E falando em cão... — disse ao sentir meu celular vibrar ao nosso lado — Desculpa, eu não deveria ofender os animaizinhos desse jeito.
Dei-lhe um tapinha no ombro e peguei o aparelho celular com considerável ansiedade.
"Ainda sobre convites e comemorações... posso ter sua companhia amanhã à noite?"
Danilo suspirou.
— Você tinha que ver sua cara. É a expressão suicida dos malucos que se jogam de paraquedas.
— Você já pulou de paraquedas — rebati.
— Por isso eu sei.
"Me convença"
Como se fosse necessário.
Batuquei no celular até receber a resposta.
"Tem uma festa na casa da Kendall. Quero que seja minha acompanhante".
Bufei e revirei os olhos.
— O que foi? — Danilo perguntou, espiando meu celular.
— Veja. Ele disse que queria comemorar o lançamento do livro comigo...
— Que ele mesmo atrapalhou — pontuou.
Torci o nariz, era mesmo cômico para não dizer trágico.
— Sim. E então vai numa festa da Kendall e quer que eu vá junto. Isso não parece bem uma comemoração nossa.
Ele estudou meu rosto por alguns segundos.
— Você se sente intimidada pela Kendall?
Desviei o olhar e levantei um ombro. Sua altura e magreza, cabelo sempre impecável, maquiagem natural quase impregnada na pele de porcelana, traços angelicais e a doçura de uma donzela indefesa pareciam bem contrários ao meu caos diário.
— Juli, você não se vê direito, lembre-se disso. E se ele quisesse estar com ela assim, estaria, não te levaria pra uma festa que a mesma vai fazer. Mas concordo que ele devia ter pensado em outra coisa. Talvez vocês possam planejar depois.
Franzindo o cenho, tentei imaginar como seria estar numa festa na casa de Kendall. Era uma oportunidade de estar numa mansão pela primeira vez. Com um círculo social completamente fora do meu – milionários. E provar especiarias sofisticadas — embora minha primeira experiência no evento beneficente não tenha sido boa. Por outro lado, me lembrava muito de sua fase complicada. Bom... então seria melhor que eu estivesse com ele, não?
Será que Kylie estaria lá? Deveria mencionar o livro?
"Onde e que horas?".
A mensagem chegou de imediato, quase como se já estivesse digitada:
"Los Angeles. Te busco às 18?"
Ai.
"Jatinho?"
"Ele está com saudades de você.".
Suspirei, mas senti o sorrisinho brincar na ponta dos lábios. Eu ainda detestava essas joças voadoras, porém, me deleitava com sua atenção para dissipar meu temor.
— Eu não tenho nem roupa para isso — pontuei.
— Não seja por isso. Laraaaa — Danilo voltou a cabeça para a porta, chamando.
Apesar das reclamações, quando me coloquei em pé para ser manequim de Lara, minhas emoções se concentravam no júbilo de reencontrá-lo. Com minha publicação a vista e a promessa de estar com ele no dia seguinte, a vida parecia doce. Daquele tipo de felicidade que dava medo. Expectativas altas precedem grandes quedas, mas também anunciam altos voos.
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OIEEEEEEEQueria escrever mais, PORÉM, se eu nao postar agora vou demorar mais, e eu mesma não aguento mais nao ter atualização de litigious. Deus me ajude a voltar logo.
que saudade! espero que estejam bem! um abraço!
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