Capítulo 5: Humilhado
Desembainhei a espada, jogando a bainha de madeira no chão.
O fio do aço cintilou prateado à luz solar, a peça era pesada, mais era um peso confortável e que, de certa forma, me dava confiança. Parecia afiada e mortal, testei alguns golpes. Eu vou morrer! Sacudi a cabeça, fechei os olhos numa oração silenciosa.
"Por favor. Por favor. Eu não quero morrer!".
Abri os olhos, do outro lado da Arena, Irmão Yang me encarava como se me estudasse, aqueles dois lagos negros profundos e selvagens me deram calafrios. Antes que eu pensasse mais, ele me atacou. Avançou pelos espaços que nos separavam, numa corrida veloz.
Prendi a respiração.
Oh, céus receba minha alma!
Subitamente, minha mão se mexeu por instinto e pa!!! Metal chocou-se contra metal.
Oh, glória! Acho que vou viver!
Girei a espada no meu entorno, me defendendo de outro golpe, pulei desviando de um corte feito pela espada de Yang. Ele se mexia com calma, misturado com uma ferocidade felina. Era rápido e forte quando precisava ser. Em outros momentos era fluído como água. Seus avanços e estocadas, se mesclavam com a movimentação de seu hanfu, era como uma dança.
Rodopiamos, mais uma vez metal lançou-se contra metal, o clangor retumbou pela arena. Houve um breve murmúrio de agitação, os discípulos se uniam timidamente num coro de torcida.
— Irmão Yang!
Eles chamam seu nome, não o meu. Sempre era assim. Aquele pensamento me distraiu. Abri a guarda. Um chute. Saí arrastando aos pés na areia dourada, que se lançou aos ares formando uma nuvem poeirenta ao meu redor. Arfei e me posicionei, Irmão Yang fluiu na minha direção, desviei a ponta da sua espada, outro clangor. Giramos, tecidos ondulantes como vapor azulado, lâminas afiadas que se interceptavam.
Num passe em falso de Irmão Yang, desferi um chute, que atingiu a lateral do seu tronco. Ele voou longe, rolando no chão arenoso, fios soltaram de seu rabo de cavalo e parecendo um pouco descontrolado, Irmão Yang se ergueu e lançou outra investida. O interceptei, lâmina defrontando com lâmina. O clangor do metal. O fio da sua espada raspou minha bochecha deixando um rastro de sangue, mais um chute e fui eu quem rolou pela areia. Ergui-me, usando a espada como apoio. Do outro lado, Irmão Yang abriu um sorriso debochado. Ele estava rindo de mim. Olhos brilhantes de cada discípulo, eles também estavam rindo de mim. Enchi-me de uma raiva súbita e fervente.
"Sempre contra mim, sempre com ele. Sempre com ele".
Antes que eu pensasse, ativei o qi e o fiz escorrer pela espada, um golpe e um raio de luz cortou os espaços entre mim e o Irmão Yang. Areia foi arremessada nos ares com a força de uma explosão, enchendo o ambiente de poeira. Grãos de pó coloriam o ar de amarelo. Houve o som de um estrondo, como o ruir de algo, metade da arquibancada, do outro lado, rangiu e desabou. Irmão Yang desviou por pouco do corte embebido em qi e cambaleante, me encarou com uma expressão surpresa. Corri numa velocidade alarmante e me joguei contra ele. Eu ia matá-lo. Matar aquele desgraçado parecia uma ótima ideia. Lâmina contra o pescoço do adversário. Parei.
O que eu estava fazendo? Hesitei. Só para receber um chute, rolei na areia, ele estava em cima de mim agora, íris brilhando com fúria assassina, espada parada na base do meu pescoço, ele a puxou, deixando um corte superficial na minha pele. Se levantou com um sorriso largo.
— Acho que eu venci.
Vivas encheram o recinto junto de aplausos. Permaneci deitado, meu corpo inteiro tremia, meus dedos avançaram para o corte, que ardia. Observei o sangue e engoli em seco. Ele me estendeu a mão, num gesto educado, a ignorei. Eu estava com tanto medo dele e de mim. O que estava acontecendo comigo?
— Não esperaria outra solução do melhor discípulo da Seita. — a voz ecoou na Arena e me assustou. Parei a minha comemoração mental.
O dono da voz caminhou e se juntou a nós. Seus cabelos negros amarrados com perfeição no topo da cabeça, rosto rígido, lábios finos, postura impecável. Eu sei quem é, me levantei e me curvei em respeito. Esse é o Líder da Seita, Xian Lian e Shizun de Yang e Shun Xuě.
O Líder me ignorou e se colocou ao lado do Irmão Yang, deu-lhe dois tapinhas no ombro.
— Está melhor na espada, Discípulo Yang.
— Obrigado, Shizun, estou me esforçando bastante para melhorar sempre.
— Ótimo. — um sorriso brilhante em resposta, o Líder da Seita focou sua atenção em mim, seu sorriso murchou. — Veja, Discípulo Shun, como um verdadeiro Mestre é. Percebi que sua empunhadura piorou, deveria tentar ser mais como o Discípulo Yang.
Entreabri os lábios, eu realmente ouvi isso? Ele acabou de me humilhar? Eu não sabia direito como reagir. Devo aceitar isso? Ele é o Líder da Seita, então sim.
Vai ver que, só quer que eu melhore. Pode ser isso, não é?
Curvei-me em subserviência.
— Sim, Shizun.
Um último olhar de nojo e o Shizun se afastou, levou a tiracolo o Irmão Yang, ambos conversavam alegres. Fechei o punho e naquele momento, senti um misto de raiva, ódio e inveja fervendo dentro de mim como um caldeirão de sopa prestes a queimar.
Depois da aula aos discípulos, treinei com espada a tarde inteira. Girei e manobrei o fio, fazendo as areias douradas se lançarem, criando uma nuvem poeirenta, que ficou suspensa, mesmo quando finalizei a última investida.
Enxuguei com a mão o suor que descia pela testa. Com a outra, apertei o punho frio da espada. "Veja, discípulo Shun, como um verdadeiro Mestre é".
— Ridículo. — comentei entre dentes.
Saí do centro da Arena Dourada, as botas macias estavam com uma quantidade grande de pó armazenada, o que incomodava cada passada. Embora, não fosse isso o que mais me irritava.
"Percebi que sua empunhadura piorou, deveria tentar ser mais como o Discípulo Yang". Relembrar aquelas palavras fizeram meus músculos tencionarem, franzi o cenho e trinquei os dentes. O desprezo vivo em cada rosto e íris, o nojo no canto de cada boca.
Expirei, numa lufada cansada e me curvei para tirar do chão a bainha de madeira negra, que possuía detalhes em prata nas pontas, as quais contratavam com o punho também prata. A peguei, preparei para guardar a espada, porém me peguei a admirando.
Seu fio reluzia com o brilho das chamas das tochas recém-acesas. Era uma bela espada reta de dois gumes com caracteres traçados no aço que diziam: "食者", que significava "destruidor", esse deve ser o nome da peça. Pensando bem, o nome combinava com o vilão que Shun se tornaria mais a frente. Encaixei a lâmina na bainha, até só restar o punho da mesma. Segurei firmemente a peça completa e senti como aquele peso era confortável e seguro na mão.
Olhei para além das portas da Arena Dourada, as quais estavam escancaradas e estremeci, diante do mundo novo que se abria. Um mundo que não me prometia nada de leveza ou bondade. Um mundo que me julgaria com um único olhar. Agulhas finas cutucaram meu coração. Era medo.
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