Capítulo 20: Precisamos conversar

Eu analisei com interesse o mapa, que traçava no couro, uma única montanha flutuante que ficava à 6km de distância da Seita Picos Claros. Segundo minhas pesquisas, naquele lugar havia uma antiga mina de fada, onde se extraía cristal dos ventos de alta qualidade.

Um antigo mal dominou o lugar, mas meu desespero de proteger a muralha era grande (eu não quero morrer, ok? Me julguem!) o bastante para que eu me arriscasse. Se conseguisse o cristal, poderia acessar o poder das fadas e com ele resolveria o problema de comunicação com o "vinculo mental" e com a técnica de multiplicação (sim, eu ia dar uma de Naruto), o problema de pessoal seria sanado e todos seriamos salvos dos bruxos. E pronto, final feliz!!!

No entanto, eu conseguiria lutar e vencer o demônio Zhong Kui, o atual dono da mina de cristal dos ventos? Se eu tivesse a sorte... Mas ter sorte era algo difícil para alguém como eu. Quer mais azar que morrer, entrar em outro mundo, perder seu passado e personalidade e sem perceber se tornar a porr* do vilão?? Eu temia o dia que não lembraria mais do meu próprio nome! Tá entendendo a situação?

Tirei meus cabelos longos do meio (eu sempre me atrapalhava com aqueles fios compridos). Quando alguém se sentou ao meu lado, enrolei o mapa lepidamente, não queria que ninguém visse o que eu planejei ou poderiam tentar me deter, e escondi dentro da minha vestimenta.

Ergui a vista, o semblante do elfo estava um pouco abatido e sem vida, essa visão me apertou o coração. Ok, eu precisava ser gentil com ele, afinal Torden veio de uma Ordem devastada, inclusive ainda vestia o branco do luto. Por uma fração de segundos, lembrei do meu luto quando a minha mãe morreu, eu me senti vazio o dia inteiro e nem consegui comer direito. Não tinha apetite e nem vontade de fazer nada além de virar as páginas dos álbuns de fotografia, dia e noite, vendo as fotos e desejando que ela voltasse. No fim de uma quinzena tive que largar as fotos e continuar vivendo. Tive que seguir em frente.

O rosto da minha mãe, franzi o cenho, como era o rosto dela? Com certo pânico percebi que não lembrei. Eu não recordei de seu rosto! Um tremor perpassou o meu corpo. Começou, eu realmente estou me perdendo nesse mundo! Engoli meu medo, eu decidi continuar meu plano de ser amável, eu podia fazer isso, mesmo não indo muito com a cara do elfo.

- Torden, bom dia! - tentei soar alegre e puxei os cantos dos meus lábios numa tentativa de sorriso.

Calmamente, Torden se sentou, sua elegância emanou como uma aura impossível de ser ignorada, tinha uma expressão gentil na face. O jovem franziu o cenho e perguntou, num tom preocupado:

- Bom dia! Está sentindo dor em algum lugar?

O sorriso se desmanchou como gelo sobre a chuva, fiz uma careta e chutei sua perna.

- Idiota! - repliquei.

Com uma expressão divertida (demais para o meu gosto), o elfo sorriu de um jeito tímido, duas covinhas surgiram em suas bochechas. A comida escapou dos meus Kuàizi, pisquei desacreditado, meu coração errou uma batida e minha mente ficou cheia de algodão. Dei alguns tapinhas no peito, tentei fazer meu coração parar de bater tão forte, voltei a prestar atenção a refeição. Coloquei dois baozi cozidos no vapor dentro da minha boca, enchendo as minhas bochechas. Eu me senti tão malditamente nervoso que até as minhas palmas suavam. Mastigue e não olhe para aquele sorriso, só não olhe.

- A negociação finalmente chegou a um termo - sua voz soou séria.

Parei de comer e lhe lancei um olhar cauteloso. Nada de sorriso? Terreno seguro! Tomei um gole de água aromatizada, hidratando a minha garganta. Meus olhos fora atraídos para os seus lábios, que pareceram tão macios. Será que beijá-lo seria bom? Me engasguei com água, por que eu estava pensando nisso? Limpei a garganta.

- Que foi? - indaguei, curto e direto.

- Decidiram cooperar harmonicamente até a ameaça bruxo ser extinta. - sorriso alegre. Senti como se levasse um soco, o ar me faltou por um tempo, desviei os olhos e enchi as minhas bochechas com mais baozi. Coma e não pense nos lábios dele, só não pense!

Logo três magos passaram por nós, eles lançaram olhares de soslaio na minha direção e comentaram gélidos.

- Não devia se sentar com cultivadores. - a última palavra foi dita como se fosse um xingamento.

Encarei aqueles rostos enjoados, que tinham as sobrancelhas arqueadas e cara de entojo. Uma parte minha rosnou: "Pior que Irmão Yang, são os Magos! Eu os detesto!", aquela voz era do Shun original e repercutia em meu cérebro. "Ah, então deu ar da graça? Vamos coabitar na paz?". Não houve resposta, parte dois.

- Se precisamos trabalhar juntos então que convivamos em paz. - Torden respondeu com um sorriso educado.

Os magos trocaram olhares, mas se afastaram vagarosos. Apenas um permaneceu, este possuía um nariz aquilino e sobrancelhas grossas e arqueadas, ele falou acidamente para o elfo:

- Faça o que quiser, elfo. Mas tire esse anel, nunca será digno dele. - o mago se afastou e o elfo se encolheu na cadeira.

Meus olhos se focaram naquela pedra avermelhada que cintilou e lembrou um carvão em brasa, era uma Ágata de fogo, uma pedra rara e conhecida por "queimar máculas", além de amplificar os poderes de um mago. Por isso, eram muito visadas. Porém, havia uma única mina em toda Aarthy, de onde se extraía tal pedra. Assim, por sua raridade e características especiais, costumavam ser o símbolo dos Arcanos-Mestres (sim, eu li quase todos os livros da biblioteca do pavilhão azul). O que tornou tal pedra incomum para um anel e ainda mais incomum um servo-mago estar a usando. Torden escondeu a mão esquerda e se colocou a comer seu café da manhã.

Fiquei intrigado com aquela peça e com a alegação anterior do mago. Por que ele tinha a posse de tal raridade? Por quê? Quem é você Torden? Alisei o queixo em meditação, tentei em vão encaixar as coisas de um jeito que fizesse sentido. Ele sabia demais sobre bruxos, era um elfo letrado, com ares de elegância e estranhamente, parecia me conhecer. Eu senti isso, naqueles olhares. Estava ficando louco? Ou... Abruptamente, Irmão Yang aproximou-se, surgindo por de trás de uma multidão de discípulos que adentravam o refeitório, pois o horário de pico chegou. Olhos insondáveis e obscuros, se fixaram em meu rosto.

- Precisamos conversar.

Não esperou a minha resposta e saiu me puxando atrás de si. Um piscar, um flash.

Estávamos em avanço contínuo, sempre empatados, sempre ombreando um ao outro. Então Shifu Xian disse "Farei do mais forte o herdeiro da liderança da Seita", assim o inferno começou. Haviam fofocas no ar com o meu nome, sempre estavam lá. Diziam coisas cruéis, coisas terríveis que só aumentou o nojo deles por mim. E ele sabia de tudo. Sabia que falavam que eu era impuro e indigno, que não deveria ter sobrevivido, que devia ter morrido com os outros elfos de gelo. Eles se reuniam ao seu redor falando e ele nunca discordava. Doeu vê-lo na roda das fofocas contribuindo com as palavras ácidas, contando histórias irreais sobre um meio-elfo cruel que estripou os cachorros da vizinhança do orfanato.

Um amigo deveria falar mal do outro com tamanha calma? Um amigo se juntaria ao grupo de fofoca com seu nome na boca? Um amigo faria isso? Faria?

Eu sempre senti que era um péssimo amigo por invejá-lo, por querer sua popularidade, seu rosto, às vezes eu queria ser ele. Queria tanto, mas eu só era esse meio-elfo odiado por todos.

Então deixem que me odeiem, que eu seja o vilão. Me detestem, só não tenham nojo. Falem comigo nem que seja para me insultar, mas não me deixem de fora. Não quero me senti sozinho. Não quero estar sozinho. Por favor. Por favor. Não me deixe sozinho. Por favor.

Pisquei. Uma lufada de ar me fez engasgar entre lágrimas e uma dor no peito, como um buraco aberto e sangrando. Senti a dor do Shun original , cada lembrança dele se entrelaçou com a minha própria vida anterior. Eu também tinha medo da solidão. Queria ter amigos, sair para festas, mas nunca consegui me enturmar muito bem. Laços feitos eram fracos, num primeiro puxão eles se rompiam e os meus "amigos" me abandonavam. Talvez eu não fosse interessante o suficiente, com o trabalho me consumindo cada tempo livre e as contas exigindo uma economia pesada, que não me permitia passear nos fins de semana.

Talvez eu não fosse simpático o suficiente para manter uma amizade. Talvez eu simplesmente não fosse o suficiente. Não ser suficiente. Sozinho. Fofocas. Todos são meus inimigos, cada um deles. Me odeiem, mas não me deixem. Meus pensamentos foram rompidos, quando o aperto de Yang aumentou em meu pulso.

Estávamos diante do refeitório, alguns discípulos se acotovelavam para entrar no local, pouco me importei com o público, quando puxei minha mão e empurrei o Irmão Yang.

- O que pensa que está fazendo, Irmão Yang? - ergui uma sobrancelha em desafio. Eu me senti péssimo, meu humor estava fermentando e pendia para as trevas com muita intensidade.

- Me fale você, o que está fazendo? - foi a vez dele de me empurrar com agressividade.

- O quê? - rosnei.

- Como pode agredir um discípulo da Seita? - ele me pegou pelo colarinho do meu hanfu azul-turquesa.

Meu humor trevoso se estilhaçou e confusão tomou o lugar. O que ele estava falando?O que aconteceu?

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