Capítulo 15: Negociação

Deixei o cômodo ou piraria. Tudo isso só podia ser brincadeira! Como eu defenderia uma muralha com 4 construtores? Como se faz isso? Ouvi passos, virei-me e o Discípulo Yan me seguia.

— O que foi? — inqueri mais azedo que um limão.

— Não tomará o chá conosco? Ou tomar a sopa? Caprichei na pimenta, soube recentemente que Da Shixiong Shun gosta de coisas apimentadas. — ele me olhou como quem encara um ídolo inspirador, aquilo me desarmou um pouco.

— Já tomei café da manhã, não se preocupe comigo. — respondi num tom controlado e forçosamente cordial.

Olhei em volta, notei que a neblina matutina tinha se dissipado e era possível ver a muralha em todo o seu esplendor, as pedras plúmbeas com ranhuras cintilavam sob os raios solares, sua altura era impressionante e fazia o pescoço doer de tanto olhar para cima. Além disso, se analisasse o horizonte veria a muralha se perdendo ao longe, serpenteando por sobre o terreno acidentado sem nunca findar, como se infinita.

— São 450 mil km2 de muralha. Tivemos sorte! Pelas costas e parte da lateral dos Picos Claros terem o mar como proteção. — apontou para as construções minúsculas acima do paredão de rocha pura. — Tem torres de vigília a cada mil km, homens o vigiavam e protegiam. 10.000 soldados o defendiam no começo, quando a ameaça dos anões trevosos e elfos sombrios ainda era real e não um mito. Depois, 500 homens. 250. Por fim, 100. E então apenas nós quatro. Os muros perderam importância e ficaram entregues a nada. Para 4000 anos de história não ruírem, ficamos e as mantemos. Meu pai, a manteve. O pai do meu pai a manteve. E agora eu a mantenho. Entende?

— Sim, mas só mantê-la não nos salvará. — respondi num sopro, minha voz carregada de preocupação.

Shizi Yan se aproximou de mim e depositou um pedaço de couro enrolado e preso com uma fita de mesmo material.

— Esse é o mapa das muralhas, creio que ajudará quando for montar uma estratégia ou seja-lá-o-que for preciso.

— Obrigado.

Abri o pedaço de couro, o qual deslizou suave e liso contra os meus dedos. Um mapa se desenrolou. O fechei e voltei a encarar os paredões. Eu não queria admitir, mas teria muito trabalho pela frente.

Voltei ao cômodo e aguardei que todos comessem, quando terminaram, desenrolei o mapa contra o tampo rígido e frio da única mesa do lugar.

— Bem, vamos conversar. — meu dedo descansou contra as costas dos Picos Claros. — Um mar nas costas e laterais, não significa exatamente proteção, não no nosso caso. Quero saber o que mais tem lá.

— Ah, tem um paredão liso de mármore branco, é impossível de se escalar. — informou o mais baixo do grupo, de nome XiaoXiao.

— Certo! — menos uma preocupação. — Me contem tudo o que puderem sobre a muralha.

— Como o quê, exatamente? — perguntou o mais alto, Chu Mengao.

— Do que é feita? — eu li muito material sobre as muralhas, mas haviam pontos nebulosos em minha memória, que eu queria clarear.

— De martéreo, uma espécie de rocha única e rígida e de difícil decomposição, deve ter dado um trabalhão quando foi feita. — respondeu Shizi Yan.

— Cada bloco foi encaixado e derretido, os unindo sem espaço entre uma rocha e outra. — completou XiaoXiao.

— Dizem que fogo élfico forjou a muralha há 4000 anos. — foi a vez de Liu Wei falar.

— Também tem runas de proteção a cada 3 metros, para defesa contra maus espíritos. — disse XiaoXiao.

— Runas? — ergui as sobrancelhas em surpresa. Isso não estava nos materiais que eu li.

— Runas de fada. São eficientes. — informou Yan.

Acenei com a cabeça, nota mental: procurar mais sobre magia de fada.

— E as torres de vigília? — perguntei.

— Estão em bom estado, se quiser vê-las... — sugeriu Shizi Yan.

— As verei, por último: e os armamentos?

— Armamentos? — Yan limpou a garganta numa tossida.

Rostos ganharam ares apertados e nervosos.

— Foram retirados 200 anos atrás.

Soquei a mesa em pura raiva.

— Porr*!

Meu pé bateu impaciente contra o chão de madeira, um silêncio denso e incomodante caiu na sala. Soltei o ar.

— Desculpem-me. — fechei os olhos e controlei a respiração, tentando me acalmar.

— Tudo bem. Mas o que está havendo, afinal? — falou o discípulo Yan, me encarando em espera.

Suspirei e cruzei os braços.

— Se pudesse contar, decididamente os falaria, entretanto, esse não é o caso. Preciso que confiem em mim, tudo bem?

— Sim, confiamos no Da Shixiong  Shun! — responderam num uníssono animado.

Me impressionei com aquilo. Semblantes iluminados me observaram sorridentes e com esperança queimando em cada íris escura. Arregalei os olhos, o que é isso? Cadê o desprezo? Ué? Fiquei sem graça e desviei o olhar.

— Precisarei da cooperação de vocês nos próximos passos, posso assim fazê-lo?

— É claro! — falou Yan com felicidade na voz. As cabeças dos outros três acenaram em  confirmação, havia entusiamo brilhando nas faces.

— Ótimo. — encarei o chão, pelo visto encontrei um grupinho de fãs do Shun. Os cantos da minha boca curvaram para cima sem minha permissão.

— Quererá fazer um tour pela muralha?

— Sim, seria bom Chefe Yan.

Este esboçou um sutil sorriso e me acompanhou até o outro lado do pequeno comodo, onde havia uma porta metálica reforçada que se abriu sem rangidos, escadas em caracol me encararam, os degraus eram inumeráveis. Ok, lá vamos nós! Sobrevivi ao último degrau, passamos por mais uma porta metálica e uma visão panorâmica se apresentou. Filas e filas de coníferas se estendiam ao horizonte verdejante. Um vento frio me envolveu os membros, uma pontinha de medo de altura falou alta aos meus ouvidos, a ignorei.

Caminhamos pelo calçamento de pedra e avançamos de uma torre de vigília para outra. Tudo era feito naquela rocha cinza, o tal do martéreo. Perscrutei cada canto e não encontrei nenhuma fissura ou marca de desgaste. Pensando bem, nem os portões metálicos rangeram quando abertos. Ou seja, o cuidado com cada parte daquele muro era evidente.

São atenciosos e detalhistas, foi o que deduzi percebendo o quão bem mantiveram a estrutura milenar, o que não era pouca coisa. Os olhei de soslaio, os quatro andavam em fila e analisavam a vista exuberante e verdejante que o horizonte os ofertava. Comecei a pensar que eles poderiam ser mais que simples construtores. Se eu os treinasse bem, seria como lapidar um carvão cujo diamante se escondia em seu seio?

Poderia valer o esforço. Fiz essa anotação mental. Descemos os muros e eu me separei deles, voltando pela estrada lateral até a escadaria na rocha. Eu tinha algo a resolver.

— 50 discípulos! — negociei.

— 25, no máximo. — replicou a outra parte.

— 50 já é o mínimo do mínimo! — rebati.

— 25 já é o suficiente, é pegar ou largar.

A gaiwan de yao bateu contra a mesinha, uma sobrancelha negra se ergueu em desafio. O líder da montanha, Shishu Cheng, me olhava com um asco indisfarçável. Por que vim até ele? Eu precisava de sua aprovação para o recrutamento dos discípulos para a guarda dos portões, pelo vista a placa dourada que me foi dada só servia para comprovar o fardo da minha missão e mais nada.

Droga de placa!

— Mas posso lhe dar 30. Se ajoelhar-se e implorar. — falou o homem com aquela cara arrogante, que me deu vontade de estapear.

— Sabes que esses guardas protegerão a todos os 7 picos? — retruquei, o encarando com a intensidade da minha raiva.

— Ainda não o vi se ajoelhando! — ele ergueu o queixo, com ar de superioridade.

Era demais! Me ajoelhar?! Eu poderia sair dali e o mandar ir para aquele lugar feio e sombrio e não conseguir soldado algum, ou poderia me ajoelhar e ganhar mais cinco do que ele me ofertara antes.

Meu orgulho rugia, este preferia a morte à humilhação. A minha consciência dizia: ajoelhar não me desgasta em nada, visto que é ele que precisa humilhar alguém para se sentir poderoso. Ok, acho que só por hoje controlarei meu ímpeto de xingá-lo e irei, tranquilamente, ceder.

— 25 homens parece bom para mim!

Mais um gole do chá morno, o qual ele nem se quer me ofertara.

— Então que seja. Os recrutarei e enviarei á você, amanhã pela manhã. Agora saía.

Com aquela fala cheia de simpatia, do miss simpatia da Seita, eu me ergui e lhe ofereci meus cumprimentos respeitosos, deixando o recinto logo em seguida.

Eu precisava de mais gente para a guarda dos portões, mas onde diabos eu ia conseguir mais? Fechei a porta, a deslizando atrás de mim, no exato instante que um grupo de magos passou pelos corredores, os acompanhei com um olhar, uma ideia surgindo na minha cabeça.

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