Capítulo 13: A Ordem Lírios ao Vento

Observamos atentamente aos três sobreviventes, que pareciam contemplativos e receosos, nenhum dos três pareciam querer continuar a narrativa. Seus rostos estavam cansados e acinzentados e transpareciam esgotamento. Suas capas marrons estavam amarelentas pela poeira da estrada. As vestimentas, compostas de casacas na cor vinho bordadas em prata, apresentavam desgaste e os punhos chamuscados e desfiando tirava todo a elegância restante das suas roupas. 

Somando toda a imagem, aquele trio era a expressão fiel da ruína e da exaustão.

Quando pensei que a sala continuaria imersa em silêncio, o elfo começou a falar:

— Sou Torden, servo-mago da Ordem Lírios ao Vento. E eu, com alguns poucos, que estão agora nos portões implorando asilo, somos os únicos sobreviventes do ataque ao Castelo. A Jade Obscura foi de algum modo ativada por forças desconhecidas, sua irradiação negra levou a crises psicóticas de muitos magos. A Arcana-Mestre Eloísa, percebeu o fato e resselou a pedra, o que funcionou. Contudo, não foi o bastante para impedir que a desgraça se abatesse sobre a Ordem. Havia um traidor entre nós, ele roubou a pedra e incendiou nossa morada. Nos salvamos por muito pouco, só mantivemos a nossa vida. O resto, roupas, livros,  tudo foi queimado.

Ele pausou, sua voz estava carregada de tristeza, limpou uma mancha de fuligem da bochecha ou limpava lágrimas? Um anel estranho de cor vermelha-alaranjada cintilou brevemente, suas mãos voltaram a descansar sobre suas pernas. Meu coração se apertou. Em seguida, o elfo deu uma leve tossida, seu corpo se curvou, engoliu com certo esforço e retornou a fala:

— Procuramos ajuda da Ordem das Rosas Negras, alguns magos se direcionaram para lá. Outros, como eu, preferiram vir até aqui e avisar ao segundo portador. — sua voz quebrou.

A quietude caiu pesada no ambiente, apertei os lábios e tentei entender o que estava acontecendo ali. Uma Jade Obscura foi roubada, mas o que é uma Jade Obscura? Tentei lembrar da palavra, porém cheguei atemorizante conclusão que tal joia não existia no livro "Dois mundos a Manter".

Ah, isso é ruim!

Cocei a nuca em temor e nervosismo, ergui a vista e para a minha surpresa, Torden me encarou, assim que fixei meu olhar nele, o elfo desviou a atenção com rapidez. No entanto, ele sempre voltou a me fitar e sempre desviou quando eu o observei. Era esquisito. Ué? Eu tô com alguma sujeira no rosto? Disfarçadamente, passei a mão por sobre a minha face. Porém, mesmo quando o fiz e nada encontrei, aqueles olhos dourados ainda retornavam para mim.

Por que ele está me olhando assim? Ele estava me julgando? Me desprezando por eu ser uma anomalia que não deveria existir? Um meio-elfo asqueroso?! Ah, filho da gaita! É isso que você está pensando, não é? Ok, eu não gosto de você nem um pouquinho. Antipatia passou por mim como um raio, cruzei os braços numa resposta imediata aos meus sentimentos crescentes.

Mesmo assim, o elfo continuou me observando, timidamente, aquilo me incomodou, eu já ia perguntar em voz alta se ele havia perdido algo na minha cara, quando Shizun Xian rompeu a quietude com sua voz possante:

— E a Arcana-Mestre, Eloísa Muriel?

Torden abaixou a vista, seu rosto se contorceu de pura dor e luto, seu corpo tremia. Sem erguer o rosto, disse:

— Ela está morta.

Houve um burburinho incessante, vozes se elevaram, choque e terror irrompeu a sala como uma explosão. Coisas como:

— Não pode ser!

— O elfo está mentindo!

— A palavra de um elfo é tão imunda e incerta como a sua própria moral! Ele mente.

Ok, aquilo foi longe demais, posso não ir com a cara daquele elfo, mas ninguém pode julgar as palavras alheias embasadas em puro preconceito.

— Dá para calarem a boca! — eu gritei, pouco me importando se seria considerado mal-educado ou sei-lá-o-quê. — Parem com esse julgamento desnecessário e irritante, elfo ou não, os fatos foram apresentados tal qual o são. Não é mesmo, magos?

Os dois acompanhantes ergueram os rostos manchados de fuligem.

— Sim, ele está falando a verdade. Eloísa nos salvou do fogo élfico, a todos nós... Mesmo com a sua vida sendo o preço a ser pago pelo feito.

Todos ficaram terrivelmente pálidos, eu abaixei a cabeça. 

Minha cabeça zunia com tristeza e indagações sem reposta. O nome da Arcana- Mestre me era desconhecido, a saga em nenhum momento a citava no enredo, por isso eu não sabia exatamente quem ela era, mas pela reação do Mestre da Seita e dos outros, obviamente, a morte dela era um péssimo sinal.

Quando o silêncio se estendeu, nenhum de nós quis o distanciar da sala. Olhos cruzaram-se, receios trocados na quietude, bocas duras e em linhas retas, rostos obscuros e pensativos, imersos em inúmeras circunstâncias e informações que eu não tinha.

Havia algo a mais, senti em meus ossos como um mau presságio.

— Toda a Ordem foi queimada pela ação de fogo élfico. Só bruxos podem invocar esse tipo de fogo. — virei-me e só então percebi a presença do médico, daquele a quem eu não sabia o nome, mas já me atendeu antes. Seus olhos passaram longe dos meus. — E há outra coisa a ser considerada: a loucura já chegou à nossa Seita.

Aquela frase trouxe algo em minha mente, que escorreu até os meus lábios.

Shizi Qian.

— Como sabe? — perguntou o médico.

— O peguei falando sozinho um dia desses, mas eu nunca achei que enlouquecia de fato, pensei que apenas conversava com seu ego ou sei lá. — dei de ombros.

— De qualquer forma, ele foi o primeiro caso, já estamos com 50 ao todo. De todas as idades. 11 anos, 15, 18, 30, 60. Essa loucura, seja o que for, não perdoa ninguém. — comentou o médico, com a sua cara de suíno com óculos, um pouco mais pálida que o normal.

— Mas por que está acontecendo? Nós temos uma Jade Obscura? — minha pergunta gerou uma calmaria nervosa. Arqueei as sobrancelhas. — Temos uma Jade Obscura!

— Não bem uma Jade, mas uma peça que se conecta a ela. — a fala saiu vagarosa da Líder Adjunto da Seita.

— E que peça seria essa? — indaguei atônito.

— É um segredo do pavilhão branco. — falou Shizun Xian.

— Segredo? Isso é alguma piada? — bati contra o tampo da mesa, punhos fechados, unhas adentrando a carne.

— Discípulo Shun, cuidado com suas palavras e ações! Não aja como um descontrolado na frente dos Magos! — ralhou comigo o Líder da montanha Azul. Céus, esse me detesta!

— O que eu disse? Eu só... — ia bater de novo na mesa, mas meu punho foi detido no ar por Irmão Yang, que me encarava como quem olha para uma criança malcriada.

— Apenas se cale. — sussurrou. Puxei minha mão de seu aperto e me calei. 

— De qualquer forma, foram chamados aqui, pois conto com vocês para protegerem a Seita. Decidimos que ambos não deixarão a montanha para 12ª Reunião das Seitas. Deixaremos a representatividade para Yue Ning e sua comitiva. — soltou a sentença, me surpreendi e ergui minha vista observando o Shizun Xian.

Com o coração aos pulos, tentei entender o que simbolizaria essa sentença... A história principal, escrita no livro, não ocorreria! Não haveria a disputa e nem a Reunião da Seita. Ambos os eventos impulsionaram a trama para o caminho em que Irmão Yang e Shun se separavam. O que isso queria dizer? Era para ficar feliz ou ainda mais preocupado com tal enredo que eu nem sabia para onde penderia?

— Ouçam as ordens e recebam as instruções, vocês a recebem? — a voz clara da Líder Adjunto, Chun Xiulan, me puxou de meus pensamentos profundos.

— Sim! — Eu e Yang, respondemos em uníssono.

— Discípulo Yang! — chamou o Líder da Seita.

Este se ergueu e postou-se de pé ao lado da cadeira. Costas eretas, rosto sério.

— Sim, Shizun Xian!

— Conduzirá um esquadrão de sua escolha para vigiar o pavilhão branco. — ditou o Mestre da Seita.

— Assim será feito!

— Discípulo Shun!

— Sim, Shizun Xian! — também me ergui do assento.

— Você treinará a guarda e vigiará os portões, nada deve entrar ou sair sem permissão. Nada.

— Escuto e obedeço. — respondi ao Shifu, nesse momento me senti muito importante e meu coração bateu com mais força e determinação.

— Vão! — Shizun Xian fez um sinal com as mãos, nos dispensando.

Relembrando:

Líder da Seita: O chefão, no caso é Mestre Xian (nome completo: Liu Xian, ele é o mestre de Shun e Yang).

Líder adjunto: vice-chefona da Seita, Mestre Chun (nome completo: Chun Xiulan, mestre de Yue).

Líder da montanha azul: só toma conta da montanha azul (nome completo: Cheng Bohai, detesta o Shun e pretende chutá-lo para fora da Seita).

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