CAPÍTULO TREZE
Naquele domingo, enquanto Andressa estava aproveitando sua folga, Balthazar admirava a movimentação e o burburinho alegre entre os familiares e os hóspedes da clínica. Sentiu saudades do filho que morava no exterior e vinha em datas específicas, como Natal ou aniversário. Sabia lá no fundo, que sua hora estava chegando. Não sentia medo de morrer, pois fazia parte da vida e nunca viu a morte como o fim e sim, como um novo começo.
Seus olhos percorreram o ambiente e se deparou com a mesma mocinha do aniversário da amiga Carlota. Ficou profundamente feliz em vê-la ali novamente e em seus lábios surgiu um sorriso franco. Seu maior desejo, era ter um neto, mas seu filho achava que atrapalharia sua carreira como advogado, mal sabendo ele da falta que um filho faz para os longos anos da vida.
Douglas, o enfermeiro que substituia Andressa, se aproximou, convidando-o para se juntar aos demais no salão, que ficava na parte oposta da clínica, onde era bem mais amplo e arejado.
— Seu Balthazar? O senhor não deseja ir com os outros para o salão de recreação? Terá uma tarde com danças de casais.
Sorria, gentil, esperando uma resposta positiva do senhor ainda indeciso se aceitava ou continuava ali, acompanhado apenas de suas lembranças e saudades.
— Não sei, meu jovem... Não sou um bom dançarino! — Riu. — Na verdade, sou péssimo! Praticamente dois pés esquerdos. Vou acabar machucando uma amiga!
— Pois o senhor não precisa dançar, se não quiser. Venha comigo e vamos apreciar os casais! Há sucos geladinhos e aqueles bolinhos de mel que só a Flora sabe fazer. — Piscou.
— Quem resiste aos bolinhos de mel dela? — Levantou-se com certa dificuldade.
O rapaz olhou, surpreso. Nunca o tinha visto tão frágil. Pensou ser os sintomas do Parkinson, mesmo assim iria contactar o médico de plantão, se acaso não houvesse uma melhora após a medicação. Estendeu a mão para auxiliá-lo a se levantar e o acompanhou até o salão.
— Se o senhor se sentir cansado, avise-me, sim? Posso pedir que o doutor o examine.
— Não há necessidade, meu bom rapaz. É só boas recordações que me emocionaram. Na minha idade, qualquer emoção já se manifesta com mais intensidade!
O rapaz apenas sorriu, guiando-o gentilmente pelo braço.
Ao chegarem perto, já podiam ouvir a melodia suave vindo do salão. Douglas olhou para ele, sorrindo. Desejava que o idoso se divertisse um pouco, já que sempre o via sozinho em dias de visita. Queria trazer um pouco de alegria no coração do bom homem.
Acompanhou Balthazar até uma das mesas onde estava seus amigos Jeremias, Carlota e a neta, conversando animados sobre as músicas e os casais no salão.
— Com licença, pessoal! Olha quem veio se juntar a vocês?
— Douglas! Você conseguiu trazê-lo! Que maravilha! — Carlota batia palmas.
— Confesso que não foi uma tarefa fácil! Querem que eu traga algo para beber e comer? — Sorriu.
— Pode nos trazer uma rodada de martinis, Douglas!
— Não vai rolar, seu Jeremias! Infelizmente não temos na copa.
— Então pode ser água gelada com rodelas de limão e mais alguns sanduíches, não é mesmo, Carlota? — Disse, olhando para a garota que ria, descontraída.
— Bom! Isto sei que tem e já trago uma rodada para todos e um refrigerante para a dama.
Passaram-se algumas horas e Balthazar conversava alegremente com os amigos, quando de repente a jovem o alcança um copo de suco gelado e ele, surpreso, agradece, dando um gole e por algum motivo, aquilo fez com que se lembrasse da amiga Lili. Sorriu de volta, se descontraindo com os amigos e com a mocinha muito educada.
— Dona Carlota, a senhora deve estar imensamente feliz em ter sua neta, tão bondosa, neste domingo.
— E estou mesmo, Balthazar! Adivinhasse!
— Foi ela que teve a ideia do baile, Balthazar!
Ele a olhou, que correspondeu com um largo sorriso.
— Sua ideia foi de fato maravilhosa, pequena. Eu fui tão grosseiro aquele dia! Não perguntei seu nome.
— Me chamo Maribel. — Sorriu. — Que bom que o senhor tenha gostado!
A jovem sorria, embalada pelas notas alegres da canção que iniciava. Era o seu primeiro ano visitando a avó e pretendia trazer sempre novidades para os hóspedes. Para ele, ter uma alma iluminada como a dela, trazia alto astral e alegria para a clínica.
— E o senhor não recebe visitas, seu Balthazar?
— Meu filho mora muito longe. Mas quem tem amigos como a sua avó, por exemplo, nunca está sozinho ou entediado. — Riu, dando mais um gole no suco.
Estava se sentindo feliz, como há muito não se sentia. Desde o dia em que revelou a senhorita Andressa, a solidão já não o incomodava mais.
A menina sorria emocionada ao ouvir aquelas palavras e espontaneamente o convidou para dançar, já que era um dos poucos que não havia se arriscado no salão.
— O senhor quer dançar comigo, seu Balthazar?
Ele, meio sem jeito e empolgado pelos demais, acabou aceitando. Naquele instante, lembrou-se de Lili. Flashes do passado o invadiram, como os passos suaves no piso encerado e da forma como ela o olhava e sorria.
Foram para a pista, ao som da música alegre, sendo guiado pelas mãos da menina, que com passos lentos, o conduzia entre os outros dançarinos. Balthazar, como que por um passe de mágica, se viu na sala de casa, rodopiando com a gentil Lili. Quando a música terminou, fez uma reverência respeitosa, agradecendo, sendo imitado por ela, que ria descontraída. Voltaram à mesa, onde os outros aplaudiram a dupla, deixando-o encabulado.
— Grato por este momento único, minha pequena Maribel. Foi maravilhoso!
— Eu é que agradeço, seu Balthazar.
Sentaram-se, bebendo água e aproveitando os salgadinhos servidos pelos enfermeiros. Passados alguns minutos, foi a vez de Jeremias dançar com a menina, que o incentivava, empolgada com a música.
— Não se nega a dançar com uma dama, não é?
— Não faria esta desfeita! Sou um pé de valsa, diga-se de passagem! — Ria, sendo acompanhado pela garota.
— Sua neta é uma menina muito querida, Carlota.
— Ela é a minha felicidade, Balthazar. Não sei o que seria da minha vida sem a presença dela.
— Que ela cresça sem perder sua essência, minha amiga Carlota. Que encontre um grande amor que a trate com respeito como ela merece.
— Sábias palavras, meu amigo. Eu sempre digo a ela para aproveitar a vida e tratar a todos como ela gostaria de ser tratada, porque nada se repete como antes e tudo pode desaparecer em um piscar de olhos, tornando-se apenas uma lembrança.
— E às vezes é só o que nos resta no fim das contas, não? Lembranças.
Ela assentiu, olhando para a neta, se divertindo.
Algum tempo depois, despediu-se de Carlota, Jeremias e a menina Maribel. Pediu para Douglas acompanhá-lo até seu dormitório e se despediu do rapaz.
Já deitado, sob a luz do abajur, começou a se lembrar do dia em que voltou da escola esperançoso de que Lili tivesse voltado, correu pela casa, a procurando pelos cômodos, pelo quintal, em seu quarto. Sentou-se um pouco e lembrando que ele mesmo a criou, poderia trazê-la de volta, mas em vão. Nada havia acontecido.
Foi então que pensou em procurá-la onde a imaginou pela primeira vez, saindo correndo pela rua, indo até a residência da tia, que ficava em um bairro distante do seu, mas mesmo assim, não titubeou. Foi correndo em direção ao local, sentindo a garganta arder e as lágrimas escorrerem pelo rosto.
Quando voltou para casa, tarde da noite, todo o corpo ardia em febre. Se sentia totalmente fragilizado e uma tristeza invadiu sua alma. Encontrou os pais desesperados, que até o momento, estavam à procura dele, sem saber onde estava. Se aproximou da mãe, chorando, sendo abraçado pelos pais, que faziam tantas perguntas, que mal o deixava conseguir pensar. Sua mãe sentiu o quão frágil seu filho se encontrava, oferecendo seu colo. No aconchego da mãe, obteve o conforto que tanto precisava, adormecendo em seguida. No dia seguinte, foi acometido de uma febre, colocando-o de cama por dois dias e deixando a mãe aflita, sem saber o que estaria acontecendo. Mesmo quando ela lhe perguntou o que estava acontecendo, ele não soube dizer naquela época.
— Você jamais entenderia, mamãe... — Murmurou.
E mais uma vez lá estava ele chorando de soluçar até adormecer, como da primeira vez em que ela partiu...
(1393 palavras)
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