CAPÍTULO DOZE
No instante que as duas mulheres se despediram dele, Olavo ficou pensativo. E se tudo aquilo que ouviu das duas fosse de fato algo espiritual? Ele sempre foi muito cético com tudo que envolvia o sobrenatural. Para ele, advogado e ateu, só a ciência poderia ser explicada. Mas, aquela conversa mexeu com ele, de alguma forma.
— Você está muito impressionado, Olavo! Leve as moças até onde elas quiserem e fim de conversa!
Lavou os copos usados, secou e começou a encaixotar o restante das louças. Subiu em direção ao sótão e começou a descer as caixas, com certa dificuldade. Não eram muitas, mas carregadas de coisas antigas da família e ele teria que separar o que teria algum valor sentimental, como álbuns de fotografia ou objetos de valor.
— Pronto! Esta é a última! Vamos ver o que elas escondem.
Abriu uma delas e começou a retirar alguns álbuns com capa de couro e o nome da família em dourado. Uma toalha de mesa, ricamente bordada em cruz, muito bem conservada e uma boneca de porcelana. Guardou tudo, desanimado.
— Nenhuma caixa de joias? — Riu.
Pegou uma segunda, abrindo e recebendo um punhado de pó, fazendo com que espirrasse em seguida. Tirou de lá uma caixa menor com vários animais feitos de cristal, todos embalados em seda e preso em barbante. Olhou para dentro da caixa e retirou um embrulho pequeno, desembrulhando com cuidado e descobrindo ser uma caixinha de música, com as iniciais L.B.A. Dentro, algumas joias delicadas.
Foi colocando tudo no sofá, com cuidado e, ao olhar o fundo da caixa, havia um embrulho maior e ornamentado com flores secas de alfazema e fitinhas mimosas que um dia fora rosa. Tirou a caixa para o lado, colocando o embrulho em seu colo, soltando o lacinho delicadamente e assim que terminou de desembrulhar, surgiu um lindo vestido azul rendado, com pequeninas flores bordadas. Junto com ele, um laço de fita de cetim e um cartão, já desbotado pelo tempo:
"De nossa amada Liandra. Eternamente, nossa borboleta."
— Óh, minha nossa! Era verdade...
Ele olhava para o vestido, compreendendo naquele instante, que existem muitos mistérios que jamais iremos entender. Convencido, ele decide revelar para as duas o que acabara de descobrir. Envolveu o vestido e a fita de volta no embrulho, com cuidado para não danificar e se levantou.
Pegou uma caixa menor, colocando o embrulho dentro e reservou sobre o aparador.
— Amanhã mesmo, irei mostrar a elas o que encontrei. Sei que saberão exatamente o que fazer. — Sorriu, satisfeito com a decisão.
Na manhã do dia seguinte, Olavo foi direto ao hotel onde elas estavam hospedadas. Estacionou logo adiante, indo em seguida até a recepção, pedindo que chamassem por elas. Sentou-se em uma das poltronas na sala de estar. Não demorou muito, Andressa surgiu, com sua mochila e um sorriso largo, feliz em vê-lo tão cedo.
— Bom dia, Olavo! Eleonor já está vindo. Dormiu bem?
— Fui dormir tarde ontem, já que tive de organizar o restante dos móveis, logo terei de retornar à São Paulo. Mas antes, cumprirei com minha parte.
Não demorou muito, Eleonor surgiu com sua bagagem, iluminando o ambiente com sua presença.
— Bom dia! Eu vou colocar nossas bagagens no carro e vocês já podem ir se acomodando que logo estarei lá, sim?
Os dois concordaram, indo em direção ao carro dele.
Não demorou muito os três já estavam indo em direção a zona rural, onde ficava o cemitério antigo da localidade. Olavo puxou assunto, para quebrar aquele silêncio entre eles.
— Então, Andressa. Me fale um pouco deste senhor que imaginou ou viu a minha bisavó falecida?
— Ah... O senhor Balthazar... — Ela sorriu. — Ele é um cavalheiro! É um dos poucos homens que ainda possui uma gentileza impecável! Eu cuido dele já algum tempo, na clínica geriátrica onde trabalho como cuidadora. Sou enfermeira há cinco anos, já.
— E aquela história que ele te contou? Posso saber em mais detalhes?
— Então! Ele tinha uns dez ou doze anos mais ou menos e foi em uma festa acompanhado da mãe e se afastou, indo até uns balanços e ela estava lá, fazendo amizade com ele, como qualquer criança...
Andressa começou a contar em detalhes, tudo que ouviu de seu Balthazar, enquanto ele manobrava o carro, por uma ladeira íngreme.
—... até que ele descobriu que sua amiguinha imaginária não fazia parte da sua imaginação fértil e sim uma menina que veio a falecer anos antes. Ou muitos anos? Não sei ao certo!
Olavo a encarava muito sério, agora. Estava ouvindo tudo, mas com atenção voltada na estrada, também.
— Estou muito inclinado a acreditar em tudo que estás me dizendo.
— Obrigada.
— E o que ainda falta, Olavo? — Perguntou Elle.
— Você é sempre assim, impulsiva?
— O pouco que eu a conheço, sim. Ela é! Riu.
Olavo continuou até chegar em uma estrada secundária, de terra batida. O sol àquela hora da manhã estava tímido, escondido entre nuvens. Andressa aproveitou para admirar a paisagem, mostrando para a outra, os raios do sol, penetrando entre os pinheiros. Eleonor olhou na direção do céu e viu um bando de pássaros indo para o norte.
— Um bom presságio. — Apontando, para que Andressa também observasse os pássaros.
Ambas sorriram.
Levaram uns trinta minutos, pra chegar numa elevação do terreno, onde havia um portão de ferro enferrujado, onde se podia ler Cemitério São João Batista.
— É este o lugar?
— Exato! Há um mausoléu da família, aqui.
Olavo foi dirigindo pela estradinha estreita e estacionou onde era destinado para os veículos. Desligou o carro e se virou para elas.
— Então, meninas? Vamos lá?
Desceram os três juntos, entrando e indo em direção ao mausoléu, através de túmulos, onde estátuas de anjos, cruzes e santos completavam o ambiente do sepulcrário.
Assim que chegaram, Andressa pôde ver que era de família tradicional. O mausoléu estava impecavelmente conservado, com uma porta dupla em vitral e bronze.
— Chegamos. É aqui.
Olavo pegou uma pequena chave do bolso, encaixando-a na pequena entrada, abrindo as portas de vidro colorido.
Deu espaço para elas entrarem na frente e foi logo atrás.
— Ela está ali. — Apontou para um retângulo na parede, todo em mármore, com letras em prata.
— Não, Olavo. Ela não está mais nesta dimensão. — Eleonor olhou para ele.
Na parte gravada, havia a imagem de uma boneca antiga em relevo, juntamente com o nome dela e as datas de nascimento e falecimento. Ao lado, lindos buquês de lírios brancos em vasos e castiçais de prata, completavam o ambiente.
Andressa se aproximou, alisando a foto de uma jovem de cabelos cacheados e olhos expressivos. Sentiu-se completamente emocionada.
— Oi, Lili? Eu sei que você não me conhece. Eu soube da sua história e de como conheceu o seu Balthazar. Parece loucura falar com alguém que já partiu há tanto tempo, mas eu precisava saber se você era mesmo a garota que fez o gentil Balthazar se apaixonar. Sim, o seu Balt, o cara de sapo não entendia como poderia estar apaixonado por alguém que já não existia e, sei agora que existem amores que vão além da compreensão humana e que nem tudo pode se explicar com a razão. Bom! Era isto. Desejo que estejas em paz, onde quer que esteja, Lili. Saiba que ele também ama você. Adeus.
— Vamos fazer uma breve oração, para que, onde quer que ela esteja, receba nosso carinho?
Os dois assentiram, baixando os olhares e ficando alguns minutos em silêncio.
Andressa secou as lágrimas, sendo abraçada pela amiga, dando meia volta e saindo do mausoléu. Olavo ficou o tempo todo calado, olhando a cena. Assim que elas saíram, ele se aproximou, trancando novamente as portas de vitral e acompanhando ambas até o carro.
Os três fizeram o caminho inverso, em silêncio, cada um com seus pensamentos pessoais.
Fizeram o resto da viagem em silêncio, até que Andressa resolveu iniciar a conversa:
— Agradeço imensamente, tudo que fez por nós, Olavo.
— Não precisam me agradecer. Foi de coração. — Baixou os olhos, tentando entender aquela emoção que o invadia.
— Você é um bom homem, Olavo.
Não demorou muito já estavam em frente ao hotel. Olavo olhou para elas, sorrindo.
— Antes que vocês vão embora, quero dar algo para o senhor Balthazar.
Dizendo isto, desceu, indo até o porta malas e voltando com um pacote bem embrulhado. Sentou-se novamente na direção e se virou para Andressa.
— Eu achei isto, no sótão e pertencia a minha bisavó. Sei que ela adoraria saber que foi entregue para a pessoa certa.
— E o que é? — Indagou, pegando o pacote.
— Você saberá. — Sorriu.
— Vocês ainda têm tempo para mais alguma coisa na cidade?
Elas se entreolharam, confusas.
— Não. Acho que não. Temos Elle?
A outra só encolheu os ombros, sem saber o que dizer.
— Então, visitem as vinícolas da região. É um lindo ponto turístico, com degustação e a paisagem é deslumbrante e muito romântica.
Elas riram, encabuladas.
— Com certeza, iremos, sim! Obrigada, Olavo!
— Disponha, Andressa. E se um dia inventarem de ir à São Paulo, para mais alguma aventura como essa, ou se precisar de um advogado, me liguem.
Ela riu, pegando o cartão de visitas do homem. Desceram, se despedindo dele, que saiu, dirigindo pelo mesmo caminho que elas fizeram, logo que chegaram na cidade.
— E então? Vamos neste lugar?
— Eu vou adorar!
Pegaram todas as informações necessárias e dirigiram até lá, felizes. Os olhares que trocavam, eram cúmplices do mesmo sentimento.
No momento em que chegaram, ficaram deslumbradas com a beleza natural. O ponto turístico era uma vinícola muito tradicional, onde os visitantes podiam passear por entre as videiras, degustar vinhos ou comprar produtos feitos da fruta, na lojinha local.
Elas andavam de mãos dadas, encantadas com a beleza, se deixando se deslumbrar e se divertindo juntas. As duas foram sendo orientadas pelo guia, que gentilmente mostrava a história da cidade e dos primeiros produtores de vinhos, até que, um dado momento ficaram sozinhas em meio às vastas parreiras de uva.
— Acho que ficou só nós duas, aqui. — Riu.
— Pois é... Andressa?
— Fala. — Sorriu.
— Você sabia que uvas são o símbolo maior da doutrina espírita?
— Não sabia. Quer me contar?
Enquanto Eleonor ia explicando, Andressa a olhava apaixonada.
Sentaram-se em um espaço com grama, bem juntas.
— Que lindo... — O olhar dela, era doce e apaixonado.
A morena percebeu, baixando a cabeça, tímida e mordendo os lábios. Sentia a mesma coisa por ela, desde a primeira vez que a viu.
— Você tem um sorriso lindo, Dessa... — Alisando o rosto da outra, delicadamente.
Andressa sorriu, inclinando na direção dos lábios de Eleonor, deixando-se envolver pela emoção.
E assim, beijaram-se pela primeira vez... O amor aconteceu, maravilhosamente...
(1765 palavras)
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