Capítulo 1.1
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Vilarejo de Denária
A nova hóspede chegou com sua simplicidade e carisma que até então achei ser impossível vindos daqueles que a trouxeram. Não compactuava e me mantinha longe de todos que moravam na Normandy e foi uma surpresa quando fui obrigado a abrir minhas portas para o herdeiro ao trono.
Para minha surpresa, o Príncipe Philip não era em nada semelhante ao pai e isso foi como um alívio, já que o Rei Baltazar não é o tipo de homem que se pode confiar quando seus olhos são vendados para o que os levaram até ali. E mesmo que eu quisesse negar seu pedido, não podia, não quando devo um favor a um Hendeston e pagar dessa forma acabou por ser melhor do que um dia cogitei que seria.
Mesmo após tantos anos desde o incidente que nos levou a abandonar a cidade e a renunciar ao posto de cavaleiro — fugindo do passado e buscando reconstruir um futuro numa vila isolada —, sempre tive a convicção de que um dia seria forçado a romper com a confiança do reino em que servi para quitar uma dívida com o Hendeston. E estava ciente disso quando os vi se aproximando. Apesar de não conhecer nenhum dos três cavaleiros, sabia que eles não eram dessas bandas. Não quando a postura deles era invejável e a maneira como agiam dava para perceber o quanto o mais velho era bem treinado. O que eu não conseguia compreender era como eles me encontraram naquelas terras, o que também não me atrevi a questionar. Aceitei o trato e o cumprirei com prazer, removendo assim o fardo que me pesava desde aquela manhã ensolarada.
Thalkon Hendeston o filho adotivo do Rei Caesar sempre foi um homem honrado, sábio e acima de tudo, leal. Leal ao seu rei e não ao meu, não depois do que Baltazar havia feito no passado e desunido os dois reinos, os tornando inimigos declarados.
Embora conhecesse profundamente a história, pouco me importava com ela, ambos haviam cometido seus erros e cada um pagou por suas injustiças e tiveram suas perdas semelhante ao tamanho de seu pecado. A vida tende a cobrar caro quando transgride as leis divinas, principalmente ao brincar com o oculto, o que foi exatamente o que ambos fizeram ao tentar se vingar um do outro.
Talvez a garota fosse uma bênção, ela era meiga e minhas filhas a adoravam. Vê-las correr pelo campo em uma brincadeira enchia meu coração cansado de alegria. Aurora parecia gostar de crianças e todos ali se apegaram a ela com facilidade, e não davam trabalho a seus familiares, já que a mesma gentilmente pegou a responsabilidade de cuidar dos pequenos o dia todo, os devolvendo para suas casas só no cair da noite. Sinceramente não tinha ideia de como ela aguentava tanto barulho, mas, se todos estavam felizes, eu também estava.
Denária sempre foi um lugar calmo e vivíamos do trabalho no campo, plantamos e colhemos para nosso sustento e alguns levavam os suprimentos para vender no porto ou até na cidade. Entretanto, aquilo era só uma maneira de cooperar com o comércio de materiais que não conseguimos produzir em nossas terras. Tudo organizado e ganhado com o suor das famílias daquele vilarejo.
Apoiado sobre o cabo da enxada observava as risadas infantis que vinham do campo coberto por flores coloridas, as crianças corriam da garota vendada a qual conseguia adivinhar facilmente o lugar onde os baixinhos estavam. Ela é boa na brincadeira que te deixa cego para os acontecimentos a sua volta.
— Aurora, Aurora — uma das meninas grita entre as risadas quando é pega por trás e levantada para o alto, girando ambas até caírem sobre o campo florido. Outras crianças rapidamente correm e pulam em cima da garota que tentava inutilmente se levantar e não obtinha sucesso em meio ao mar de braços e pernas minúsculas que insistiam em abraçá-la e imobilizá-la ao chão.
— Como ela aguenta aquilo? — Prior pergunta observando a brincadeira.
— Juro que não sei. Eles estão se divertindo e isso é o que realmente importa — respondo voltando a capinar a pequena lavoura que crescia verdinha.
— E quando vai comunicar sua chegada ao vilarejo para o...
Olho diretamente para o homem que vestia uma roupa que mais parecia ser feita de sacos em um corte de bata longa e amarrada na cintura com um cinto do que panos.
— Desculpa — ele levanta as mãos em rendimento, as mangas longas chacoalharem pelo tamanho sobressalente. — O assunto não é da minha conta e você sabe o que está fazendo.
— Ainda bem que sabe que o assunto não lhe diz respeito. A jovem vai ficar, até que o príncipe volte para buscá-la.
— E se não voltar? — Ele insiste dirigindo sua atenção às crianças que brincavam alegremente, os cabelos longos e brancos, deixando nítido que logo o mesmo deverá descansar do trabalho árduo e os deixar para os mais jovens.
— Aí faremos desse lugar o lar dela — Margareth responde ao se aproximar com um sorriso encantador em sua face delicada em contraste com os cabelos castanhos escuros presos em um coque que lhe davam um destaque nos olhos azuis que mais pareciam cinzas a luz solar. O vestido simples combinava com sua personalidade tranquila e sem os traços de sua antiga vida luxuosa. Ela segurava em suas mãos uma jarra, onde despeja o líquido fresco em uma caneca e me entrega, fazendo o mesmo para Prior que a pega sem encarar a mulher a nossa frente. — A refeição já está pronta, vá se lavar enquanto vou chamar as crianças — diz se dirigindo a mim.
— Sim, senhora —– respondi curvando o corpo para terminar aquele pedaço que faltava.
— Você também, Prior, fiz comida suficiente para mais pessoas. Ganther! — Margareth me chama e quando volto a olhá-la sua atual felicidade tinha se perdido em uma fisionomia carrancuda.
— Já vou, irei só terminar esse pedacinho.
— Eu disse, agora — ela responde endireitando o corpo e saindo em passadas elegantes.
— É melhor ir, eu termino aqui e já te sigo. — Prior sugere e abre um sorriso em seguida. — Mulher brava é pior que fêmea com cria, vá antes que ela resolva puxar sua orelha.
— Muito obrigado! — falo me afastando.
Margareth tem várias qualidades admiráveis, só que minha esposa se irrita facilmente quando nos atrasamos para as refeições e sei que é mais fácil lutar com um javali durante uma caçada do que enfrentar a mulher que escolhi para viver ao meu lado até o fim de nossas vidas.
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