Capítulo 6
– Espera aí, quer dizer que essa música não tem a ver com o cachorro dele estar morrendo ou algo assim?
– Você não é engraçado. – eu ri.
– Sou, sim. – Rafe riu silenciosamente na outra ponta do sofá enquanto Tim McGraw bradava sobre seu tipo preferido de chuva na TV de tela plana que tomava conta da parede oposta.
– Por que todos eles usam chapéus tão grandes, hein? Eu tenho uma teoria... – Quieto. O modo como aquelas pessoas viviam me atordoava. Rafe, apelido de Rafael, morava numa casa na praia que era basicamente três andares de estrutura de vidro e metal. Era incrível. Não era suntuosamente enorme como a mansão nas colinas, mas inspiradora mesmo assim. Meu pai teria ficado extasiado com seu minimalismo, pela simplicidade das linhas e tal. Eu só apreciava o fato de ter um amigo numa hora de necessidade. A casa de Rafe era obviamente um covil-barra-toca da perversidade de um solteiro. Tive a vaga intenção de preparar o almoço como agradecimento por ele me receber, mas não havia nenhuma migalha de comida na casa. Cerveja enchia a geladeira, e vodca, o freezer. Ah, não, também havia um saco de laranjas usadas como cunhas para acompanhar as doses de vodca, ao que tudo levava a crer. Ele me proibiu de tocar nelas. No entanto, sua cafeteira de última geração balanceou as coisas. Ele também tinha decentes grãos de café. Deixei-o de queixo caído com alguns dos meus movimentos de barista. Depois de tomar três xícaras de café em apenas uma hora, voltei a me sentir mais como a velha garota cafeinada e comum de sempre. Rafe pediu pizza e ficamos assistindo TV até altas horas. Na maior parte do tempo, ele se divertiu caçoando das minhas preferências em basicamente tudo: filmes, música e assim por diante. Pelo menos ele fez isso de maneira benevolente. Não pudemos ir à praia porque havia alguns fotógrafos à espreita. Me senti meio culpada, mas ele fez pouco caso.
– E que tal esta música? – perguntou ele – Gosta dela? Miranda Lambert apareceu na tela com um vestido estilo anos 1950 bem legal, e eu sorri.
– Miranda é demais.
– Eu a conheci.
Eu me endireitei no sofá.
– Sério?
Mais risadas da parte de Mal.
– Você se impressionou por eu ter conhecido Miranda Lambert, mas nem sabia quem eu era. Caramba, garota, assim você destrói o meu ego.
– Eu vi os discos de ouro e de platina no corredor, meu chapa. Acho que você aguenta. Ele bufou. – Sabe, você me lembra meu irmão. – Eu quase consegui me desviar da tampinha de garrafa que ele jogou em mim. Ela quicou na minha testa.
– Ei, por que isso?
– Não pode, pelo menos, fingir que me idolatra?
– Não. Lamento.
Com completo desrespeito pelo meu amor a Lambert, Rafe começou a zapear pelos canais. Compras, futebol, E o vento levou... e eu. Eu na TV.
– Espera... – disse eu. Ele gemeu.
– Não é uma boa ideia.
Primeiro, fotos da escola, seguidas de uma minha com Sarah no baile de formatura. Eles até tinham um repórter do outro lado da rua da loja da Ruby, discorrendo sobre minha vida antes de ela ser elevada ao status sagrado de esposa de JJ. E depois o próprio homem, numa filmagem de algum concerto, guitarra na mão enquanto cantava no vocal de apoio. A letra era a típica minha garota é má: "Ela é a garota da minha vida, me faz cair de joelhos...". Fiquei pensando se ele escreveria canções a meu respeito. Se escrevesse, eram grandes as chances de não serem nem um pouco elogiosas.
– Caramba. – Abracei uma almofada do sofá bem apertada contra o peito. Rafe se inclinou e afofou meu cabelo.
– JJ é o predileto, querida. Ele é bonito, toca guitarra e escreve as canções. As garotas desmaiam quando ele passa. Junte isso ao fato de você ser uma criança e, pronto, temos a notícia da semana.
– Tenho vinte e um.
– E ele vinte e seis. A diferença é grande o bastante se eles derem a notícia do jeito certo. – Rafe suspirou – Veja bem, noiva criança, você se casou em Vegas diante de um ator fantasiado de Elvis com um dos filhos prediletos do rock. Isso só podia provocar uma tempestade. Além disso, muita coisa vinha acontecendo com a banda... Jimmy festejando como se fosse 1999 e JJ sem inspiração para compor. Bem, você entende... Mas, na semana que vem, outra pessoa vai aprontar alguma e a atenção vai se desviar.
– Acho que sim.
– E eu sei disso. As pessoas estão sempre se metendo em confusão. Isso é magnífico. – Ele se recostou com as mãos atrás da cabeça. – Vamos lá, dê um sorriso para o bom e velho tio Rafe. Eu sei que você quer. Sorri forçadamente. – Esse é um sorriso de merda e estou com vergonha de você. Não vai enganar ninguém com isso aí. Tente novamente. Tentei com mais vontade, sorrindo até as bochechas doerem. – Puxa, agora só parece que você está sofrendo.
Batidas na porta interromperam a nossa diversão. Rafe ergueu uma sobrancelha na minha direção.
– Fiquei me perguntando quanto tempo ele levaria.
– O que foi?
– Segui-o até a porta da entrada, escondendo-me atrás de uma divisória, para o caso de ser a imprensa. Ele abriu a porta e JJ avançou, com o rosto contraído e furioso.
– Seu merdinha. É melhor não ter tocado nela. Onde ela está?
– A noiva criança está ocupada no momento.
Rafe inclinou a cabeça, enfrentando JJ com um olhar tranquilo.
– Mas que porra te interessa?
– Nem comece. Onde ela está? Lentamente, Rafe fechou a porta, sem olhar para o amigo. Hesitei, ficando parada. Ok, eu me escondi covardemente. Tanto faz. Rafe cruzou os braços.
– Você deixou que ela enfrentasse sozinha Adrian e três advogados. Você, meu amigo, sem dúvida é o merdinha deste cenário em especial.
– Eu não sabia que Adrian iria para cima dela com tudo isso.
– Você não queria saber – replicou Rafe – Minta para quem quiser, J, mas não para mim. E, por certo, não para si mesmo.
– Nem vem.
– Você está precisando de alguns conselhos, amigo.
– E quem é você, Oprah? Tossindo alto, Rafe se deixou cair contra uma parede.
– Ah, é, isso mesmo. Fique por perto que logo começo a distribuir carros.
– O que ela disse?
– A Oprah? JJ só o encarou feio. Ele sequer percebeu que eu espiava. Era triste admitir, mas mesmo zangado, JJ era de uma rara beleza. Ele provocava coisas em mim. Coisas complicadas. Meu coração saltava no peito. A raiva e a emoção na voz dele não podiam ser preocupação comigo. Isso não fazia sentido, não depois da noite anterior e desta manhã. Eu devia estar projetando isso e era uma droga eu querer que ele se importasse. Minha cabeça estava confusa. Afastar-me desse cara era a opção mais segura de todas.
– J, ela estava tão brava que tentou bater em mim.
– Até parece.
– Não estou inventando. Ela estava quase chorando quando a encontrei – disse Rafe. Bati a testa na parede numa agonia silenciosa. Por que diabos Rafe teve que contar aquilo? Meu marido deixou a cabeça pender.
– Não tive essa intenção.
– Ao que parece, você não teve intenção de muitas coisas. – Rafe balançou a cabeça e estalou a língua num som de decepção. – Cara, você ao menos quis se casar com ela? De verdade? O rosto de JJ se crispou, a testa voltando a personificar a de James Dean.
– Eu nem sei mais, ok? Droga. Fui para Vegas porque estava cansado de toda esta merda e a conheci. Ela era diferente. Pareceu diferente naquela noite. Eu só... queria algo fora de toda esta idiotice, para variar.
– Pobre Jzinho. Ser uma estrela do rock perdeu a graça?
– Onde ela está?
– Sinto o seu sofrimento, cara. Sinto mesmo. Quero dizer, você só queria uma garota que não ficasse te bajulando, para variar, e agora está bravo com ela por esse mesmo motivo. É bem complicado, não é?
– Vai se foder. Para com isso, Rafe. Já está feito. – Meu marido exalou fundo. – Não importa, foi ela quem quis o maldito divórcio. Por que você não está passando um sermão nela, hein? Com um suspiro dramático, Rafe abriu os braços.
– Porque ela está muito ocupada se escondendo ali atrás, ouvindo tudo. Não posso atrapalhá-la no momento. O corpo de JJ ficou imóvel e seus olhos azuis me descobriram.
– Kiara.
Puxa. Apanhada em flagrante.
Saí de trás da parede e tentei fazer cara de alegre. Não deu certo.
– Oi.
– Ela diz isso tão bem... – Rafe se virou para mim e piscou. – Então, é verdade que você pediu o divórcio ao Todo-Poderoso JJ?
– Ela vomitou em mim quando contei que tínhamos nos casado. – meu marido relatou.
– O quê? – Rafe disparou a rir, as lágrimas escorrendo pelo rosto. – Tá falando sério? Puta que o pariu, isso é fantástico! Ah, cara, como eu queria ter estado lá.
Lancei em JJ o que eu esperava que fosse o olhar mais malvado de todos os tempos. Ele me encarou de volta, imperturbável.
– Foi no chão – esclareci – Não vomitei nele.
– Naquela hora – disse JJ.
– Por favor, continuem – pediu Rafe, gargalhando ainda mais – Isto está ficando cada vez melhor.
JJ não continuou. Graças a Deus.
– Sério, eu amo a sua mulher, cara. Ela é demais. Posso ficar com ela? O olhar que Rafe me lançou revelava uma afeição muito mais relutante. Com aquela ruga entre as sobrancelhas, mais se parecia com irritação absoluta. Soprei um beijo na direção dele. Ele desviou o olhar, os punhos cerrados como se estivesse se controlando para não me esganar. O sentimento era totalmente mútuo.
Ah, a felicidade conjugal...
– Vocês dois são demais. – O som de uma campainha tocou dentro do bolso de Rafe, que pegou o celular. O que quer que ele tivesse visto na tela o fez parar de rir de imediato.
– Sabe, J, acho que você deveria levá-la para a sua casa.
– Não acho que seja uma boa ideia. – A boca de JJ se estendeu numa expressão de dor profunda. Eu também não pensava que fosse uma boa ideia. Eu ficaria muito contente em nunca mais colocar os pés na casa dos horrores. Talvez, se eu pedisse a Mal com muito jeitinho, ele pegaria as minhas coisas para mim. Impor a minha presença por mais tempo não me parecia certo, mas eu não tinha muitas opções.
– Uau. – Com o rosto sério, Rafe empurrou o celular para JJ.
– Droga – murmurou JJ, apertando a nuca com a mão. O olhar preocupado que me lançou sob as sobrancelhas escuras fez todos os alarmes do meu cérebro tocarem. O que quer que houvesse naquela tela, era algo ruim.
Muito ruim.
– O que foi? – perguntei.
– Ah, hum... Você não tem que se preocupar. – Seu olhar recaiu no celular mais uma vez antes de devolvê-lo a Rafe.
– Acho que, na verdade, vai ser bom levá-la para casa. Vamos fazer isso. Legal. Tudo bem.
– Não. – Para JJ ficar tão legal comigo tinha que ser alguma coisa muito ruim mesmo. Estiquei a mão, remexendo os dedos, de impaciência ou nervosismo, ou ambos.
– Quero ver.
Depois de um aceno relutante da parte de JJ, Rafe me passou o aparelho. Não havia dúvidas do que se tratava, mesmo na tela pequena. Havia muita pele em razão de eu estar nua da cintura para baixo. Meu traseiro pelado estava bem no meio com toda a sua gloriosa palidez. Deus, ele parecia imenso. Será que usaram uma lente ampla ou algo assim? O vestido estava erguido e eu estava de pé, reclinada sobre uma mesa enquanto um tatuador trabalhava no meu traseiro. A calcinha estava abaixada, cobrindo apenas o essencial. Merda. Que posição comprometedora. Fazer parte de uma foto pornográfica definitivamente não estava nos meus planos. Na outra ponta da foto, nossos rostos estavam próximos, e JJ sorria. Puxa. Então era assim que ele ficava quando sorria. Foi então que lembrei, o zunido da agulha, e ele falando comigo, segurando minhas mãos. No começo a agulhada doeu.
– Você estava fingindo que mordia os meus dedos. O tatuador ficou bravo com a gente porque estávamos brincando.
JJ ergueu o queixo.
– É. Era para você ficar quieta.
Assenti, tentando me lembrar de mais coisas, mas sem resultado. Pessoas veriam aquela foto. Pessoas viram aquela foto. Pessoas que eu conhecia e desconhecidos. Todos e qualquer um. Senti a cabeça girar como no dia da foto. Só que, desta vez, a culpa não era do álcool.
– Como conseguiram isto? – perguntei, com a voz trêmula e o coração nos pés. Ou talvez só isso tivesse restado da minha dignidade esfarrapada. JJ me lançou um olhar triste.
– Não sei. Estávamos numa sala particular. Isso jamais deveria ter acontecido, mas as pessoas recebem ofertas de muito dinheiro por esse tipo de coisa.
Assenti e devolvi o celular a Rafe. Minha mão tremia.
– Muito bem. Hum... Os dois só ficaram olhando para mim, com os rostos tensos, esperando que eu me desfizesse em lágrimas ou algo assim. Nada aconteceu.
– Tudo bem – disse eu, esforçando-me ao máximo para acreditar nisso.
– Claro – disse Rafe.
JJ enfiou as mãos nos bolsos.
– A foto nem está muito clara.
– Não, não mesmo – concordei. A piedade no olhar dele foi mais do que eu poderia aguentar – Com licença um minuto, sim?
Felizmente, o banheiro mais próximo estava a uma corrida rápida de distância. Tranquei a porta e me sentei na beirada da Jacuzzi, tentando controlar a respiração, procurando me acalmar. Não havia nada que eu pudesse fazer. A foto já estava disponível para quem quisesse ver. Aquilo não era nenhuma morte, nem desmembramento. Era uma foto idiota minha numa posição comprometedora, na qual eu mostrava mais pele do que gostaria, mas e daí? Grande coisa. Aceitar e seguir em frente. Coisas piores aconteceram na história da humanidade. Eu só precisava colocar as coisas em perspectiva e ficar calma.
– Kie? – JJ bateu de leve na porta. – Você está bem?
– Sim. – Não. Na verdade, não.
– Posso entrar?
Olhei, sofrendo, para a porta.
– Por favor...
Devagar, levantei e a destranquei. JJ entrou e fechou a porta atrás de si. Sem rabo de cavalo hoje. O cabelo loiro estava solto, emoldurando o rosto. Ele tinha três brincos pequenos em uma orelha, brincando de esconde-esconde atrás do cabelo. Fiquei olhando para eles porque me deparar com seus olhos estava fora de questão. Eu não iria chorar. Não por causa daquilo. Que diabos havia de errado com os meus olhos nos últimos tempos? Deixá-lo entrar fora uma idiotice.
Com o cenho franzido, ele olhou para mim.
– Desculpe.
– Não foi culpa sua.
– Foi, sim. Eu deveria ter cuidado melhor de você.
– Não, JJ. – engoli com força – Nós dois estávamos bêbados. Deus, isso tudo é uma estupidez tão horrível e embaraçosa.
Ele só ficou olhando para mim.
– Desculpe.
– Ei, você tem motivos para ficar chateada. Era um momento particular.
Não devia ter sido publicado.
A gentileza dele foi demais. Lágrimas idiotas surgiram.
– Eu quase nunca mostrei minha bunda antes e agora ela está na internet.
– Eu sei, gata.
Ele apoiou a cabeça na minha, segurando-me firme enquanto eu ensopava a camiseta dele. Ter alguém me abraçando ajudou. Tudo ficaria bem. Bem no fundo eu sabia disso. Mas, naquele instante, eu não conseguia visualizar muito bem o que aconteceria. Ficar ali em seus braços pareceu o certo.
Não sei quando começamos a balançar. JJ me ninou com suavidade de um lado para o outro como se estivéssemos dançando uma música lenta. A tentação esmagadora de ficar ali, com o rosto pressionado na camiseta dele, foi que me fez recuar um passo, controlando-me. As mãos dele ficaram pousadas de leve no meu quadril, a conexão ainda não rompida.
– Obrigada! – eu disse.
– Tudo bem. – A frente da camiseta dele estava molhada, graças a mim.
– Sua camiseta está toda molhada.
Ele deu de ombros.
Eu chorava feio. Esse era um dom meu. E o espelho confirmou: olhos de demônio e bochechas rosadas incandescentes. Com um sorriso desconcertado, recuei um passo, e as mãos dele penderam na lateral do corpo. Joguei um pouco de água no rosto e sequei com uma toalha enquanto ele continuava ali, com a testa enrugada.
– Vamos sair de carro – disse ele.
– Como é? – Lancei um olhar duvidoso. JJ e eu sozinhos? Dado o evento do casamento e nossos encontros sóbrios posteriores, esse não parecia um plano muito brilhante.
– Isso aí. – Ele esfregou as mãos, ficando entusiasmado. – Só você e eu. Vamos sair daqui por um tempo.
– JJ, como você mesmo disse antes, não acho que essa seja uma boa ideia.
– Quer ficar em L.A.? – ele caçoou.
– Olha só, você foi muito gentil desde que passou por aquela porta. Bem, a não ser pela parte em que contou para Rafe sobre eu ter vomitado em você. Mas nas vinte e quatro horas anteriores, você me largou sozinha num quarto, saiu com uma fã, me acusou de tentar fazer sexo com seu irmão e soltou seu bando de advogados em cima de mim.
Ele não disse nada.
– Não que você sair com uma fã seja da minha conta. Claro.
Ele virou de costas e andou até a outra ponta do banheiro, os movimentos contidos, zangados. Apesar de ser umas cinco vezes maior do que o banheiro da minha casa, aquele ali ainda não dispunha de tanto espaço para aquele tipo de performance. E ele estava entre mim e a porta. Subitamente, sair dali me parecia uma boa decisão.
– Eu só pedi que eles cuidassem da papelada – disse ele.
– E foi o que eles fizeram. – Coloquei as mãos no quadril, fincando os pés. – Não quero o seu dinheiro.
– Foi o que ouvi. – O rosto dele estava impassível. Minha declaração não provocou nem a descrença nem a zombaria que provocara nos valentões de terno. Sorte dele. Duvido que ele acreditasse em mim, mas, pelo menos, estava disposto a fingir. – Eles estão redigindo outros papéis.
– Que bom. – Encarei-o. – Você não tem que me pagar. Não faça suposições desse tipo. Se quiser saber alguma coisa, pergunte. E eu nunca venderia esta história para a imprensa. Jamais faria algo assim.
– Ok. – Ele se recostou na parede, apoiando a cabeça e olhando para o vazio. – Desculpe – disse para o teto. Tenho certeza de que o gesso ficou muito agradecido.
Quando não respondi, o olhar dele acabou encontrando o meu. Tinha que ser errado, ou pelo menos imoral, ser tão bonito. Pessoas normais não tinham a mínima chance. Meu coração mergulhava toda vez que eu olhava para ele. Não, mergulhar não descrevia muito bem a situação. Ele despencava.
Onde estava Sarah para me dizer que eu estava sendo melodramática quando eu mais precisava?
– Sinto muito, Kie – repetiu – Sei que as últimas vinte e quatro horas foram um desastre. Minha oferta de sair daqui por um tempo foi meu modo de tentar melhorar a situação.
– Obrigada – disse eu – E também por vir até aqui para ver como eu estava.
– Sem problemas. – Ele me encarou, com olhos desprotegidos para variar. E a honestidade em seu olhar mudou as coisas para mim, a breve centelha de algo mais. Tristeza ou solidão, não sei. Um tipo de exaustão que esteve ali e desapareceu antes que eu pudesse compreender. Mas que deixou sua marca. Havia muito mais naquele homem do que um belo rosto e um nome famoso. Eu precisava me lembrar disso e não fazer mais suposições.
– Você quer mesmo ir? – perguntei – De verdade?
Seus olhos brilharam de contentamento.
- Por que não?
Sorri com cautela.
-Podemos conversar sobre o que precisamos, só você e eu. Só preciso dar uns telefonemas e depois podemos ir, ok?
– Obrigada. Eu gostaria disso.
– Com um aceno de despedida, ele abriu a porta e saiu. Ele e Rafe falaram baixinho a respeito de alguma coisa na sala de estar. Aproveitei a oportunidade para lavar novamente o rosto e pentear os cabelos com os dedos. Chegara a hora de assumir o comando. Na verdade, já passara da hora. O que eu estava fazendo, indo de um desastre para o seguinte? Essa não era eu. Eu gostava de estar no controle, de ter um plano. Era hora de parar de me preocupar com o que eu não podia mudar e agir naquilo que podia. Tinha algum dinheiro guardado. Um dia desses, meu pobre carrinho morreria e eu vinha planejando. Porque, quando o inverno chegasse, e ficasse frio, cinzento e úmido, andar não seria legal. Pensar em usar minhas economias não me enchia de alegria, mas era um tipo de emergência.
Os advogados de JJ redigiriam os papéis, menos a parte do dinheiro, e eu os assinaria. Não havia por que me preocupar com essa parte. Contudo, esconder-me da opinião pública por algumas semanas estava dentro das minhas capacidades. Eu só precisava parar e pensar para variar, em vez de simplesmente reagir. Eu era uma garota crescida e poderia cuidar de mim mesma. Chegara a hora de provar isso. Eu sairia com ele, discutiríamos o básico, e eu seguiria em frente, primeiro numas férias secretas, depois voltando à minha vida muito bem organizada e ordenada, desprovida de intervenções de estrelas do rock.
Isso.
– Me dê as chaves do seu Jeep – disse JJ, encurralando Rafe na sala.
Rafe fez uma careta.
– Eu estava brincando quando disse que distribuiria carros.
– Vamos lá. Pare de reclamar. Eu vim de moto e não tenho um capacete para ela.
– Tá bom. – Com uma expressão azeda, Rafe deixou cair as chaves do carro na mão esticada de JJ. – Mas só porque gosto da sua mulher. Nem um arranhão, entendeu?
– Tá, tá. – JJ se virou e me viu. A sombra de um sorriso curvou seus lábios.
A não ser por aquela primeira vez no chão do banheiro, eu nunca o vira sorrindo, nem mesmo chegar perto de sorrir. Aquele leve indício de um sorriso me deixou leve por dentro. Meus joelhos ficaram moles. Isso não podia ser normal. Eu não deveria estar me sentindo animada e feliz só porque ele estava. Não poderia me permitir sentir nada por ele. Não se quisesse sair daquilo num pedaço só.
– Obrigada por me aguentar hoje, Rafe – agradeci.
– O prazer foi todo meu – disse ele com fala arrastada – Tem certeza de que quer ir com ele, noiva criança? O retardado te fez chorar. Eu te faço rir.
O sorriso de JJ desapareceu e ele andou na minha direção. A mão dele pousou de leve nas minhas costas, aquecendo a pele apesar da camada de roupa.
– Vamos embora daqui.
Rafe deu um sorriso e piscou para mim.
– Para onde vamos? – perguntei a JJ.
– Isso importa? Vamos só sair dirigindo por aí.
Esse capítulo tem 3.869 mil palavras.
por favor vote e comente
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