Capítulo 2 - Doutor Paulo

Thomas não precisava ser um Sherlock Holmes para saber que o doutor Paulo teve um dia longo. As olheiras em seus olhos eram profundas e a íris, geralmente sempre em um tom verde claro e sereno, estava mais escura, da cor de uma garrafa de vinho.

"Está tudo bem com sua esposa, doutor?" Thomas perguntou educadamente enquanto se sentava no sofá.

"Estamos bem", doutor Paulo bufou, caindo em sua cadeira. "Chocolate ou pirulito?"

"Pirulito", respondeu Thomas. Ele gostava de chupá-los da maneira mais obscena possível de vez em quando, apenas para ver a reação do doutor Paulo.

O pirulito era vermelho, com gosto de verde-vermelho-amarelo, como as cerejas. Thomas teve o cuidado de esfregar nos lábios, deixando-os o mais vermelhos possível.

"Na última sessão, discutimos os livros", disse o doutor Paulo, sem prestar atenção ao tratamento que Thomas dava ao seu pirulito. "E dores de cabeça."

"Esses dois também podem ser sinônimos", Falou Thomas.

"Sim, você já mencionou isso muitas vezes", disse o médico, parecendo cansado.

"E a Bíblia-"

"- tem letras tão pequenas que você pode muito bem estar olhando para um arco-íris", concluiu o médico.

"Embora a primeira parte-"

"- de Gênesis é quase inteiramente verde, então é por isso que você consegue ler", interrompeu doutor Paulo. "Eu sempre anoto tudo, lembra?"

"É, eu lembro", falou Thomas no mesmo tom que usava com sua mãe.

Doutor Paulo, que estava totalmente familiarizado com os tons vocais de Thomas, suspirou, sabendo que fora rude com o garoto.

"Olha, Tom... me perdoe por isso. Eu não estou em um dia bom, mas não devia ter deixado isso afetar nossa conversa.", disse ele. Ele se inclinou para frente com a intenção de tocar em sua mão, para acalmá-lo, mas Thomas deu um pulo para trás tão rápido que o pirulito quase desceu pela garganta. "Desculpe, desculpe!" Ele falou, apressado e arrependido. O médico tirou os óculos para esfregar o rosto com a mão. "Sinto muito, Tom."

Thomas não falou nada. Ele achou que se abrisse a boca sairiam nada além de palavras que só Alex parecia entender. Seu coração estava batendo forte no peito e ele colocou a mão sobre ele. Doutor Paulo estremeceu ao ver os movimentos de Thomas.

"Sinto muito, Tom", ele repetiu. "Eu não queria te assustar."

"Estou bem", Thomas se forçou a dizer, satisfeito quando as ouviu saírem como palavras 'normais'.

"Não, você não está, Tom", falou o doutor com um suspiro. "Você não está bem." Ele balançou a cabeça lentamente, como se quisesse mudar de assunto, mas que sabia que não poderia fazê-lo tão abruptamente. "Sobre o que você quer falar hoje?"

Thomas deu de ombros. "Não sei."

"Você tem escrito recentemente?" ele perguntou.

"Um pouco", murmurou Thomas, puxando um fio solto em sua calça jeans.

"Você escreveu sobre algo particularmente interessante?"

"A casa da árvore", disse Thomas. Os olhos do doutor Paulo ficaram azul-laranja-verdes: interessados ​​e quase famintos. Imediatamente, ele desejou não ter dito nada.

"Que casa na árvore?" o médico perguntou, anotando algo em seu caderno.

"Nós... eu encontrei uma casa na árvore na floresta", murmurou Thomas, olhando carrancudo para o tapete. Ele se sentiu estranhamente exposto ao dar aquela informação.

"Como é a casa da árvore?" ele perguntou, sem tirar os olhos do caderno.

"Eu não sei. Madeirada.". Ele não queria dizer que ela era amarelo-púrpura. A sensação do giz molhado. O B mais grave do piano. Doutor Paulo não entenderia. Só Alex era capaz de concordar com ele.

"Seus pais sabem sobre a casa da árvore?" o médico perguntou.

"Isso importa?" Thomas rebateu, um pouco mais na defensiva do que pretendia.

Doutor Paulo piscou. "Suponho que não", disse ele lentamente. "Na verdade, eu só queria saber se você tem falado com eles."

"Você poderia apenas ter perguntado isso a eles, não é?", ressaltou Thomas. "Ou pra mim. Você poderia ter simplesmente perguntado."

"Você está certo, Tom. Sinto muito", o doutor perguntou, parecendo genuinamente arrependido. "Você tem conversado com seus pais?" Thomas bufou. "Foi o que eu pensei." O médico se inclinou para frente beeem lentamente, para que dessa vez Thomas tivesse tempo para se preparar para sua presença se aproximando. "Eu acho que você deveria falar com eles, Tom. Eles realmente se preocupam com você."

"Isso não é verdade." Thomas sabia que estava parecendo uma criança, como o cheiro de cascas de laranja, mas não se importava com isso naquele momento.

"É sim, Tom. E eles ficaram extremamente chateados e tristes quando descobriram o que aconteceu com você"

"Eles nunca acreditaram em mim. Até hoje."

"Tom, você não era muito fácil de entender na época", admitiu doutor Paulo gentilmente. "E você continua não sendo pra falar a verdade..."

"Você parece administrar isso muito bem."

"Eu já te conheço há muito tempo, Tom."

"Meus pais também."

"Eles realmente te conhecem?"

Thomas ficou em silêncio por um momento, refletindo. Apenas o tique-taque do relógio podia ser ouvido, mas a resposta era clara em sua mente. "Não." Ele fez uma pausa. "Não, eles não me conhecem."

"Tom, você já pensou em fazer as pazes com seus pais?" doutor Paulo perguntou.

Tom franziu a testa. "São eles que deveriam tentar fazer as pazes comigo."

"Eles estão tentando, Tom, de verdade", disse o médico. "Eu acho que você não percebeu, mas eles estão tentando se desculpar."

"Bem, eles estão fazendo um ótimo trabalho, realmente", murmurou Thomas.

Doutor Paulo ignorou o comentário. "Eles disseram que estão tentando levar você para passear e participar das atividades familiares."

"Odeio multidões", falou Thomas ao médico. "Odeio jogos de tabuleiro. Odeio TV."

"Eles não sabem do que você gosta, Tom", disse o doutor Paulo. "Mas tenho certeza que eles ficarão felizes em fazer o que você quiser com eles."

"Eu ..." Thomas fez uma pausa. "Não há nada que eu goste de fazer."

Doutor Paulo ficou quieto por um momento. "Você gosta do Alex."

Thomas piscou. "O quê?" O garoto ficou genuinamente curioso. O doutor Paulo nunca tinha tocado voluntariamente no tópico de Alex antes.

"Não estou dizendo que Alex é real, Tom", disse o médico rapidamente. "Mas talvez você pudesse tentar contar a alguém da sua família sobre ele."

"E a que propósito isso serviria, a não ser para suprir minhas ilusões?" Indagou, usando o mesmo tom que vira num livro de época uma vez.

"Isso vai ajudá-lo a se abrir", disse o doutor Paulo, ignorando seu sarcasmo. "Você é muito mais fácil de entender quando está falando sobre algo pelo qual está apaixonado."

Thomas pensou um pouco sobre isso. "Você vai ter que dizer aos meus pais que está tudo bem eu falar sobre Alex."

Doutor Paulo suspirou. "Eu... eu não queria que aquilo acontecesse quando contei a eles sobre Alex, Tom. Sinto muito."

Tyler deu de ombros. "Tudo bem."

Doutor Paulo balançou a cabeça lentamente para si mesmo, anotando algo em seu caderno. "Certo. Eu vou falar com eles."

Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top