I Just Wanna Go Home.

Capítulo dedicado a aut_kali_

✶⊶⊷⊶⊷❍⊶⊷⊶⊷✶

"Talvez esse lugar seja minha casa. Com você, me sinto rico. Mesmo sem falar nada, vai ser confortável. Você sabe que eu quero esse lar. Você sabe que você é meu lar."

C A P Í T U L O  Q U A T R O


Porque Yoongi era a pessoa de Hoseok e Hoseok era a pessoa de Yoongi.

Caso contrário, nada disso teria acontecido. A tinta feita especialmente para aquele momento — em uma mistura secreta de jasmim, artemísia, carvão ativado e uma preciosa água tirada da gruta secreta que era diretamente banhada pelo luar —, então, não teria como ela errar.

Hoseok era seu parceiro, independente de ter um lobo ou não vivendo em conjunto consigo.

— A Lua o trouxe para mim — disse, com muita certeza. — Eu retornaria para casa sem meu parceiro, mamãe. E isso continuaria acontecendo em todas as vezes que eu participasse do Leafde, porque o meu parceiro destinado nunca estaria dentre esses alfas. Mas pedi que ela levasse ele até mim, e eu fui atendido.

Minji não soube o que falar, a princípio, observando Yoongi caminhar até poder sentar ao lado de Hoseok, acariciando o rosto do homem e contornando os traços com cuidado para não acabar machucando-o de alguma forma.

— Será difícil fazer nossa alcatéia se sentir segura com ele — expôs o que já estava mais que claro. Nem mesmo ela confiava em Hoseok, e tinha muitos motivos para isso. — Se envolver com esse desconhecido… não sei se é uma boa ideia, Yoon.

— Estou ligado a ele, mamãe, e não há mais nada que eu possa fazer para mudar isso — respondeu, sem desviar o olhar do que fazia. — E nem quero — sussurrou a sentença, como um segredo seu, de Moon e de um Hoseok desacordado.

A ômega meneou a cabeça, sorrindo pequeno para o filho querendo acreditar que tudo ficaria bem, que o rapaz não sairia machucado naquilo tudo. Não é como se pudesse fazer uma confusão maior do que a que tinha sido feita mais cedo e voltar a descontrolar Yoongi ou Moon. Estava insegura quanto a seu possível genro, não o conhecia e lhe atormentava a mínima possibilidade daquele homem estar ali apenas para machucar os seus.

Mas, além disso, também possuía um lobo como hospedeiro, sabia como o lado lupino costumava ser bastante honesto em toda sua intensidade. Seja ela tomada por amor, ódio, tristeza, felicidade ou o que fosse.

E o que viu Yoongi fazendo naquela noite... O que viu Moon fazer — atacar seu próprio líder — lhe fazia querer confiar.

Manteve seus olhos sobre o loiro desacordado, como se assim fosse enxergar a ameaça que ele representava vindo a tona, mas tudo que viu foi um rosto calido, e ainda pálido, adormecido pela mente agitada. Suspirou, sentindo os feromônios do filho circulando Hoseok em um gesto protetor.

Não tinha muito o que fazer ali, era contra àquela aproximação ao mesmo tempo em que temia pelo filho. Precisava confiar no Leafde Moanne, confiar que a Lua realmente entregou um bom homem para Yoongi e que tudo ficaria bem.

Se aproximou com calma, atraindo a atenção do ômega que relaxou ao ganhar um selar de despedida sobre a franja que cobria sua testa. Com esse silêncio como trilha sonora, Minji deixou para trás sua principal aflição e seguiu em direção a roda formada em meio a vila.

Todos viraram para acompanhar Minji caminhando até estar de frente para o casal de lupus e ter ao seu lado Dara, tão ansiosa para uma resposta quanto o restante dos presentes.

— Ao que parece, o rapaz é mesmo o escolhido do meu filho — anunciou, recebendo um silêncio sepulcral dos acompanhantes. — De alguma forma, a Lua ligou Yoongi a um humano sem lobo.

— Isso é inacreditável!

— Como algo assim pode ser possível?

— Um ômega sem um alfa? Óbvio que não dará certo.

— Eu deveria ter sido o escolhido!

— Ainda vai ter o banquete comemorativo?

A taciturnidade que prendia os lupinos foi quebrada pelo avalanche de vozes sobressaindo uma sobre a outra com incredulidade e protestos pela afirmação de Minji. Um burburinho que se elevou até ninguém mais se fazer entender, a maioria realmente preocupada em como seria a convivência com um humano e como aquilo funcionaria.

Não-lupinos eram o verdadeiro sinônimo de destruição para aquela raça que vivia escondida por entre árvores e montanhas, resguardando o que podiam daquilo que era alvo de ódio ignorante por humanos que esqueciam tais traços — a humanidade — ao se mancharem de preconceito e estranheza contra algo que em momento algum os faria mal.

Quantos ali não já viram seus amigos e familiares serem mortos, feridos, perseguidos e ofendidos?

Então, a confusão era compreensível, assim como o medo e a incerteza em conviver com o desconhecido há menos de três metros.

— Silêncio.

A ordem repercutiu pelo círculo formado por homens, mulheres e os poucos adolescentes que conseguiram permanecer ali sem a proibição dos pais. Até mesmo os grilos estridulando por perto pareceram obedecer a voz do alfa lupus, que observou a todos antes de prosseguir.

— Tantos anos se passaram e nos tornamos tão desleixados com nossa história que acabamos nos esquecendo como esta alcateia foi formada.

Houve um intervalo mínimo de tempo apenas para que o moreno se colocasse no centro do círculo, as mãos para trás e um olhar austero sobre todos. Arqueou uma sobrancelha, inquisitivo, ao avistar o filho não autorizado a estar ali, recebendo um sorrisinho amarelo do adolescente.

Taehyung era a cópia fiel do pai omega, desde os traços bonitos até a personalidade teimosa. Se queria algo, dava o seu jeitinho, mesmo que isso significasse desobedecer os próprios pais. Aquela rebeldia aparentemente advinha da idade curiosa, já que o garoto acabou fazendo uma dupla complicada com Beomgyul, fazendo não só os líderes ficarem a ponto de uma síncope nervosa como Minji e Dara também.

No entanto, deveriam focar em (tentar) achar uma solução para Yoongi e o forasteiro em suas terras, não nos dois garotos que faziam de tudo para passarem despercebidos pelos genitores e não acabar sendo enxotados de volta pra casa.

— Do que está falando, querido? — Seokjin expôs a questão que incomodava a todos.

— De como nossa alcatéia se deu início e como é mais que possível essa ligação entre Yoongi e o forasteiro.

O silêncio que se seguiu foi necessário para a compreensão geral, que só não iluminou as faces mais que a Lua transcendendo nos céus.

Essa mesma lua que ornava o céu quando Yunho fugiu de casa e cruzou os limites que hoje era a morada daquele grupo que observava Namjoon na espera que ele contasse sobre a história mencionada.

Acontecimento esse que teve seu principal marco no momento em que Medeia se aproximou da enorme pedra que lhe chamara a atenção no instante em que pôs seus olhos cristalinos sobre o monumento, mesmo há quilômetros de distância. Ele seria perfeito para sua oferenda a deusa Selene, que consistia em uma trouxa de pano repleta de frutas suculentas, dois canários abatidos e presos pela alça da bolsa forrada.

Estava cansada após uma longa viagem de um distrito a cinco dias da área civil de Sian. Era uma feiticeira deserdada de sua União por se virar contra o deus cultuado por estes e dedicar suas preces à deusa da lua.

Vagou por inúmeras cidades até enfim chegar à floresta densa que praticamente cercava Sian. Não planejava estender sua estadia ali, entretanto, a pedreira encheu seus olhos de admiração e a mente de curiosidade.

Durante sua apreciação, Medeia escutou um ruído entre os arbustos e voltou o rosto naquela direção acreditando que encontraria algum animal.

Por um instante, a altiva feiticeira ficou sem palavras.

Um rapaz de físico perfeito a observava igualmente surpreso. Tinha cabelos compridos, duas espadas na cinta e uma pele de leopardo amarrada ao redor do corpo. Imediatamente, Medeia sentiu que seu destino estava ligado para sempre àquele homem.

O que chamou de amor a primeira vista.

Descobriu naquela noite que o homem, cujo nome era Yunho, havia fugido de sua terra para ficar longe da violência infernal de sua própria família. Queria paz e acreditou encontrá-la naquela floresta, agradecido por tamanha decisão um tempo depois ao iniciar uma relação envolvente com a bela devota de Selene.

Yunho construiu uma pequena casa às margens do riacho, enquanto Medeia cultivava trilhas de variadas frutas, verduras e vegetais. Formaram a dupla perfeita em tornar o alto da pedreira como um altar para a deusa que os iluminou na noite em que tomaram votos perante ela, ali mesmo.

Foram felizes como nunca imaginaram ser.

Ou, só até a noite em que Medeia precisou ir até a pedreira sozinha, pois, o esposo havia se machucado ao tentar construir um poço para lá de engenhoso. A mulher de pele alva retornou para casa com as ervas preparadas para o tratamento do homem ferido, contente por ter encontrado tudo que precisaria.

Tranquila, se assustou ao escutar vozes altas vindo de sua moradia. Seus passos foram acelerados numa corrida desesperada que não foi o suficiente para salvar Yunho da crueldade de seus irmãos, esses que descobriram seu paradeiro depois de muito tempo e decidiram castigá-lo com peso.

Medeia não pensou muito, tomada pela ira de ouvir as risadas e provocações da dupla enquanto abraçava, aos prantos, o corpo frio e coberto por sangue daquele que tanto amou. Sua magia foi afetada pela perda, fugindo de seu corpo e se arrastando até os algozes que agonizaram por horas pré-mortais.

A feiticeira, temendo que mais deles estivessem pelas proximidades, permitiu que sua magia se expandisse com vastidão, formando uma barreira mística capaz de criar pesadelos terríveis e realizar os maiores medos daqueles que tentassem cruzar seus limites.

Seu luto durou três longos dias, onde chorava e dormia sobre o corpo cadavérico de seu amado esposo.

Foi em um de seus despertares que uma ideia iluminou sua mente ao mesmo tempo que manchou seu coração, pois, o que estava prestes a fazer ia contra as leis naturais. E ela sabia disso, sabia mas, sinceramente, não se importava.

Só queria seu Yunho consigo.

A deusa, cheia de tristeza pelo que assistia, viu a natureza punir Medeia pelo crime de ressuscitar aquele que deveria permanecer onde estava. Seus poderes foram retirados e Yunho, tomado pela loucura causada pelos espíritos da natureza, matou a feiticeira. Sua mente transtornada só se acalmou no momento em que suas mãos carregavam o sangue da própria esposa, e ali o humano chorou.

Seus olhos cobertos pelas lágrimas, confusão e culpa pelo que fez, se firmaram no globo brilhante acima de sua cabeça. Então, rogou. Implorou por dias até que Selene se inclinou aos pedidos dolorosos daquele homem que tanto apreciava e cedeu aos seus dois fiéis devotos a oportunidade de viver o que a maldade destruiu.

Todavia, consequências viriam junto ao despertar de Medeia.

O casal sentiu o momento em que seus cernes foram tomados por hospedeiros não convidados, a sensação angustiante de uma segunda pele sob as suas, a consciência dividida por duas e os sentidos mais apurados até mesmo para a antiga feiticeira.

— Selene ouviu os pedidos de nossos pioneiros, mas não poderia fazer muito para impedir que os espíritos da natureza decidissem impor aquele preço que hoje é nosso maior motivo de orgulho: nossos irmãos lobos — Namjoon finalizou a história, os olhos fixos na lua, mas os ouvidos atentos nos fungados de alguns sensibilizados com o relato.

— Nossa deusa já amou um humano antes, já o abençoou e o confiou uma de suas devotas a eles, então, porquê agora seria diferente? — Jin questionou o grupo. — Esse homem conseguiu passar pela barreira que teria o afastado caso ele fosse uma ameaça, não acham?

— Os sem-lobo são nossos principais inimigos, meu lupus — Suna, a velha beta responsável pela colheita e por atormentar os mais novos, protestou. — Agora, essa ameaça dorme ao nosso lado, e nós cuidamos para que ele acorde e destrua-nos?

— Acha que Selene permitiria que tamanha desgraça nos acontecesse? — o líder ômega rebateu, desgostoso. — Não confia na tua deusa, beta?

— Em quem nós não confiamos é nesse forasteiro — outro lupino respondeu, sendo apoiado pela maioria que iniciou outra discussão conjunta e desorganizada.

— Basta! — Namjoon recordou ali, novamente, um dos motivos por ter teimado tanto antes de se tornar líder. — Aguardaremos o seu despertar para saber como ele conseguiu adentrar nosso território e quais suas intenções — ditou, querendo acabar com aquela baderna. — No momento, vamos nos resguardar em nossos lares e esperar. Sei que é difícil ficar tranquilos em uma situação como essa, mas façamos como nosso lupus ômega pontuou: confiar na deusa. Ela sempre nos protegeu, não há motivos para desconfiar de suas ações justo agora.

Nada mais foi dito, além da obediência ao homem, o cansaço era geral, principalmente entre os alfas participantes do Leafde Moanne, sendo eles um dos primeiros a arrastarem-se para as cabanas. Minutos depois, apenas o casal de líderes se encontrava no centro da vila junto a Taehyung, que já havia desistido de se esconder.

— Acham mesmo que o destinado do Yoon está aqui para nos fazer mal?

— Não temos certeza ainda, filhote. Precisamos esperar e fazer como seu pai mandou, sim?

— E é bom que você não me desobedeça novamente, ômega — Namjoon recriminou, olhando duro para o garoto antes de passar os braços sobre os ombros pequenos do adolescente e tomar as mãos do esposo na intenção de guiá-los até sua casa.

Aquela tinha sido uma noite e tanto, com fortes indícios de que o dia seguinte seria ainda mais puxado. Afinal, ainda tinham um banquete após interrogar um dos noivos.

✶⊶⊷⊶⊷❍⊶⊷⊶⊷✶

Sabe quando você desperta e tua nuca, pescoço e cabelo tá tudo molhado, e a sensação térmica é de deserto com uma ponta do inferno?

Foi assim que Hoseok acordou naquele princípio de manhã.

O sol batendo em seu rosto poderia ser classificado como uma das piores formas de despertar-se, ao contrário do que muitos pintam por aí. A queimação na pele quando a estrela parece acordar o puro suco do ódio, a luz intensa na retina até então protegida pelas pálpebras e o calor causando uma suadeira desagradável.

As frestas da cabana com sua construção não concluída ajudavam na invasão dos raios solares, a parede incompleta estava contra a direção do vento, então era só o mormaço em forma de brisa. Para completar, alguém dormia sobre o seu peito, piorando a situação ao dividir o calor corporal. Hoseok, em qualquer outro momento, até curtiria as sensações de acordar estressado mas se deparar com um homem bonito abraçado a ele se o homem em questão não fosse Yoongi.

Yoongi.

O mesmo rapaz que encontrou no alto daquela pedra enorme, onde tiveram uma refeição incrível regada a conversas legais e tão estranhas quanto o tal do ritual.

Mas nada, absolutamente nada, foi tão assombroso quanto ver aquela criatura que dormia com a porra de um bico fofo se transformar num lobo.

UM FUCKING LOBO ENORME.

&$@:+-@:$:$'#@:@_#@;'#*

Percebam o estado mental em que esse pobre homem estava.

A letargia e incômodo pós-sono sumiram em um piscar de olhos no instante em que o Jung recordou dos acontecimentos que sucederam aquele. Estava dividido entre ficar estático ou sair correndo e gritando pelo medo da situação pra lá de inusitada que se colocou ao refugiar-se na floresta.

Não era possível que tivesse acabado nas mãos da galera mais aleatória possível. que na noite passada ele chegou a cogitar até mesmo que Yoongi fosse um canibal — usou todo seu arsenal de filmes de terror para imaginar as coisas mais absurdas sobre o de madeixas longas —, todavia, um LOBO?! Não, isso não.

E, pior, Yoongi estava falando muito sério sobre o levar até outros lobos. Uma alcatéia inteira apontando lanças, rosnando e com presas ameaçadoras em sua direção. Não iria esquecer tão cedo dos olhos de Sandara mudando de cor, ou, da transformação sinistra de Yoongi para um lobo.

UM BIG-HIPER-SUPER LOBO CINZA.

Hoseok iria surtar.

Aquele rolê foi o mais maluco da sua vida e ele esperava um dia poder sentar na sala de sua casa, em um distrito melhor que o Norte, e contar para os seus filhos como sua fuga da polícia o levou até homens-lobos.

Mas, antes, teria que dar o fora se não quisesse virar espetinho de churrasco lupino.

Prendeu a respiração, como se até mesmo isso fosse capaz de acordar o menor, fazendo a sua melhor manobra lenta para afastar as mãos firmes na sua jaqueta úmida pelo suor agora também de nervosismo. Quis chorar ao sentir Yoongi apertar ainda mais a peça de roupa, mesmo que inconscientemente.

Seu coração batia muito rápido, pior ainda por estar prendendo a respiração. Tratou de tentar levar ar aos seus pulmões o mais devagar possível, olhando ao redor na esperança de encontrar algo que pudesse substituir seu corpo do enlace alheio enquanto ele mesmo correria para o mais longe que pudesse.

Correr de lobos não deveria ser mais difícil que fugir da polícia.

Sua cabeça se moveu em direção a cada canto daquela cabana, todavia, não encontrou absolutamente nada de útil. Voltou seu olhar para baixo na intenção de conferir se Yoongi ainda dormia, pretendendo voltar a tentar tirá-lo de cima.

O grito ficou preso em sua garganta e tudo que saiu foi um suspiro trêmulo pelo susto de encontrar Yoongi o encarando atentamente.

— Você acordou — constatou, se colocando para longe do loiro que se tremia inteiro e tinha as orbes arregaladas. — Não precisa ficar com medo, eu não vou te machucar.

— Cara, tu se transformou em um lobo bem na minha frente. EM UM LOBO! — Abriu ainda mais os olhos, arrastando seu corpo para o mais distante possível enquanto prosseguia: — Te vi atacando aquela galera. Pode apostar que eu tenho ótimos motivos pelo meu cagaço.

— Mas eu ataquei eles pra te defender!

Hoseok franziu o olhar, com uma expressão desconfiada, analisando o menor com bastante cuidado. Yoongi estava sentado sobre as panturrilhas, mãos a mostras e quieto para não assustar ainda mais seu pretendente. Deixou sua mente trabalhar um pouco mais, mergulhando nos acontecimentos anteriores para buscar indícios de que o que Yoongi falava poderia ser verdade.

— Eu tive inúmeras chances de te machucar, se eu quisesse, na noite passada — voltou a falar, vendo o silêncio do Jung como uma brecha. — Mas eu não quis e não quero. Desafiei e ameacei meu líder, meus pais e cunhado só para te manter seguro.

— Isso não inspira muita confiança…

— O que eu fiz pode ser visto como um ato de traição e tentativa de ataque ao meu lupus e povo, pagando com exsilium ou morte — rebateu, sério. — Então, acredite quando eu digo que, para nós, isso é bem mais que uma prova de que você é importante pra mim.

— Você mal me conhece.

— Ainda assim, jamais te machucaria, Hoseok.

Certo, Hoseok não esperava por aquele final. Seu corpo relaxou contra o cantinho da cabana, onde estava encolhido, piscando rápido como se assim não se deixasse amolecer pelas palavras do ômega.

Bandido perigoso, é? Pff!

— Mas e aqueles outros? — Poderia até não ser Yoongi, mas ainda tinha gente querendo sua cabeça.

— Eles estavam nervosos.

— Quando alguém 'tá nervoso, o indicado é tomar um chá de camomila ou um suquinho de maracujá, não tentar matar uma pessoa inocente.

Não totalmente inocente, mas é isso aí.

— Você que mandou eu me aproximar, pra início de conversa, e no final o culpado fui eu. — Gesticulou, realmente irritado com o perigo que correu sem nem ter sido alertado.

— A questão não é essa, Hoseok.

— E qual é? Porque eu nem ‘tava fazendo algo pra merecer aquela lança na minha garganta.

Yoongi apertou a extremidade do nariz, buscando um jeito de se explicar de forma que Hoseok compreendesse. Sua mente estava tão cansada quanto seu corpo que não repousou o suficiente, praticamente se obrigando a velar o sono do homem amedrontado durante a madrugada inteira. Seu físico cobrava pelo esforço do dia anterior e até mesmo Moon custava a despertar para ajudá-lo com Hoseok.

— Resumindo: pelo que parece, você é um humano sem lobo e conseguiu passar pela barreira sem que ninguém notasse e, de certa forma, poderia ser uma ameaça para mim e meu povo.

— Barreira? Ameaça? Quê?!

Sua cabeça iria explodir.

Não viu barreira alguma quando adentrou aquela vastidão verde na escuridão e, por mais que usasse parte do seu tempo livre para conseguir seu sustento de uma forma nada limpa, não era um agressor louco ou algo do tipo. O que fazia, fazia por necessidade.

Machucar Yoongi estava bem longe disso.

— Nossas terras são protegidas por uma barreira mágica — começou, se remexendo ao sentir Moon despertando. — Ela serve para alertar uma invasão e impedir que humanos nos encontrem, causando alucinações fortes o suficiente para matar aquele que insistir em avançar.

— Espera aí — espalmou a mão direita no ar, arqueando uma sobrancelha —, mas eu passei por essa barreira, não?

— Incrivelmente, sim.

— Então ela não funciona? Ou — desviou o olhar para o piso amadeirado, personificando alguém a ponto de perder o juízo —, eu tô alucinando agora…

Yoongi precisou ser forte e não rir das reações do maior. Sinceramente, o que passava pela cabeça do Jung?

— Sou real, Hoseok.

— O que rolou, se essa barreira aí não fez o serviço dela?

— No momento, os lupus já devem ter em mente o que aconteceu. A maior certeza que eu tenho é que você conseguiu passar por ela porque não é uma ameaça — e porque é o meu parceiro destinado, completou para ele e Moon, achando melhor não externar aquela parte.

"Por que ele está tão distante?"

O lobo indagou, incomodado com os metros entre ele e o humano pensativo.

"Acordou assustado, mas agora parece um pouco mais tranquilo em nossa presença"

"Quero ficar mais perto dele."

"Não seja impaciente. Ele precisa de um tempo para digerir tudo isso, tenha calma."

— Olha — o loiro disse, perdido no meio daquela confusão toda  —, eu não quero problema, tá legal?

— Você não é um problema — afirmou. — Só… faz muito tempo desde nosso último contato com um humano e, acredite, ele não veio com intenção de fazer amizades. Isso só contribuiu para que todos ficassem nervosos daquele jeito.

O Jung, pela segunda vez, analisou Yoongi com um olhar crítico. Queria confiar, ficar tranquilo quanto a sua (efêmera) segurança e não causar a ira daquelas pessoas. Por mais que, com o relato do ômega, agora compreendesse todo o surto, afinal, era bem assim no seu distrito também. Quando alguém de fora cruzava os limites que os separavam, coisa boa nunca vinha.

Homens e mulheres eram presos, agredidos, submetidos a humilhações que lhe faziam questionar o porquê de tanto poder para seres tão podres como aqueles.

Ele não era o bom moço da história, o exemplo de contra a violência. Precisava dormir com o peso de ações que tomou em algum momento de sua vida, ações essas que encurtaram ou ceifaram outra. Corria em suas mãos as manchas do sangue que precisou derramar para defender sua gente.

Gostaria de dizer que, por mais que seu coração fosse tomado pelo gosto amargo da culpa, teria feito diferente. Entretanto, não era assim que o seu mundo funcionava. Não teve escolha, não era o caso de alguém lhe permitir outra saída, uma primazia ou vida diferente.

O governo precisava do vilão para derrotar e fazer o papel heróico que sua sociedade hipócrita almejava. Apontaram o distrito Norte como os marginais, os bandidos, os assassinos, os agressores, o lixo humano da cidade. Mesmo que todos aqueles adjetivos fossem naturais da burguesia corrupta, o Norte dançou conforme imposto e assim viviam sem esperança de dias melhores.

Hoseok era conhecedor da realidade em que sobrevivia, do que via e vivia lá dentro, de como eram tratados, mesmo que tudo o que quisessem fosse uma vida digna negada por capricho de potências.

Com o tempo, aprendeu que era seu distrito contra todos os outros, sem mais, então, que assim fosse.

Todavia, a situação ali era diferente. Suas intenções nunca foram ferir Yoongi ou seus companheiros, mas, sim, salvar sua pele. Ninguém sabia daquele detalhe e assim ele planejava continuar, pois, se na noite passada — enquanto não era nada mais que um pobre desavisado — já foi recepcionado daquela forma, imagine o que fariam consigo caso soubessem que o forasteiro também era um fugitivo da lei.

— ‘Tá me dizendo que eu não corro mais o risco de cortarem meu lindo pescocinho?

— Vou garantir que não.

— Hm…

Ficaram se encarando por um tempo, estudando um ao outro em um silêncio surpreendentemente confortável. Aliviados em encontrar ali, naquele espaço pequeno e abafado, os mesmos de quando se conheceram. Os mesmos estranhos que tiveram um jantar agradável regado a conversas que, agora, faziam mais sentido.

Não era como se apenas Hoseok estivesse batalhando para encaixar um detalhe novo sobre seu recém amigo — ainda eram amigos? —, até porque, quando Yoongi iria imaginar que um evento tão importante de sua vida seria marcado por sua ligação com um não-lupino?

Estava confuso, curioso, instigado e assustado.

Muito assustado.

Como faria? Como seria um relacionamento com Hoseok? O rapaz compreenderia o significado por trás daquela ligação em que estavam expostos? Seria abandonado pelo forasteiro e teria sua oferta de um amor duradouro negada?

Morreria se isso acontecesse, sem eufemismos.

Um lobo era muito apegado a conexão que a Lua faria entre suas almas, conexão essa que, se quebrada, exigia consequências. Nunca houve, na história, um relato que negasse o falecimento do homem após seu lobo definhar por dias antes de esvair-se.

E Hoseok e Yoongi estavam profundamente ligados, amarrados no enlace divino que os designou para ser.

Onde fosse e quanto tempo custasse, seriam.

Seriam diferentes, seriam estranhos, seriam almas buscando — consciente e inconscientemente — pela outra que lhe traria paz durante o resto de suas vidas, envolvidas num plano muito mais além do que qualquer um, se não quem o escreve, teria conhecimento.

Seriam homem e ômega se encontrando, seriam homem e ômega pintando suas peles com a tinta que vinha os tingindo por mais tempo do que imaginavam, seriam homem e ômega dividindo um banquete de alegria, seriam homem e ômega compartilhando a satisfação do primeiro e último toque, seriam homem e ômega finalmente se encontrando após tanto procurar.

Aquela certeza era tão concreta que arrepiava seus epidermes, acelerava o coração e suava as palmas inquietas por tocar, novamente. Era até mesmo engraçado como, de tudo, o que mais incomodava era a saudade de ter as mãos entrelaçadas num aperto carinhoso.

— Se eu me aproximar — ansioso, Yoongi inquiriu —, você não vai se incomodar?

Não demorou um segundo sequer para receber um acenar negativo como resposta, uma que entregava bem como Hoseok também queria aquilo, ainda que estivesse pouquíssimos instantes atrás  tremelicando de tanto medo daquele que engatinhou para si, vagarosamente. O de madeixas compridas se acomodou ao lado do Jung, deixando que suas pernas se encostassem casualmente, engolindo em seco ao se preparar para segurar as mãos alheias. No entanto, surpreendendo aos dois, Hoseok foi mais rápido em cruzar seus dedos entre a canhota de Yoongi, que prendeu a respiração em uma reação automática pela iniciativa do maior.

— Bom…

— Bom.

Era bom, era confortável, era certo.

Hoseok, aparentemente, entendia isso, então não precisava mais se preocupar, era isso?

“Não precisa de um lobo para ter um cheiro e presença agradável.”

Moon quebrou o show de gritos histéricos e vergonhosos que precisava ouvir Yoongi encenar no esconderijo de sua mente.

“Eu posso conviver mais que perfeitamente com isso.”

“Não seja cínico! O quis desde o momento em que colocamos nossos olhos sobre ele.”

“Só eu?”

— ‘Tô me arrependendo de ter reclamado daquele frio ontem — Hoseok verberou, atrapalhando a briguinha tola entre os ômegas sobre quem estava mais encantado pelo Jung. — Calorzinho desgraçado.

— Vou pegar água para que você se hidrate.

— Não precisa.

— Não está com sede? Fome? — buscou saber, preocupado com o bem estar do loiro agora mais relaxado. — Posso ir buscar alguma coi-

— Não! Não me deixa aqui sozinho, até pelo amor de Deus — se alarmou, apertando mais a mão de Yoongi quando esse se moveu para fazer o que dissera.

— Tudo bem, eu não vou — o acalmou, voltando a sua posição inicial. — Mas você precisa se alimentar.

— Eu ‘tô bem assim, só… não me deixa sozinho — suplicou, sentindo o medo piorar só com a possibilidade do seu único chegado deixá-lo desacompanhado.

Vai que invadem aquela cabana, arrancam sua cabeça igual fizeram com Aro em Crepúsculo e depois jogam os restos no rio? Não, não. Não podia arriscar.

— Okay. Ficaremos aqui com você. — Hoseok o olhou com estranheza, momentaneamente confuso com o emprego do plural na frase, até recordar da característica pra lá de peculiar do menor.

Aqui veremos outra particularidade sobre Jung Hoseok: ele era curioso.

Bastante curioso.

Do tipo que fica encarando algo que despertou aquele sentimento em si — do jeitinho que estava fazendo agora com Yoongi — com a face jogada para a lateral, olhos levemente arregalados escaneando seu alvo enquanto suas bochechas inflavam com ar e a corrente de perguntas que ansiava fazer, até ela se externar da forma mais discreta possível.

— Cara, como diabos tu simplesmente se transforma em um lobo? Foi mordido por um? Não dói? Onde ele fica?

— Ah. — Riu, achando adoravelmente engraçado a forma atrapalhada que o maior disparou as questões. — Pelo que eu entendi, o homem passou a conviver em união com o lobo desde os primórdios do universo, mas não sei exatamente como. Cada alcateia acredita em um mito, a minha fala de um casal formado por uma feiticeira e um caçador. Eles foram nossos pioneiros, infelizmente, assassinados pela família do homem. A deusa se compadeceu do casal e os concedeu o direito à vida, mas com a consequência de que eles e seus descendentes possuiriam lobos vivendo com eles.

— Quer dizer que não é a primeira vez que um maluco sem nada de lobo pisa aqui?

E lá estava a risada que gostava.

— Não… — confirmou, o mirando com uma coragem repentina ao murmurar: — Não é a primeira vez que um adorador da Lua se apaixona por um não-lupino e são abençoados por ela.

O loiro arregalou os olhos, deixou a boca escancarada num formato quase oval não fosse a forma de coração que seus lábios possuíam, completando sua reação surpresa.

— E quem foram os outros?

— O quê?

— Quem foram os outros que chegaram aqui e puderam ficar de boa?

“Ele está brincando, não é?”

“Eu acho que não…”

“Minha Selene, que alfa lerdo!”

“Não sabemos se ele é um alfa.”

Mencionou o fato, como se o lobo tivesse esquecido, entretanto, ele apenas não ligava para aquilo.

“É o meu alfa.”

— Enfim — falou, tentando disfarçar sua vergonha pelo fora não intencional do mais velho —, desde então, nós descendemos com a capacidade de nascer com um lobo em nosso cerne.

Ajeitou sua postura, virando para Hoseok e puxando suas pernas contra o seu peito, apoiando as mãos entrelaçadas sobre os joelhos. Tentou focar em brincar com os dedos mais finos que os seus, um pouco intimidado pelo olhar fixo que recebia agora ainda mais perto. Não calculou que sua nova posição os deixaria naquela situação, perto demais para dar margem a pensamentos perigosos.

Hoseok que o diga, preso no jeito em que Yoongi mordiscava o lábio inferior, deixando a área com uma tonalidade mais forte, chamativa e tentadora demais para seu eu o dizendo que beijar o ômega lhe traria mais problemas.

Mas, e se ninguém ficasse sabendo? Quer dizer, estavam sozinhos…

“Ele tá olhando 'pra sua boca!”

Dificilmente alguém teria soado mais animado que Moon ao expor o Jung. O animal estava a ponto de uivar de animação, não poupando a essência de tangerina sobre cada cantinho daquele casebre como um aval para o que ele sabia que Hoseok estava pensando.

“Não tá, não.”

“Yoongi, nosso destinado está claramente desejando um beijo. Não é hora para pensamentos negativos.”

“Moon!”

“Pula nesse homem ou eu farei isso.”

— Eu 'tô ficando louco — sussurrou, quase sucumbindo aos seus desejos. Yoongi levantou os mirantes, perdido.

— Desculpe? Não entendi.

— Eu disse que é muito louco esse negocio de homem meio lobo. — Abriu um sorriso amarelo, piscando rápido para se concentrar no que deveria fazer, não no que queria. — Pode continuar.

“Não acredito que você perdeu essa oportunidade…”

“Fica quieto e para de colocar ideia errada na minha cabeça.”

Moon bufou, inconformado com como aqueles dois demoravam tanto para agir logo. Os Lobos não eram assim. Uma cheiradinha aqui, outra ali, e ‘tá feito! Uma ninhada de filhotes e uma marca bonitinha no pescoço, sem frescura.

Seus resmungos foram ignorados por seu velho amigo, muito ocupado em fazer o que Hoseok pediu e desviar de acreditar no que Moon dissera.

— Ah, sim, sim. — Balançou a cabeça, se concentrando em lembrar as perguntas que foram feitas pelo seu acompanhante. — Só conhecemos nosso lobo quando ele se revela, e isso pode ser rápido ou demorar bastante. Eu convivo com o Moon desde a minha quinta primavera, quando ele finalmente se mostrou para mim.

“Cinco anos? Eu te acompanho desde o nosso nascimento!”

“Mas só mostrou sua presença quando eu tinha cinco anos, oras.”

“Você era estranho, eu não queria me misturar com um filhote esquisito.”

Zombou de seu hospedeiro, não assumindo que só demorou tanto porque tinha vergonha e medo de ser negado por seu humano, como ouvia seus pais contando ter acontecido com alguns de seus semelhantes.

“Cala a boca.”

Riu junto a Moon, esquecendo que era observado e que sua conversa era interna. Hoseok diria que ele estava louco, mas agora sabia que a situação era mais encabulosa.

— ‘Tá conversando com ele?

— Sim, perdão.

— Não, não precisa se desculpar é que… Sei lá, é bem mais fácil assimilar que uma pessoa conversa com as vozes na cabeça dela do que com um lobo, né?

— Preferia que eu fosse louco?

— De louco já basta eu, obrigado — rebateu, fazendo o ômega soltar outra risada para a sua satisfação pessoal.

Ah, que som gostoso… só quem ouviu poderia saber.

— E como é falar com ele aí na tua cabeça?

— Seria tranquilo se Moon não fosse tão falastrão — sua resposta veio acompanhada de um rosnado do animal, como planejou. — Estou brincando. Eu amo ter com quem compartilhar meus pensamentos e sentimentos, além de nunca me sentir sozinho.

— E ele é sempre assustador daquele jeito? — se referiu a noite passada e a fúria do lobo cinza, agora sendo ele a desenhar formas invisíveis na destra de Yoongi.

Confortável.

— Foi a primeira vez que agimos assim, Hoseok. Nem eu acreditei, depois que a adrenalina passou.

— Pensei que fosse um dos mais fortes da tua alcateia — brincou, limpando um filete de suor que escorria pela lateral do rosto sorridente e feliz por, além de lembrar de sua conversa durante o Leafde, Hoseok o cuidar e se mostrar relaxado em sua presença.

Muito confortável.

“Eu também quero falar com ele.”

Hesitou em atender o pedido em tom de ordem. Aquele ômega era muito desbocado e poderia colocá-los num poço de vergonha agonizante — para Yoongi —, e isso era apenas um dos motivos bastante aceitáveis para se negar a fazer aquilo.

“Nem ouse! Não seja maldoso, Yoongi.”

“Me prometa que não será indecoroso com ele.”

“Eu não sou isso, seja lá o que signifique.”

“Moon, estou falando muito sério.”

“Prometo ficar quieto, só quero me apresentar de forma correta.”

Yoongi não acreditava em uma letra sequer daquelas palavras, porém, não tinha o direito de negar ou impedir que seu lobo também tivesse um momento com aquele por quem estavam morrendo de amores.

— Moon quer falar com você.

— O quê?! — Seus olhos saltaram para fora, espantados. — E como eu faço isso? Posso entrar na tua mente?

— Se houvesse um lobo aí dentro — apontou para o peito do maior —, sim. Mas, como esse não é o caso, vou só deixar ele sair. Tudo bem para você?

— CLARO! Quer dizer — pigarreou, envergonhado por sua reação e como Yoongi riu por causa dela —, pode ser.

Qual é? Era um lobo falante e que dividia um corpo com o carinha que ele andava querendo beijar. Quais as chances de uma coisa dessas acontecer na tua vida?

Tá no paraíso? Bate asas com o anjo.

Observou Yoongi caminhar para o centro da casinha, fechando os olhos para se concentrar em evaporar seu constrangimento e não tornar a mutação em algo bizarro para seu espectador ansioso. Sentiu aquele mesmo desconforto de sempre ao que seu corpo foi se transformando completamente, modelando sua presença em algo subentendido para que Moon ficasse em evidência.

— Puta merda — Hoseok sussurrou, impressionado com a magnitude do ômega.

Continuava tão alto e corpulento como se lembrava, os pêlos tinham um tom de cinza mais claro naquele horário e era possível ver que a parte inferior — da barriga até um pouco abaixo do queixo — era da cor preta. Moon ficou parado por um tempo, permitindo que o homem fizesse sua vistoria completa e, assim, talvez não se assustasse com uma aproximação.

Para Hoseok, foi inevitável o sinal do seu cérebro o mandando sair correndo quando Moon se moveu com calma até quebrar o espaço que os separavam. Prendeu a respiração, assistindo o animal cheirar suas pernas, braços e cabelos na intenção de confirmar que, sim, seu parceiro estava bem.

Contrariando os alertas de possível perigo, o Jung levantou as mãos até tocar o vão entre os olhos púrpuras que lhe encaravam fixamente, acariciando a área de forma superficial com a pontinha dos dedos até ganhar confiança para espalmar sua destra ali enquanto usava a canhota para acarinhar a lateral do rosto peludo.

O lobo suspirou, satisfeito, soltando um bufar leve contra o rosto do rapaz entretido no que fazia. Se aconchegou mais perto do humano agora sorridente perante a imagem de Moon se inclinando ao seu toque, e, principalmente, sem qualquer sinal de que arrancaria sua mão fora.

Era como encontrar um Pitbull e descobrir só depois do susto que ele possuía uma personalidade dócil.

Moon ficou quieto, apreciando aquele silêncio bem mais do que uma conversa que poderia iniciar com o Jung, mesmo amando diálogos infindos. Entendia a enchente de informações que foram jogadas no colo que apoiou sua cabeça ao se deitar ao lado de Hoseok, sabia que, depois de tanto, uma calmaria viria a calhar.

Até porque, o dia estava só começando.

— Mano, se isso for um sonho, vai ter sido o mais louco que eu já tive em toda a minha vida.

Você é engraçado, alfa.

Deu um pequeno saltinho ao se assustar com a voz tão de repente, numa vibração estranha, como se soasse com um eco de fundo protegendo a sonoridade. Não era ruim, um pouco diferente do habitual, mas nada que o impressionasse mais do que já estava.

— Eu não sou um alfa. — Achou que seria importante lembrar, sentindo seu rosto queimar em vergonha pela resposta que recebeu.

É o meu alfa.

— ‘Tão, tá bom.

Ele que não era doido em contrariar um lobo daquele, ainda mais depois que o animal — que agora esfregava o focinho contra seu pescoço — quase arranca a cabeça de Namjoon fora para defendê-lo.

“Para de marcar ele sem consentimento.”

Yoongi repreendeu após notar o que o lobo atrevido fazia. Estava quieto, pois, não queria atrapalhar aquela cena tão adorável entre Hoseok e o ômega. Contudo, pelo que viu, dar liberdade demais ao animal não era recomendável.

“Ele é o nosso destinado, podemos fazer isso.”

“Não sem que ele saiba.”

Eu posso te marcar, alfa? — perguntou para o homem distraído em pensamentos enquanto afagava suas orelhas pontudas.

— Oi? — Fez uma careta cômica, estranhando a pergunta. Moon queria o marcar como? Será que… — Quer fazer xixi em mim?

Dessa vez, o lobo quem ficou confuso, sentando-se sobre as patas traseiras enquanto Yoongi explodia em uma gargalhada que só piorou a mente perdida do animal.

Por que eu iria urinar em você?

— Ué? Disse que quer me marcar. Não é assim?

Usamos nossos feromônios para isso, alfa — consternou. — Em sua antiga casa, as pessoas urinavam umas nas outras para marcar território?

— Não? Acho que não…  — Refletiu a frase de Moon com mais calma. — Como assim “marcar território”?

Preciso garantir que ninguém vai chegar perto de você, principalmente outro ômega-

Antes que pudesse concluir sua sentença, o corpo animalesco voltou a mutação rápida de um Yoongi afobado em não deixar o ambiente ainda mais constrangedor para o seu lado. Pensou que Moon fosse ter conversas mais produtivas com Hoseok e ajudar o loiro a se habituar com a presença de ambos.

Porém, esqueceu como Moon era, de fato.

“Eu não terminei minha explicação!”

“E nem vai terminar. Ficou louco?”

— Desculpa por isso — se apressou em dizer, preocupado em como o Jung se afastou um pouco para o lado, virando o rosto para a direção oposta. — Não liga para as coisas que o Moon falou. Não vamos sair te sufocando com instintos lupinos territorialistas, prometo!

— Não é isso, Yoongi — falou, puxando sua jaqueta para fora do corpo, finalmente encontrando uma tarefa útil para ela com aquele calor todo. — Você ‘tá pelado.

O ômega balbuciou um “ah”, puxando a peça estendida em sua direção para colocá-la sobre sua genitália. Não via problemas em ficar desnudo frente a Hoseok, sua mente e corpo já o reconheciam como parceiro, o que lhe poupava qualquer inibição daquele tipo para com o mais velho. Mas, aparentemente, o Jung não compartilhava de seu pensamento.

— E eu gostei do Moon — continuou, notando pela periférica que o menor já estava coberto, só assim o mirando novamente. — É o primeiro lobo que eu vejo cara a cara, e isso me deixou bastante encabulado. Mas, gostei.

Eu também gostei de você, alfa — a voz vibrante e a íris roxa entregou que a fala veio de Moon. Seu sorriso se desmanchou com o retorno da cor castanha aos olhos pequenos.

Esticou as pernas, passando a vista pelo casebre até se concentrar na paisagem exterior que dava vista para uma área limpa e mais distante das árvores. O sol brilhava ainda mais e ele sabia que já não era tão cedo como aparentava. Naquele horário, conseguiria voltar tranquilamente para a área civil mais próxima, que era a uns três dias de carro, mas ele precisaria fazer o trajeto a pé. Quem sabe, seus hóspedes não o permitiriam levar uma pequena quantidade de frutas e água? Seria o suficiente para sua viagem em busca de um novo lugar para viver.

Era inviável retornar para sua casa, não com a polícia fazendo rotas e vigia por ali na esperança de o capturar, caso voltasse. Além da agonia por abandonar a residência que, apesar dos pesares, o lembrava seu pai, Hoseok também sentia pelas pessoas que teriam que aturar aqueles abutres fardados circulando sobre suas cabeças, buscando a carne desejada enquanto beliscavam as que estivessem pelo caminho.

Sacudiu a cabeça, afastando aqueles pensamentos. Precisava resolver os seus problemas agora, dar um jeito em sua vida do zero e não faria isso preso naquela cabana enquanto se martirizava pelos amigos mortos e sua comunidade em decadência.

— E aí? — Fitou Yoongi, encontrando o menor já o encarando. — Quando eu vou poder ir embora?

— Quer ir embora? — Yoongi perguntou em um muxoxo.

Pensou que, depois de toda aquela conversa e momento amigável, Hoseok já havia tirado aquela ideia da cabeça, afinal, eram destinados.

Como ficaria longe dele? Não poderia!

— Não é por mal, não, Yoongi — coçou a nuca, nervoso —, eu gosto de ti. Desde o momento que a gente se conheceu eu me senti bem a vontade e tudo mais, o problema não é tu.

— Por que quer ir embora, se gostou de mim?

— Olha, eu não fui muito bem recebido pelos homens-lobos lá fora. Lembra que eu sou um puta medroso? Pois, é. Quero encontrar um lugar onde eu possa ficar seguro.

— Você estará seguro comigo.

— Não foi isso que rolou ontem.

— Mas-

— E eu também não quero te causar mais problemas — falou, segurando as mãos mais claras que as suas. — Se ter enfrentado teu lupis uma vez já foi ruim o suficiente, não quero te fazer repetir isso.

— Eu não me importo!

— Yoongi…

— Eu não me importo — repetiu, inflexível. — Faria tudo de novo e muito mais se isso significar que você vai ficar bem e comigo!

Hoseok apertou o cenho, incomodado por ser colocado como prioridade na vida daquele garoto que havia conhecido não tinha nem vinte e quatro horas. Não fazia sentido algum, ainda que buscasse por uma razão plausível para Yoongi querer jogar fora uma vida boa e cercada de amor e pessoas — lobos, enfim — que queriam o seu bem.

Era um ser humano, uma pessoa que escondia suas inseguranças, sim, mas não conseguia apagá-las. E uma delas era o medo de destruir a vida de todos que se aproximavam demais. Parece ilógico, mas ele tinha essa ideia fixada no fundo da sua mente de que ele estava afundado na merda e todos que fossem tentar lhe salvar acabariam no mesmo destino.

Por isso, se incomodou.

Se incomodou porque Yoongi tinha o que muitos, inclusive ele, gostariam de ter. E vê-lo desdenhar de tudo por um Zé Ninguém lhe deixava perturbado, irritado, sensibilizado e preocupado. Não queria ter mais ninguém se ferrando por ele, porém, lá estava Yoongi correndo para a borda do precipício que Hoseok via, como se fosse nada.

— Mas eu me importo — redarguiu, calando o mais novo. — Tu tem uma vida boa aqui, não tem? — Yoongi acenou. — Então? Por que estragar isso por alguém que mal conhece?

— Sabe o que eu estava fazendo em cima daquela pedreira?

Hoseok achou que Yoongi estava tentando mudar de assunto e iria repreendê-lo sobre isso, porém, o rapaz continuou sem esperar sua resposta.

— Existe um ritual em minha alcatéia que diz que todo ômega com vinte e duas primaveras pode participar dele para encontrar seu companheiro de vida, aquele escolhido e enviado pela própria deusa.

— Porra, eu atrapalhei isso também? — Se sentiu terrivelmente culpado.

— Hoseok, o meu destinado seria aquele que chegasse primeiro até mim.

— Mas não tinha ninguém lá contigo.

Silêncio.

Mais silêncio.

— ESPERA AÍ! — berrou, soltando as palmas alheias ao ficar de pé num pulo só. — Tá querendo dizer que eu…?

— Fizemos todos os passos do ritual e recebemos a benção da Lua.

— Eu não lembro disso, não!

— A tinta em nossa pele brilhou, Hoseok!

Ah. Ah. AH!

— Puta merda — sussurrou, atômico. — E tu não pode fazer esse ritual com outra pessoa?

Dessa vez, Yoongi se levantou, dando a mínima em continuar cobrindo sua nudez. Hoseok gostaria de apontar aquele fato, entretanto, o olhar magoado  que recebia não lhe dava muita abertura.

— Está me rejeitando, é isso?

— Quê?! Eu não tô rejeitando ninguém. Só não acho que, de tanta gente nesse mundo, algum deus aí decidiu que a melhor opção seria eu.

— É tão ruim a ideia de estar ligado a mim que prefere até mesmo me ver com outro?

— Não! — exclamou, fazendo uma careta incomodada. Yoongi já se irritava ao passo que Hoseok se desesperava. — Não é isso que eu ‘tô querendo dizer.

— Pois, não parece.

— Yoongi, eu não acredito que você seja tão odiado por uma divindade a ponto dela te ligar a mim. — O lupino franziu o cenho, enquanto Hoseok esfregava o rosto com força.

— Do que está falando? Seja mais claro, por favor.

— ‘Tô falando que eu sou um fodido! Não tenho onde cair morto, e olha que eu ‘tô sempre sendo ameaçado de morte. Não posso voltar pra minha casa e o pior é que não tenho alguém me esperando porque a porra do meu destino não é encontrar um cara bonito e divertido numa noite estrelada. Não é descobrir que alguém lá em cima finalmente olhou pra mim e me deu a chance de ser feliz — apontou para Yoongi, os globos oculares já brilhantes enquanto a face era tomada pelo vermelho —, é ficar sozinho — sequer notou as lágrimas escorrendo para fora de seus olhos enquanto fazia aquilo que não praticava desde a morte de seu pai: desabafar. — Além disso, provavelmente, a morte é o preço que todos têm que pagar sempre que se aproximam. E, se existe mesmo essa deusa, porque ela iria me colocar na tua vida, sabendo disso?

Yoongi não respondeu verbalmente, sabia que não seria ouvido e que palavras não eram o que Hoseok estava precisando. Assim, puxou o Jung de encontro a seu peito, enlaçando o corpo maior que o seu num abraço apertado e carinhoso. Hoseok demorou segundos para processar a situação, respirando fundo antes de soltar toda a carga líquida sobre os ombros oferecidos para acalentar suas feridas emocionais.

Não lhe pergunte os motivos exatos por seu pranto, ele não poderia dizer. Só sentia o seu desconhecido desmanchando para fora do seu corpo, lavando e levando grande parte da sujeira entulhada ali desde a sua adolescência. E, céus, se não tinha a certeza de que precisava de um abraço, agora tinha os dois.

E chorou.

Soluçou alto enquanto ouvia Yoongi sussurrar que ficaria tudo bem¹, envolvido demais naquele conforto para perceber a porta sendo aberta por um dos guardas, que logo foi enxotado pelo ômega.

Como foi parar ali? Por que diachos começou a falar tudo aquilo e chorar como um bebezinho para alguém que acabou de conhecer?

— Não seja tão cruel consigo mesmo — Yoongi falou, longos minutos depois, ao notar que o loiro estava mais calmo. — Não acha que o mundo já fez isso o suficiente?

Enxugou as lágrimas de Hoseok, fez aquilo com tanto cuidado e atenção, sorrindo docilmente ao ser encarado por olhos chorosos. E ali estava a parte que Hoseok não costumava mostrar, a parte fragilizada, a parte que ao menor dos toques se desmanchava em lágrimas, a parte que sentia falta de ter alguém se importando o suficiente para não ligar para aquele berreiro todo.

Outra vez, Yoongi o via de verdade.

— Seja gentil consigo a ponto de saber que alguém olhou por ti e decidiu que, o que quer que você estava passando, deveria ter um fim — foi ouvido com atenção, como se estivesse contando um dos seus segredos mais profundos. — Uma pessoa, uma divindade, o que for. Você tem três querendo fazer isso, porque vai nos repelir?

— Vocês vão sofrer.

— Não — negou, com afinco. — Você vai ser feliz.

Hoseok abaixou a face, numa guerra interna bastante acirrada entre acreditar ou não no que lhe foi dito.

Depois de tanto tempo, porquê só agora encontraria felicidade? E se não fosse? E se estivesse se iludindo? E se estivesse se precipitando? E se, no final, tivesse razão e Yoongi tivesse um fim trágico? E se? E se? E se?

— Não precisa decidir agora, hm? — continuou a soprar suas palavras de conforto e sinceridade. Seu coração sangrava ao ver o estado abatido de Hoseok, mas ali estava um de seus papéis como companheiro: apoio. — Mas, se me permitir, eu posso ser um amigo para você, antes de qualquer coisa. Já estamos ligados, isso é irreversível. E entendo se a ideia for muito para você, só que ainda podemos ser bons amigos, não podemos?

A pergunta ficou em aberto, sem um retorno negativo ou positivo.

Sua oferta requeria muito de Hoseok e ele precisava pensar, tirar um tempo para organizar sua mente e Yoongi respeitaria isso.

O esperou por longos anos, faria isso um pouco mais.

— Yoongi?

Se assustaram em conjunto pela entrada repentina na cabana, envolvidos demais em uma  troca de olhar que buscava uma direção dentro de tanta bagunça. Minji os analisou, levantando as sobrancelhas ao notar que o filho se encontrava pelado e próximo demais do forasteiro.

— O que…?

— Ah — o ômega murmurou, tentando amarrar a jaqueta em sua cintura. — Moon.

— Entendi. — Acenou, retirando seu cardigã verde e mais eficiente em cobrir o rapaz. — Vim buscá-los, nossos lupus nos aguardam.

— O que ele quer? — Hoseok voltou a se preocupar por saber que seria levado até o líder.

— Está tudo bem, Hoseok — Yoongi afirmou, se compadecendo do temor alheio. — Eu vou ficar com você o tempo todo, prometo que ninguém te fará mal. E, se tentarem, você sabe que eu vou te proteger, não sabe?

As íris ficaram púrpuras, a mesma cor dos olhos do lobo que pulou em sua frente com determinação e não se afastou desde então.

Independente de qualquer coisa, Yoongi era sua única garantia de resguardo pessoal, e ele nem estava falando sobre a reunião com o restante da alcateia.

O olhou como olhou para aquela pedreira no momento em que buscou segurança, ainda letárgico pelo abraço e palavras derramadas contra sua pele, mente e alma. Parecia impossível que Yoongi pudesse lhe causar tantas sensações boas  em pouco tempo de convivência, como se, na verdade, se conhecessem há décadas.

No final, talvez, não precisasse ir tão longe para encontrar sua nova casa.

✶⊶⊷⊶⊷❍⊶⊷⊶⊷✶

"Um dia, quando a campainha tocar três vezes, você vai abrir a porta pra que eu possa dizer aquelas palavras que não consegui ainda?
Eu as direi, então."

¹ Quem entendeu chorou junto com o Joseok, quem não, é uma referência a música Snooze do Yoon.

O que acharam do capítulo, lobitos?

Já peço desculpas por algum erro que eu deixei passar. Não consegui corrigir o capítulo com muita atenção porque, além de estar doente, perdi minha cachorrinha e fiquei bem meh. Assim que estiver mais okis, faço uma segunda revisão.

Também gostaria de me desculpar pelo atraso. No último momento, tive um surto e apaguei o capítulo que já estava praticamente pronto porque não achei que tava bom. Por sorte, consegui escrever mais da metade dele em um só dia e a atualização veio antes de 2024.

A história, finalmente, entrou na reta finalíssima. Não sei se comemoro ou choro. LM, como dito lá nos avisos, deveria ser beem curtinha (no máximo 3 capítulos), mas aqui estamos nós no quarto e seguindo para o quinto. Tô desconfiando que tá muito corrido o desenvolvimento dos sope, porém, o planejamento inicial era o Hoseok já concluir o ritual (cerimônia oficializando o casamento) ainda na noite que ele encontra o Yoongi, que meus personagens cagam e andam para os meus planejamentos 🙄

Enfim! Estou sem uma data de postagem do cap 5, até agora, qualquer coisa dou um jeitinho de avisar vocês.

Aliás, temos um grupo de whatsapp para que eu possa estar atualizando vocês sobre a história, data de postagens e etc (além de jogar conversa fora). Caso alguém deseje entrar, é só me chamar na DM e eu adiciono.

Tenham um bom final de semana e até a próxima 💜

Com amor,
Dri.

Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top