ㅤㅤ✷ 04

"It only hurts this much right now"
Was what I was thinking the whole time
Breathe in, breathe through, breathe deep, breathe out
I'll be getting over you my whole life

Demorou um pouco para ele se acostumar com toques físicos, uma tarefa árdua quando se tem Ethelyn Rivers como melhor amiga – ele conseguia ouvir a risadinha estúpida dela só de imaginar que admitiria isso algum dia. E, por mais que quisesse dizer que odiava sentir a pele grudenta dela em dias de calor ou se controlar para não brigar quando ela simplesmente enfiava as mãos geladas por debaixo de sua camisa, Severus, incrivelmente, acabou se acostumando.

No verão, Severus arregaçava as mangas e jogava sua túnica debaixo de uma árvore alta, com galhos grossos o suficiente para oferecer sombra até mesmo sob o sol intenso. Severus acreditava ser um lugar perfeito: fresco, com uma vista para o lago e longe dos Marotos. Sempre que Ethelyn aparecia ela se jogava ao seu lado sem cerimônia. A cabeça pousava em seu colo, aquecendo-o, enquanto os dedos inquietos cutucavam sua camisa ou o braço, acompanhados de algum comentário empolgado sobre o livro que estava lendo.

Ela sempre tinha algo a dizer – fosse sobre os personagens ou sobre como ele "deveria ler" o mesmo livro porque ela sabia que ele ia gostar, mesmo quando ele claramente não queria admitir. Severus resmungava, fingindo impaciência, mas nunca pedia para ela parar.

Nos dias frios, ele se preparava para os ataques inesperados de Ethelyn, já separando um suéter grosso para impedir que ela o congelasse e enfiava um par extra de luvas – sem furos – em seu bolso. le sabia que, por mais teimosa que fosse, ela nunca recusaria uma caneca de chocolate quente – especialmente se ele a conduzia a um banco próximo à cozinha, onde o aroma doce da bebida iria fazê-la se levantar e arrastar ele até a entrada do quadro.

Quando ela finalmente surgia com o rosto avermelhado pelo frio, Severus a recebia com um gesto irritantemente típico: jogava as luvas extras nela e soltava alguma provocação.

─ Até o Nick Quase Sem-Cabeça teria mais bom senso do que sair pelos corredores com só o uniforme, se ele ainda estivesse vivo.

─ Vai se fuder, Sevy

Ele contava as horas para a chegada de Ethelyn todos os dias. Era assim, sempre. Sem exceção.

Até que não foi.

Ele ficou alguns minutos na sombra, sentindo o suor escorrer pela testa e se incomodando com o pinicar da grama. Ainda assim, manteve-se irredutível, ignorando os chamados de Pandora, que balançava as mãos e mostrava pergaminhos – provavelmente tentando convencê-lo a estudar. Ele recusou. Era o momento dele e de Ethelyn, e a última coisa que queria era lidar com uma crise de ciúmes dela caso aparecesse e não o encontrasse ali.

Batucou as pernas, puxou algumas gramas e até xingou e azarou um primeiro-anista que quase o atropelou enquanto corria de um colega. Seu humor decaía; ele estava ficando ranzinza. Estranhamente, não estava com fome, mas o estômago revirava tanto que ele chegou a sentir frio. Aquela sensação incômoda só passou quando viu Ethelyn Rivers correndo em sua direção, sem maquiagem, mas ainda incapaz de andar em linha reta – quase tropeçando e caindo em cima dele, como o primeiro-anista antes.

Dessa vez, no entanto, Severus apenas riu.

─ Sabia que ia te achar aqui! ─ É claro! Severus quis gritar, mas manteve-se quieto e mostrando uma carranca indiferente. ─ Acabei perdendo a hora, estava conversando com a madame Pomfrey.

─ Sobre? ─ Virou mais uma página e finalmente pôde respirar quando sentiu os fios de cabelo dela se espalhar pelo seu colo.

─ Eu queria saber se ela estava aceitando aprendizes... ─ Com uma liberdade que só Ethelyn tinha, ela começou a revirar a mochila dele e puxou uma garrafa de água – um acessório trouxa que Severus carregava. ─ Nosso último ano está quase acabando, preciso começar a procurar cartas de recomendação.

O corpo dele ficou tenso, que muito tenta se esquecer daquele assunto impertinente. Suas aulas estavam acabando, a vida adulta estava batendo na porta de cada um e Severus seria logo o próximo, consequentemente, Ethelyn também. Respirou fundo e tentou se ajeitar de novo, sem chamar atenção da garota que repousava a cabeça em seu colo, mas ela logo notou seu estresse.

─ Qual é Sevy, você vai se dar bem em qualquer lugar que vá. ─ Deixando isso no ar, o sonserino agradeceu silenciosamente pelo livro. Pelo rosto escondido e quente, Severus logo entendeu como odiava elogios. ─ Oh, espera, o que você quer fazer?

Ethelyn tirou o livro do rosto dele, e, quando Severus abriu a boca para reclamar, foi rudemente interrompido mais uma vez.

─ Já sei! Eu aposto que você quer fazer poções, talvez professor? Nossa você seria um péssimo professor, sem querer ofender...

─ Não ofendeu.

─ Mas acho que você se daria bem com pessoal mais velho, tipo o pessoal dos últimos anos! Pra você, os primeiros anos seriam um desafio, pois você vive falando que eles têm o cérebro do tamanho de uma semente de abacate.

Severus sabia que não gostaria de ser professor, pelo menos não de Poções. Se fosse ensinar, escolheria Artes das Trevas – um assunto que o fascinava desde sempre, com suas complexidades e segredos. Porém, era também um lembrete amargo da ruptura entre ele e Lily, uma ferida que nunca cicatrizou completamente e o fazia evitar a matéria com um misto de mágoa. Sem contar a suposta maldição associada ao cargo, embora ele tivesse visto a Professora Tauris completar um ano e seis meses no posto, aparentemente ilesa.

O que Severus realmente imaginava para si era algo mais discreto. Via-se fabricando poções, transformando uma lojinha em Hogsmeade ou no Beco Diagonal em seu apotecário, repleto de frascos brilhantes e aromas intrigantes. Podia até sentir o cheiro do caldeirão borbulhando no andar de cima enquanto os corredores estreitos ficavam cheios de clientes – bruxos curiosos, curandeiros em busca de ingredientes e, claro, os adolescentes desastrados que ele faria questão de xingar ao menor deslize.

Apenas não admitia em voz alta como sempre havia uma presença em cada um dos seus cenários estúpidos. Era impossível ignorá-la. Se desviasse o olhar da miragem, ela logo tomava sua visão por completo, como se fosse uma parte indissociável de seus sonhos – e de suas memórias.

Enquanto Ethelyn balbuciava sobre o próprio futuro, o contraste entre a leveza dela e o peso de seus pensamentos era quase sufocante. Ele começou a perceber pequenos detalhes: o modo como a voz dela oscilava quando falava sobre o medo de não conseguir cuidar de algum paciente específico, a maneira como suas mãos se agitavam ao gesticular e sempre acabava esbarrando nos dedos dele, segurando firme antes de se soltar, com o brilho nos olhos sempre tão vívido. Esses detalhes, tão banais para qualquer outra pessoa, o faziam engolir em seco.

Era estranho – inquietante, até – perceber como ela estava tão entrelaçada em sua vida que ele simplesmente não conseguia imaginar o próprio futuro sem risadas escandalosas e fios de cabelo loiros balançando ao vento. Mais estranho ainda era notar que Ethelyn, ao que tudo indicava, não compartilhava dessa mesma visão.

Severus suspirou, o peso do próprio silêncio o pressionando, e perguntou de repente: ─ Ei, quer fazer uma aposta?

Ele não sabia se era uma fuga ou uma tentativa desesperada de prolongar aquele momento. Mas valia a pena, enquanto pudesse vê-la sorrir por mais algum tempo.

ㅤㅤㅤㅤㅤ

ㅤㅤㅤㅤㅤ

Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top