Capítulo 20

Haenim, Reino da Luz. Hyunggwangshi, Clã da Luz, 01-12-982.

— O que ele está fazendo parado no meio da neve? — Palk perguntou à Jo Han, vendo In Su acumular neve enquanto olhava para o rio pouco congelado.

— Fazem dois anos, senhor — Jo Han estranhou que a divindade tivesse esquecido.

— Entendo — pigarreou. — Que péssimo dia para um encontro com os Vulpinos, não acha?

— Certamente, pouco agradável. — Jo Han cerrou os dentes, forçando um sorriso.

— Vá tirar seu afilhado da neve. Ainda temos tempo até que cheguem — Palk apontou com a cabeça para In Su.

O general fez uma leve mesura e desceu correndo a escadaria do castelo, chegando ao garoto com o máximo de cautela e iniciando um diálogo que Palk não ouvira.

Sorriu tristemente ao ver a criança enxugar suas lágrimas e abraçar o meio Kumiho, claramente abalado com as memórias daquele dia.

— Palk. — Uma voz feminina o chamou e, imediatamente, um sorriso foi pintado nos lábios do deus.

— A que devo a honra de sua materialização, Haenim? — ele virou, cruzando os braços e observando a deusa de longos cabelos louros, arrastando ao chão, e pele levemente amarelada.

Os olhos da deusa, puxados como quase jurasse que estavam fechados, brilhavam em uma luz esbranquiçada e ela sorriu.

— Honra nenhuma — retrucou. — Vim para uma conversa.

— Aos meus aposentos? — o deus sugeriu e ambos adentraram os corredores do palácio.

Haenim sentou-se à borda da cama de Palk, apoiando a cabeça entre as mãos e suspirando pesadamente. De imediato, as feições do deus se fecharam numa carranca preocupada; já sabia do que se tratava.

A deusa abriu um olho e o fitou por cima, dando-lhe um sorrisinho melancólico.

— Não me olhe assim, já estive pior — sorriu com os lábios, ficando ereta, e o deus sentou-se ao lado, pegando a mão dela e vendo a coloração um pouco arroxeada pelos dedos.

— Está morrendo — Palk constatou rispidamente. — Acho que meus esforços não estão sendo o suficiente para conter as investidas de Kud, se já está lhe atingindo dessa forma.

— De certo, as coisas estão complicadas. O maldito miasma que matou o terceiro dos planetas baixos era mais forte do que imaginei — Haenim asseverou num tom preocupado. — Mas não vim apenas para falar coisas que ambos já sabemos. Proponho uma medida mais radical.

— Sabe que não posso tentar uma purificação de grande escala — Palk arqueou uma sobrancelha, numa expressão apreensiva. — Posso acabar matando alguns que estiverem infectados.

— Por isso devo propor... — Haenim suspirou — precisamos ressoar de novo. O planeta está em decadência e não podemos continuar com isso. Abrimos um escudo pelo Reino da Luz e nos protegemos dos ataques infernais até que nossa dinastia esteja como um novamente...

— Sabe que não poderei sequer sair do palácio com isso? Mal poderia me mover até que o escudo fosse consolidado! Como protegeria meu povo como uma estátua? — Interrompendo a fala dela, Palk bradou. — Não é digno que eu me mantenha fora de uma luta por meus atos sob o pretexto de protegê-los. Já fui omisso o suficiente aos assuntos dos meus filhos.

— Suas escolhas, Palk, infelizmente irão repercutir nos assuntos dos seus filhos até o fim dos mundos. Aja como o deus dessa dinastia e proteja eles dos assuntos de outros deuses. Por mais que seja revoltante que não faça nada, deve escolher entre salvá-los de morrer pelo aço ou pelo ar.

Quando Haenim pronunciou tais palavras, a figura dela brilhou uma última vez e focos de luz dançaram pelo ar antes de desfazerem. Palk ficou sozinho, ponderando tais palavras.

"A responsabilidade de um deus, Palk, não é proteger todos do sofrimento. É ter o discernimento de qual sofrimento eles poderão aguentar e qual você terá que os livrar."

As palavras proferidas por Hae Tae no início do PyeongHwa ecoaram por sua mente... escolher o sofrimento.

Toc. Toc. Toc.

— Senhor — Jo Han o chamou. — Sinto lhe incomodar, mas Hwan Yeo chegou e lhe aguarda na sala do trono.

— Mande-o para a de reuniões. Sentar num trono e agir como um prepotente arrogante agora seria entregar minha cabeça a ele — Palk obtemperou com um sorriso fraco, já se pondo de pé e apertando as têmporas. Uma dor de cabeça se aproximava com a tempestade de neve que cairia no mais tardar. — In Su?

— O levei para junto de Min Sun. Está calado como mudo e se recusa a comer — Jo Han constatou firmemente. — Espero que In Seok vá até ele e aja como um pai, ao menos nesse dia.

— Não acho que o coração ferido dele será o que In Su precisa agora — Palk foi até o general, pondo as mãos aos seus ombros, e sorriu. — Fique com ele. Me acerto sozinho por hoje.

— Mas senhor... — a divindade negou com a cabeça e seguiu até aos balneários.

A discussão daquele momento ditaria se conseguiria amenizar o sofrimento dos filhos ou acender mais vigorosamente a chama do ódio dos seus atuais inimigos.

Lavando seu rosto com água em abundância, Palk manteve-se sério.

"Tome sua responsabilidade como deus" se auto afirmou, convicto, e, à firmes passos, seguiu à sala de reuniões.

Ao abrir a porta, a figura impassível de Hwan Yeo estava sentada à outra ponta da grande mesa, junto a Kwan Seok e Kyong Nam.

"Ótimo trio..." Palk quase riu, mas apenas sentou-se próximo o suficiente, quando a porta abriu mais uma vez e Hyun Seung adentrou, fazendo uma pequena mesura e se aproximando do deus.

— Apenas por segurança, senhor — justificou à sobrancelha arqueada da divindade, que acenou com a cabeça para que ele sentasse ao seu lado.

— Imagino que saibam o porquê de tê-los chamado aqui. — Palk anunciou com um tom duro, beirando à indiferença.

Por mais compostos que os Vulpinos aparentaram, Hyun Seung sentiu uma pitada de apreensão em suas feições, para o seu deleite. Por mais que negassem sua divindade, seus corpos ainda sentiam e temiam a presença e fúria do deus.

— Após anos se negando a conversar, vejo que finalmente tivemos o que pedimos — Hwan Yeo alfinetou num tom pretensioso. — Mas receio que não estamos mais abertos a um diálogo.

— Então planejam começar a destruir a nossa dinastia, deixando-nos aos cacos para enfrentar os exércitos de Kud e deixá-lo nos destroçar...? Quanta responsabilidade para ditos líderes — as palavras ásperas de Palk retumbaram pelo recinto como um brado alto. Os olhos róseos da divindade cerraram ao ver um sorriso se formar nos lábios do líder vulpino.

— Não passe vossa responsabilidade para nós! — anunciou, quase gritando. Palk manteve-se calado. Não falou uma palavra. Sabia que, se falasse qualquer coisa para interrompê-lo agora, deixaria Hwan Yeo mais furioso ainda. — Os problemas da dinastia perduram desde os tempos ancestrais, antes mesmo das dinastias serem formadas. Se aceitou tal jogo com Kud, lide com as consequências pela dor do seu povo.

— Mas não vejo motivos para a carnificina que os seus promovem. Se alguns nutrem ideais diferentes, cabe a você como cidadão do Reino da Luz respeitar até o mínimo Syhah Thomüt! — Palk bradou com firmeza. — Sei meus erros como divindade por ter acatado as ações do meu irmão, mas meus erros não justificam suas transgressões!

— Uma divindade nunca deveria pôr a vida dos filhos em risco por mero capricho de um jogo! — Kyong Nam retrucou, levantando-se e, de imediato, Hyun Seung se pôs de pé, levando a mão ao pomo da espada à sua cintura.

Palk levantou a mão num gesto para que ele parasse e acenou com a cabeça, fitando os Vulpinos.

— Sinto que não estamos aqui reunidos para uma discussão infundada como tal — o deus da luz começou em tom brando quando a anciã voltou ao seu assento. — Tenho uma proposta.

— Tente a sorte, talvez estejamos abertos a ela. — Hwan Yeo riu, ciente de que, naquele momento, Palk estava mais desesperado para proteger o seu povo do que ele por qualquer coisa que viesse a oferecer.

— Tenham sua supremacia. — Ao por tais palavras para fora, os demais integrantes da sala sobressaltaram em seus lugares, espantados com a mera menção de uma supremacia. Hyun Seung quase refutou, quase. Quando se fez que levantaria, Palk interrompeu concluindo sua fala: — Apenas se ganharem a guerra contra meus Imperiais.

— O que? — Hyun Seung quase gritou, mas logo voltou à sua compostura e pigarreou, se aproximando de Palk. — Senhor, planeja continuar com a guerra?

— Apenas ouça, General líder — a expressão de Palk nunca esteve tão dura como naquele momento. Rígido e imutável. Não iria negociar. Aquela era sua proposta, e assim seria. — O que quero de vocês é apenas uma coisa, por permitir ou cogitar em acatar sua ideia extremista. Parem de atacar as cidades. Faça ser uma luta entre guerreiros e não sejam sujos para atacar homens desarmados. Essa carnificina já foi o máximo que eu pude aguentar calado.

— Sugere que lutemos apenas contra nós mesmos? — Kwan Seok indagou, com um sorriso. — Não nos impede de novos recrutas?

— Contanto que sejam seguidores e não impostos, recrutem quem quiserem. Apenas não ataquem as vilas e cidades. — Palk assentiu, tamborilando os dedos na madeira da mesa. — O ganhador poderá impor seu ideal para o perdedor e, com esse trato, aceitarei o resultado da guerra. Aquele que perder será seu ideal banido e não se falará mais dele.

Alguns momentos de pleno silêncio se sucederam e as palavras de Haenim ecoaram por sua cabeça, o deixando enjoado. "Ressoe comigo".

— Claramente, não irei interferir — completou em resposta aos olhares desconfiados. — Conterei os infernais até que tudo seja decidido.

— E se não aceitarmos? — questionou o líder ancião após ouvir os cochichos de Kwan Sook.

— Verão a fúria de um deus — respondeu de imediato, calando as bocas dos inimigos. — Odeio quaisquer modos de imposições de pensamento ou ameaça bélica, mas não posso mais permitir que destruam minha dinastia. Se desejarem pelo caminho de espinhos e carnificina, terminarei com o sangue lavando as ruas de Kodaeshi.

Um suspiro. Hwan Yeo ponderou pelos próximos segundos e suspirou mais uma vez. Ouvira lendas sobre a fúria destrutiva de Palk em várias cantigas antigas, cantadas pelas velhas das vilas da Terra, certamente não gostaria de provar daquilo. Temeu.

— Que assim seja — anunciou, levantando-se e reverenciando, já se dirigindo à porta.

— Assim será, senhor? — Hyun Seung questionou quando a divindade se pôs de pé, exasperando pela dor de cabeça que o assolava.

— Assim será, general. Prepare seus exércitos. Darei meu apoio até quando a primeira espada for levantada — anunciou, já indo até a porta, parando ao segurar a maçaneta. — Pode me orientar a fazer um chá ideal para dores de cabeça?

Com o sorriso habitual, coçou os cabelos róseos e passou os dedos pelas cicatrizes à sua bochecha. Hyun Seung se levantou e o acompanhou, com um aceno positivo, rindo:

— Senhor, como pode ser tão bom em muitas coisas e tão desajeitado com relações culinárias?

— Está questionando sua divindade? — ele arqueou a sobrancelha e Hyun Seung encolheu os ombros de forma confortável.

— Nunca ousaria.

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Haenim, Reino da Luz. Hyunggwangshi, Clã da Luz, 23-06-983.

— Já foram resolvidos, senhor. — In Seok avisou, pela terceira vez, sobre os papéis os quais Palk se perdia lendo.

— Não estou lendo os papéis. Não de novo — justificou a divindade, pressionando as têmporas após apoiar o cotovelo à mesa de cedro claro. — Por que está aqui em um dia como esse?

A voz dele soou quase num rosnado por ter falado entredentes, já com o olhar denunciando uma certa indignação. In Seok, mais uma vez, suspirou e depositou os pergaminhos próximo à Palk, sentando-se ao lado.

— Sei que é aniversário de In Su. — Respondeu já ciente de que se tratava a carranca na testa do deus.

— Então não me venha com desculpas para estar perdendo seu tempo vendo minha cara, que já vê todos os dias, todas as horas, em vez de estar passando um tempo com sua cria — se endireitou na cadeira, juntando as mãos e o lançando um olhar irritado, na tentativa de enxotá-lo do palácio.

— Não posso — a resposta foi mais afiada que um gume que acabará de sair de uma forja, fazendo uma carranca se formar nas feições de Palk.

— Tenho ciência do seu luto e o quão difícil é encarar o menino pela semelhança dele com sua mulher e pela promessa que quebrou, mas não é certo deixá-lo sozinho daquela forma! — dessa vez bradou. — Sabe que o garoto vai ressentir com você até o fim dos seus dias. Jo Han está sendo o pai daquela criança.

— Eu amo o In Su com todo o meu coração... — respondeu tristonho, dando um sorriso quebrado de canto — e por amar ele, não posso ficar com ele.

— Faça algum sentido pelo amor dos mundos — Palk revirou os olhos voltando a pressionar as têmporas, dessa vez, com as duas mãos.

— Ryo Su queria que ele não lutasse. Eu não quero que ele lute — começou a sua explicação após tomar um pouco de fôlego e coragem. — E por isso estou fazendo de tudo para resolver essa maldita guerra civil. Para que ele não tenha que lutar.

— Sabe do destino na criança... deveria ajudá-lo a vencer seu trauma pelas espadas. Se afastando desse modo, apenas o enfurecerá mais — objetou com uma voz cansada.

— Por saber que é impossível que ele não lute, faço de tudo que, ao menos dessa luta, ele fique longe — com um arqueio das sobrancelhas, Palk demonstrou sua surpresa à declaração do conselheiro, que não ousou, em momento algum, o olhar nos olhos. — Mas sei que ele lutará... sei disso, mas quero que ele fique longe.

— É um pedido nobre. Mas sabe que irreal. Se quer proteger seu filho de verdade, ensine a ele como lutar. Pelo que acredita, pelo que ama e pelo que almeja.

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