Capítulo 10

Flashback ON

Leonard, de 7 anos, havia recebido uma carona para casa, porque sua mãe tinha demorado muito para buscá-lo na escola. Ao chegar, ele tocou a campainha, mas ninguém atendeu, então ele pegou a chave extra escondida no vaso de planta e entrou em casa

— Mamãe? Mamãe? — Leonard chamou algumas vezes, mas nem sinal dela. Ela tinha saído?

Não. Se ela tivesse saído teria deixado um bilhete na geladeira.

Leonard foi deixar a mochila no quarto e passou pelo quarto da mãe, que a porta estava aberta. Ela estava deitada no chão e o quarto estava sujo com vidro e um líquido roxo. Provavelmente suco de uva. Aquela imagem assustou o pequeno Leonard, mas ele foi devagar em direção a sua mãe, com cuidado para não pisar no vidro

— Mamãe? — ele encostou nela, e seu corpo estava muito frio. Leonard começou a estremecer — Mamãe?! Mamãe, por favor acorda!

Ele deu tapinhas no rosto dela, mas ela não se mexeu.

— Mamãe não me deixa, por favor! Volta!

Ele se deitou no chão sem se preocupar mais com o vidro, e alguns pedaços rasgaram sua pele, mas ele não se importou. Aquilo não doía nada comparado ao que ele sentiu quando viu sua mãe deitada sem vida.

Leonard começou a chorar e a gritar tanto, que chamou atenção de seus vizinhos. Eles o levaram para longe da mãe e chamaram por ajuda. Uma ambulância chegou, mas Leonard sabia que era tarde demais. Eles levaram Leonard junto para cuidar das feridas nas costas do menino. Felizmente, não foi um ferimento grave, mas ele tinha perdido muito sangue e ficaria com cicatrizes pelo resto da vida.

No hospital, as pessoas olhavam para o menino e não sabiam o que fazer. Ele perdeu a mãe muito novo e não tinha mais ninguém. Ou pelo menos foi o que pensaram.

Um homem muito alto, bem vestido e com um longo cabelo escuro com alguns fios já grisalhos entrou correndo no hospital

— Boa tarde, eu procuro por Leonard Dixon — ele perguntou educadamente para a recepcionista

— Sinto muito senhor, mas Leonard não pode receber visitas de desconhecidos. Quem é você?

— Eu sou o pai dele, Terrance Silver.

Terry entregou o documento que comprovava a paternidade. Ele havia trancado o resultado do teste de DNA a sete chaves, mas agora precisava de uma vez por todas enfrentar as consequências dos seus erros.

Quando Leonard recebeu alta, os médicos já tinham explicado que o pai dele estava ali, e que agora ele moraria com ele.

Leonard se parecia muito com a mãe. Olhar para ele todos os dias, seria o castigo de Terry pelo que ele fez com ela. Ele reconhecia que merecia isso.

Leonard se segurou o tempo inteiro para não chorar ao lembrar da mãe. Ele também não sabia o que pensar sobre seu pai. A viagem de carro para a casa de Terry Silver foi muito longa e Leonard adormeceu.

— Ei, Leo. Chegamos, vamos lá? — Terry disse com um sorrisinho tentando ser simpático e ajudou Leonard a sair do carro.

O garoto ficou completamente perplexo ao ver a casa de seu pai. Era absurdamente enorme.

Ao andar pelos cômodos, caiu a ficha. Terry Silver era rico. Muito rico. Rico o bastante para ter o que quiser. Para comer o que quiser, vestir o que quiser, e o mais importante: nunca ficar doente.

Durante todo o tempo em que a mãe de Leonard esteve doente, Terry vivia nessa casa? Se vestia daquele jeito e tinha pessoas trabalhando para ele?

— Por que você não salvou a minha mãe? — ele não pensou antes de falar. Apenas falou

— O que?

— Você é rico. Minha mãe não era. Por que você não a salvou quando ela ficou doente? Por que você nos deixou?

Terry se ajoelhou para ficar mais perto de Leonard

— Eu não sabia que sua mãe estava doente. Se soubesse teria feito algo

— Por que você nos abandonou, papai? — os olhos de Leonard ficaram encharcados e a única coisa que ele pôde fazer foi abraçar o pai. Ele estava destruído. Era só uma criança vivenciando a perda mais dolorosa de sua vida. E bem na sua frente, estava seu pai que o abandonou. Por que ele fez isso? Por que ele não ficou por perto? Se ele estivesse por perto, a mãe de Leonard ainda estaria viva.

Mas ela não estava. E a culpa era dele. De Terry Silver.

Flashback OFF

Leonard foi ao banheiro lavar o rosto e tirar o quimono. Quando tirou, ele virou as costas para o espelho e passou os dedos pelas cicatrizes nas costas. Flashes daquele dia invadiram sua mente, mas ao invés de tristeza, o sentimento que tomou conta dele foi raiva. Mas tudo aquilo iria passar, quando Terry finalmente tivesse o que merecia.

Depois de se vestir, foi ver Terry e Kreese que estavam olhando para os novos equipamentos do Cobra Kai. Mal sabiam os dois que aquele equipamento seria de Leonard muito em breve.

— Quando vamos arrumar esses equipamentos? — Kreese perguntou

— Eu vou chamar uma equipe para configurar e organizar tudo

— Uma equipe? Sério? Não precisa fazer isso, pai. Eu posso arrumar tudo agora. Vocês merecem um descanso — Leonard falou olhando para os dois senseis.

Kreese não confiava em Leonard. O garoto parecia o extremo oposto do que o pai já foi. Ele não era manipulável, não tinha medo de nada e era muito falso. Mas Kreese não podia fazer nada quanto a isso, Terry amava o filho e não iria admitir que alguém o tratasse mal. Ao menos Leonard foi inteligente o bastante para não contar a Terry sobre aquele dia. Ele não deixaria o garoto sair impune se algo prejudicasse a parceria com Silver.

— Você tem certeza? — Terry perguntou

— Claro. Eu usava muitos equipamentos como esses na academia do internato. Amanhã vai estar tudo pronto, não se preocupem

Terry olhou para Kreese, que deu de ombros

— Por mim, tudo bem. Tranque tudo quando terminar

— Claro, sensei.

— Certo, então te vejo mais tarde em casa. Dirija com cuidado — Terry deu um soco de leve no ombro do filho e ele e Kreese deixaram o dojô.

Leonard mandou uma mensagem para Elliot e Isa, e começou a arrumar os equipamentos. Assim que ele acabou, os dois chegaram.

— Olha só — Elliot disse passando a mão nos novos sacos de pancada e nos equipamentos de malhação

— Mal posso esperar para ver nossos alunos usando isso

— Tudo de última geração, Elliot, do jeito que a gente merece!

— Isso me faz sentir um pouco de saudade de quando eu fazia karatê. Era muito bom

— Está enferrujada, Isabela? — Leonard perguntou

— Talvez eu esteja. Mas mesmo que não estivesse, ainda prefiro não lutar com você, tenho amor à minha própria vida!

Leonard riu, e olhou para Elliot que também estava rindo. Isabela andou pela sala, olhando todos os novos equipamentos, e Elliot não tirou os olhos dela

— Está tudo bem, Elliot? Parece distraído — Leonard perguntou, despertando Elliot de seus pensamentos.

— Estou bem sim!

— Ok... tenho algo para dar a vocês

Leonard abriu um dos armários e tirou duas caixas pretas com o símbolo do Cobra Kai

— Essas são só amostras da nova mercadoria, quero que vocês fiquem com isso

— Silver não vai sentir falta? — Isa perguntou enquanto tirava um dos moletons da caixa

— Não. Tem várias dessas guardadas. Quando isso acabar, todos na agência vão usar essa mercadoria. Existe marketing melhor do que o maior empresário de Los Angeles ser o sensei do Cobra Kai?

— Existe, o comercial que você planejou para o tio Danny em parceria com a Marvel — disse Isabela. Leonard deu de ombros, ele tinha que concordar que o comercial havia sido um grande sucesso

— Ok, tem razão, não dá para competir com esse marketing, mas isso não importa. Elliot e eu como senseis do Cobra Kai, vai ser algo no mínimo curioso. Elliot é CEO de uma empresa de marketing. Eu sou um adolescente. Isso por si só já vai chamar muita atenção

— E você será sensei por mais tempo do que eu, já que também tenho que cuidar da minha empresa.

— Você pode nomear um novo CEO. Tipo a Isa

A garota quase ia derrubando a caixa do Cobra Kai no chão

— Eu ainda não me formei na faculdade e não tenho a menor condição de ser CEO!

— Está se subestimando, LaRusso

— Gente! — Elliot gritou — Agradeço por se importarem com o meu futuro como sensei, mas ainda faltam alguns dias para isso. O que eu sei é que eu ainda sou o chefe de vocês e quero os dois na agência amanhã. Eu preciso muito da ajuda de vocês

— Então, vamos abaixar nossas armas por um dia?

— Isabela perguntou

— Acho que não vai fazer mal. Nós já fizemos o que podíamos, agora nos resta esperar o torneio. Ter passado esses dias no Cobra Kai me ajudou a ver muita coisa que será útil para mim e para Elliot, além de ter ajudado o Miyagi Do e o Presas de Águia

— Ajudou mais o Presas de Águia. Daniel é muito resistente aos métodos do Cobra Kai. Pelo menos ele aprimorou a defesa. A tia Amanda me disse que quando ele foi para Okinawa há alguns meses, outro sensei do Miyagi Do ensinou novos segredos a ele.

Leonard e Elliot trocaram um olhar. Os meses que eles passaram juntos arquitetando todo esse plano fez os dois se aproximarem a ponto de se entenderem com um único olhar. Os dois se perguntavam a mesma coisa: O Miyagi Do tinha outro sensei?

— O que sabemos exatamente sobre esse outro sensei? — Leonard perguntou

— Ah, parece que ele e o meu tio se conheceram nos anos 80, lutaram até a morte e fizeram as pazes quando ele foi para Okinawa. Eu não o conheço, mas parece que o cara é muito forte

Isabela notou o espanto de Leonard e de Elliot e ficou com medo de ter falado demais. Era um pequeno defeito que ela tinha

— Ei, ei! Eu conheço essa cara, o que vocês estão pensando?!

— Nada, Isa. Só estamos nos perguntando por qual motivo Daniel não pediu ajuda ao sensei de Okinawa para o torneio se claramente ele sabia muito mais — Elliot disse calmamente

— Seu pai é bicampeão de karatê e existe alguém mais forte que ele do outro lado do mundo? Isa descubra agora quem é esse cara, quero saber tudo sobre ele

— Mas por que?! Você não pode ensinar o Miyagi Do, o Cobra Kai não é sobre isso!

— Não quero ensinar o Miyagi Do, isso é função de Daniel. Eu quero aprender o Miyagi Do. E quero aprender da forma mais completa e brutal possível. Esse sensei pode me ajudar em tudo que eu preciso saber. — Leonard fez uma pausa. Elliot e Isa ainda estavam esperando uma justificativa para aquela vontade repentina de Leonard — Depois que tomarmos o Cobra Kai, meu maior inimigo ainda vai viver sob o mesmo teto que eu, ainda que por pouco tempo. E eu preciso não só me proteger, mas preciso mostrar a ele, que ele não pode me destruir

Isabela refletiu por um momento. Durante a luta de Daniel e Johnny, ela viu um golpe diferente, que paralisou o braço de Johnny por alguns segundos. Aquilo era novo, ela nunca tinha visto seu tio usando aquele golpe antes. Se usado nos lugares certos, aquele golpe era brutal

— Acho que sei de algo que esse sensei ensinou

Naquela noite, Leonard não dormiu. Ele havia mandado uma mensagem para Terry dizendo que um dos colegas da agência tinha feito aniversário e ele passaria a noite fora. Mas a verdade era que, depois de instalar as câmeras de segurança, ele foi para o Miyagi Do com Isabela para treinar o golpe que ela havia falado. Daniel já estava em casa e não sabia que eles estavam no dojô. Isabela foi resistente ao ensinar o golpe para Leonard, mas ele a persuadiu.

No dia seguinte, ele disse que não estaria no Cobra Kai para a aula, por causa do trabalho, mas que talvez conseguisse chegar mais tarde.

Na agência de Elliot, todos os projetos passavam pela aprovação do CEO antes de serem entregues para as empresas, e Elliot tinha muitos para analisar, por isso Leonard e Isabela o ajudaram naquele dia

— Elliot você está de mau humor? — Leonard perguntou

— Não. Só estou cansado

— Você não está bem, está rejeitando todos os projetos. Geralmente você só faz algumas alterações, nunca os rejeita completamente — disse Isabela, sem olhar para ele. Leonard olhou para os dois, um pouco confuso

— O que está acontecendo com vocês dois? Estão prestando muita atenção um no outro ultimamente

Elliot tirou os olhos do computador e olhou para Leonard. Depois para Isabela e depois para Leonard de novo

— Eu presto atenção nela do mesmo jeito que presto atenção em você, Leo.

— Então diga algo sobre mim

Elliot suspirou de cansaço.

— Leonard, você é um livro fechado, não dá para tirar conclusões verdadeiras sobre você porque está sempre manipulando os pensamentos dos outros para que elas só enxerguem o que você quer — disse Elliot

— A maior prova disso é que você consegue enganar seu pai. Quem mais conseguiu? — Isabela disse

— Foi uma boa análise, mas não muda o fato de vocês estarem estranhos.

Leonard já tinha uma suposição, e achava ridículo. Eram dois adultos agindo como adolescentes. Mas ele não tinha tempo para isso, ele precisava focar no plano.

Após quase um dia inteiro aprovando - ou rejeitando - projetos, eles foram liberados e Leonard correu para o Cobra Kai. O treino já tinha acabado, mas seu pai ainda estava lá, lendo um livro.

— Ei, Leonard. Como foi o trabalho? — ele perguntou, fechando o livro

— Foi normal. E as coisas por aqui?

— Os alunos perguntaram por você e eu venci John em uma aposta. Olha só, falando nele — Terry apontou para a porta, onde John Kreese chegou com uma caixa de cervejas — Um homem de palavra! É uma ba muoi ba?!

— A velha 33, elas mudaram um pouco desde a guerra

— Essa aqui é ótima Leonard, vem aqui

Kreese semicerrou os olhos para Terry, quando Leonard se aproximou e pegou uma cerveja

— Você deixa seu filho beber?

— Seus alunos bebem e têm a mesma idade que eu, nunca percebeu?

Kreese revirou os olhos. Leonard sempre tinha uma resposta para tudo.

— Sabe de quem isso me lembra? Do Skovil. O bom e velho garoto de Utah

Leonard parou de prestar atenção ao perceber que era mais uma história do Vietnã e pegou seu celular. Elliot e Isa não paravam de falar

Meu celular não para de vibrar no meu bolso, o que é tão interessante?

Mas ele não viu a resposta, porque notou que a conversa entre Terry e Kreese estava passando dos limites

— Quieto! Eu não terminei de falar, tenente. No meio da aula, você disse aos alunos que eu tinha uma fraqueza

— Eu disse que todos têm...

— Não, você falou especificamente de mim. E isso me fez pensar, qual você acha que é minha fraqueza?

— Olha, foi só uma lição para a turma...

— Você tem medo de falar

Kreese começou a humilhar Terry e quase fez o homem de 1,96 baixar sua cabeça, seus olhos estavam marejados. Leonard nunca tinha visto seu pai assim

A ação de Leonard surpreendeu até ele mesmo. Diante de John Kreese, ele sentiu a necessidade de defender o seu pai. Comparado a Terry, Kreese estava sendo muito mais imbecil

— Sua fraqueza é Johnny Lawrence

— O que foi que você disse? — Kreese tirou os olhos de Terry e encarou o mais novo. Terry também olhou para o filho e pediu com o olhar para que ele se calasse, mas ele não obedeceu

— Sua fraqueza é Johnny Lawrence. Foi tudo sobre ele, desde o início. Seu precioso pupilo, sua pequena arma, o homem que o senhor tem como filho. Você quer que o Cobra Kai ganhe o torneio para trazer Johnny de volta, e descartar meu pai na primeira oportunidade. Eu sabia disso desde o início.

— Sabe qual é o seu problema? Você acha que está acima de todos, acha que é o mais esperto e que sempre vai conseguir o que quer. E o que você quer, é criar um confronto entre mim e o seu pai. Você não vai conseguir o que quer. Não é Terry?

Leonard olhou para seu pai com incredulidade, enquanto ele olhava para Kreese e para o filho

— John está certo, Leonard. Você sempre acha que sabe tudo sobre todos. Está sempre na defensiva e tirando conclusões erradas

— Conclusões erradas?! Ele acabou de te humilhar e você está o defendendo? Vai escolher confiar nele, ao invés de mim?

Terry não respondeu, só ficou olhando para o chão

— Parece que quem cala consente. Mas guarde minhas palavras, Terry. Um dia você vai ter que fazer uma escolha, e quando as consequências chegarem, você vai se arrepender de não ter escolhido a mim.

Leonard pegou mais uma garrafa de cerveja e foi embora do dojô. Ele não voltaria mais para o Cobra Kai, até tudo aquilo acabar. Faltava pouco.

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