Surpresa

21 de julho.

11:47 PM.

Ludmilla POV

Já havia se passado pouco mais de um mês que comecei a morar oficialmente na casa da Brunna. Depois que percebi alguns olhares confusos dela quando íamos sair ou pedir comida em casa, resolvi pedir sua ajuda pra arrumar um emprego. Ninguém podia desconfiar da onde vinha meu dinheiro mas era quase impossível já que eu sempre o tinha mesmo sem emprego.

Ela me ajudou a entregar alguns currículos o que pra mim, foi bem divertido. Nunca havia feito isso, afinal de contas, eu já nasci com um emprego garantido já que era dona da empresa, mas a experiência foi um tanto interessante. Eu havia conseguido algumas entrevistas mas nunca tive uma resposta positiva. Obviamente menti no currículo dizendo que não tinha experiência profissional, o que me prejudicou um pouco.

Depois de tantas tentativas em vários lugares, Brunna resolveu me ajudar, de novo, e conversou com seu patrão pedindo a ele que me desse uma ajuda. Ele prontamente me deu uma vaga de garçonete no bar e eu passei a trabalhar com Brunna. Tudo isso só fez nossa amizade se fortalecer mais e mais. Agora, além de passarmos o dia todo juntas, também tínhamos a noite para aproveitar a companhia uma da outra, o que era bem legal.

As férias chegaram para a maioria das pessoas, principalmente os estudantes universitários que batiam ponto no bar todo fim de semana. Aquilo nos ajudou bastante pois as gorjetas eram garantidas. Depois de um tempo comecei a exercer outra função, além de servir mesas eu também cantava no barzinho. Na primeira vez eu havia somente quebrado um galho para a banda, pois a cantora acabou furando com eles. Eu não conhecia muito bem o repertório mas consegui me virar cantando alguns cover's de bandas e cantoras que eu gostava. Os clientes simplesmente amaram e começaram a pedir cada vez mais. Assim que percebeu uma maior movimentação nas noites em que eu me apresentava o dono do bar logo tratou de fazer uma noite especial para isso e todas as quintas e sextas tínhamos noite de música ao vivo com Ludmilla e Banda. Confesso que aquilo me fez sentir um tanto realizada, era como se meu sonho de criança se tornasse realidade.

De todos, Brunna era minha maior fã. Ela sempre ficava por perto com um sorriso lindo nos lábios e os olhos brilhando enquanto eu me apresentava. Além disso, sempre quando estávamos em casa ela me pedia para cantar e eu simplesmente não conseguia dizer não a ela.

Brunna e eu estávamos casa vez mais próximas. Passamos a fazer diversas coisas juntas, eu a levava a passeios que queria fazer pela cidade e em troca, poderia ter ainda mais sua companhia. Visitamos lugares na cidade que nem mesmo ela conhecia. Quando estávamos em casa, sempre assistíamos a filmes e séries juntas. Tinha uma coisa em especial que eu amava fazer com Brunna, fofoca.

Quando começamos a falar de alguém, não paramos mais. Ela me contava os babados das pessoas da vizinhança e sempre falávamos dos clientes do bar. Era incrível como ela conseguia me fazer tão bem com tão pouco.

O que mais me surpreendeu era que, por incrível que pareça, eu acabei me acostumando e gostando da vida simples que levava agora. Sem ninguém me bajular ou fingir nada por interesse. Pela primeira vez senti que realmente tinha amigos e pessoas que gostavam de mim por quem eu era e não pelo quê podia oferecer.

Com o tempo, minha relação com Larissa também mudou bastante e pra melhor. Ela foi ficando cada vez mais maleável até que finalmente se rendeu e começou a confiar em mim. Acabei descobrindo q Larissa era muito engraçada e adorava contar piadas de mal gosto.

Agora nós éramos o quarteto fantástico, Brunna, Larissa, Renatinho e eu. Inclusive esse era o nome do nosso grupo no whatsapp.

Hoje seria nosso dia de folga. Brunna e eu tínhamos a noite livre, Larissa estava de férias da faculdade e Renatinho estava livre como sempre, por conta disso decidimos marcar de sair, os quatro. Brunna e Larissa queriam me levar em um pagode, elas juravam por tudo que eu iria amar o lugar e eu tinha plena certeza que sim, mesmo não sabendo do que se tratava.

Renatinho tentou até o último instante fazê-las mudar de idéia. Ele queria ir em uma boate LGBT que tinha inaugurado na cidade, mas Brunna não quis e bateu o pé que iríamos ao pagode. Era no mínimo engraçado ver os dois discutindo para onde iríamos, Lari e eu só sabíamos rir de toda a situação.

Eu estava terminando de me arrumar. Brunna havia me dito que eu poderia caprichar já que o lugar sempre lotava. Eu havia optado por usar um cropped preto, uma saia amarela e uma sandália no estilo gladiador. Esse tempo no Brasil me fez mudar completamente meu estilo, acabei descobrindo que eu gostava muito de mostrar meu corpo, afinal, num calor desse era quase impossível usar tanta roupa social. Fiz uma maquiagem leve e uma trança no cabelo que ficava bem no topo de minha cabeça.

Desço para a sala e percebo que sou a última a estar pronta.

- Nossa, finalmente! - Renatinho diz se levantando. - Achei que não iria ficar pronta nunca.

Mostro a língua para o rapaz que retritbui o gesto.

- Podemos ir?

- Claro! - Todos respondemos juntos e Brunna sorri. Assim que pegamos nossas coisas, batidas surgem no portão. Todos nos encaramos confusos.

- Alguém tá esperando alguém?

Todos negamos e Brunna acha esteanho. Ela pega a chave e vai em direção ao portão.

Eu termino de conferir tudo no espelho do banheiro quando ouço uma conversa vinda da sala.

- Pensei que não voltaria mais.

- Um dia isso iria acontecer né?!

- Ou não...

Saio do banheiro indo para a sala e a cena que via ali era um tanto estanha. Renatinho tinha os braços cruzados e uma expressão fechada no rosto, Larissa parecia nervosa e Brunna sorri, ansiosa.

- E você quem é? - O rapaz aponta para mim me fazendo encara-lo.

- Ah, essa é a Lud..milla! - Brunna diz nervosamente. Percebo que o rapaz segurava sua mão um pouco forte demais o que a deixou um tanto desconfortável. - Ela se mudou pra cá.

- Ah sim. Prazer, Ludmilla. - Ele estende a outra mão a mim e eu não consigo dizer nada, apenas encarar seu rosto e logo em seguida as mãos entrelaçados.

- Prazer...?

- Erick! - Ele completa.

- Erick?

- Sim! Sou namorado da Brunna.

O que? Brunna nunca havia dito que tinha um namorado. Ela única havia me dito nada em relação a esse rapaz.

Encaro ela e percebo que Brunna estava desconcertada. Ela tinha uma expressão indecifrável no rosto. Encaro Larissa que também tinha a mesma expressão, já Renatinho continuava encarando o rapaz de cara fechada.

- É um prazer, Erick. - Finalmente consigo responder alguma coisa.

- Vocês iam sair? - Ele diz se virando para Brunna.

- Nós vamos! - Renatinho se levanta. - Vamo num pagode hoje.

- Pagode? Não tinha nada mais legal não? 

- Se você não quiser ir não precisa, ninguém te chamou mesmo.

Depois daquela resposta atravessada de Renatinho, Erick apenas sorri, cínico e volta sua atenção para Brunna.

- Você vai assim? - Ele a olha dos pés a cabeça.

- Sim... Por que?

- Não acha que essa roupa tá curta demais não? Não quero ninguém olhando pra minha mulher.

- Fica em casa. Assim você não vê ninguém. - Renatinho estava irredutível.

Larissa aperta levemente o ombro do rapaz tentando faze-lo se acalmar.

- Escuta aqui, o viadinho. - Erick da dois passos ficando de frente e Renato se levanta. Os dois travam uma batalha com o olhar. - Pode deixar que da minha mulher cuido eu, tá bom.

- Eu tô vendo mesmo o jeito que você cuida dela.

- E o que você tem a ver com isso?

- Ela é minha amiga! Não vou deixar um escroto igual a você falar merda e ficar quieto.

- Vai se fuder, seu merda.

- Amor! - Brunna entra no meio. - Calma, por favor. Vem.

Ela sobe puxando o rapaz pela mão enquanto ele ainda encarava Renato que não abaixava a guarda. Encaro os dois que estavam na sala e logo em seguida me sento no sofá.

- O que aconteceu aqui?

- Esse escroto tava em São Paulo! - Renato começa. - Ninguém tava sentindo a falta dele. É sempre assim, é só ele chegar que começa esse inferno.

- Renato... - Larissa repete o gesto de alguns minutos atrás. - Ele e a Brunna estão juntos a dois anos. - Lari se senta ao meu lado. - Ele não fica muito aqui no Rio porque trabalha em sampa. Renato e ele nunca se deram bem.

- Por que?

- Porque ele é um escroto! - A veia do pescoço do rapaz salta mostrando toda sua raiva. - Um machista, ridículo. A Brunna fica super bem quando ele não tá aqui, é só ele chegar que ela muda. Parece outra pessoa.

- Isso é verdade?

- Claro que é! - Renato grita sem paciência. - Ele age como se fosse dono dela e ela não consegue dizer não. Eu odeio tanto esse cara, meu Deus!

- Calma Renato.

Brunna desce as escadas e Erick segurava seu pulso de forma possessiva.

Percebo que ela havia trocado toda a roupa. Brunna antes usava uma blusa preta totalmente decotada nas costas e uma mini saia também preta, agora, uma calça jeans de cós alto lhe cobriam as pernas enquanto uma blusa preta de gola rolê com mangas que iam até seu antebraço cobria a parte de cima. Ela se mantinha praticamente encolhida enquanto o rapaz lhe abraçava de lado pelo pescoço com uma certa grosseria.

- Agora sim podemos ir. - Ele sorri com maldade.

Renatinho revira os olhos saindo primeiro, Larissa vai logo atrás. Erick sai na frente puxando Brunna. Ela pára dizendo que iria beber água e que logo o alcançaria.

Brunna vai até a cozinha e eu permaneço imóvel. O clima que antes era alegre e de descontração pesou de uma forma que fez com que meu estômago se revirasse.

- Brunna. - Toco levemente sua mão fazendo ela parar e me encarar.

Seus olhos estavam tão diferentes, faltava aquele brilho que ela tinha a alguns minutos atrás.

- Oi Lud. - Sua voz sai quase como em um sussurro.

- Tá tudo bem?

- Tá sim. - Ela me dá o esboço de um sorriso. - Eu só...

- E aí Brunna? - Erick volta e nos assusta. Ele encara nossas mãos e Brunna trata logo de as afastar.

- Vamos? - Ela diz sem me encarar.

Eu apenas assinto e saímos do lugar. Erick puxa Brunna apara perto de si pelo pescoço e os dois saem abraçados. O Uber que havíamos pedido havia chego mas Brunna foi com Erick em seu carro.

Quando chegamos no lugar as coisas melhoraram um pouco. A música era realmente muito boa e envolvente, Larissa me ensinou alguns passos e me arrisquei a sambar junto a ela. Renato tentou não deixar a presença desagradável de Erick o atrapalhar e logo tratou de aproveitar a noite bebendo e encontrando algumas bocas para beijar. Lari se reencontrou com um ficante antigo e os dois decidiram ficar juntos.

Durante toda a noite Erick não desgrudou de Brunna um segundo sequer, mas não no modo bom. Ele segurava a garota pela cintura de uma forma que ela ficasse colada em seu corpo, ela mal conseguia dançar. Brunna até tentou beber mas ele logo deu um jeito de faze-la mudar de idéia, então ela ficou na água por um bom tempo enquanto ele bebia tudo o que queria. Eu nunca havia presenciado um casal tão estranho quanto aquele e me sentia ainda pior per ver Brunna naquela situação.

A minha vontade era de arranca-la dos braços daquele cara pra que ela pudesse aproveitar.

Brunna era de longe, a mais animada de nós quatro para sair àquela noite, a tempos ela queria me trazer neste lugar e quanto finalmente conseguimos, ela não pôde aproveitar da forma como planejava. Era como se Erick sugasse a garota e tirasse todas as coisas boas que ela tinha a oferecer e deixasse apenas as ruins para serem vistas. Como se tudo aquilo que ela fazia em sua presença, fosse culpa dela, mas eu sabia que não era, eu conhecia Brunna o suficiente para saber que aquilo tudo se devia a influência do rapaz.

Depois de algum longo tempo ela finalmente consegue se livrar de seus braços possessivos e vai em direção ao banheiro do lugar. Encontro uma maneira discreta de segui-la até lá. Assim que entro no banheiro percebo que Brunna ja estava em uma das cabines. Me apoio na pia afim de esperar ela sair de lá e ouço algumas fungadas baixinhas. Será que ela estava chorando?

A descarga é acionada e ela demora um pouco para sair. Quando o faz, se assusta com minha presença.

- Oi Lud. Que tá fazendo aqui?

- Eu queria falar com você.

- Pode falar. - Ela desvia nossos olhares e vai até a pia lavar a mão.

- Você tava chorando?

Brunna cora levemente.

- Não. Só minha alergia que atacou.

- Brunna. - Seguro seu queixo com o máximo de cuidado possível fazendo ela me encarar. - Você tá bem?

- Tô sim.

- Tem certeza? Você tava tão alegre antes.

- Eu tô bem, Lud. Fica tranquila. - Ela se desfaz do meu contato e vai em direção a porta.

- Por que você trocou de roupa?

Brunna pára com a mão na maçaneta. Ela nada responde. Sua cabeça estava baixa e ela permenace de costas.

- Você trocou por ele? Você tava tão linda com...

- Não se mete na minha vida, Ludmilla. - Me assunto com seu tom, ela nunca havia falado comigo daquela forma. - Eu não gosto disso.

- Eu não tô me metendo. É só que...

- Você tá sim! Eu troquei porque quis, porque me deu vontade. - Aquelas palavras saíam tão mentirosas, ela mal conseguia me encarar. - Erick não teve nada a ver com isso.

- Você tem certeza?

- Tenho! Agora se me dá licença, eu quero aproveitar o resto da noite.

Brunna sai batendo a porta com força me deixando sozinha e absolutamente confusa. A forma como ela havia defendido Érick era patética. Decidi que não iria deixar minha noite ser atrapalhada por aquele cara. Respiro fundo e volto para onde estava.

O resto da noite foi ótima, quando o grupo de pagode finalmente terminou seu show, o DJ assumiu o posto e logo o funk começou a tocar. Confesso que a batida e até mesmo as letras do funk carioca eram muito bons.

Chegamos em casa as quatro da manhã. Sentia meu corpo exausto mas estava muito feliz, apensar dos pesares, a noite tinha dito incrível e eu aproveitei muito. Cheguei e de cara já tomei logo um banho. Só queria saber de deitar e dormir até que meu corpo estivesse descansado, mas quando entro no quarto, meus planos vão por água abaixo.

Erick abraçava Brunna por trás e dava beijos em sua nuca enquanto ela tirava os brincos e correntes que usava. Eu já tinha visto alguns casais trocando carinhos mas aquilo estava longe de ser uma demonstração de afeto. Era um tanto nojento de se ver. Quando ele finalmente percebeu que eu estava lia, me lançou um sorriso malicioso me fazendo arrepiar dos pés a cabeça, aquele cara sabia ser escoto.

- Tá dividindo quarto agora, amor? - Ele diz se afastando dela e se aproximando de mim.

Continuo arrumando minha coisas e ignorando sua presença.

- Ah é, Lud tá dormindo aqui agora.

- Humm... - Ele observa minuciosamente todas as minhas coisas. Desde meu chinelo no canto da cama até alguns objetos em cima do móvel.

Passo ao seu lado afim de pegar mais um travesseiro no guarda roupa e sinto seu olhar queimar sobre mim, aquilo já estava ficando desconfortável.

- Brunna disse que cê trabalha com ela no bar.

O encaro brevemente e maneio confirmando.

- Se for tão boa servindo mesas quanto é dançando, vai ser promovida a funcionária do mês rapidinho.

- Erick! - Brunna chama sua atenção enquanto ele somente ri com desdém. Sinto meu sangue ferver nas veias.

Aquilo tinha sido uma cantada? Quer dizer, uma cantada na frente da sua namorda? Que porra tava acontecendo aqui?

- Desculpa, Lud. - Brunna diz bufando logo em seguida enquanto encarava o rapaz.

- Não tem problema. - Apenas respondo colocando travesseiro na cama.

- Tá vendo amor, ela nem liga. - Ele volta para o lado da moça e a segura pelo pescoço. Parecia que iria lhe dar um mata leão a qualquer momento.

- Erick, você tá bêbado. Acho que tá na hora de ir embora. Vou chamar um Uber pra você.

Brunna faz menção de sair de seu braço mas ele o aperta em volta de seu pescoço fazendo a garota lhe segurar.

- Ah não amor. Tô com saudade, pensei que a gente ia curtir hoje...

Toda aquela cena me dava arrepios macabros. Era uma mistura de tensão, raiva e impotência. O pior de tudo era ver que Brunna mal conseguia se mexer ou se defender.

- Eu tô cansada amor.

- E eu fiquei a porra de seis meses longe! Não vou embora sem antes matar minha vontade. - Erick fazia questão de me encarar enquanto falava, como se quisesse exibir alguma coisa, no caso Brunna.

- Amor, hoje não. Eu tô cansada, Lud já tá indo domir, você tá bêbado. Deixa pra outro...

Erick fecha mais o braço e se aproxima do ouvido de Brunna. Suas palavras saem baixas, mas ainda consigo ouvir.

- Eu quero agora!

Brunna fecha os olhos derrotada. Ela abaixa a cabeça e apenas assente para logo em seguida me encarar como se pedisse socorro. Entendo bem o que a garota queria dizer e apenas pego meus travesseiros e celular e saio do quarto. Erick veio logo atrás de mim e ouço ele trancar a porta.

Atravesso o corredor e bato algumas vezes na porta. Renatinho abre e assim que me vê, franze o cenho.

- Que houve?

- Brunna e Erick.

- Argh! - Ele abre a porta me deixando passar para finalmente entrar.

O quarto de Renatinho tinha o mesmo tamanho dos outros dois, mas por ter menos coisas, parecia maior e mais espaçoso. Havia somente uma cama de casal ao lado direito, na frente da cama, uma TV, do lado esquerdo um guarda roupa com um espelho enorme na porta e um puff azul no centro. Algumas roupas estavam espalhadas pelo chão, o quarto tinha um cheiro de perfume masculino muito bom. Ele abre espaço na cama se deslizando para o lado e bate no colchão me dando a deixa pra deitar. Eu ajeito meus travesseiros e antes que pudesse deitar ele se levanta para apagar a luz.

- Esqueci de avisar, eu gosto de dormir pelado.

Renato apaga a luz e com a claridade dos postes da rua consigo ver ele tirando a cueca e vindo para a cama. Dou um leve gritinho quando sinto ele me abraçar por trás e me dar um beijo na bochecha.

- Boa noite, gostosa.

- Fica longe de mim! - Digo em meio a uma risada o fazendo rir também.

- Eu me mexo muito quando tô dormindo tá.

- Ah, Renato!!!

Ele ri mais ainda e se vira de costas.

- Dorme com os anjos Lud, te amo!

- Você é ridículo!

[...]

Larissa POV

Acordo com o canto dos pássaros que estavam na fiação do poste. Sento na cama ainda sonolenta e estico os braços me espreguiçando, eu conseguia ouvir alguns de meus ossos estalarem. Deus! A noite de ontem foi ótima.

Calços minhas pantufas e olho no visor do celular, mesmo de férias eu não conseguia acordar tarde. Saio do quarto e faço minha higiene matinal. Desço pra cozinha afim de preparar o café, a casa estava incrivelmente silenciosa. Coloco o pó no filtro e despejo a água quente sentindo aquele aroma tão gostoso invadir o lugar. Já tinha comprado o pão que estava quentinho, quando finalmente me sento e dou a primeira mordida ouço uns murmúrios na escada.

Brunna aparece me dando um sorriso lindo.

- Bom dia.

- Bom dia.

Erick aparece logo atrás dela.

- Opa, café!

Ele pega uma das xícaras que estavam na mesa e despeja o líquido.

- E aí? Cadê o carinha que tava contigo ontem?

- Deve estar na casa dele.

- Hum... Não conseguiu dar conta?

- Erick!

Brunna chama sua atenção e me encara como se pedisse desculpa. Apenas assinto de volta. Eu já conhecia bem toda aquela situação.

Erick era um escroto de marca maior, nunca escondeu o jeito pervertido de ser. Eu não conseguia entender o motivo de Brunna ter aceito namorar com esse cara, ele era um grosseiro, machista e mulherengo. Já até houveram alguns boatos de que ele tinha uma namorada em cada estado que ficava, mas ninguém conseguia provar nada. Brunna vivia chamando sua atenção quando ele falava alguma merda, parecia mais a mãe dele do que qualquer outra coisa. Ele termina de beber todo o líquido e coloca a xícara de volta na mesa.

- Mais tarde a gente se vê, gata.

Ele da um selinho na minha amiga segurando ela pelo pescoço e logo depois vai em direção a porta. Brunna o segue pra fechar o portão e não demora muito pra entrar de volta. Ela pega a xícara e lava, se senta ao meu lado e começa a preparar seu café. O silêncio antes confortável agora se tornou agoniante. Ela estica o braço pra alcançar o presunto e vejo uma mancha. Na mesma hora seguro ela pelo punho afim de ver melhor.

- Ele tá com essa palhaçada de novo? - Pergunto irritada.

- Foi sem querer, não é nada demais.

- Sem querer?

Me aproximo dela jogando seu cabelo pra trás. Ela tinha uma mancha igual, no pescoço.

- Brunna, olha o tamanho dessa merda!

- Shh, fala baixo!

Toda minha paz e tranquilidade foram pelo ralo. Erick tinha essa mania ridícula de toda vez que ele e Brunna transavam, ele fazia questão de deixar marcas nela em lugares bem visíveis. Era como que se quisesse exibir pra todo mundo que ela era dele, mas da forma errada.

- Isso não vai parar nunca? É isso?

- Lari, por favor...

- Por favor digo eu Brunna! Que desgraça, esse escroto não sabe transar como uma pessoa normal?

Ela fecha os olhos e suspira, era nítido o quanto ela estava exausta.

- Ele te forçou a alguma coisa?

- Não! - Era como se sua resposta tivesse saído no automático.

- Brunna, você não deveria fazer nada com ele naquele estado. Ele sóbrio já é um cavalo, bêbada então.

- Lari, tá tudo bem. Sério. Não precisa se preocupar.

- Como não Brunna? Olha esses hematomas, tão quase pretos!

Levanto da cadeira dando a volta nela e começo a procurar novas marcas.

- O que ta fazendo?

- Isso! - Toco levemente sua perna, o short não cobria a marca que tinha ali. - Isso! - Levanto sua blusa vendo outra em sua costela. - E isso! - Dava pra ver certinho o desenho dos dedos do cara em seu pulso.

- Larissa... - Ela diz baixinho evitando me encarar.

- Não Brunna, nem vem! Qual é a necessidade disso?

- Por favor! - Sua voz sai quase como um choro. - Só me deixa comer.

Suspiro vencida. Eu odiava a forma como esse cara conseguia acabar com a minha amiga. Volto a me sentar, dessa vez do seu lado. Puxo ela pra um abraço e ouço algumas fungadas, era sempre assim, Erick voltava e a saúde mental da minha amiga ia pro lixo. Seria ótimo se ele sumisse e não voltasse mais.

- Tá tudo bem? - Ouço a voz rouca atrás de nós e Brunna se afasta bruscamente.

- Tá sim! - Ela diz sem nem encarar Ludmilla. - Vou comer no quarto.

Brunna pega um prato e coloca o pão e o café e sobe as escadas quase em um tiro. Lud me encara confusa e se aproxima.

- O que aconteceu?

Suspiro cansada.

- Erick foi embora agora a pouco.

- E ela tá assim por isso?

Hesito em responder.

- Ai Lud, é complicado.

Ela continua me encarando como se esperasse minha explicação. Me indireito na cadeira e puxo minha xícara, enquanto ela se serve.

- Erick é meio bruto. Desde o incio sempre foi meio rude com a Brunna, tanto no jeito de falar quanto no agir. Ele tem umas manias estranhas...

- Como assim?

- Ele foi o primeiro namorado da Brunna. - Ela arregala os olhos em surpresa. - Pois é. Ela nunca tinha tido um relacionamento sério antes dele, só alguns peguetes. Depois de um tempo de namoro, ele começou a mostrar como realmente era. No começo, era todo romântico e cavalheiro, mas depois ficou grosso, era seco com ela, às vezes fazia graça tirando sarro dela na frente dos amigos. Um babaca completo.

- E por que ela não termina?

- Porque ela acha que não vai conseguir coisa melhor.

- Por que?

- Porque é o que ele diz. Ele é muito escroto, as vezes fala umas coisas pra Brunna que dá pra ver que ela fica mal. É como se ele a manipulasse pra ela fazer tudo o que ele quer.

- E ela faz?

- Ela não tem outro escolha. Toda vez que ela fala não, ele fica todo nervosinho e acaba convencendo ela a ceder.

- Larissa, isso é muito sério!

- Eu sei! Já cansei de conversar com a Bru sobre isso, Renatinho também, mas ela nunca nos ouve. Já cansei de brigar com ela por causa desse cara até entender que não vale a pena acabar com minha amizade com ela por causa dele. Então hoje em dia eu deixo estar, mas eu não gosto dele. Ele não faz bem pra Brunna..

Lud respira fundo e se encosta na cadeira. Ela parecia prensar seriamente sobre alguma coisa.

- Vou falar com ela.

Ela levanta e eu seguro sua mão.

- Não fala nada do que eu falei! E por favor, tenha paciência. Ela tá cega por ele.

Lud apenas assente e sobe as escadas logo em seguida.

Ela e Brunna haviam criado um laço bem forte ultimamente, quem sabe com alguém de fora falando, ela finalemente entenda.

[...]

Ludmilla POV

Bato na porta algumas vezes até que ouço sua voz me permitindo entrar. Fecho a porta atrás de mim e observo Brunna, ela havia mudado tanto.

A garota tava sentada na cama de cabeça baixa, ela comia, quieta, ainda não havia me encarado hoje.

- Bom dia. - Digo me aproximando calmamente.

- Bom dia.

- Você tá bem?

- Tô sim.

Brunna estava seca comigo.

- Brunna, me desculpa por ontem, no banheiro. - Ela finalmente em encara e seus olhos pareciam tão tristes. - Eu não queria me meter no seu relacionamento.

- Tá tudo bem.

- Tá mesmo?

- Sim.

Não era o que parecia.

- Ok. Eu tava pensando, e se a gente...

Brunna coloca uma mecha do cabelo atrás da orelha e eu levo um susto com o que vejo. Seu pulso estava vermelho com marcas de dedos envolta. Levanto da cama em um salto e agarro seu braço, com cuidado. Ela me olha assutada.

- Brunna, o que é isso? - Meu tom sai mais alto do que eu imaginava.

- Não é nada! - Ela puxa o braço de volta e se levanta, nervosa.

- Ele te machucou? Brunna o que aconteceu?

- Não! Não aconteceu nada Lud. Deixa quieto.

- Deixar quieto? Como não aconteceu nada? Você tá machucada!

Tento segurar se braço novamente afim de ver melhor mas ela se esquiva e vai em direção a porta. Eu corro e paro a sua frente.

- Você não vai fugir de mim de novo!

- Da licença! Me deixa sair!

- Não!

- Ludmilla!

- O que tá acontecendo aqui? - Renatinho abre a porta e nos encara assustado.

- Aquele cara machucou a Brunna.

Ele entra no quarto e começa a avaliar o corpo da garota que bufa em resposta.

- Ele não me machucou.

- Ah não? - Renato diz e logo depois mostra o hematoma no braço esquerdo da garota. - Quê isso aqui então? E isso? - Aponta para sua perna. - E isso? - Por último seu pulso. - Ele tá com essa graça de novo?

- Como assim de novo? - Pergunto incrédula, aquela não era a primeira vez?

- Esse escroto tem tesão em deixar ela marcada. Toda vez é a mesma merda.

- Que gritaria é essa? - Larissa aparece e os quatro nos encaramos, todos extremante irritados.

- Brunna tá machucada! De novo! - Renato grita e a garota bufa.

- Da pra vocês me deixarem em paz? Que merda!

- Merda é o que esse retardado tá fazendo com você.

- Renato, calma.

- CALMA O CARALHO! A MENINA TÁ TODA ROXA! - Ele se vira para ela de novo. - Ele te forçou a transar?

Brunna hesita e continua o encarando. Seus olhos estavam marejados.

- Brunna!?!

- Não! - Sua voz estava embargada. - Ele não fez nada! Me deixa em paz.

- Brunna! - Ela sai do quarto e Renato tentar ir atrás mas Larissa o segura.

Eu a sigo quarto a fora e assim que chamo seu nome, Brunna pára no meio do corredor. Ela limpa algumas lágrimas que insistiam em cair.

- Você sabe que não precisa ser assim.

- Você não sabe de nada.

- Sei que você merece alguém melhor!

- Quem? Você?

- E se for?

- Ah me poupe! - Suas lágrimas ainda rolavam. - Eu acho melhor vocês pararem de tomar conta da minha vida! Eu já tô de saco cheio disso!

Brunna desce as escadas, até tento ir atrás mas ouço a porta da sala bater com força. No momento era melhor deixá-la sozinha. Ouço passos e Lari e Renatinho estavam atrás de mim.

- Eu vou quebrar a cara desse escroto, deixa eu ver ele de novo! - O rapaz rosna, com raiva.

- Você não vai fazer nada! Depois dá merda pra você e eu quero ver.

- Foda-se! Eu não vou deixar minha amiga ser feita de escrava por esse cara.

- Não é assim que você vai conseguir ajudar ela. Violência não resolve nada!

- Larissa tem razão. - Entro na conversa. - Não é assim que isso vai se resolver.

- E qual teu plano então? - O tom do garoto era de puro cinismo.

- Não sei. A gente pode conversar com ela...

Ele solta uma gargalhada sarcástica e Larissa suspira coçando a testa.

- O quê?

- Não adianta! Não tem conversa com a Brunna quando se trata desse imbecil.

- Renato, calma! - Pela primeira vez ouço Larissa gritar. Nunca havia visto ela exaltada. - Ela não aceita Lud. Brunna nunca aceita quando a gente fala dele.

- Em algum momento ela vai ter que aceitar, não dá pra ficar cega a vida toda.

- Boa sorte, então. - Renato diz e sobe em seguida. Ele bateu tão forte a porta do quarto que as outras portas tremeram.

Larissa me encara, seu semblante era cansado.

Encaro a porta da sala mais uma vez como se Brunna fosse entrar por ali a qualquer momento. Eu ainda não sabia o que iria fazer, mas não deixaria que ela continuasse nessa situação.





















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tenso...

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