Agradecimento

Este é um agradecimento especial e póstumo a Carlos Ortega, jornalista e fanzineiro argentino – um orgulhoso cidadão da Província de Córdoba. Dirigiu algumas ótimas publicações underground, além de divulgar ativamente o trabalho dos colegas fanzineiros.

Carlos foi responsável por uma homenagem gigante para Juna, a pirata, e o fanzine Voyeur. Fui pega completamente desprevenida, quando recebi a publicação dedicada à minha personagem, contando a trajetória dela e a minha também. Ortega me revelou que os leitores argentinos ficaram impressionados com a longevidade do meu fanzine e com o vigor das HQ's da Juna. Na época, o Voyeur era a única publicação brasileira ininterrupta – lançada a cada dois meses – em quase uma década. Acredite, isso era algo bem raro em um meio em que os fanzineiros publicavam de vez em quando, sem previsão, ou só quando conseguiam material.

Por causa dessa erraticidade nas publicações nacionais, e da desmotivação que frequentemente dominava os fanzineiros, eu encabecei um movimento denominado Fan Magazine, buscando a união em torno de melhores condições para publicar nossas criações. A minha ideia era formar uma espécie de cooperativa ou algo do gênero. Havia pessoas que trabalharam contra isso e em benefício das editoras oficiais, que estavam sempre de olho no que fazíamos. Não era conveniente que o meio underground conseguisse superar suas limitações. Todos nós sabíamos disso. Afinal, o Brasil sempre foi uma Mafiocracia.

No final, apesar de levantarmos a discussão, acredito que a maioria dos fanzineiros não estava preparada para realmente se unir e lutar pelo que queriam: reconhecimento e apoio. Todos diziam querer reconhecimento e apoio, mas a união não era algo fácil. Estávamos acostumados ao descompromisso de fazer as publicações do jeito que fluísse e sem pensar muito nas necessidades dos colegas. Talvez alguns dos maiores sabotadores da união sofressem da Síndrome do Pequeno Poder... Vai saber...? De qualquer forma, não vi as ideias irem adiante. Logo em seguida, eu saí do meio porque comecei a fazer o Mestrado. Eu trabalhava o dia todo e estudava... Tive que eleger as minhas prioridades. Considerando tudo o que vi acontecer no meio underground, não foi uma escolha difícil. Nós capricornianos somos assim: tudo o que nos propomos a fazer, fazemos bem feito e vamos fundo. Somos mega perseverantes e teimosos. Mas, quando viramos a página, acabou. A página está virada. Por isso, não fiquei lá vivendo da memória da Juna e do Voyeur, como alguns fanzineiros que de vez em quando voltam para lançar alguma edição comemorativa, a fim de lembrar os velhos tempos.

Durante o tempo em que lidei com fanzines, pude contar com o apoio de pessoas maravilhosas como Carlos Ortega, que repercutiu as reivindicações do Movimento Fan Magazine em seu fanzine Historieta e articulou muitos contatos na Argentina.

Carlos foi um grande amigo. Certa vez, ele me enviou uma placa de carro, na qual mandou gravar o meu nome. Eu a guardo comigo até hoje. Enferrujou um pouco, mas passei uns produtos e continua bem para a idade. Ortega e eu compartilhávamos uma paixão pela Patagônia. Tudo o que sei sobre o lugar foi graças a ele. Quem sabe, um dia, eu ainda possa conhecer a região pessoalmente, né, Carlos?

Não me lembro com exatidão, mas acho que Carlos Ortega faleceu pouco depois da edição número 32 ou 33, do Voyeur, quando também publiquei o último material, contendo o abaixo assinado do Movimento Fan Magazine. Só descobri o que aconteceu porque enviei a ele roteiros de minha autoria, que Carlos me pediu para que alguns desenhistas argentinos pudessem ilustrar as aventuras de Juna, em seu próprio país. Estranhei que não respondesse de imediato, como sempre fazia. Telefonei para sua casa e um parente me informou que ele tinha falecido, de maneira súbita. Entendi que foi um ataque do coração. Foi um choque para mim. 

Já se passaram mais de vinte anos desde a sua morte. Ninguém levou adiante o lendário fanzine Historieta... Tudo o que Carlos fez, acabou-se, e não aparece nas redes sociais. Os jovens fanzineiros de hoje poderiam dizer que ele nunca existiu.

...E cá estou eu abrindo a mala das lembranças, contendo este capítulo da minha vida – "fanzines e Juna"; portanto, é justo imortalizar a participação de Carlos Ortega na minha jornada. Ele foi um cavalheiro muito gentil e espirituoso. O universo underground perdeu um grande colaborador. E eu perdi um grande amigo. 

Capa do Fanzine Voyeur nº 27, feita pelo mestre dos quadrinhos de terror dos anos 1970 e 1980, Elmano Silva. Uma homenagem à criadora da pirata mais amada do Brasil, naqueles anos em que eu usava o cabelo da Claudia Raia, a Tancinha da novela Sassaricando. Aliás, usei esse cabelo por muitos anos porque nenhum cabelereiro ou produto conseguiu domá-lo. Kkkk!

Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top