Capítulo 42
No dia seguinte, antes do café, Thomas a encurralou em um canto enquanto dizia:
— Micaela, me desculpe pelo meu comportamento ontem. Eu estava confuso e nervoso.... Não sabia o que....
— Tudo bem, Tommy. – Respondeu ela brandamente – Eu te entendo, deveria estar se sentindo péssimo.
— Sim, e acabei descontando em você. Me perdoa.
— Não tem que se preocupar com isso.
Ele lhe deu um de seus sorrisos travessos e a abraçou forte. Depois ambos se dirigiram para a sala de café, onde Susana, Gregory e Nicolas, que segurava Benjamin, já tinham começado a comer.
Eles se sentaram em seus respectivos lugares e começaram a comer enquanto conversavam trivialidades com os outros. A conversa era descontraía e a tensão que se estabelecera na casa há alguns dias já não existia mais. Enfim podiam respirar aliviados.
Depois de terminarem tudo, Nicolas se dirigiu para seu escritório onde uma ligação o esperava, Micaela foi junto com ele, pois talvez fossem notícias de Natasha. Ela não suportava aquela mulher, mas suportava menos ainda ver seu primo naquele estado de culpa. Ela não queria o mal de Natasha, apenas queria que ela pagasse por tudo que fizera e queria mais ainda que aquele peso saísse das costas de Thomas. Por isso, torcia para que as notícias fossem as melhores.
Nicolas se sentou na poltrona atrás da escrivaninha e Micaela se sentou em frente a ele, enquanto amamentava Benjamin.
— Sim, sou eu. – Disse Nicolas. Ele escutou as notícias calado, porém sua expressão o denunciava. À medida que ouvia o que a pessoa do outro lado dizia, seus olhos se arregalavam e as sobrancelhas quase se uniam – Tem certeza disso?... Mas.... Como?... Santo Deus! Eu nem sei o que dizer.... E-eu.... Posso. Eu posso ir.... Está bem. Obrigado pela informação.... Tchau.
Ele desligou, apoiou os cotovelos sobre a mesa e a cabeça nas mãos, soltou todo o ar dos pulmões como se aquilo pudesse aliviar de alguma forma.
— O que foi? – Perguntou Micaela preocupada.
— Natasha está bem. Passou por cirurgia e daqui alguns dias será transferida para a penitenciária. Depois será julgada.
— Por isso ficou assim?
— Não. Não é só isso.
— O que é então?
— Hugo estava fugindo do país. Ele pegou um avião particular.
Micaela sentiu um arrepio percorrer toda a sua coluna e uma sensação ruim se acumular em seu ventre.
— Aquele homem vai ficar solto por aí? Por que as autoridades não fazem nada? Ele é perigoso! – Disse ela um pouco desesperada.
Nicolas levantou a cabeça e a encarou por alguns segundos. Como iria dar aquela notícia para Micaela? Resolveu que não havia uma forma melhor de dizer a não ser contar logo a verdade. Sendo assim disse:
— As autoridades o localizaram. O.... Avião.... O avião caiu na reserva florestal, um pouco antes de cruzar a fronteira.... Não houve sobreviventes.
— Meu Deus! – Arfou Micaela.
Um clima de tensão se estabeleceu novamente ali e nenhum dos dois sabia o que dizer, ficaram em silêncio alguns longos segundos. Logo depois Micaela encarou o filho que já tinha terminado de mamar e agora dormia. Arrumando suas roupas e cobrindo o bebê com uma manta que carregava, ela perguntou:
— Eu seria uma pessoa ruim se dissesse que em partes estou aliviada?
Nicolas novamente encarou a mulher e o filho e respondeu:
— Não. Não seria.
— Parte de mim diz que essa era a única solução para vivermos em paz, mas a outra parte diz que não é certo pensar assim.... Ele era uma pessoa, por pior que fosse.
— Ele fez a escolha dele. E essa escolha o levou à essa consequência. Não estou feliz também, tampouco estou triste. Estou apenas.... Indignado. – Ele deu um riso melancólico e completou – Eu não entendo! Eu juro que não entendo! Nós crescemos juntos e nos dávamos muito bem, tínhamos planos, jamais brigamos quando éramos mais novos e agora.... Como ele pôde fazer isso? Será que fui eu que não percebi o que ele sentia? Será que foi minha culpa aquela raiva que ele tinha de mim? Será que foi eu que causei isso?
— Não, Nicolas! Nada do que aconteceu entre vocês foi sua culpa. Ele alimentou esse sentimento de inveja e foi isso que o matou! Não somente fisicamente, mas por dentro também. Ninguém teve culpa, e mesmo que tivéssemos percebido isso antes, ele estava tão afogado nesse sentimento que duvido que teria aceitado nossa ajuda.... Eu só lamento que tenha acabado assim.
— É.... Eu também lamento. – Ele se levantou e contornando a escrivaninha, parou ao lado da esposa e disse – Minha mãe e eu somos os únicos parentes vivos dele.... Vou ter que reconhecer o corpo.... Ou pelo menos o que restou dele, talvez até façam teste de DNA. Avise Thomas que Natasha está bem, talvez isso tire o peso de suas costas.
— Avisarei.
— Eu volto logo.
Ele deu um beijo na testa de Micaela e depois saiu apressadamente, enquanto ela permanecia sentada tentando se recuperar do choque que havia levado com aquela notícia.
Logo depois ela se levantou e saiu a procura do primo, o encontrou na cozinha tomando um medicamento e fazendo um enorme lanche.
— Pelo visto seu apetite voltou. – Disse ela.
— Sim, eu não consigo ficar muito tempo longe da comida. Temos uma relação muito especial.
— E que remédio é esse aí?
— Ah.... É para minhas costas. Um analgésico, às vezes dói um pouco e esse remédio me ajuda bastante.
— Tem ido ao médico?
— Já fui. Não precisa se preocupar. – Respondeu ele evasivo.
— Então tenho uma notícia boa para te dar.
— Que notícia?
— Bom.... Pode ser considerada boa, afinal vai tirar esse peso das suas costas. Natasha está bem. Dentro de alguns dias vai ser transferida para a penitenciária. Significa que sua recuperação é boa.
Thomas soltou o ar, aliviado. Aquela notícia acabara de melhorar seu dia, e aumentar mais ainda sua fome. Deu uma mordida considerável no lanche e disse:
— Agora vou poder dormir em paz.... E voltar a sair sem olhar para uma mulher e pensar que quase matei uma.
— Tem mais uma coisa.
— O quê?
— Hugo está morto. – Disse Micaela de uma vez.
Thomas parou de comer e olhou fixamente para a prima que tinha uma expressão perturbada no rosto.
— Era para eu sentir alguma coisa? – Perguntou por fim.
— Thomas!
— Me desculpa, mas eu não sinto pena! O cara quase desgraçou a vida de todos aqui e ainda quer que eu dê os pêsames?
— Ele era primo do Nicolas.
— Que o sequestrou, espancou e por pouco não o matou. Um ótimo primo!
— Um pouco de sentimento seria bom.
— Micaela, só porque era parente do seu marido não significa que devemos passar por cima de tudo e fingir que nada aconteceu. Sangue não quer dizer que temos que aturar a família, e muito menos ele estar morto agora significa que devemos esquecer o que ele fez. Ele era um psicopata e acabou!
— Tudo bem, não vamos discutir isso.
— Até porque não iríamos chegar a um acordo. Você é sentimentalista demais.
— E você de menos.
— E olha só como vivo bem. Não tenho uma ruga de preocupação no meu rosto. – Respondeu ele debochado.
— Continue assim e logo não terá mais coração.
Agora Micaela assumira um ar provocativo, com uma sobrancelha elevada.
— Não tenho coração já faz muito tempo, priminha querida.
Micaela riu e logo mudou de assunto:
— Você não acabou de tomar café? Por que está comendo de novo?
— Ora, e desde quando tem horário para comer agora?
— Desde que os médicos disseram que deve se comer de três em três horas.
— Quem liga para os médicos? São um bando de estraga prazeres.
— Eles só falam o que é correto para seu organismo.
— Meu organismo não é normal.
— Não mesmo. Para onde vai toda essa comida?
— Minha libido gasta tudo. – Respondeu ele com um sorriso canalha no rosto.
— Ah, você é horrível, Tommy!
— Não se faça de sonsa! Você fez um filho com o Nicolas.
— Seu pervertido!
— Quer falar sobre perversão?
Micaela não teve tempo para responder, pois Susana entrou na cozinha dizendo:
— Eu tive uma ótima ideia para minha festa de aniversário!
Os primos se entreolharam e deram um olhar significativo um para o outro. Susana estava animada demais, com certeza Nicolas não tinha contado nada do que acontecera a ela.
— O que foi? – Retomou a mulher – Por que estão com essas caras de morte?
— Literalmente morte. – Resmungou Thomas.
— O que disse?
— Hã? Eu não disse nada!
— Mas nos conte sobre sua ideia, Susana. – Se intrometeu Micaela tentando desviar do assunto.
— Ah, sim! Eu sou uma grande fã de romances de época, então eu pensei: Por que não dar uma festa como se fosse aqueles bailes do século XIX? Seria magnífico! Poderíamos contratar alguns músicos, também podíamos nos caracterizar. O que acham?
— Acho uma ótima ideia!
— Eu vou poder cortejar como eles faziam? – Perguntou Thomas.
Micaela revirou os olhos enquanto Susana ria e respondia:
— Creio que sim, Thomas.
— Então eu aceito.
Nesse momento Joana, uma moça loira e muito bonita que trabalhava na cozinha entrou e ficou um pouco constrangida por encontrar os patrões ali, principalmente porque Thomas a encarava descaradamente. Mesmo assim a moça continuou seu trabalho, separando alguns legumes que ia preparar depois.
Micaela e Susana saíram para deixar a moça mais à vontade, mas Thomas permaneceu ali terminando de comer seu lanche.
Porém tinha certas horas que ele odiava o silêncio, sendo assim terminou de enfiar o último pedaço de pão na boca e quando engoliu perguntou a Joana:
— Qual seu nome mesmo?
— Joana, senhor.
— E há quanto tempo trabalha aqui?
— Há dois anos.
— Tem namorado?
— Não, senhor.
— Pode me fazer um favor?
— Claro.
— Pare de me chamar de senhor, me sinto um velho.
A moça riu brevemente e perguntou:
— Tudo bem, mas como quer que eu o chame?
— Pode me chamar de Thomas.... ou, meu acompanhante.
— Meu acompanhante por quê?
Ele se dirigiu para o lado dela e disse:
— Susana irá dar uma festa que tem como tema os bailes do século XIX. Quem sabe você possa me acompanhar.
— Ora, senhor Thomas. – Quando ele lhe dirigiu um olhar mais severo, Joana corrigiu – Thomas. As moças não iam acompanhadas de suas damas de companhia ou do homem da casa?
— Então reserve uma dança para mim.
Ela riu novamente e disse:
— Se a senhora Susana permitir....
— Ela irá permitir. Conheço Susana e sei que ela irá querer que os empregados participem dessa festa.
— Então será uma honra.
Joana resolveu brincar fazendo uma mesura graciosa e Thomas retribuiu pegando sua mão e depositando um beijo ali, dizendo:
— A honra será toda minha.
Logo depois saiu caminhando calmamente e se deparou com Micaela parada no corredor com uma expressão debochada no rosto:
— Flertando com a Joana?
— Ela é uma gracinha! Não posso evitar.
— Se abusar você flerta até mesmo com um poste, Thomas.
— Se for um poste bonito.... Que mal tem? – Debochou ele de volta – Cadê o garoto?
— Está com a babá, ela foi dar uma volta com ele pelo jardim. Susana disse que eu tenho que me desgrudar um pouco dele.
— Não posso discordar. Você parece até uma menininha que ganhou uma boneca nova e agora carrega para todo lado.
— A diferença é que meu bonequinho é de verdade. E precisa de mim.
— Juro que não entendo essa sua obsessão por seu filho.
— Vai entender quando tiver seu filho.
— Está brincando comigo? Eu nunca vou ser pai!
— Você me disse um dia que nunca ia ser amigo do Nicolas.
— E o que isso tem a ver?
— Quero dizer para nunca dizer nunca. Cuspa para cima e depois cairá na sua testa.
— Você e seus ditados.
Ouviram o barulho da porta se abrindo e foram em direção ao salão principal, se depararam com Nicolas que tinha acabado de voltar e tinha uma expressão pesarosa no rosto. Micaela se adiantou em direção a ele e chegando perto, perguntou:
— Então.... Era ele?
Nicolas balançando a cabeça levemente respondeu em seu tom baixo:
— Era. Era ele sim.
— Eu sinto muito.
Micaela o abraçou forte e ele retribuiu o abraço a mantendo colada a si, logo depois se afastou e disse:
— Tenho que conversar com minha mãe, ainda não disse nada a ela.
— Sim, nós notamos.
— Se me dão licença....
Ele saiu e subiu as escadas rapidamente indo em direção ao quarto. Thomas apenas encarava a prima e ambos não sabiam o que fazer naquela situação, era extremamente difícil expressar os sentimentos com palavras.
"Esse capítulo ficou grandinho, não é mesmo pessoal? Como acham que vai ser essa festa, hein? Vou postar dois capítulos hoje para adiantar e no próximo capítulo tem um recadinho importante!"
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