A Cura Perdida

Aedeia |  Érica Moura
(AcireRomua)

Graças aos efeitos da radiação, Ana tornara-se vulnerável a uma superbactéria chamada Mors rubrum. Assim, desenvolvera Carmesina, uma doença que enrubescia os olhos dos infectados antes de matá-los subitamente. Desde então, empenhou-se em uma busca incessante para escapar da morte.

Existia uma solução comercial, claro. Viva, uma empresa farmacêutica, estabeleceu-se como a pioneira na produção do composto capaz de neutralizar os principais sintomas. Comercializava-o como “A Cura” a preços astronômicos. Como esperado, monopolizou o medicamento e tornou-o inalcançável à população mais pobre. Na ausência de recursos para adquirir a opção cientificamente testada, Ana decidiu recorrer a uma anciã de 560 anos. Testemunha do maior evento místico do país, tinha presenciado o selamento de um tesouro no solo sagrado da mata atlântica, feito pelos líderes dos povos nativos. 

Ao visitá-la, a mulher sussurrou-lhe a lenda da Sambacaitá depois de muito olhar para os lados, como se estivesse confidenciando um segredo de Estado. Ana ouviu atentamente a história dos antigos habitantes do Novo Mundo, que tinham acesso aos portões da vida e obtinham a verdadeira Cura — o antídoto para qualquer mal — através de um tesouro natural, a planta Hyptis pectinata. Por mais ilusória que a possibilidade de salvação parecesse, Ana agarrou-se a ela com unhas e dentes. Fosse lenda ou verdade, ela seguiu as orientações dadas pela curandeira, juntou o dinheiro da passagem e partiu para o nordeste.

Perambulando pelo litoral baiano, uma terra inóspita cujo mar contaminado afastava os turistas de outrora, fitava alternadamente a mata costeira e o mapa em suas mãos. A anciã marcara um xis naquele mapa e ela o seguia como um pirata ambicioso. Caminhava pesadamente, afundando os pés na areia, cada passo doía-lhe até os ossos por conta da doença. Apenas mais um pouco, pensava, forçando-se a seguir em frente.

Deparou-se com diversas ossadas parcialmente enterradas pela areia, formando uma espécie de trilha rumo à mata adjacente à praia. Os restos mortais das centenas de pessoas que haviam procurado o mesmo tesouro eram um péssimo sinal.

Apesar das pernas bambeando, Ana forçou-se a continuar seguindo o rastro das tentativas falhas em busca de sua recompensa. A floresta ficava mais densa, ondas de calor e calafrios se alastravam, ela ardia em febre. Quanto mais avançava, pior se sentia.

Chegou a um ponto no qual até respirar tornara-se um suplício. Então, algo resplandeceu, como se tivesse surgido do além. Ela seguiu rumo ao feixe luminoso. À medida em que se aproximava, seu corpo parecia ser consumido de dentro para fora.

Quando finalmente enxergou com clareza e riqueza de detalhes a delicada planta, de caules finos e folhas serrilhadas de um verde intenso, compreendeu o que estava acontecendo. A um passo da Sambacaitá, tombou estendendo a mão em uma última tentativa de alcançá-la. A doença atingira o estágio final, seus olhos vermelhos contemplavam, estáticos, a beleza da planta lendária que curava todos os males.

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