PRIYA | Sem calcinha em Manhattan

Priyanka Seth tinha um plano. Chegar de ressaca na entrevista que mudaria a sua vida não fazia parte dele.

Jogada no canto da cama, Priya resistia à vontade de abaixar a cabeça, botar as mãos no rosto e gritar. Ela mal havia acordado cinco minutos atrás, de bruços com a cara em um travesseiro — macio demais para ser o da sua própria cama — e uma dor de cabeça lancinante causada pelo barulho irritante do despertador do celular, que tocava sem dó, com a missão de despertá-la da confusão induzida por tequila. Em meio ao seu estado grogue, ela tentou alcançar o agressor em modo vibra sobre a mesa de cabeceira e piscou com a claridade da tela, clara demais para o breu da suíte.

O horário no visor dizia Domingo 7:00, nada demais para alguém que acordava cedo — mas foi o lembrete abaixo que fez com que pulasse da cama com um grito histérico, e acabasse caindo de bunda no chão.

Entrevista da MNS: HOJE– às 8:00

Flashes da noite passada voltavam em fragmentos incompletos. Ela havia decidido sair sozinha para afogar as mágoas em um bar novo, que estava na moda. E por afogar as mágoas, ela queria dizer entornar uma fileira de shots de tequila enquanto a sua conta bancária permitisse, ou até ela ficar bêbada demais para se sentir tão brutalmente traída. O que quer que acontecesse primeiro.

E algum momento ela conheceu um cara, e havia uma lembrança de um e-mail, que uma pesquisa rápida na sua caixa de entrada confirmava, enviado após a meia noite pela secretária executiva da Sra. Nagao, informando à Priya que a sua entrevista às 10 da manhã de segunda havia sido antecipada para o domingo às 8 da manhã. A mensagem perguntava ainda se ela confirmava.

E como uma idiota completa — Priya confirmara.

Scheisse.

E agora, ela estava ilhada em um quarto de hotel que ela apostava que ficava no meio de Manhattan, perto da firma, mas longe demais para que desse tempo de tomar banho e vestir o terninho impecável, feito sob-medida. O mesmo que custara a quantia obscena de duzentos dólares, e que ela havia planejado usar bem nessa ocasião.

Pelo que ela percebia, estava sozinha, acompanhada apenas de um carrinho de serviço de quarto com pratos de comida cobertos e um bule de café, aquecido por uma plataforma eletrônica. Cortesia do homem misterioso, ela imaginou — já que não dava para fingir que havia se hospedado em um hotel de luxo sozinha. E embora ele tivesse fugido de manhã, pelo menos havia sido gentil o bastante para deixá-la com um verdadeiro café da manhã. Ovos, bacon, panquecas e várias fatias de torrada, sucos frescos de frutas cítricas e um café recém preparado que deixaria um italiano chorando de alegria.

Não que ela tivesse tempo para saborear muita coisa.

Enquanto se passava a roupa da noite passada, Priya ingeriu o máximo de carboidratos possível e praticamente engoliu sem mastigar as panquecas enroladas e várias fatias de torrada.

Encontrou a saia no pé da cama, ela havia dormido de blusa e sutiã, os sapatos estavam próximos à porta, a bolsa em cima deles. Ela havia encontrado quase tudo. Menos uma peça de roupa: a calcinha. Uma calcinha boy short rosa-choque com acabamento de renda — difícil de perder de vista, e ainda mais difícil de perder em algum lugar.

Mesmo assim, em uma suíte de apenas 700 metros quadrados, ela havia conseguido essa façanha.

Tomando um banho de 10 segundos, Priya passou a pasta de dentes, cortesia do hotel, com o dedo, enfiou as roupas de qualquer jeito, enrolou o longo cabelo molhado em um coque, e avaliou o resultado final no espelho.

Que. Merda.

Ela estava a cara da derrota, inchada e com ressaca. Deus do céu, ela mataria por um pouquinho de rímel que fosse, para pelo menos amenizar os olhos vermelhos. Um batom que fosse. Qualquer coisa servia! Se a Caitriona estivesse presente, ela criaria o look perfeito pós acidente de trem: Louca-da-tequila-chic. #Lacrou!

Uma voz interna desesperada implorou que a Priya pegasse o celular...pra que? Remarcar? Aquele simples ato de burrice representaria uma única coisa: dar adeus ao seu futuro. Ninguém cancelava com a Senhora Nagao. Nunca. Se você marca um compromisso ou uma reunião com ela,— você aparece. Ponto final.

E qual é a única coisa pior do que estragar tudo em uma reunião? Se atrasar para ela. E uma reunião às 8 significava que a Priya precisava chegar lá às 7:45. Que era em quinze minutos! Porra!

Ela pegou um taxi, parado do lado de fora da porta de entrada do hotel, depois de devolver as chaves do quarto (e após uma pequena discussão com uma recepcionista escrota). E já que não conseguia pensar em uma hora mais oportuna para ligar para as Irmãs em busca de apoio psicológico, enviou uma mensagem para todas elas.

Regra 31. Nunca deixe uma irmã em apuros. Esta Irmã aqui está uma merda fdp! Atendam!

Se citar as Regras como um padre citaria um versículo da bíblia a tornaria um tanto melodramática, tanto fazia. Azar o delas, que ninguém tivesse tido a ideia de acrescentar 'nada de ligações de manhã cedo' de antemão à lista. Após apertar "Enviar", Priya se jogou no banco de trás, e decidiu garimpar a bolsa para qualquer pista que a ajudasse a preencher as lacunas da sua memória falha.

Ela encontrou um recibo do bar, no valor de quase trezentos — (pontequemepartiu!) —dólares! Achou uns trocados, a tampa de um batom, sem o batom (droga—ela adorava aquela cor!)

Por sorte, nada de números aleatórios ou mensagens no celular. Nas redes sociais, tudo limpo também, sem nenhum post no Facebook ou Twitter—Graças a Deus!

Mas tinha um vídeo...

Scheisse. Priya fechou os olhos. Por favor, me diz que eu não quebrei a regra 13 b): Diga não a mensagens de sexo, nudes, ou vídeos caseiros.

Com as mãos tremendo, Priya abaixou o volume o bastante para que só ela ouvisse sobre o som do rádio, deu play e ficou boquiaberta com os ruídos que só poderiam ser descritos como carnais.

Era basicamente a respiração dela, ofegante, e entrecortada. Sua voz se arrastava em gemidos ardentes e, em resposta, ouvia a risada masculina, suave e maldosa, e o dono da voz sussurrava alguma coisa — algo que foi cortado pelo que parecia ser o início de um orgasmo intenso, antes do fim do vídeo, e de a imagem congelar no close parcial do rosto de um homem.

Vago e nebuloso como a sua memória.

Ela só tinha uma lembrança, de uma imagem fugaz: Mãos rápidas e uma boca quente. Era só isso. O resto do vídeo não tinha sido claro, mas deu para ver um painel de controle e luzes fortes subindo, a medida que o elevador ficava mais alto, oferecendo uma vista da cidade.

Menos de um quarteirão depois, o telefone apitou na sua mão, e na afobação, Priya quase deixou o maldito voar pela janela que ela tinha aberto para respirar um pouco de ar fresco.

Pelo amor de deus...

O que aconteceu?

Agradecida por ter alguém com quem falar, Priya digitou a resposta o mais rápido que os seus dedos trêmulos permitiam.

Eu acordei sozinha em uma suíte do Waldorf sem sinal do cara ou das calcinhas. E quando tentei obter alguma informação na recepção, tive que encarar a babaca-rainha que basicamente me chamava de piranha com os olhos, enquanto recitava a política do hotel que não permitia a divulgação de informações pessoais sobre os hóspedes com ninguém, nem mesmo — sem sacanagem —suas acompanhantes.

E porque, só de pensar no assunto fez com que ela sentisse uma onda de raiva, Priya fechou os olhos e respirou fundo algumas vezes, para se acalmar, enquanto tentava ao máximo ignorar os olhares do taxista, que provavelmente estava achando que ela estava enlouquecendo de vez.

Que escrota. Espero que você tenha dado uma voadora nela com os seus louboutins.

Priya riu alto, com gosto, da resposta irritada da Seis. Ela não achava possível rir em um momento como esse, mas essa era a beleza e a força da Irmandade, elas se conheciam, se entendiam tão bem! Não havia ninguém que ela amasse mais, em que ela confiasse mais do que as suas Irmãs, e mesmo a Seis estando mais distante dela do que as outras, a Priya sabia que podia alcançar e se conectar com todas as Irmãs — a qualquer custo.

Distancia, fusos horários, a vida — nada cortaria os laços ou romperia o pacto que elas tinham umas com as outras.

A própria existência miserável dela já é carma o suficiente. Tenho dificuldade de dar um chute na cara de alguém, quando a pessoa está tão abaixo de mim. Mas, de qualquer forma, voltando ao meu dilema.

Tá bom. Foi mal

Como eu ia dizendo, estou em um taxi.

Usando um Valentino vintage fofo —

Sua vaca! Onde você conseguiu um Valentino vintage?

Sério mesmo? Priya revirou os olhos, indignada. De todas as Irmãs, ela esperaria esse tipo de comentário da Caitriona, A Fashionista, mas mesmo assim, nem dava pra culpar a Seis por dar uma de fã, e alisou o material rendado que só chegava ao meio das suas coxas.

Afinal de contas, era um Valentino.

Meu Deus, foca, mulher! Eu estou em um taxi — sem calcinha!

Então, vai pra casa e veste uma...?

Não dá tempo. Estou a caminho da (inserir nome da empresa).

A entrevista foi adiantada para as 8. Hoje.

Diante de um gif que ria, zombando dela, Priya fechou a cara.

Não consigo achar graça nenhuma.

Outro gif, com a legenda – Para, para, assim eu vou fazer xixi na calça. Priya olhou para o celular. Piscou, uma piscada longa e lenta ...

OK – vai se fuder —Tenho que ir agora.

Ah, deixa disso, é bom demais.

Por que você foi sair e se embebedar, se a entrevista foi adiantada?

Eu recebi um email ontem, por volta das 12:36, e a essa altura eu já tava bebaraça.

Eu hein.

Quem é que envia e-mails depois da meia noite?

E quem marca uma entrevista num domingo de manhã?

Priya balançou a cabeça, suspirando. Quem?

Eu a chamaria de Satanás,

Mas isso a tornaria ainda mais perfeita.

Você procurou pela suíte, antes de entrar no taxi?

É claro! Eu procurei em tudo quanto era canto.

A única explicação possível? O cretino pegou.

Eca.

Eu sei. Ele é um ladrão. Um ladrão de calcinhas cujo nome eu nem sei. Se não fosse pela foto, eu nem faria ideia de como ele é.

E primeiro lugar – você precisa parar com os blackouts de tequila. Pensa nos seus neurônios. Em segundo – como é que você tinha uma foto dele esse tempo todo e não me mandou imediatamente? Pode mostrar! Agora.

"Moça, chegaremos no destino depois desse quarteirão". Disse o motorista. "Onde você quer que eu te deixe"?

"Na esquina, do lado esquerdo, seria ótimo", ela respondeu, sem tirar os olhos da tela, enquanto passava pelo álbum de fotos e encontrava a imagem capturada.

Pena que eu não lembro se o sexo foi bom, pq o video é uma loucura.

Deve ter sido alucinante.

Merda de tequila.

A Tequila é uma vadia cruel com todas nós,

Mas que ela tem estilo, ela tem.

LOL fato. Ok, tenho que ir.

Espero que não vente forte

Senão eu vou mostrar a minha bunda pra cidade toda.

Tchau, vaca

Lol te adoro, piranha.

Da próxima vez, vê se obedece as Regras e vai embora antes do sol nascer.

De repente assim você não perde a calcinha.

LOL Vai se foder.

Te ligo mais tarde.

Tchau GI Jane.

Sacou?

GI...comandos sem calção?

Priya deu uma risada com um ronco, bem quando o taxi parou abruptamente. Ele se virou no banco da frente e deu uma batida forte no vidro que o separava dos passageiros. "São onze e cinquenta".

Enfiando o celular na bolsa, ela procurou a carteira, e pagou a corrida no cartão, torcendo para que fosse aprovado, e quase desmaiou de alegria quando saiu o recibo. Embora os seus pais enviassem uma quantia a cada dois meses para cobrir as suas despesas, Priya havia levado os seus gastos ao limite, e ainda faltavam duas semanas para enviarem novamente, não que ela pretendesse aceitar mais dinheiro dos pais.

Ela estava prestes a se tornar uma trabalhadora, ganhando o próprio salário, o que significava que ela pagaria uma parte do salário da casa em Chelsea. Já que ela era a única que morava lá agora, era justo, e fazia sentido que ela contribuísse. No ano anterior, os pais haviam decidido se aposentar em Zurique e deram a ela opção de ir com eles, mas ela recusou.

Era Nova York que fazia o seu coração bater mais rápido. Ela adorava o ritmo acelerado da cidade e a sua beleza impiedosa. Ela havia tido a sorte de poder rodar o mundo com os pais, o que fez, indo de Toronto a Paris, pra Londres e algumas partes da Espanha, mas nenhum desses lugares parecia a sua casa, como Nova York.

Guardando a carteira na bolsa, Priya fechou a cara, grunhindo à medida em que lutava para se mexer de um lado do banco traseiro para o outro, para sair com o máximo de dignidade possível. De repente, sentiu uma pontada de simpatia por todas as socialites escandalizadas que eram flagradas com uma lente por baixo da saia ao sair de um carro, porque, a não ser que ela colasse uma coxa na outra, aquilo era extremamente difícil.

E Priya tinha bastante certeza que, apesar de todos os seus esforços — ela havia mostrado uma boa parte da bunda para o motorista, ao sair.

Se o sorriso aberto e as sobrancelhas mexendo agitadas enquanto ele acelerava eram alguma indicação.


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