*Bônus - Meados de 2144
Ethan.
Um ano foi o suficiente para que todos vissem as mudanças que fazíamos e decidissem ficar ao nosso lado, talvez só por conveniência, mas não nos causavam problema algum.
As crianças estavam mais seguras de si e compreendiam que sua diferença era um dom. Um dom que podia ajudar muitas pessoas se usado com sabedoria.
- Agora que as coisas estão estáveis por aqui quero ficar um tempo lá fora na casa que a mamãe deixou as coordenadas naquele relógio. Ele quase parou uma vez não quero correr o risco de perder essa oportunidade tio. - esperava que ele entendesse meus motivos.
- Você já está bem crescido, não precisa mais me pedir permissão. - titio sorria. - Mas já que o fez, quero ir junto, essa pode ser nossa ultima aventura juntos.
- Deixa disso, o senhor vai viver bem mais que eu. - tentei descontrair, mas sabia que ele estava falando a verdade.
- Vai começar a mentir pra mim a essa altura da minha vida. - titio começou a rir e o acompanhei.
- Dentro de uma semana partimos então.
Sai dali pensando o quanto essa exposição tinha feito mal a ele, sua respiração tinha um chiado permanente, e essa viagem poderia agravar ainda mais seu estado, só que dificilmente ele me ouviria e desistiria. E apesar disso tudo, caso ele morresse eu gostaria de estar ao seu lado e não longe.
No decorrer da semana deixamos as crianças preparadas para qualquer infortúnio e então partimos. Boa parte do caminho conhecíamos de cor pelo tanto de vezes que saiamos para conseguir mantimentos, foi uma caminhada suave e fria pela noite adentro, apenas uma pequena lanterna iluminaria nosso caminho pela parte desconhecida.
- Estamos caminhando a tempo tio. Tem certeza que não quer dar uma pausa. - já estava preocupado com ele.
- Não podemos! Tão logo o sol nascer não teremos como avançar você sabe disso, não se preocupe comigo. - sua respiração foi falha.
- Mas...
- Já disse Ethan!
Não deveria ter contado a ele minha intenção. Entretanto seria injusto tal atitude de minha parte.
- Okay, para de se martirizar. - olhei para ele - Não adianta vim com essa cara de quem não sabe do que eu estou falando, te conheço muito bem Ethan.
Bufei frustrado.
- Só queria que tudo pudesse ser diferente. - confessei.
- Eu sei! E vai! Estou aqui para lhe ajudar, como sempre fiz, mas preciso que você pare com isso. Eu sei meus limites e acredite em mim estou bem longe deles.
Bem que eu queria acreditar, só que não é isso o que eu vejo.
- Mas uma meia hora de caminhada a leste, é onde encontraremos abrigo, depois disso apenas terra, areia e destroços. Quando chegarmos lá paramos e só então, antes jamais.
- Como sabe disso? - a surpresa em minha voz foi difícil de esconder.
- Ha anos ando por aqui, meu querido sobrinho, vai me dizer que se esqueceu disso?
- Claro que não, só estou surpreso por saber disso.
- Não é a primeira vez que estou indo para lá, como você acha que eu concertei o relógio? Para que quando você quisesse ir ele estivesse em pleno funcionamento.
Parai abruptamente.
- Porque não me disse isso antes? - a raiva queria se estabelecer em mim.
- Não era relevante.
- Como não?
- Acredite, não era! Você era apenas uma criança tinha de agir como uma. Agora você é um adulto formado e tenho que lhe ensinar algumas coisas antes que o tempo que me resta acabe.
- Ah! E agora é relevante!
- E agora vai agir como criança! Ethan compreenda que tudo nessa vida tem seu tempo certo para acontecer, um dia você terá seus filhos e vai entender exatamente o que eu estou dizendo e tudo o que eu fiz por você. Até que esse dia chegue não julgue as minhas atitudes.
Abaixei a cabeça, não queria admitir que ele tinha razão apesar de eu saber que ele tem.
- Estamos chegando. - ele falou depois de um tempo de silencio. Apenas balancei a cabeça em entendimento.
Sem mais palavra o vi entrando em uma abertura pelo pouco que a lanterna iluminava, assim que ele entrou se atirou no chão e ali ficou sem se mexer. Sem mais nada a fazer ou para onde ir, encostei-me à parede oposta e fique ali até que o sono me encontrasse.
🍁
- Acorda! - meu corpo balançou. - O sol já se pôs é hora de voltarmos a andar.
Relutante me levantei e segui por onde titio ia, mais um dia de caminhada.
- Quando chegaremos lá? - perguntei.
- A partir de agora vamos correr, mas três dias com sorte chegaremos.
- O senhor não esta em condições de correr. Não me importo que demore mais.
- A questão não é poder, é necessitar, se não corrermos não teremos abrigo e sem abrigo seremos descobertos. Compreende! - seus olhos estavam fixos nos meus.
- Sim! - estava começando a entender o porquê de ele vir junto.
- Ainda existem bombas terrestres, quando eu disser pare, você obedece no mesmo instante sem nem mais um passo ou questionamento, esta entendendo?
- Sim! - ele sempre tem razão.
- Então vamos.
🍁
- Ethan pare ai! - o aviso foi tão inesperado que por pouco não consegui obedecer.
Olhei para titio que estava com seus olhos fixos em algo brilhante muito longe de nós. O ponto luminoso parecia se mover.
- Tem algo errado os SORG nunca andam sozinhos. Ou aquele é um desertor ou é uma emboscada. De qualquer forma logo o sol se levanta e não podemos ficar aqui!
- O que sugere? Devemos voltar?
- Não se vira as costas para uma potencial ameaça e estamos muito longe do abrigo.
Olhei ao redor, estávamos escondidos atrás de uma arvore seca caída. Depois disso, apenas terra e areia. O sol começava a deixar tudo laranja avermelhado. Estamos ficando sem tempo.
- De acordo com a localização, alguns minutos a nossa frente esta um pequeno casebre. - titio analisava atentamente - Vamos esperar um pouco, prefiro lidar com o sol quente a lidar com os SORG.
- Mas se ele é um desertor não o faz um dos nossos? - perguntei.
- Não necessariamente. Ele pode ser um traidor da coroa, alguém que tentou ter posse do trono, prefiro não arriscar. Você é puro meu sobrinho, não vê a maldade desse mundo.
- Mas e se ele não for?
- Você arrisca colocar todos em risco para saciar um duvida? - pensando por esse lado.
- Não!
- Se for para ajudarmos ele, o destino se encarregará de colocá-lo no nosso caminho novamente.
O resto do percurso foi silencioso e logo estávamos diante de uma casa abandonada com algumas esculturas quebradas, piso e teto no mesmo estado. Suspirei diante daquela imagem e entrei.
🍁
- O que são isso? - levantei alguns papeis que encontrei no porão do porão da casa grande.
- Desenhos técnicos. - titio disse avaliando. - acho que vi um protótipo disso por aqui. - ele voltou para a bancada onde estava e logo apanhou uma pequena esfera pontiaguda. - Aqui esta!
- Pra que serve?
- Ainda não sei, deixa-me ler essas anotações e logo saberei.
Concordei voltando a olhar a quantidade de materiais que tinha ali, deve ter dado trabalho encontrar e trazer tudo isso para cá.
- Minha irmã era um gênio! - desviei meu olhar para titio que encarava os papeis e a esfera pontiaguda de aproximadamente 2,5 centímetros em suas mãos. - O mundo não será mais o mesmo graças a você.
- Do que o senhor esta falando titio?
- Isso! - ele chacoalhou os papeis diante de meus olhos - É a maior descoberta que esse mundo poderia ter e precisar. - acho que minha cara estava bem claro que eu não o entendia. - Isto é um projeto de reconstrução. Essas esferas possuem componentes que quando se colidem geram impulsos e, além disso, ha uma programação de reconhecimento para que não se percam.
Estava começando a entender.
- Esses impulsos geram uma espécie de escudo eu presumo.
- Exato! - o sorriso de titio era gigantesco - E esse escudo vai permitir que a camada protetora da terra se reconstrua. Poderemos voltar a andar com o sol nos iluminando.
- Isso é incrível, mas e os riscos?
- Sempre haverá riscos, mas este estou disposto a correr. Quem sabe assim um dia o povo consegue se livrar das garras desse rei. Temos trabalho à frente. - titio me olhou esperançoso, fazia anos que não via esse olhar. - Precisamos reproduzir essas esferas e fazer dois propulsores que as levem o mais alto possível depois elas fazem todo o trabalho.
- Porque dois?
- Para abranger uma área maior. - ele pegou um papel e fez uns cálculos rápidos - Iremos para sudoeste e noroeste, depois nos encontramos aqui. - ele apontou para a bolinha. - É uma floresta morta, ninguém vai lá é muito arriscado.
- E porque nós iremos para lá?
- Porque ninguém vai! Será nossa melhor opção. Agora chega de papo e vamos à diversão. - titio esfregou as mãos em animação.
🍁
- Tem certeza disso titio? - perguntei pela ultima vez antes de partir para o meu destino.
- Absoluta! Agora vá! - assenti e comecei a andar. - Espera! - titio me impediu de continuar me envolvendo em um abraço, estranhei, mas retribui. - Se algo acontecer e eu não chegar, não quero que vá atrás de mim. Não vale apena o risco. Se eu não voltar em um dia volte para casa o mais rápido possível e feche tudo, fiquem por lá o máximo que conseguirem.
- Eu não vou fazer isso! - protestei de imediato.
- Vai sim, temos muitas vidas envolvidas e meus dias estão contados, sabemos disso. Não faça a escolha errada.
Dito isso ele se afastou e começou a correr em direção noroeste, o lado mais perigoso e onde poderíamos encontrar os SORG, sem ter mais nada que eu pudesse fazer além de obedece-lo retomei minha jornada.
A cada passo dado mais minha pulsação acelerava em antecipação, deixei que o chão sob meus pés me guiasse e corri como se minha vida dependesse disso. E talvez realmente dependesse.
7.500 passadas depois parei e retirei a mochila das costas, colocando para fora seu conteúdo. Apanhei a pá e comecei a cavar para retirar o pequeno foguete que construímos e enterramos ali. Há essa hora titio deve estar fazendo o mesmo.
- Ai esta você! - olhei para o equipamento a minha frente e bati no suporte para abrir o compartimento. - Agora só colocar vocês e acioná-lo! - apanhei as esferas e despejei cuidadosamente. - Isso ai, todas acomodadas! - olhei ao redor para ter certeza do que falava.
Segurando nas alças laterais puxei o foguete para fora do buraco e o posicionei corretamente. Olhei para o buraco na duvida se o cobria ou não, porque não? Com um simples gesto o buraco estava tampado.
- Vamos lá, inserindo código de comando, rota, cronometro iniciado. - olhei o timer, 120 segundos em contagem regressiva.
Apanhei a mochila e a pá e sai em disparada me afastando. Assim que ele decolasse o barulho chamaria muita atenção. Atenção essa que eu não queria.
Cheguei ao ponto marcado e me assustei com o lugar, o ar era pesado, rarefeito, parecia que algo muito ruim tinha acontecido ali. Me afastei o que pude, mas me mantendo perto e aguardei o retorno de titio. Retorno esse que não aconteceu.
Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top