Capítulo 41 - Revelações
https://youtu.be/BnSkt6V3qF0
Atordoado. Era assim que eu me sentia diante da revelação que Caio acabara de me fazer. Não era a Sophia, coitada, alvo te tantos ciúmes meus, a ex de Victor. Era um ex. Um homem. Era Caio. Como eu pude ser tão burro e não ter notado? Minha insegurança me deixou cego e eu não consegui ver algo que estava bem diante dos meus olhos. Em minha cabeça tudo começou a fazer sentido de uma forma tão clara quanto o copo de vidro que caio agitava na minha frente.
- ... da lua? - Ele perguntava algo que eu não ouvia.
- Oi?! - Agitei a cabeça ao falar, voltando ao lugar onde meu corpo estava.
- Vamos lá?! - Após o convite ele colocou um pouco de água no filtro à sua frente. - Parece que a notícia de que Victor é meu ex te pegou de surpresa. - Ele disse, sem me encarar. Bebeu o líquido em um gole. A ressaca deixava minha garganta seca, mas de repente eu queria estar em qualquer lugar que não fosse a casa de Caio. Nem um gole de água a mais que viesse dali eu queria. - Eu pensei que você já soubesse. - Voltou a me fitar. - Vocês parecem tão amigos.
- Eu sabia! - Afirmei, da forma mais desastrosa possível. Nem sei porque falei isso. - Claro que eu já sabia. É só que... - Me perdi nas palavras. Semicerrei os olhos. - Caio, se tu não se importa... - Parei pra respirar o ar que me faltava. Crise de asma, agora, não! Pensei. - É que eu tenho um monte de coisa pra adiantar lá na loja. Ainda tenho que passar em casa...
- Ué! - Ele franziu o cenho ao falar. - Tô só te esperando.
- Então vamos! - Falei. Eu estava completamente perdido com a notícia bombástica. Dei as costas e segui na direção pela qual Bia tinha ido embora.
- Por aqui! - Caio me chamou. Me virei e o encarei. - A garagem é por aqui.
Como se eu já não estivesse perdido o suficiente. Refleti.
• • • • •
O carro de Caio me pareceu familiar, mas não lembrei de onde. Talvez fosse uma das lembranças esquecidas da noite anterior. Entramos e batemos as portas ao mesmo tempo. Eu tentava organizar meus pensamentos, em meio àquela dor incômoda, para rever tudo o que eu tinha vivido nos últimos dias, baseado na fantasia de que Victor era hétero e namorava Sophia. Em quê toda essa confusão implicaria? Eu me perguntava, hipnotizado pelo portão que se abria, causando um efeito interessante com o movimento das suas diagonais ao cruzar com a parede.
- Theo? - Caio falou, me tirando do transe.
- Oi? - Perguntei.
- O cinto. - Ele apontou.
- Ah... Sim. - Eu disse. Então coloquei o cinto de segurança. Caio deu partida e saiu de casa, fechando o portão atrás de nós assim que passamos por ele. Perdi alguns segundos observando a residência que eu conheci de dentro para fora. A arquitetura externa era tão impressionante quanto a interior.
- Bonita né? - Ele perguntou. Pareceu presunção, mas eu concordei balançando a cabeça. - Tu disse isso ontem. - Ele falou. Então entendi. Senti meu rosto aquecer ao lembrar das coisas que eu não conseguia lembrar. Alguns segundos de silêncio seguiram, até que Caio o quebrou. - Posso ser sincero contigo?
O portão do condomínio se abriu à nossa frente. Sinceridade. Se eu tivesse sido mais sincero comigo mesmo, com Victor e ele comigo. Talvez tudo tivesse acontecido de uma forma totalmente diferente. Por que eu não percebi? Por que ele não me contou. Minha cabeça tentava a todo custo assimilar tudo.
- Claro. - Respondi a Caio, que aguardava.
- Eu sei que tu não sabia do meu namoro com Victor. - Ele disparou. Eu franzi o cenho, imaginando como ele poderia saber isso. - Desconfiava, na verdade. - Ele se corrigiu. Minha expressão voltou a ficar neutra. - Por isso joguei a verde lá na cozinha. Precisava confirmar e tua reação mostrou que minha suspeita estava certa. Até porque se tu soubesse dificilmente ia querer se aproximar de mim.
- Por que não me aproximaria? - Interrompi curioso. Estava um pouco atordoado em ver que o condomínio onde Caio morava ficava um pouco afastado da cidade. Pegávamos a BR. Como eu não lembro de nada?
- Porque o nosso relacionamento não acabou de uma maneira muito legal. - Caio parou e pigarreou. Olhei para ele, que mirava a estrada. - E Victor tem uma mania de exagerar nas coisas. Com certeza já teria feito a tua cabeça contra mim. Não sei porque ele não te contou. Enfim... - Ele pareceu querer encurtar aquele assunto, muito embora minha curiosidade estivesse me corroendo. - Não era nesse ponto que eu queria tocar.
- Em qual era, então? - Indaguei. A cidade começava a nos cercar.
- É que talvez eu não tenha feito as coisas do jeito certo. - Ele iniciou. Meu cenho voltou a franzir. - O modo como eu me aproximei de tu. - As palavras dele começaram a me preocupar. - Sexta-feira, antes do esbarrão, eu tinha te visto conversando com Victor, Bia e Sophia. - Ele revelou. Meu coração acelerou um pouco os batimentos. Minha cede aumentou. - Eu tava no meu carro, em frente à boate. Eu senti tantos ciúmes ao ver tu com Victor. - Ele fez uma careta ao falar. - Pensei que talvez fosse um pretendente novo. - Não errou. Pensei. - Eu buzinei, chamando Sophia...
- Ah! - Interrompi. - Então por isso achei teu carro familiar. - Lembrei do fato. Então a sensação de reconhecer o carro fez sentido. - Eu lembro que tu chamou ela, buzinando.
- Pois é! - Ele falou. - Eu perguntei quem era tu e ela disse que não sabia muito. Tinha acabado de te conhecer. Deixei pra lá. Mas dez minutos depois, eu tinha acabado de estacionar e te vi se aproximando, sozinho e todo distraído, olhando para a boate. - Então quer dizer que... eu pensava. - O esbarrão não foi acidental. - Ele revelou ao mesmo tempo em que eu supus. Arregalei os olhos.
- Tu esbarrou de propósito. - Meu coração acelerou um pouco mais.
- Foi. - Ele me encarou brevemente, com o rosto envergonhado e voltou a olhar para a frente. - Eu te vi ali, na minha frente, de perto. Quis dar um jeito de descobrir o que tava acontecendo entre tu e Victor. Se era só um amigo ou se era algo mais. - O primeiro sinal da cidade chegou e estava vermelho. Ele freou e me encarou. - Mas eu tenho que confessar que tua beleza, de perto, me chocou um pouco. - Senti meu rosto queimar novamente. - O jeito que tu me olhava, tua tensão, acabou me deixando um pouco atraído. Eu vi uma chance de matar dois coelhos com uma cajadada só.
- Como assim? - Perguntei, aumentando minha preocupação.
- Eu podia ficar contigo e acabar com a chance de que alguma coisa acontecesse entre tu e Victor. - A sinceridade dele me deixou chocado. Então ter algo com ele faria Victor não querer mais nada comigo? Eu via minhas chances se distanciando mais uma vez, depois de tudo que aconteceu. - Isso se ele não fosse rápido ao ponto de vocês já estarem tendo algo, com um fim de relacionamento tão recente. Então eu consegui te convencer e quando chegamos lá no camarote rolou o beijo. - Um carro buzinou. O sinal tinha ficado verde. Eu não estava me sentindo bem. Queria sair dali. Como Caio pôde fazer isso? Eu me senti ingênuo demais.
- Caio, eu... - Tentei falar.
- Mas o que eu quero te dizer é que me arrependi. - Ele me interrompeu. - Por isso resolvi te contar tudo isso. Ser tão sincero. Ontem, na loja, minha intenção ainda era muito a de atrapalhar as coisas entre Victor e tu. Quando eu vi Victor chegar por trás de tu eu falei do beijo e a reação de vocês me mostrou que eu tinha razão nas minhas suspeitas. - Por mais que ele dissesse que tinha se arrependido, eu estava com tanta raiva dele. Só queria sair dali.
- Como tu pôde... - Eu balançava negativamente a cabeça.
- Me desculpa! - Ele falou. - Eu não te conhecia direito. Mas depois de ontem. A noite contigo, principalmente depois que teus amigos foram embora. Tu me tratou tão bem. Se abriu comigo. Eu vi quem tu era. Vi que eu errei em fazer tudo aquilo. Vi principalmente a chance de tu ser a pessoa que apareceu pra me fazer esquecer Victor.
- Tu só pode estar doido. - Eu falei, sem querer acreditar em tudo que ele me falou. - Eu tava bêbado. E se arrepender não desfaz nada do que tu fez. Para esse carro. Eu quero descer.
- Calma! - Caio insistiu. - Eu te peguei de surpresa. Mas pensa bem...
- Eu não tenho em que pensar Caio. - Eu falei. - Eu senti que não devia me aproximar de tu, mas fui burro o suficiente pra não seguir meus instintos. Agora eu tô vendo porquê.
- Droga! - Caio gritou e deu um murro no painel do carro. Eu arregalei meus olhos, assustado. Ele esfregava a mão no rosto, enquanto eu, assustado com o comportamento dele, olhava o trânsito ao qual ele parecia não prestar atenção. - Eu faço tudo errado. Tudo! - Ele falou.
- Calma, Caio! - Tentei fazê-lo se controlar, com medo de que ele causasse algum acidente.
- Me perdoa! - Ele falou, mais uma vez me olhando. Sua expressão era de descontrole e seus olhos começavam a lacrimejar. - É que tudo isso...
- Eu te perdoo! - Falei da boca pra fora. Mas eu precisava fazer com que ele ficasse calmo. - É só que realmente me surpreendeu tudo isso. - Vi que estávamos na mesma avenida onde ficava minha loja. - Me deixa ali na loja, por favor. Tenho que organizar a bagunça de ontem para abrir mais tarde. - Inventei.
- Tá bom. - Ele falou, parecendo mais calmo. - Só me diz se eu tenho alguma chance contigo.
- É complicado Caio. - Eu falei. - Eu também saí recentemente de relacionamento. Um noivado, para ser mais exato. - Argumentei. Olhei pra ele. - Com uma menina, embora eu tenha falado aquilo ontem. É que tudo isso é relativamente novo. É uma confusão para mim.
- Eu entendo. - Ele falou. - Mas eu quero que tu saiba que, eu estou aqui. E estou interessado. - Ele parou o carro em frente à loja.
- Certo. - Falei. - E obrigado, por tudo.
- Faria novamente ele falou.
Eu não sei a qual dos fatos ele se referia com essa afirmativa, nem perguntaria. Com um sorriso sem mostrar os dentes eu desci do carro. Que louco! Pensei, enquanto acenava, me despedindo. Meu coração estava a mil. Tinha até esquecido minha dor de cabeça, que depois dessa voltou com tudo. Como ele perdeu o controle, assim, tão rápido? Minha mente estava uma bagunça só. Me virei e entrei na loja.
Camila já tinha adiantado bastante as coisas e a loja estava quase pronta para abrir. Perguntei se meu pai tinha ligado para a loja procurando por mim. A resposta foi negativa. Indaguei se ela teria um carregador para me emprestar, mas seu celular era um Samsung, que tem a entrada de carga diferente do iPhone. Bebi bastante água. Minha garganta parecia areia do deserto de tão seca. Passei um pouco mais de tempo por lá, para justificar minha aparição repentina e, em seguida, pedi um táxi.
• • • • •
No caminho eu até minha casa eu consegui finalmente começar a assimilar o quão conturbada tinha sido minhas últimas vinte e quatro horas. Quando finalmente descobri que o sentimento que eu nutria por Victor tinha bastante chances de ser recíproco. Quando finalmente tomei coragem para agir e ser mais direto. Quando finalmente passei por cima de todos meu medos e aflições relacionadas à minha sexualidade. Tudo desmoronou.
Depositei todo meu ciúme na pessoa errada. Coitada de Sophia. Eu pensava. E o que Victor deve ter sentido, quando entrou naquela sala e ouviu aquelas palavras? Inclinei meu corpo para a frente, apoiando meus cotovelos nos joelhos e escondendo com as mãos o meu rosto. Como eu pude cair no papo de Caio? Por que Victor não me alertou sobre ele? Será que, como Caio falou, Victor jamais ficaria comigo se soubesse que eu tinha ficado com o moreno? Mesmo que isso não fosse, de fato, verdade. Mas pelo menos era a história que ele conhecia.
- Está tudo bem moço? - O taxista perguntou, me fazendo voltar ao mundo.
- Oi? - Me ergui. - Sim, tá tudo bem. - Menti, mais uma vez. Olhei de lado e vi que tínhamos chegado. Nem notei o carro parando. - Quanto eu te devo?
• • • • •
Eu encarava minha imagem no espelho do elevador. Outras mil perguntas surgiam em minha mente. O medo de perder Victor me fez sentir os olhos arderem. Antes mesmo de abrir a porta do meu apartamento as lágrimas já caíam. Os meninos tinham deixado a casa uma bagunça. Mas isso era a última coisa que me deixaria irritado naquele momento. Em cima da mesa, um bilhete tinha como peso de papel a chave do meu carro.
Ligamos mil vezes para tu. Pelo jeito teve mais sorte depois que saímos. A menina dever ser muito gostosa pra tu não ter voltado. Desculpa a bagunça, mas nós atrasamos. Fala no grupo quando chegar. Se tiver foto da boyzinha, manda lá para a gente dar a nota.
Igor.
Coloquei meu celular para carregar. Fui tomar uma ducha, na esperança de que as lágrimas que ainda corriam dos meus olhos fossem embora com a água ralo abaixo. Na volta peguei meu celular e finalmente vi a enxurrada de notificações e mensagens chegando. Liguei para meu pai, que me chamou para almoçar com ele em meia hora. Sabia que tinha pelo menos uma, na verdade.
Abri o Whatsapp. Várias conversas com poucas mensagens, que eu não abri, ainda, pois vi que se tratavam de felicitações pela inauguração. Mandei um "Tô vivo!" no grupo dos meus amigos e automaticamente xingamentos começaram a ser proferidos a mim, entre um "Pensei que tinha morrido!" e outro "A trepada foi pesada.". Corri então para a conversa que eu mais ansiava e temia abrir. Victor. O que ele teria falado? A notificação avisava que ele tinha me enviado cinco mensagens, todas antes da inauguração e a última era uma imagem. Abri a conversa.
Victor Ferraz: Porra! Por conta dessa agonia toda, só me toquei agora que esqueci de pegar minha cueca!
Victor Ferraz: kkkkkkkkk... 🙈
Victor Ferraz: Tá corrido? Se tiver precisando de ajuda me fala! Apareço aí num piscar de olhos.
Victor Ferraz: Vi uma coisa aqui, agora, que esqueci de te mostrar ontem...
Victor Ferraz: [Imagem]
As lágrimas que eu finalmente havia conseguido controlar, de repente, lá estavam novamente, caindo, incontroláveis. Tudo o que eu queria era poder abraçar Victor, explicar tudo pra ele, encher ele de beijos, sentir aquele cheiro. Como eu desejava não ter machucado meu príncipe da coroa de papel. Como eu desejava aquele garoto. Como ele fazia com que eu passasse por cima de qualquer princípio bobo que ainda restasse em mim. Amor. Só podia ser amor.
• • • • •
Meu pai chamou minha atenção umas três vezes, por estar tão absorto durante o almoço. Perguntou se estava acontecendo algo, pois, depois do sucesso da noite anterior, eu devia estar esbanjando um sorriso. Tentei forçar alguns. A inauguração, de fato, havia sido um sucesso. Mas minha noite, definitivamente, nem de longe. Terminamos de comer e seguimos para a loja. Esperaríamos os funcionários para que meu pai fizesse a tal reunião e falasse o que nem eu sabia que ele ia falar.
• • • • •
Camila estava se mostrando uma excelente gerente. Chegou antes de todos os outros funcionários. Já emendou na conversar com meu pai, que foi lhe contar toda a história da Santos Sá. Aos poucos os outros foram chegando. Meu coração palpitava toda vez que ouvia o barulho da porta se abrindo. Meu coração batia acelerado pela ansiedade do momento em que eu ficaria frente a frente com Victor, depois de todas as turbulências. Será que Bia contou sobre eu ter dormido na casa de Caio? Certamente sim. Eu pensava.
A porta então se abriu, mais uma vez. Me virei, como em todas as outras, mas apenas nessa vi o rosto que eu tanto ansiava. Tentei olhar nos olhos de Victor, mas ele parecia saber exatamente onde eu estava e propositalmente me evitava. Uma dor tomou conta do meu peito. Ele segurou a porta para Bia, que entrou em seguida e, ao me encarar, entregou que já tinha aberto o bico e contado tudo para o amigo. Não tiro a razão dela. Certamente eu faria o mesmo por um amigo. Imaginei.
O que eu não esperava era ver o rosto daquela terceira pessoa, para quem Victor continuou segurando a porta. Eles foram embora juntos e chegaram juntos. Pensei. A dor, de repente, tornou-se angústia. Senti meu coração quase pular pela minha boca, de tão agitado. Meus olhos deviam estar transparecendo tristeza. Aqueles olhos azuis. Davi. Sempre Davi. Hoje Davi. Desde o passado Davi.
Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top