Capítulo 3 - Stalker
Mais uma madrugada e ali estava eu acordado. O dia havia sido bastante atribulado... A correria do fim da mudança, o incidente com o ônibus, o Victor. Esse último havia causado uma bagunça ainda maior, quando achei que meu dia não podia ficar mais bagunçado. Me trouxe bastante lembranças, algumas que eu nem queria ter. Ainda perdi um bom tempo procurando minha caneta, que havia ganhado do meu pai em minha formatura. Já tinha aceitado que certamente deveria ter a esquecido em meu carro, mas, embora fosse um objeto muito importante para mim, não quis ir até o estacionamento somente por esse motivo.
Depois de organizar todo o material para as entrevistas do dia seguinte, mais uma vez parti para minhas companheiras de insônia: as redes sociais. No whatsapp apenas conversas genéricas em grupos, quando entrei no Instagram algumas solicitações de seguidores apareceram. Pude notar nomes familiares das fichas de inscrição para as vagas de estágio que eu já havia lido. Mandei um e-mail para cada um, confirmando o local e horário de cada entrevista, minha assinatura digital deve ter facilitado a vida deles na hora de me stalkear.
A ansiedade em procurar o nome do Victor entre as solicitações me fez relembrar uma preocupação que eu tive, mais cedo. Uma parte de mim achava que eu facilitaria as coisas, só para poder ver aquele rosto lindo todos os dias, mas por outro lado eu sabia que tinha de ser justo e imparcial. Como alguém que eu mal conhecia podia mexer assim comigo? Senti um alívio quando vi que o currículo dele era um dos melhores, se não o melhor. Tudo iria depender apenas das entrevistas, as quais foram organizadas pelo meu lado racional. Tanto por ordem de entrega das fichas, quanto pelo fato de eu querer analisá-lo já conhecendo todos os outros concorrentes, deixei o Victor por último. Além do mais a responsável pelo RH da marca viria da sede de João Pessoa para me aconselhar, o que deixaria as coisas ainda mais equilibradas.
Último também era a posição em que ele aparecia na lista de solicitações para me seguir no Instagram, o que significava que ele tinha sido o primeiro a me encontrar, mesmo quando tinha sido o último também a receber meu e-mail, já que os enviei na ordem das entrevistas. Isso me deixou ainda mais ancioso. Eu estava imaginando coisas ou ele estava demonstrando algum tipo de interesse? E esse interesse seria estritamente profissional? Essa ansiedade não estava ajudando em nada meu sono e eu teria que acordar cedo, pois as entrevistas começariam às 8h da manhã. Aceitei todos que me pediram para seguir, mas não segui nenhum de volta. Não queria que ninguém criasse uma falsa esperança por alguma interpretação equivocada por essa atitude.
Fechei o Instagram e abri o Facebook, para ajudar a atrapalhar ainda mais meu sono uma nova solicitação de amizade estava marcada na aba superior. Abri. Para minha surpresa, ou para confirmar minha esperança, Victor Ferraz, nome e sobrenome do meu sonho e pesadelo atual. Pensei por alguns segundos, até que aceitei a solicitação e levantei instintivamente para pegar alguma coisa na geladeira, pois já estava com come. Nem lembrei que ela tinha sido instalada naquele dia e não havia nada para comer dentro dela. Minha dieta estava uma bagunça, mas por sorte sempre tive um metabolismo excelente. Além de ser relativamente alto nos meus 1,85m, conquistados com ajuda da natação, esporte que pratiquei desde a infância até grande parte da adolescência, também lutei muito, o que me possibilitou ter um corpo atlético, principalmente nos últimos dois anos, quando comecei a lutar Artes Marciais Mistas, esporte também conhecido como MMA.
Voltei para o computador frustrado, mas também aliviado de não bombardear meu corpo com mais besteiras. Na janela do computador em que deixei meu Facebook aberto uma aba de conversa brilhava à direita do canto inferior, quando li o nome da pessoa que tinha falado a fome passou instantaneamente. Era ele, Victor:
Victor Ferraz: Acordado a essa hora?
Olhei o relógio do computador, que marcava 3:38h da madrugada. Ele tinha falado apenas dois minutos antes. Antes mesmo que eu pudesse pensar, já tinha escrito e enviado:
Theo Santos Sá: Pois é!
"Pois é!"? Eu não podia ter pensado um pouco antes de escrever uma merda dessa. Nem dava margem pra um assunto. Então, tentando descontrair, já emendei:
Theo Santos Sá: E não tô sozinho.
Victor Ferraz: Desculpa! Não quis interromper.
Voltei pra ler o que eu tinha falado e quando li "E não tô sozinho.", me dei conta do que ele podia ter imaginado. Que eu estava com alguém. Eu não estava sabendo levar o papo. Nem nas minhas épocas de adolescente eu paquerava tão mal. Foi aí que me toquei e assumi para mim mesmo que era isso que eu estava fazendo: paquerando um garoto. O que tinha acontecido comigo? Parei de pensar nisso um pouco e voltei para a conversa, tentando desfazer o mal entendido.
Theo Santos Sá: Não! Quis dizer que você também está por aqui...
Victor Ferraz: Ahhh... Não dormir faz parte do curso de Arquitetura e Urbanismo.
Theo Santos Sá: Não dormir faz parte da minha vida...
Victor Ferraz: kkkkkk
Theo Santos Sá: É feio rir da desgraça alheia... Kkkkk
Victor Ferraz: É só um sujo rindo de um mal lavado.
Theo Santos Sá: Tá perdoado.
Victor Ferraz: Mas enfim, te adicionei nas redes sociais pra te avisar que estou com a sua caneta. Quando voltei à sala da Professora Andreza para conta que havia o alcançado ela pediu que eu a devolvesse quando o encontrasse na entrevista. Mas vim tentar avisar antes, caso você estivesse procurando.
Essa mensagem foi como um banho de água fria na alegria que eu estava sentido por ver o papo fluir. Então, quer dizer que ele só me adicionou nas redes sociais para dar um recado? Uma parte de mim já fazia planos e imaginava que o interesse dele era outro. Achei melhor eu me acalmar e tentar deixar de lado tudo isso que estava passando por minha cabeça.
Theo Santos Sá: Ah... Tava mesmo procurando ela. Amanhã você me entrega. Tô indo nessa, boa noite!
Victor Ferraz: Ok. Boa noite pra você também.
Resolvi encerrar a conversa por ali. Os acontecimentos do passado ao mesmo tempo que me impulsionavam nessas situações, também me deixavam preocupado. Desliguei tudo e deitei pensativo, mas antes de finalmente dormir, repassei várias lembranças na cabeça.
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