Rafael

- Vai sair logo hoje? - sua mãe perguntou.

Rafael parou antes de chegar na porta e se virou para trás. Seu pai estava ao lado dela e seu irmão brincava com alguns carrinhos que ele ganhou no último aniversário.

- Sim. Eu tenho o projeto. Lembra?

- Ah, sim.

- Você ainda participa? - seu pai perguntou. Ele nunca participou, e pra ele isso era só mais uma história de Rafael pra poder sair com os amigos e beber a noite inteira em uma noite na qual ele deveria ficar com a família. Agora porém ele começava a levar a ideia a sério.

- Todo ano - Rafael respondeu.

- Quero ir - Ben anunciou se levantando.

- Você não pode - sua mãe interviu. - É só pra adultos.

- Mas o Rafa não é adulto! - ele protestou.

- De fato - seu pai disse rindo e Rafael fez uma cara feia.

- É só pra gente grande - Rafael falou e o irmão pareceu ficar chateado. - Já vou.

Ele deixou o apartamento e desceu faltando alguns minutos apenas para o carro do projeto passar e buscá-lo. Ele poderia ir de táxi, mas eles preferiam buscar a todos.

Assim que chegou ele começou a  distribuir a sopa que o projeto preparou. Rafael já tentou trazer seus pais e alguns de seus amigos para participar, porém, nenhum deles demonstrou muito interesse na ideia. Por isso ele resolveu não insistir mais.

A noite estava normal e tranquila. Alimentar aquelas pessoas era reconfortante e ele se sentia melhor a cada pratinho oferecido, a cada vasilha que ele enchia. As pessoas o agradeciam e sorriam de um jeito que o fazia se sentir uma pessoa um pouco melhor, por isso todo ano ele participava.

- Rafael - chamou uma pessoa. Ele foi até ela. - Parece que acabamos por aqui.

- Sim. Mas sobraram coisas, não?

- Sim, sim. É por isso que vamos mandá-las para outro lugar. Como você sabe, esse não é nosso único ponto, então pra aproveitar tudo isso nós vamos transportar o que não foi consumido aqui. Vá lá dentro do galpão e coloque o que ainda tiver de garrafa d'água dentro de um caixa separada, eles vão mandar alguém pra pegar.

Rafael assentiu e foi fazer o que foi pedido. Alguns minutos depois ele escutou o barulho da vã estacionando, vozes e cumprimentos se seguiram e então ele passou pela porta. O gorro vermelho em sua cabeça só deixava tudo ainda melhor.

Rafael decidiu não chamá-lo nem nada do tipo. Ele continuou de cabeça abaixada e colocou a última garrafa dentro da caixa, então Téo se aproximou da mesa e enfim Rafael levantou a cabeça o encarando. Ele percebeu Téo paralisar por um momento, estava sem reação. Seu rosto demonstrava a mais pura surpresa e choque.

- Surpreso? - Rafael perguntou.

- O... O que você está fazendo aqui? - Téo perguntou.

- Uma boa ação - ele respondeu, e em seguida pegou a caixa e se encaminhou para o lado de fora.

*

Depois ajudar com as coisas do lado de fora, Rafael voltou para dentro do galpão. Estava frio e ele resolveu evitar o vento gelado. Logo em seguida ele escutou o barulho do motor, a van estava partindo.

- Rafa - uma voz soou na porta.

- Sim?

- Nós vamos com eles para ajudar no outro ponto, pra terminar mais rápido.

- Ah, sim.

- Ainda falta algumas coisas pra arrumar aqui... Tem como você terminar e fechar o galpão pra gente? Pra não precisarmos voltar aqui?

- Claro - ele respondeu. Não era muita coisa para arrumar mesmo, só umas mesas e cadeiras para organizar, além de varrer o chão. Não demoraria muito.

Ele ouviu o carro arrancar e sair, ele deu de ombros suspirando e olhando ao redor decidindo por onde começar.

- Precisando de ajuda? - uma voz soou na porta e ao levantar os olhos ele viu Téo parado de pé, ele não pôde evitar um sorriso.

- Pode ser - Rafael disse se levantando.

Eles começaram a arrumar as cadeiras e mesas, cada um de um lado. O silêncio só era quebrado pelo barulho do plástico das cadeiras esbarrando no chão.

- Então... - Téo resolveu quebrar o silêncio. - Como você veio parar aqui?

- Minha família nem sempre teve uma condição de vida boa. Só de uns anos pra cá que as coisas melhorarem depois do meu pai se formar na faculdade de Medicina. Ás coisas eram mais simples antes - ele explicou. - Qual a surpresa? Só porque eu tenho uma condição de vida melhor eu preciso ser um esnobe que não enxerga os outros? - Rafael disse rindo.

- Idiota.

- Você é um idiota.

- Só há um idiota aqui, e ele não sou eu.

- Tem razão, você é cego. Não enxerga nem o óbvio.

- O que é óbvio aqui? - Téo perguntou.

- Que eu gosto de você! Ou não se lembra de quando me declarei enquanto conversamos por mensagem?!

- Era sério?

- É claro que era sério!

- Não zombe de mim Rafael.

- Não estou. - Rafael disse e Téo ficou em silêncio por um momento. - E então?

- Então o quê?

- O que te preocupa? O que te impede?

- Olha Rafa eu... Não sei se quero um negócio passageiro entende? E as coisas com você não duram muito. Na verdade não duram nada.

- Entendo - Rafael concordou depois de um tempo ponderando o que ouviu. Ele tinha que adimitir que Téo estava certo, em parte. Os relacionamentos que ele teve até o momento não duraram muito, mas não é porque ele não tinha responsabilidade para mantê-los, era simplesmente porque ele não estava apaixonado. Era bom, mas não era aquela coisa. Era normal. - Téo... Eu preciso fazer um pedido formal de namoro pra que você entenda que vale a pena?

- Desde quando você aposta tão alto?

- Isso não é uma aposta. Ou você vai negar que, quando conversamos e você disse que ainda gostava de uma pessoa, estava falando de mim?

Rafael percebeu ele ficar sem reação por um momento, e então não aguentou e começou a sorrir.

- Qual a graça? - Téo perguntou do outro lado do galpão.

- Vai negar?

- De onde você tirou isso?

- Não vou negar, me ajudaram a enxergar isso.

- Péssima ajuda que você recebeu.

- Eu te garanto que a pessoa que abriu meus olhos sabe do que está falando.

- Eu... Isso... Não... - Téo gaguejou, depois engoliu em seco enquanto observava Rafael cruzar o espaço que os separava chegando bem perto.

Rafael decidiu se aproximar antes que o outro pudesse protestar ou fazer qualquer coisa. Ele parou a mais ou menos um palmo do rosto de Téo. Rafael percebeu que ele ficou ofegante e então um sorriso de vitória surgiu.

- Por quê não me falou nada? - Rafael perguntou.

- Naquela época?

- Sim.

- O frio está afetando sua mente? Éramos desconhecidos, era nosso primeiro ano. Ou você não se lembra!?

- Tá. Mas... podia ter dito depois.

- Você está complicando as coisas pra mim.

- Como assim? Não é mais simples você admitir?

- Não posso. Não vai ter volta.

- Ótimo.

- Caramba! Não é ótimo. Não é simples assim. Eu gostei de você de verdade lá no primeiro ano. Era algo diferente. Mais forte. Mas resolvi deixar isso de lado, então tentei abandonar essa ideia. Mas conviver com você todos os dias é claro que não ajudou em nada.

- Você não acha que agora daria certo?

- Você sabe que eu só arrisco em uma coisa que eu julgue que tenha cinquenta por cento de chance de dar certa.

- Comigo você tem cem por cento.

- Pelo visto, confiança é o que não te falta.

- Um de nós precisa ter, ou isso não vai pra frente.

- Isso? Onde você está ven... - Téo não conseguiu continuar pois quando menos percebeu Rafael já o estava beijando.

Rafael se lembrava de imaginar como seria aquele momento e, no entanto, ainda assim estava melhor. Porque aquilo era real e não uma imaginação. Ele realmente estava beijando Téo, e a mão em sua nuca demonstrava que o outro não estava nem um pouco relutante. Rafael queria mais. Téo demonstrava querer mais. E assim eles ficaram por segundos a fio até se separarem ofegantes.

- O que foi? - Rafael perguntou.

- Nada... É que... foi... inesperado.

- O quê?

- Tudo isso. Achei que você estivesse zombando de mim.

- Mas não estava.

- Parece que não.

- Está pronto pra admitir que vai dar certo agora? - Rafael perguntou.

Téo fez uma careta.

- Acho que preciso de mais provas - disse o fazendo rir.

- Mais provas?

- Mais provas.

- Então tá. Temos bastante tempo pra você chegar numa decisão.

- É... Temos.

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