4. Iniciando o breu
Apagão: Interrupção no fornecimento de eletricidade
March, 2019
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Rules encarou a cortina da sala, como se fosse um problema maior do que realmente era. Não se recordava que era nesse tom azul, preferia em amarelo. Sempre preferiu. Mas as cortinas em azul bebê eram feias e sem graça. E ela as odiou, no momento em que bateu de frente com elas.
Fazia anos que não pisava ali.
Nunca sequer passara mais tempo aqui do que o necessário. Sempre que vinha a Munich se prendia em um hotel, pois o período era curto e geralmente a trabalho ou para um jogo de Marco Reus, já que Scarlett insistia que ela viesse em alguns. Eram amigas a tempo demais para que Rules conseguisse recusar todos os convites da loira.
— Quer que eu troque as cortinas? — Mark perguntou, vendo o semblante extasiado da filha.
— Quero que tire elas dali. — Explicou, e piscou, resolvendo ignorar elas. E caminhou com a caixa na mão, deixando no balcão da cozinha. — Por que você está me olhando com essa cara de curiosidade, Mark?
Mark era um homem grisalho, no auge dos seus sessenta anos e com uma energia jovial. Se casou com a esposa quando era jovem, e o sonho de ter filhos, ele abraçou junto com ela. Olhos castanhos e um sorriso costumeiro, ainda conseguia ser protetor e sensível quando se tratava das filhas. E Rules era a mais velha, conhecia traço por traço do pai.
— Como você vai fazer com o Nolan? — Mark questionou, deixando outra caixa ao lado da dela.
— O que você acha que eu deveria fazer? — Questionou, se escorando na caixa. Mark então hesitou. — Consigo fazer isso, pai. Se não conseguisse, não teria trago ele.
— Sei que está querendo recompensar o tempo perdido, mas correr não é o jeito certo.
— Iana disse isso para você? — Mark tentou desviar, mas Rules apenas pescou a insegurança no olhar. — Não é tempo perdido, é tempo aprendido. 3 meses, pai, em Munich só comigo. Eu posso lidar com isso. Você acredita em mim?
— Eu acredito, filha, mas e o seu trabalho? — Ela não entendeu. — Você veio a trabalho, não a passeio. Vai ter coisas demais para fazer. Contrate alguém.
— Sério, pai? — Riu. ─ Não, não vou contratar ninguém. Marco está falando com uns amigos, se der tudo certo, temporariamente Nolan vai a um clubinho com outras crianças. Vou consiliar tudo isso. Confie em mim.
─ Só contrate alguém, por favor. Vai deixar seu coroa mais tranquilo.
─ Cheguei, mãe!!
O grito alertou Rules de sua companhia, fazendo com que a mulher largasse as caixas, e fosse até a sala, no mesmo momento em que Nolan, seu mini adolescente de 10 anos cruzou a porta.
─ Como foi no shopping, filho? ─ Questionou, o menino se aproximou da mãe, jogando-se no sofá. ─ Oi, Iana.
─ Tia Iana me levou pra ver um filme muito maneiro. ─ Nolan alegou, sorridente enquanto se lembrava o quanto era bom sair com a tia. Às vezes queria que fosse a mãe, mas não tinha como dizer isso sem magoar a mãe no processo.
─ Vamos ao cinema juntos na próxima. ─ Ele assentiu. ─ Agora vai que nós precisamos conversar.
─ Nem tô aqui. ─ Ele disse, antes de desaparecer para a cozinha.
Iana riu do menino, e Rules sentou no sofá, com a irmã ao seu lado e o pai na frente das duas. Mark sabia que Rules era inteligente e esperta, que lidaria com isso da melhor forma. Mas também sabia que voltar para o apartamento de Evan, e ainda com Nolan depois de tantos anos, era difícil para a garota. Mesmo que aparentasse estar levando do jeito fácil. Não era.
─ Papai acha que eu estou em fase de negação.
─ Não mesmo. ─ Iana discordou do pai. ─ Você já passou dessa fase, agora está na fase de fingir que nada aconteceu.
─ Até você?
─ A opinião de vocês duas não me importa. ─ Mark alegou, fazendo ambas rirem. ─ Iana, pode por favor, se oferecer para ficar em Munich com a sua irmã?
─ Deus me livre! Minha seleção a todo vapor, eu não vou perder isso bancando a babá para minha irmã mais velha.
─ Obrigada, Iana.
─ "Ah não, eu morri de novo!" ─ Nolan gritou da cozinha, arrancando um sorriso da mãe. .
─ A seleção é mais importante que sua irmã? ─ Iana despertou com a voz do pai, e só então notou como havia ficado imersa em seus próprios pensamentos e esquecido que estavam conversando.
─ Desculpa, Rules. ─ Pediu, sorrindo sem jeito. ─ Eu ficaria, mas mudar de faculdade logo nos primeiros anos não é indicado. E outra, Toni Kroos está na cidade, eu não vou perder a oportunidade de ver esse homem jogando.
─ E Marco? ─ Rules questionou sobre o amigo, e riu do olhar do pai, desviando de Iana, não percebendo como a irmã havia ficado sem jeito com a pergunta.
─ Marco vai estar lá também, ele faz parte do pacote.
─ Rules, filha você não acha que vai ser puxado para você se ficar sozinha? ─ Mark insistiu mais uma vez.
─ Não, pai. Não vou contratar ninguém. A casa é minha, o filho é meu e não sei se você notou, mas eu estou tentando fazer isso aqui dar certo. ─ Mark fisgou o deboche. ─ Então não, eu não vou contratar ninguém.
Mark tinha os olhos na filha e a preocupação notável em seu semblante nervoso, mas ele apenas assentiu e Rules o agradeceu, apertando sua mão.
─ Eu odeio estragar o momento, mas eu tenho uma vida também. ─ Iana se levantou, com um telefone vibrando, ela hesitou na ação seguinte checando a mensagem que brilhava na tela. Então riu, contendo o nervosismo. ─ Sabe, Ru, eu não vou me despedir do Nolan porque eu sei que essa coisa não vai durar.
─ Iana! ─ Mark a repreendeu, Rules estendeu a mão, dizendo que "tudo bem".
─ Não lhe dou uma semana para jogar Nolan de volta nos meus braços.
─ Sua aposta é bem forte.
─ Eu só conheço a irmã que tenho. ─ Sorriu. Rules devolveu o gesto, se perguntando se Iana percebia o quanto estava sendo má ao dizer essas palavras. ─ Você tem caixas no andar de cima que nunca foram abertas. E quando começar a abrir elas, vai me enviar Nolan rapidinho.
─ Como pode falar assim com sua irmã, Iana?
─ Não, tudo bem, pai. ─ Rules recusou a defesa. ─ As caixas de Evan estão aqui e agora que me mudei algo tem que ser feito a respeito.
─ Exatamente. ─ Certa disso, Iana deixou um beijo no rosto da irmã e se afastou em seguida. ─ Nos vemos.
─ Você me liga se precisar de algo. ─ Mark abraçou a filha. ─ Eu falo com ela.
─ Não faz isso. Tudo bem.
Quando Iana se foi, levou consigo um pouco do coração de Rules, que não soube exatamente como reagir as suas palavras. Mas sabia como havia odiado ouvi-las. E havia odiado que elas tivessem vindo de sua irmãzinha caçula.
Iana sempre foi esperta. Esperta até demais. Diferente de Rules que vez ou outra era uma grande falha. Talvez por serem filhas de pais diferentes, já que a criação fora a mesma. O fato era que Iana nunca hesitava. Sempre tão determinada, tão consciente. Tão decidida. Desde nova traçando planos e seguindo-os ao pé da letra.
Ao contrário de Rules que vivia a vida na esportiva desde que perdera Evan. Não era justo se por em uma linha tênue e seguir até o fim um caminho traçado, sem curvas, sem adrenalina, sem motivação para continuar. Tanto que essa vida lhe trouxe Nolan como um lembrete. Um bom lembrete, apesar da situação.
Rules não conseguiu evitar pensar no filho por muito tempo, e quando deu por si já adentrava a cozinha atrás dele. Nolan estava debruçado sobre a pia, jogando enquanto conversava com o celular, que estava preso à um carregador. Olhou para o filho, ouviu os murmúrios. Tão imerso, sem se preocupar com muita coisa.
─ Nolan...
─ Que foi, mãe? É um jogo online, mas a senhora pode falar que eu tô' a todo ouvidos. ─ Ele nem sequer tentou olhar para Rules, o que devia, mas não a incomodou. Ela não sabia como começar o assunto.
Nolan só tinha 10 anos.
─ Você está bem?
─ Sou o melhor da minha liga, mãe. A senhora tem que ver.
─ E você é bom mesmo? ─ Deu o braço a torcer, se aproximando da pia. Nolan estava em uma floresta, armado até os dentes. ─ Esse jogo é violento assim mesmo?
─ Só na maioria das vezes.
─ Bom saber. ─ Puxou o celular da mão do filho, recebendo um olhar desesperado.
─ Mãe!!!! É um jogo online.
─ É um jogo violento.
─ Eu sou o melhor.
─ E não devia ter orgulho de dizer isso, mocinho. ─ O repreendeu, mas Nolan não se convenceu, armando um bico. ─ Tem outros jogos.
─ Não como esse.
─ A intencao é essa. ─ Nolan bufou, mas não reclamou, fazendo Rules rir. ─ Eu quero te perguntar uma coisa.
─ Não, mãe. Eu não ligo se tia Iana acha que não conseguimos ser família.
─ Já somos família, Nolan. E você estava ouvindo a nossa conversa?
─ Eu tenho ouvidos. E a tia Iana costuma gritar. ─ Ele deu de ombros.
─ O nosso assunto não é esse, senhor ouvidos. ─ Ele riu quando Rules bagunçou seus cabelos. ─ Me desculpe por nunca ter trago você aqui.
─ É a casa do meu pai. Tem coisas do meu pai aqui, não é?
─ Sim. É a casa do Evan.
Ainda era muito difícil remoer as lembranças, era difícil se colocar no lugar dela e trazer a tona tudo que estava tentando evitar, mas sabia que seria impossível no momento em que pisasse ali. E estava disposta, o que já era bom.
─ Vamos abrir algumas caixas e eu deixo você ficar com algumas coisas dele. Só não agora, ok? Quando eu tiver... Mais acostumada.
─ Eu espero seu tempo, mamãe.
─ Obrigada.
Rules imaginou como Evan teria se saído como pai e sabia que a resposta era: Melhor do que ela como mãe. Ele era atencioso e gentil. Cuidava dos outros. Cuidava dela. Com Nolan em sua vida, ele se tornaria uma caixinha de felicidade e o melhor pai que poderia ser. Ultrapassaria os limites de bom.
Uma lágrima escorreu como uma sonora gota, e Rules queria esconder esse momento do filho, mas nem precisou já que todas as luzes se apagaram ao mesmo tempo, deixando eles em um completo breu.
─ Rules?! ─ O susto pegou Nolan, e a mãe sentiu quando ele apertou forte sua mão.
─ Deve ser um apagão geral.
─ O que a gente faz em um apagão geral?
─ Na melhor das hipóteses é bem rápido.
─ E na pior?
─ A gente espera.
Ouviu as batidas na porta de forma regulares. Odiou o apagão, odiou mais ainda quem estivesse batendo na sua pronta durante um apagão.
─ Fica aqui, eu já volto.
Foi se esgueirando entre os móveis. Quando Evan comprou o apartamento, Rules decorou todo o lugar. Com a ajuda de uma Scarlett eufórica e uma internet cheia de opiniões, o apartamento ficou mobiliado semanas antes do casamento. Bastavam apenas se mudar e estavam se preparando para essa vida a três, quando foram atingidos pela ausência de Evan. E Rules nunca esqueceu um detalhe sequer do lugar. Nunca.
Quando abriu a porta viu o clarão de uma lanterna em seu rosto, que a abrigou a proteger a visão. O indivíduo recolheu sua luz e apontou para o seu próprio rosto, fazendo Rules Maniza já começar a amaldiçoar Munich.
─ Thomas Müller?
─ Acho que você precisa que eu ilumine sua vida hoje.
Desculpem o atraso.
Finalizando.....
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Até o próximo.
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