32 - Um passarinho me contou

          Steve roía as unhas enquanto olhava para Duda, que estava em dúvida se faria piada e pegaria no pé do amigo ou se manteria a conversa séria. Por mais que seu desejo fosse a primeira opção, ela nunca viu o gringo sequer falar que se interessou por alguém o suficiente para um segundo encontro, imagine então dizer que gostava de alguém. Decidiu não fazer nenhuma brincadeira, por mais que por dentro estivesse com várias ironias prontas. Levou Arthur para o berço e voltou a se sentar de frente para ele.


– E o que você pretende fazer em relação a esse sentimento?

– Para com essa fala de terapeuta! – fez uma careta – Cadê a minha amiga que vai dar risada e fazer piadinhas sem graça?!

– Ai, graças a Deus! – relaxou no sofá – Eu sabia! – vibrou – Gabizinha conquistou seu coraçãozinho de pedra!

– Viu?! É assim que eu gosto! – riu – Eu não sei ainda se ela já conquistou porque eu sou muito difícil...

– Difícil? Você?! – arqueou uma sobrancelha.

– Não falei que sou difícil de pegar, falei que sou difícil de conquistar, é diferente... Enfim, eu tenho tentado sair com essas meninas e todas elas são muito legais, lindas, uma delas tem o inglês tão impecável que eu nem precisei pensar antes de falar, mas... eu prefiro sentar com a Gabi e passar uma hora tentando me comunicar com ela do nosso jeito meio errado.

– Você tem noção de como é bonito isso que você está falando?!

– Que bonito o quê! Eu aqui sofrendo porque quero me obrigar a sair com outras pessoas e você falando que é bonito!

– Mas por que você se obriga?! É só não sair. O Carnaval está aí, logo nós iremos para lá...

– Porque ela está saindo com outras pessoas... Ela deixou claro que faria isso assim que eu viesse embora.

– E você acha que ela está fazendo isso?

– Duda... – abriu um sorriso irônico – É a Gabi...


          "Tem razão", Duda respondeu sorrindo. Steve continuou desabafando sobre os encontros que teve. Contou que apesar de linda, Paula mantinha um certo ar de superioridade o tempo todo e isso fez com que ele desistisse da conversa e partisse para o beijo de uma vez. O comportamento de Anna era o oposto, era gentil com todos na rua, mas com ele ficou mais contida, principalmente depois que ele a beijou. Já Juliana ele sentiu que desde o começo os dois dariam uma bela amizade, principalmente pelos gostos parecidos. Ele a beijou por vontade, mas desde o primeiro "olá" teve a certeza de que seriam apenas amigos – e por isso pretendia manter o contato com a moça.

***

          A segunda-feira chegou e o fim das férias de Diego também. Sua primeira turma se dividiu entre aprender um novo conteúdo e comentar sobre o que fizeram no último mês. Por ser a primeira aula do ano, ele não exigiu muito dos alunos, permitindo que todos contassem todas as suas novidades, afinal a aula sobre Excel poderia esperar um pouco mais.

          Quando a aula finalmente terminou, Diego aproveitou o horário de descanso para comer alguma coisa e mandar mensagem para Duda, mesmo sabendo que ela só responderia depois de chegar do trabalho. Pediu um sanduíche natural e um refrigerante. Mal deu a primeira mordida no pão e foi chamado pela recepcionista.


– Diego, o João quer falar com você – ela falou apressada.

– Você sabe o que ele quer? – perguntou ao terminar de mastigar.

– Como eu vou saber? Ele é o chefe, mandou, eu obedeço – riu – Agora vai, professor! Antes que ele me faça sair da recepção de novo! – deu leves tapas no ombro de Diego para acelerá-lo – Hoje o dia tá cheio e ele fica me chamando toda hora, olha eu não aguento mais...


          A mulher saiu falando sozinha, ainda reclamando. Diego suspirou ao olhar para seu sanduíche que estava tão bom e que precisaria ser interrompido. "Professor!", ela falou da recepção, chamando a atenção dele. Apontou para a porta do chefe e ele conseguiu ler seus lábios dizerem "vai!".

          Diego deu duas batidinhas na porta e ouviu a voz imponente de seu chefe o mandando entrar. Respirou fundo e entrou. João estava com seus óculos na ponta do nariz, lendo algo no computador com a cara fechada. Na mesma hora surgiu em Diego o medo de uma possível demissão – ainda mais agora, que eram dois filhos para ajudar a sustentar.


– Com licença, João. A Marta disse que você quer falar comigo... – engoliu seco.

– Senta aí, só um minuto que já falo com você.


          Diego se sentou e aguardou ansioso. João normalmente era um chefe boa-praça que adorava jogar conversa fora e falava tudo o que tinha para falar nos intervalos sentado na copa acompanhado de um copo de café, só chamava os funcionários em sua sala quando era preciso repreendê-los por alguma razão, e naquele momento ele não estava com um semblante muito convidativo. Mas era apenas o primeiro dia de aula após as férias, o que ele já poderia ter feito de errado?


– Desculpa a demora, estava fazendo um teste do BuzzFeed – tirou os óculos – Deu aqui que eu pertenço à Lufa-Lufa, mas é óbvio que minha casa seria a Corvinal! – bufou.

– Eu... – Diego segurou o riso – Eu só assisti os três primeiros filmes do Harry Potter, mas eu tenho certeza que você seria da Corvinal – falou mesmo sem ter muita certeza sobre o assunto.

– Enfim, não foi por isso que te chamei aqui... Como foram suas férias?


          "Me chamou aqui pra perguntar das minhas férias? Sério?", Diego pensou.


– Foram... boas – sorriu ao se lembrar de como começaram conturbadas e terminaram melhor do que ele imaginava.

– Ótimo. Eu e a Lúcia fomos para São Paulo, ver como está a gestão da escola de lá e aproveitamos para turistar – se espreguiçou no encosto da cadeira e relaxou as pernas – Mas não é isso que eu quero falar com você.


          "Eu só queria almoçar...", Diego pensou mais uma vez no lanche que guardou na mochila.


– Sabe Diego, vou falar com todas as letras... – começou a apertar o botão da caneta em sua mesa – A gestão de São Paulo tá uma verdadeira bosta.

– João, eu juro que treinei o coordenador de lá direitinho – Diego sentia suas mãos suarem – Deixei meu número, falei que se ele tivesse algum problema, pra me ligar...

– Cá entre nós, ele só sabe puxar meu saco. A escola está às moscas, ele não me passa a situação real e ficou apavorado quando cheguei de surpresa – riu – Você tinha que ver a cara dele...

– Eu... eu imagino – suspirou. Ainda não sabia o que estava fazendo ali.

– Enfim... Eu e a Lúcia andamos pensando e... eu acho que vou assumir a escola de São Paulo – se ajeitou na cadeira – Sabe, a Ana Clara tem umas amiguinhas virtuais que moram lá e adorou, ficou dizendo que na capital ela teria mais coisas para fazer, a Lúcia não vê a hora de sair daqui... E eu não investi boa parte do meu dinheiro para um cara destruir tudo sozinho. Sabe o que eu deveria ter feito quando decidi abrir aquela escola?


          Diego pensou que ele continuaria falando, então não respondeu. "Sabe?", João arqueou uma sobrancelha ao perguntar mais uma vez. O rapaz negou.


– Eu deveria ter mandado você para lá. Você está aqui há quase quatro anos e conhece mais essa escola do que qualquer outro funcionário, nunca recebi nenhuma reclamação sua.

– Obrigado, é muito bom saber disso... – Diego agradeceu mentalmente por João não se lembrar de todas as vezes que chegou atrasado em seu primeiro ano.

– Então, eu posso contar com você?

– Em quê? – franziu o cenho, estava realmente confuso.

– Para ser meu coordenador, Diego! – o tom de voz imponente surgiu – Eu vou me mudar para São Paulo para ver se consigo fazer aquela escola andar, mas preciso ter alguém que eu confio aqui. Essa escola aqui é o meu bebê, mesmo que a de São Paulo não dê certo, essa aqui tem que continuar funcionando e você é a única pessoa que eu confio para entregar a gestão.


          Por fora, Diego continuava com a pose tranquila. Por dentro, estava em pânico. Claro que queria aceitar! Por mais que não fosse o melhor emprego do mundo e não tivesse um salário que chamasse atenção, adorava o lugar e sempre quis crescer profissionalmente ali dentro. Sabia como tudo funcionava, mas tinha medo de não conseguir manter o lugar como seu chefe fazia há tantos anos. João não parecia com muita paciência para esperar a resposta do rapaz.


– Diego, eu não tenho o dia todo...

– Claro... Claro que pode contar comigo! – sorriu.

– Finalmente! – sorriu – Agora vamos falar sobre a questão do salário, jornada de trabalho...


          João passou todas as informações para Diego, que já estava empolgado e não via a hora de contar para Duda. Seu salário dobrou – mas continuou não sendo um valor que chamava muita atenção – e a jornada de trabalho diminuiu algumas poucas horas. Seu chefe o informou que ele continuaria com suas turmas até o final da semana, mas que na semana seguinte já haveria outro professor e que ele passaria por um treinamento ainda maior do que o coordenador de São Paulo, já que, nas palavras de João, a escola mineira era o seu bebê.

***

          O celular de Duda tocou quando ela já estava na rua de sua casa, chegando do trabalho. Diego parecia animado do outro lado da linha, mas deixou que ela contasse todo o seu dia antes de dar a boa notícia. Enquanto destrancava o portão, Diego começava a contar sobre o seu dia.


– Du, agora eu preciso te contar... Fui promovido!


          Mesmo estando há centenas de quilômetros de distância, Duda era capaz de ver o sorriso que ele tinha no rosto ao dar a notícia, então sorriu junto dele. Enquanto trancava o portão, viu Glória no quintal recolhendo a roupa do varal, mas ignorou.


– Parabéns, amor! Eu tô tão feliz por você! – vibrou.

– Eu também! Eu tô com medo, é claro... Mas você tem noção que meu salário dobrou?! – riu – Eu tô indo até lá no Bobiça's pra comemorar.


          Duda sorria ao ouvir a felicidade dele, mas desfez o sorriso assim que viu o olhar fuzilante de Glória em sua direção. "Amor! Onde já se viu, não tem nem vergonha na cara", a senhora reclamava sozinha, mas num tom alto o suficiente para que a ex-nora escutasse. "Diego, desculpa, eu vou ter que desligar. Depois a gente se fala, amor", se despediu frisando a última palavra.


– Eu acho que a senhora tá precisando guardar as suas opiniões pra você! – Duda aumentou a voz.

– Mas o que eu falei, querida? – Glória sorriu – Estou apenas aqui, falando com meus botões.

– Seus botões não têm nada a ver com a minha vida, assim como a senhora também não! Boa noite.


          Steve se assustou quando Duda entrou batendo a porta. Ela praguejava sem parar enquanto jogava a bolsa no sofá. Ele continuou a encarando, já Arthur se levantou do chão e com um sorriso no rosto saiu gritando "mamãe" até o colo da moça irritada. "Quer conversar?", o gringo perguntou. "Eu não aguento mais essa doida", ela respondeu ainda carrancuda, mas logo seu rosto se suavizou ao receber um beijo do filho.

***

          Diego chegou no Bobiça's e encontrou apenas Jonathan atrás do balcão e Nicole sentada com Thiago em uma das mesas. Todas os demais lugares estavam vazios, mas não era para menos, o bar não costumava abrir de segunda-feira e estava funcionando todos os dias daquele mês apenas porque o casal proprietário queria uma folga de pelo menos dois dias durante o Carnaval.

          Jonathan comemorou com o primo a novidade, sabia o quanto ele se esforçou naquele lugar. Diego também invadiu a cozinha para dar a notícia para Daniela, que preparava alguns pedidos do delivery. Pegou uma cerveja e sentou-se sozinho em uma das mesas, mas Nicole o chamou para sentar com os dois. Ele negou, não sabia se era bem-vindo, afinal ela era sua ex-mulher e estava com seu atual... flerte? Ele não sabia o que os dois eram, afinal.

          Logo Thiago precisou sair para realizar algumas entregas, então Nicole se levantou e foi até a mesa de Diego, puxando uma cadeira e se sentando de frente para ele. Pediu duas cervejas para Jonathan e estendeu uma das garrafas para o ex-marido, que agradeceu.


– Eu ouvi você conversando com o Jonathan, meus parabéns! – sorriu – Eu sei quanto tempo faz que você queria ser reconhecido lá.

– Obrigado! – retribuiu o sorriso – Eu não poderia estar mais feliz.

– Eu estou vendo! Você está com um brilho que olha... Eu vi poucas vezes.

– Você também! Acho que o Thiago está te fazendo bem.

– Ah, a gente ainda está se conhecendo... – encolheu os ombros – Mas e você? Um passarinho me contou que você finalmente está se entendendo com quem tanto queria...

– Esse passarinho se chama Pedro? – riu.

– Sim! Ele chegou todo contente contando do passeio, disse até que a tia Duda cuidou do joelho dele. Perguntei quem era e ele disse "a amiga do papai" – fez aspas no ar – Falou sem parar também que adorou o Arthur, que quer brincar com ele mais vezes...


          Os olhos de Diego involuntariamente se encheram de lágrimas. Ver seus filhos se dando bem era tudo o que queria, já que sentiu medo que Pedro rejeitasse o irmão por alguma razão. Nicole continuava falando sobre o filho e tudo mais o que ele contou sobre o passeio, mas Diego queria contar apenas uma coisa para a ex-mulher.


– Ni... – suspirou – Eu queria muito te contar a verdade, mas por favor, não quebra esse copo em mim.

– Ai meu Deus... – jogou a cabeça para trás – Que verdade, Diego?!

– Eu não fui sincero com você.

– Em qual das vezes? – arqueou a sobrancelha.

– Quando você me perguntou se eu já tinha ficado com a Duda e eu disse que não, eu... eu menti. Eu não estava pronto pra te dizer que a gente já se envolveu e... eu descobri recentemente que o Arthur é fruto desse relacionamento conturbado que a gente teve.


          Diego estava nervoso e arrependido de contar, mas ele mesmo falou para Duda inúmeras vezes que queria assumir para todos que Arthur era seu filho, então sentiu deveria começar com quem mostrou ser sua amiga e estar ao seu lado mesmo depois de tudo o que aconteceu.


– Diego... – suspirou – Eu já sabia – sorriu.

– Ma... o que... como você sabe?! – arregalou os olhos.

– Eu não vou dizer que tinha certeza, mas eu sempre achei que ele me lembrava você. No Ano Novo eu te vi cuidando dele e do Pedro e meio que as minhas desconfianças voltaram – deu de ombros – O que eu tô querendo dizer é que depois que a gente se separou eu parei pra prestar atenção em tudo e... O Arthur parece muito mais com você do que o Pedro. Eu não sei como não desconfiei disso antes, mas é que eu me forçava a acreditar que você e a Duda eram só uma neura minha... Mas depois do Ano Novo ficou tudo tão claro... – suspirou.


– Me desculpa... – desviou o olhar – Eu fui um idiota com você.

– Você foi um idiota sim, mas não se desculpe – segurou sua mão – Eu tô feliz e espero que você esteja feliz também... A nossa história aconteceu exatamente como deveria acontecer, mas acabou... Graças a Deus! – riu.


          Diego riu junto dela e os dois brindaram suas garrafas silenciosamente. Nicole podia não ter sido alguém com quem ele desejou passar o resto da vida, mas desejava que sua amizade perdurasse por muitos e muitos anos. Ela também não negava que estava muito mais feliz desde a separação, mas era grata por tê-lo em sua vida.

• • • • • • • • • • • • • • • • • • • •

Olá meus amores! Como estão?!

Quero dizer que eu adoro a relação da Nicole com o Diego pós divórcio!

Quanto à Glória... será que ela ainda vai trazer muitos problemas?
E tivemos também a promoção do Diego!

Preciso dizer que o João foi inspirado no meu antigo chefe que era um amor haha

É isso, deixem a estrelinha e muitos comentários! Vejo vocês em breve!

Beijinhos! ♥

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