12 - Tacada errada
A festa continuou como se nada tivesse acontecido, apesar dos três estarem remoendo aquele momento no quarto – Diego, arrependido; Duda, apreensiva; Nicole, confusa. Perto das onze, a aniversariante cortou o bolo e os convidados começaram a ir embora. Joyce e o namorado deram carona para dona Ivete, que estava com as pernas bambas devido às três latas de cervejas que tomou. Diego e Nicole saíram sem se despedir dos demais, já Mônica acelerou Gabriela, que se pudesse, ficaria conversando com o gringo o resto da noite. Logo restaram apenas os donos da casa e seus hóspedes.
Assim que saiu do banho após limpar toda a bagunça junto com Duda, Jonathan encontrou a esposa deitada na cama mexendo em seu celular. A sala estava escura e silenciosa, indicando que sua irmã e Steve já estavam dormindo. Assim que se deitou ao seu lado, Dani virou a tela do aparelho para ele, exibindo uma foto publicada por Mônica no Facebook com a legenda "Pedro e seu novo amiguinho, Arthur".
– Que foto linda – pegou o aparelho para ver mais de perto.
– Muito. Eu não vejo a hora de ser os nossos filhos...
– Nem me fale, essa espera parece não ter mais fim – suspirou – Enfim... O que você achou da sua festa quase-surpresa?
– Você e a Duda são doidos. Primeiro por fechar o Bobiça's por mais um dia, segundo por fazer tudo de última hora. Ah, e vocês são péssimos pra organizar uma festa.
– A gente é péssimo pra organizar qualquer coisa. No meu aniversário de vinte e dois anos a Duda tentou fazer uma festa surpresa pra mim e os únicos convidados foram a Gabi e o Diego.
Daniela soltou uma gargalhada, sendo contida por Jonathan em seguida. Ele precisou lembrá-la dos três que dormiam no cômodo ao lado. Na verdade, o único que dormia era Arthur. Steve rolava de um lado para o outro no sofá enquanto Duda encarava a luz que passava pela janela.
– Steve, você está acordado? – sussurrou.
– Mais do que eu queria – reclamou com a voz arrastada.
– O que você achou do churrasco? – levantou do colchão e se juntou a ele no sofá.
– Vocês deveriam ensinar para o mundo como fazer um churrasco de verdade.
– Você conseguiu se enturmar? Me desculpa, não consegui te dar muita atenção.
– Claro, enquanto você se esquivava do Diego a mãe da Daniela dizia que me amava, e eu juro que quase acreditei. E a Gabriela também foi uma ótima companhia. Você sabia que ela está solteira?
– Ah não, Steve! Você não vai perdoar nem a minha prima?!
– Olha só! Você não perdoou o seu primo, por que eu deveria?! – um sorriso cínico brotou no rosto do rapaz.
– Eu odeio quando você tem razão – retribuiu o sorriso.
– Você podia me arrumar um date com ela.
– Mas Steve, eu nem tenho o número dela...
– Você quer que eu comece a enumerar todas as vezes que eu te ajudei, baby? Lembra do Spencer Smith, nosso vizinho? E aquele cara da cafeteria que nem você lembra o nome? O vocalista daquela banda que veio lá de Illinois que a gente fotografou o show? James Blake, né? Esse aí eu não esqueço, eu acordei e ele estava tomando café na minha caneca! É muita folga... Quer que eu continue?
– Não precisa... – bufou – Eu te ajudo. Mas já te adianto que dependendo do que você pretende com ela, você não vai conseguir. Ela não é do tipo que se apaixona e fica atrás de você, igual a maioria que você conquista.
– E desde quando eu quero alguém atrás de mim? Como você mesmo me ensinou... "Eu estar suave" – falou em português.
– Eu estou suave – o corrigiu.
– Não, você não está não. O dia todo você ficou plantada nesse sofá só porque o cara estava aqui, mas você disfarçou bem quando foi cumprimentar ele. Por isso que eu estranho esse hábito de cumprimentar com beijo no rosto! Imagine eu estar no mesmo lugar que a Sharon e ter que dar um beijo em seu rosto? No way!
– A gente... A gente conversou no quarto – confessou.
– E você só me conta agora?! Vamos lá, me diga tudo! – se ajeita no sofá.
– Você parece aquelas tias fofoqueiras – riu – Bem, foi... estranho.
– Estranho como?
– Como se a única coisa que o impedia de me beijar ali mesmo fosse a presença da Nicole na casa.
– Mas você sabe que essa é a única coisa que o impede mesmo.
– Como assim?
– Eu vi esse cara três vezes na vida, e as três vezes, quando você estava perto, a tensão sexual se alastrava. Você ainda gosta dele.
– Mas eu não posso gostar! A esposa... – suspirou – A esposa dele estava aqui... Eu sou um monstro.
– Por quê?! Você já me disse mil vezes que quando vocês se envolveram eles não estavam juntos e que o noivado era só de fachada por conta dos pais dela.
– Mas agora eles são felizes. A Nicole não é uma pessoa ruim, ela merece a felicidade, assim como ele. Mais uma vez eu sou a intrusa.
– Pare com essa sofrência – essa continuava sendo sua palavra favorita em português – Já aconteceu, agora aceite de uma vez e tente dormir.
Duda concordou e voltou para o colchão. Seu amigo tinha razão, o episódio no quarto já havia acontecido e ela acreditava que por pura sorte ninguém havia visto, então não tinha o porquê se preocupar, só precisava se manter afastada de Diego pelas semanas seguintes. "Boa noite e não se esqueça de conseguir o telefone da Gabriela para mim", Steve disse por fim, antes de virar para o canto.
***
Diego já estava dormindo há um bom tempo, mas Nicole não conseguia pregar os olhos. A cena dele acariciando o ombro de Duda parecia não ter nada demais, mas desde aquele excesso de carinho na despedida dos dois em São Paulo, algumas paranoias tomavam conta de sua mente e ausência dele durante as noites só as alimentavam ainda mais.
Nicole nunca teve motivos para ter ciúmes ou desconfiar de Diego. Nos quase três anos de casados, raras foram as discussões. Estas também nunca foram por causa de uma terceira pessoa. Sempre se respeitaram e mesmo não sendo loucos de amores um pelo outro, se gostavam dentro dos limites de um "gostar" proveniente de um casamento forçado. A promessa que fizeram na virada do ano de 2014 se cumpria e dia após dia eles tentavam fazer aquela família dar certo, fazendo o carinho, admiração e confiança continuarem presentes. Mas naquela noite esta última estava por um fio.
Sem pensar muito, Nicole se levantou e foi até a mesa da cozinha, onde Diego deixou seu celular. Sabia que era errado, mas ainda assim pegou o aparelho e arriscou uma senha. Data de nascimento do Pedro, que óbvio. Foi até a agenda e procurou pelo contato de Duda, mas não encontrou nada. Abriu o WhatsApp e pesquisou pelo nome dela. Nada. Abriu a conversa de Jonathan e lá estava o que ela procurava.
"Aniversário da Dani a partir das 16h aqui em casa, traz cerveja"
"Mas sua irmã vai estar?"
"Claro né"
"Não pega mal a gente ir?"
"Mano, deixa o passado no passado"
Nicole terminou de ler as mensagens um tanto quanto atordoada, não era possível que aquilo estava realmente acontecendo. Ele já sabia que ela estava na cidade. Ela questionou a razão dele perguntar se sua presença pegaria mal. E o que o Jonathan sabia para dizer sobre deixar o passado para trás? Aliás, o que houve no passado? Sua vontade era acordar Diego e tirar tudo a limpo naquele mesmo instante, mas se passaria por uma ciumenta exagerada, o que nunca foi.
– O que você tá fazendo?
Diego apareceu na cozinha ainda sonolento, coçando os olhos. Quando finalmente conseguiu focar a visão, viu seu celular na mão da esposa. Nicole o olhou sem conseguir dizer nada.
– O que você tá fazendo com o meu celular?
– Desde quando?
– Desde quando o quê?
– Desde quando você sabe que a Maria Eduarda tá aqui?! – bateu o aparelho contra a mesa.
– Você vai acordar o Pedro e quebrar meu celular!
– Diego, eu vou te perguntar mais uma vez, desde quando você sabe que a Maria Eduarda tá na cidade?!
– Tem uma semana mais ou menos... Mas o que isso tem a ver?
– Como você sabe?! Você tem falado com ela?
– Não, eu... eu... Nicole, o que isso tem a ver?!
– Me responde! – aumentou o tom de voz.
– No dia que eu pedi lanche ela veio entregar, ela tá ajudando a Dani. Foi só isso. Só por isso eu sei que ela tá aqui, tá feliz agora?!
– E por que você não me disse nada?!
– Por que não foi nada demais!
– Se não foi nada demais, por que o Jonathan disse que é melhor deixar o passado pra trás?
A voz repentinamente calma de Nicole não enganava Diego, ele sabia que aquilo foi uma maneira vitoriosa de encurralá-lo, e fugir da pergunta só aumentaria a fúria da esposa.
– Porque é onde o passado deve ficar.
– Diego, é melhor você me responder com sinceridade.
– Eu já fui afim dela há alguns anos, mas foi só isso. Tá satisfeita?!
Por mais que desconfiasse disso há um bom tempo, não esperava que ele fosse assumir tão facilmente. Algumas lágrimas surgiram em seus olhos e ela não conseguiu contê-las.
– Você já ficou com ela? – o encarou diretamente nos olhos.
– Por que você tá chorando?
– Você não me respondeu. Você já ficou com ela?
– Não.
Diego odiava ter que mentir para Nicole, mas não poderia assumir que não só ficou, mas que chegou a desejar todo um futuro com aquela mulher que ele julgava ser o amor da sua vida. Se dissesse que deu ao menos um beijo em Duda já seria o suficiente para que sua esposa ficasse ainda mais insegura em relação aos dois. E ela não tinha motivos para isso, certo? Ambos tinham seguido suas vidas e estavam felizes com o rumo que tomaram, não é mesmo?
– Eu nunca fui assim, Diego. Eu nunca precisei desconfiar de você.
– E não precisa.
"Eu queria acreditar em você", ela murmurou, mas ele não ouviu. Diego esticou os braços e Nicole se encaixou no abraço. Ele estava se sentindo péssimo, mas queria acreditar a todo custo que todo aquele turbilhão de sentimentos que surgiram no momento que viu Duda depois de tanto tempo era apenas passageiro e que logo ele voltaria a ser o mesmo Diego de antes. O que ele não se lembrava era que o Diego de antes nunca deixou de ser apaixonado por ela.
***
O domingo ensolarado estava propício para levarem Arthur para brincar na praça, mas o banho de mangueira ao mesmo tempo em que Jonathan lavava o quintal parecia mais divertido. Duda o ajudava com a parte do sabão, deixando o chão ainda mais liso. Por mais que o clima estivesse descontraído, havia algo que Duda estava pensando desde o dia em que chegaram ali.
– Vocês já pensaram em se mudar pra uma casa maior?
– Somos só nós dois, não tem necessidade.
– Ainda não, mas eu sei que vocês entraram com o pedido de adoção e se Deus quiser, logo eu terei sobrinhos.
– Espera, a Daniela te contou? – franziu o cenho.
– Contou, mas não briga com ela, por favor! Nós estávamos falando de filhos e...
– Eu não vou brigar com ela – a interrompeu – Eu tô doido pra te contar isso há muito tempo! Não contei por causa dela... Tem sido muito difícil pra nós dois toda essa espera e ela sofre mais do que eu...
– Eu sei... – torceu o lábio – Enfim, vocês precisam de uma casa maior, até mesmo para mostrar para a assistente social que vocês já estão prontos para a criança. Eu quero meu sobrinho, Jonathan!
– De onde vamos tirar dinheiro agora? O Bobiça's ainda tá no começo...
– É aí onde eu quero chegar...
– Não vai me dizer que você tá envolvida em algum ramo de pirâmide e vai me oferecer uma oportunidade incrível de sucesso financeiro e...
– Cala a boca! – riu – Eu tô falando sério. Eu andei pensando... Sabe, quando eu voltar pra casa, não tenho necessidade de morar num apartamento de três quartos no Tatuapé, inclusive nem tenho dinheiro pra bancar o condomínio.
– O que você quer dizer com isso?
– A gente podia vender o apartamento.
– Você sabe que eu não tenho apego com essas coisas, mas pensei que você...
– Depois que fui pra Boston eu finalmente entendi que a nossa história está dentro da gente, não em um lugar. Estou aprendendo a desapegar. E outra, nós dois precisamos de dinheiro, o banco ainda vai liberar o seguro de vida da mãe...
– E com certeza a imobiliária da construtora consegue vender ele rápido...
– O que me diz?
– Só se você ficar aqui até conseguir vender.
– Então é melhor torcer para venderem logo.
***
Mais uma semana se passou e os irmãos conversavam todos os dias sobre toda a parte burocrática com os ex-colegas de trabalho de Laura, que eram muito solícitos com todas as dúvidas dos dois. Estava tudo encaminhado para a venda do apartamento, e por mais que fossem sentir saudades de onde cresceram, sentiam que estavam fazendo a coisa certa.
Duda cumpriu com a promessa feita para Steve e conseguiu o número de Gabriela para ele. Os dois conversavam bastante, sempre com as segundas intenções implícitas. Naquela noite combinaram de ir até um bar no centro da cidade. Steve pegou carona com Jonathan e chegou primeiro no endereço indicado, um bar à meia luz com algumas mesas de madeira espalhadas tanto no interior quanto na calçada. Nos fundos, uma mesa de sinuca que parecia disputada entre os presentes. Um pequeno palco exibia luzes coloridas, mas não havia um músico, a música vinha apenas de uma caixa de som acima da bancada.
Steve se sentou próximo à mesa de sinuca e passou alguns minutos tentando fazer a garçonete entender que ele desejava uma cerveja, mas sem sucesso. "Boa noite, duas cervejas, por favor", Gabriela surgiu para finalmente ajudá-lo. A mulher agradeceu a ajuda e deixou os dois a sós. Ele levantou e estendeu a mão para cumprimentá-la, já ela partiu para os dois beijinhos.
– Você está ótima – puxou a cadeira para ela se sentar.
– Você também não está nada mal.
Os papos entre os dois rendia, mas havia uma pausa entre um assunto e outro. Apesar de serem dois galanteadores natos o problema do idioma ainda era presente, então ambos precisavam pensar antes de falar. Ela, montar a frase em sua cabeça, ele, procurar sintetizar ao máximo para ela entender.
– Então... – ela sorriu.
– Então... – ele retribuiu.
– Você já tomou caipirinha?
– A Duda me falou disso milhares de vezes, mas nunca tomei.
– Não seja por isso, hoje você vai experimentar.
Gabriela pediu uma caipirinha de cachaça e limão para Steve e uma de saquê com morango para ela. Conforme bebiam, a barreira do idioma caía – ao menos era o que eles achavam – e a comunicação ficava mais fácil. Steve tomou ao menos três copos, sendo acompanhado pela loira em todos. A música ficou mais alta, fazendo com que os dois se sentassem mais próximos para conversar.
– Olha, a mesa de sinuca está vazia! – ele apontou – Quer jogar?
– Qual é! Você esperou eu ficar alegre para me ver passar vergonha!
– Ah, vamos lá – se levantou e segurou sua mão – Só uma partida.
– Eu não jogo muito bem...
– E se a gente fizer uma aposta?
– Eu sou universitária, não tenho dinheiro não!
– E eu sou um fotógrafo falido, não estou falando de dinheiro.
– E quer apostar o quê?
– É simples – encolheu os ombros – Se você ganhar eu te beijo, se eu ganhar você me beija – sorriu ladino.
– Quantas vezes você já usou essa cantada, hein? – sorriu.
– É a primeira vez, eu juro!
"Vou fingir que acredito", Gabriela respondeu estendendo um taco para ele. "Primeiro as damas", Steve respondeu após juntar as bolas. Ao estourar, Gabi matou uma ímpar, mas não deu a sorte de acertar duas seguidas. A partida foi mais longa do que ambos esperavam. Estavam empatados e restava apenas a bola 8. Ela estava na boca da caçapa, mas a tacada errada de Steve deu a chance para a loira ao seu lado. Com uma tacada certeira, Gabriela encaçapou a bola sem matar a branca, vencendo o jogo. Ela deu pulinhos para comemorar, já ele entregou o taco para os rapazes que aguardavam a vez antes de voltar para a mesa.
– Assim não é justo, você me disse que não sabia jogar! – se largou na cadeira.
– Meu avô tem uma dessas em casa, eu jogo desde criança, baby... – se sentou ao seu lado.
– Trapaceira – sorriu.
– Trapaceiro é você, que não pagou a aposta.
O sorriso tentador de Gabriela deixava claro o que ela queria. "Não seja por isso", Steve a respondeu se aproximando e emaranhando sua mão nos fios longos, aproximando suas bocas. Os beijos eram intensos e eles não tinham pressa em parar, trocaram as palavras por aquele idioma que os dois entendiam.
A noite naquela mesa foi agitada, pediram mais algumas caipirinhas e quando não compreendiam o que o outro dizia, se beijavam; era mais prático assim. Ambos estavam bastante embriagados e os assuntos se misturavam com a mesma facilidade em que eles misturavam as bebidas, deixando de lado o filtro sobre qualquer tema.
– Você tem certeza que não é namorado da Duda? – se agarrou a seu pescoço.
– Pela milésima vez, sim! – beijou seus lábios.
– É que eu não quero ser sacana com ninguém.
– E não vai ser, a Duda é só minha amiga.
– Igual ela foi só amiga do meu irmão? – riu, pois pensava que ele não entenderia.
– Não, com o seu irmão ela teve um filho, comigo é só amizade.
Steve se arrependeu no mesmo segundo em que terminou de falar. Esperava que ela não tivesse entendido, mas aí seria sorte demais e ele nunca foi um cara que esbanjava sorte.
– O que você disse?! – o encarou com os olhos arregalados.
• • • • • • • • • • • • • • • • • • • •
Eu só digo que... Eita! Steve falou demais!
O que acharam do capítulo?
Shipparam Steve e Gabriela?
Qual será a reação da Gabi?!
Vocês descobrirão na semana que vem! rs
Deixem a estrelinha linda, muitos comentários e não se esqueçam de não sair de casa.
Beijinhos ♥
Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top