11 - Novela Mexicana
"Você me paga!", Duda deu um soco no braço do irmão após prender o cinto de segurança. Ele apenas riu e entregou mais três sacolas para ela. Ainda emburrada, ficou bufando metade do caminho. Jonathan não conseguia parar de rir, a irritando ainda mais.
– Mano, para! Por que você tá rindo ainda?!
– Duda do céu, que bosta de piada foi aquela? "Só se alguém se confundiu no cartório" – a imita – Mermã, você já foi melhor que isso. Sério, quando eu te ouvi dizer aquilo eu saquei que ia demorar o papo entre vocês.
– Eu não sabia o que dizer...
– Um "ele tá no carro" já bastaria, mas enfim... Como foi o papo entre vocês?
– Passamos vinte e cinco minutos planejando a sua morte – sorriu.
– Sério?
– Bom, ele eu não sei, mas eu sim – abriu um sorriso ainda mais cínico.
– Tô falando sério, como foi? Foi a primeira vez que vocês conversaram desde que você foi embora né?
Duda não considerava o reencontro dos dois no velório de Laura como uma conversa. Ela não tinha condições de manter um assunto sadio e ele também não a procurou com essa intenção. Já hoje havia sido diferente, foi a primeira conversa dos dois depois de tanto tempo, e apesar dos silêncios intermináveis, foi levemente agradável.
– Foi... normal.
– Você já foi bem mais específica que isso – revirou os olhos.
– Falamos dos nossos filhos e ele acha que o formato da orelha do Arthur parece com o meu.
– Quem repara em formato de orelha?!
– Aparentemente, ele.
Jonathan deu risada e Duda continuou em silêncio, apesar do sorriso no rosto. Enquanto observava a paisagem correr, se lembrou de um detalhe que não havia prestado muita atenção. Será que seu irmão havia falado algo?
– Você contou pra Dani sobre mim e o Diego?
– Claro que não – desviou o olhar da pista para ela – Por que a pergunta?
– Antes de sair ela pediu pro Steve vir com você, mas ele estava ajudando na cozinha e eu disse que eu ia. Ela deu uma vacilada, parecia que ia dizer que era na casa dele, como uma forma de aviso, sei lá. Como se soubesse de algo.
– Eu garanto pra você que eu não disse nada. Será que não foi o próprio Diego?
– O Diego não contaria, eu tenho certeza.
Jonathan soltou um resmungo e o assunto morreu. Logo o primeiro endereço chegou. Ele ficou incomodado com o que a irmã disse sobre Daniela saber, pois também tinha a certeza que Diego não contaria para ela. Duda deixou isso de lado e continuou revivendo aquela quase meia hora em sua mente, e ela conseguia lembrar com perfeição dos curtos diálogos que tiveram. As duas entregas seguintes terminaram e eles voltaram para casa, aguardando até a próxima leva de pedidos. E não foram poucos, parecia que naquela noite metade da cidade decidiu pedir delivery.
***
"Chegamos!", Diego ouviu Nicole dizer ainda da cozinha. Pedro foi correndo até o sofá e pulou no colo do pai, que jogou o menino pra cima e começou a fazer cócegas, fazendo a criança gargalhar. "Não faz ele rir muito que ele acabou de tomar leite", ela disse, fazendo com que ele colocasse o filho no chão, mesmo com o menino pedindo por mais.
– Estava esperando você ligar pra te buscar.
– Meu pai me trouxe – ela respondeu apoiada na parede, tentando desafivelar a sandália – O que você jantou?
– Pedi lanche na Dani.
– Estava bom?
– Não poderia estar melhor.
"Que bom, o lanche dela sempre tá gostoso", ela respondeu levando a criança para o quarto. Quando Pedro finalmente dormiu, Nicole vestiu seu pijama e se sentou ao lado do marido, se aconchegando em seu braço que estava esticado no encosto do sofá. "A gente podia assistir um filme", ela sugeriu. Ele apenas assentiu e deixou que ela escolhesse. Deram o play em uma comédia genérica que encontraram na Netflix.
No meio do filme, ela já não estava mais afim de assisti-lo. Começou a correr os dedos pelo abdômen de Diego, já deixando claro o que queria. Desligaram a televisão e foram para o quarto, e ela se apressava em tirar sua roupa. Deitou sobre ele e começou a beijá-lo, que correspondia com a mesma vontade, mas bastou um nome surgir em sua mente para que o desejo desaparecesse por completo.
– Amor! Isso... isso nunca te aconteceu antes! – a frustração em sua voz era evidente.
– Desculpa, deve ser o cansaço. O dia foi cheio hoje no trabalho, tô meio estressado.
Nicole não aceitou muito bem as desculpas de Diego, não era a primeira vez que ele estava cansado e isso nunca aconteceu. Ainda contrariada, vestiu seu pijama e deitou. Ele vestiu sua bermuda, foi até o banheiro e jogou água no rosto. Encarou seu reflexo úmido desacreditado com o que acabara de acontecer. Mas se lamentar não mudaria nada, então enxugou o rosto na toalha e voltou para a cama. Se deitou de costas para Nicole e apagou a luz. Seria uma longa noite.
***
Mais uma semana havia se passado, era sábado e Jonathan acordou cedo sentindo o cheiro de café invadindo a casa. Se levantou e ao passar pela sala, viu Steve e Arthur dormindo no colchão enquanto Duda se esparramava pelo sofá. A regra era clara: quem tinha mais conforto dormia com a criança. Foi até a cozinha e Dani estava com os cabelos presos para cima, terminando de coar o pó. "Feliz aniversário", deu um beijo em seu pescoço, a fazendo arrepiar e soltar um riso baixinho, repreendendo o marido.
– Eles podem acordar!
– Você sabe que eles não vão, dormem feito pedra. Mas me diz o que a senhorita está fazendo acordada este horário em pleno aniversário?
– Estou me dando meu presente de vinte e oito anos – sorriu.
– Café?!
– O meu café.
– Mas eu ia fazer...
– Por isso mesmo! O seu parece mais um chafé.
– Ai, essa doeu! – colocou a mão no peito, exagerando tristeza – Mas infelizmente não tenho como discordar...
Daniela sorriu e Jonathan se apoiou no balcão que separava a sala da cozinha. Ficou observando a esposa ainda de pijamas e pensando quão sortudo era por tê-la encontrado depois de tanto tempo. Quando tem que ser, não tem jeito. Os dois se desencontraram naquela primeira festa há mais de três anos, passaram meses pensando um no outro e de repente ele estava ali, casado, criando todo um futuro ao lado da mulher da sua vida.
– Por que você tá me olhando com essa cara? – sorriu.
– Nada, só estou pensando no cara sortudo que eu sou.
***
Por mais que Jonathan insistisse, Daniela não queria comemorar seu aniversário. Estar próxima dos trinta a frustrava, mesmo sabendo que uma hora ou outra eles chegariam. Mas ele não desistiria tão fácil. Nos anos anteriores eles comemoraram com churrasco ou em algum restaurante, e esse ano não seria diferente. Poxa, sua irmã e seu sobrinho finalmente poderiam comemorar junto com eles, além de que para ele, cada segundo de vida daquela mulher incrível deveria ser comemorado.
Assim que Duda acordou e parabenizou a cunhada, Jonathan já a puxou até o quarto para combinar alguma comemoração surpresa. Logo com sua irmã, que era péssima nisso. Combinaram de comprar carne e cerveja e acender a churrasqueira improvisada que o casal mantinha no quintal. Ele pegou o celular e começou a escrever a lista de convidados.
– Bom, nós somos em quatro sem contar o Arthur, aí tem a mãe e a irmã dela, a Joyce, amiga lá da firma que ela trabalhava, a Gabi e o namorado, o Di... – fez uma careta – Não, só isso mesmo.
– Não mano, chama o Diego sim. Mais dois na conta fora o menininho.
– Não sei se é uma boa ideia...
– Claro que é! Ele é um dos melhores amigos da Dani, até parece que vou deixar você privar a presença dele só por minha causa. Nem faz sentido, o aniversário é dela, quem tem que ser agradada é ela e não eu.
– Mas...
– Sem "mas" – o interrompeu – Vai, anda logo, manda mensagem pra esse povo.
Ainda no quarto, Jonathan enviou uma mensagem para todos os convidados. A irmã de Daniela não poderia comparecer pois iria trabalhar, mas o restante confirmou a presença. Em São Paulo era praticamente impossível combinar algo para o mesmo dia, tendo em vista que a maioria das pessoas planejam sua semana inteira antes mesmo do final de semana. Lá o pessoal era bem menos acelerado e viviam um dia de cada vez, e isso era o que Jonathan mais gostava naquele lugar.
Ele e Duda correram até o mercado com a desculpa que precisavam comprar fraldas para Arthur, e lá compraram todo o necessário para um churrasco. Já estavam no carro quando deram conta de que esqueceram de comprar um bolo. Jonathan acelerou de volta até o mercado em meio a risadas. Quando os dois inventavam surpresas era sempre assim, se perdiam no próprio planejamento e precisavam correr atrás no último segundo.
Chegaram em casa e já não tinham mais como esconder as sacolas de carne e fardos de cerveja, nem mesmo o bolo. Não haviam pensado nisso. Era hora de falar a verdade. Daniela não ficou brava, muito pelo contrário, agradeceu a intenção dos dois, mas disse que já desconfiava quando viu um pacote de fraldas fechado ao lado do sofá. Mas a surpresa não foi arruinada por completo, pois ela acreditava que o churrasco seria apenas para eles, não imaginou que em pouco tempo sua mãe estaria batendo palmas em seu portão.
Dona Ivete, mãe de Daniela, era uma senhora animada, a típica mineira de sotaque cantado, que falava rápido e resumia toda uma frase em poucas sílabas. Rapidinho se encantou por Steve, que ficava com o ego inflado a cada "I love you" vindo daquela senhora, que soltava uma gargalhada todas as vezes em que dizia a única expressão que sabia em inglês. Era muito fácil saber de quem Dani herdou sua extroversão.
Não demorou muito para que mais convidados chegassem. Joyce e seu namorado chegaram juntos de Mônica e Gabriela, que quando questionada onde estava seu namorado, respondeu apenas um "ih, já era, vida que segue" acompanhado de um dar de ombros desinteressado. Clássico dela. E o melhor de tudo é que ela nunca sofria por nenhum deles.
Só faltavam mais três convidados e Duda parecia ansiosa, tamborilando os dedos sobre a perna sem parar. Logo uma buzinada clássica avisava que os três haviam chegado. Ela se afundou ainda mais no sofá e desviou o olhar para Arthur, que arrastava um carrinho pelo chão. Jonathan se apressou em abrir o portão, pois sabia que a irmã não o faria.
Diego sabia que Duda estaria lá, perguntou para Jonathan no mesmo minuto em que recebeu o convite. As horas que antecederam o churrasco ele se concentrou apenas em ignorar sua presença e focar em sua família, mas no momento em que passou pela porta e a viu sorrindo para seu filho, sentiu vontade de juntar-se a ela. Nicole ficou surpresa ao vê-la ali, não sabia que ela estava na cidade.
Pedro adorava outras crianças, então assim que Diego o colocou no chão ele já correu na direção de Arthur para brincar, tornando o cumprimento entre os pais praticamente obrigatório. Steve estava entrando na sala com um prato de carne quando parou na metade do caminho. Só faltava o balde de pipoca para assistir àquela cena que prometia ser digna de uma novela mexicana.
Mas nada aconteceu como os dramalhões latinos. Não houveram frases exclamativas como "este filho é seu!" ou "você o roubou de mim!" banhadas em lágrimas. Aquilo era vida real, e um abraço rápido em Nicole e um beijo no rosto de Diego fecharam o arco de cumprimentos, que foram bem mais fáceis do que Duda imaginou.
Já na cozinha, Daniela estava fazendo um prato para sua mãe quando recebeu o abraço repentino de Diego. "O que você tá fazendo aqui?!", perguntou sem conseguir esconder sua surpresa. "Uai, seria estranho se eu não viesse, né? O Jonathan me convidou", ele respondeu sem dar muita atenção à maneira que ela falou. Sua presença só provava para ela que seu marido nem imaginava que a irmã e o primo já tiveram algum envolvimento. Ao menos era isso que ela pensava.
***
O churrasco estava animado, apesar das poucas pessoas que estavam ali. Eram treze no total, e só aquilo já enchia a casa. Mônica estava sentada no sofá com Duda, vendo as crianças brincarem no chão. Mal sabia que ambos eram seus netos. Os olhos de Duda deram uma leve umedecida quando a avó sacou o celular e pediu para o mais velho abraçar o amiguinho. A primeira foto dos irmãos.
Daniela e Jonathan faziam sala para os convidados por mais que não precisassem disso, pois com exceção de Joyce, todos ali eram de casa. Logo as crianças correram para o quintal, e pela janela Duda viu os dois brincando com Diego. Essa era uma foto que ela gostaria de guardar. Já do outro lado, perto da churrasqueira, Gabriela e Steve conversavam animadamente.
– Como é morar nos Estados Unidos?!
– É normal para mim. É o mesmo que morar no Brasil para você, eu sou de lá, então... não tem grande coisa.
– Meu sonho é fazer um intercâmbio para lá, estudar e poder conhecer Nova York, Las Vegas, Chicago, Orlando, Miami, Los Angeles... – conforme ela falava as cidades, seus olhos brilhavam.
– Você vai precisar de um bom dinheiro para tudo isso – ele riu.
– E quem sabe conhecer um americano e conseguir um green card...
– Um americano você já conhece – sorriu ladino – Só não te garanto o green card.
Gabriela nunca negava um flerte, então continuou treinando o idioma com o gringo, mas agora, de uma maneira muito mais interessante ao seu ver. O inglês dela não era dos melhores apesar de ser acima da média, e a cada dia que Steve passava no Brasil ele se acostumava mais com a forma dos brasileiros falarem. Não que se incomodasse antes, na verdade achava incrível a hospitalidade brasileira, pois ele era o turista e ao invés de se adaptar ao idioma local, as pessoas que se esforçavam para se adaptarem ao dele. Isso só o motivava mais para aprender o português.
***
Duda estava saindo do banheiro quando deu de cara com Diego, que ia em direção ao mesmo. O sorriso no rosto do rapaz a deixava desconcertada, ainda mais sabendo que Nicole estava no cômodo ao lado. Deu passagem para ele no pequeno corredor entre a cama e a porta, e o breve instante que se cruzaram o fez parar e se virar para ela, na tentativa de puxar algum assunto só para não perder este momento.
– Eu estava brincando com o seu menino lá fora...
– Eu vi. Obrigada, me ajudou bastante, eu pude comer algo – sorriu.
– Ele é muito esperto! Ele não tem dois anos ainda né?
– Não, vai fazer no dia quinze de agosto.
– Praticamente daqui dois meses. Você ainda vai estar por aqui?
– Não, preciso dar um jeito nas minhas coisas lá em São Paulo, eu cheguei e mal tive tempo de nada... Bom, mas foi compreensível né?
– Totalmente. E como você tá em relação à mor... – calou-se, sabia que esse assunto sempre era delicado ao falar com ela.
– À morte da minha mãe? – franziu a boca – Eu choro todas as noites, mas acho que finalmente entendi que mesmo que eu estivesse com ela naquela hora, ia acontecer do mesmo jeito.
– Eu fico tão feliz em ver como você amadureceu, mas continua com a mesma essência.
Diego levou a mão ao ombro de Duda e o segurou, fazendo uma espécie de carinho com o polegar. Talvez as cervejas estivessem tirando o pouco de sanidade que lhe restava, e ele lutava consigo mesmo para manter o que sobrou do juízo. Borboletas invadiram o estômago dela, que arregalou os olhos com o medo evidente de alguém entrar ali e entender aquela cena de maneira errada.
"Diego, sua esposa tá aqui do lado", falou baixinho e tirou a mão quente dele de seu ombro mesmo sem querer tirar. O que ambos não perceberam foi que Nicole chegou a dar um passo para dentro do quarto para pegar a bolsa de Pedro, mas recuou no mesmo instante em que viu o carinho do marido em outra mulher.
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Olá meus amores! ♥
Hoje não é dia de postar, mas Incompletos atingiu 1K de leituras e eu estão tão feliz!
Sei que não é muito, mas eu não divulguei esse livro, quem está aqui é porque já leu Imperfeitos e se interessou pela continuação, então meu MUITO OBRIGADA a todos vocês! ♥
Agora...
Algumas coisinhas aconteceram nesse capítulo, né? haha
O que acharam?
Deixem os comentários que tanto amo, a estrelinha e não se esqueçam - se puderem, não saiam de casa!
Beijinhos e até a próxima! ♥
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