Prólogo mecânico
Tic-tac, tic-tac. Ao som dos ponteiros dos relógios, uma garota de 17 anos vestida com um velho macacão preto de mecânico está olhando por uma lente de aumento colocada em um suporte, enquanto segura uma ferramenta e separa as peças de uma televisão estragada para serem reutilizadas em objetos mais importantes. Seus longos cabelos castanhos cacheados estão presos num coque bagunçado, sua pele muito branca se destaca em meio ao ambiente mal iluminado. Essa garota se chama Ayana Lynch, e faz um tempo que tem trabalhado incansavelmente na oficina da família.
A oficina não é uma estrutura bonita de se ver, na verdade ela está torta, pendendo para o lado direito. Foi construída com diferentes materiais, pedaços de metal, madeira, concreto, tijolos, característica que torna suas paredes semelhantes a uma colcha de retalhos. O local possui um teto baixo, três bancadas de madeira lapidadas com muito esforço pelo próprio senhor Lynch, uma mesa de plástico com cadeira no canto, as paredes estão cheias de objetos pendurados aqui e ali. Porcas, roldanas, correias, engrenagens, pregos, martelos, chaves de fenda, alicates, se encontram esparramados em todos os lugares possíveis, do chão ao teto.
Todos são bem-vindos na oficina, lá não existe uma porta para dificultar o acesso das pessoas, elas podem entrar e sair quando quiserem. Objetos são consertados diariamente, e quando não são consertados, são modificados para terem outra função. Talvez ali seja um dos locais mais importantes do Depósito, com exceção da biblioteca e da escola.
Amelie Bloom entra correndo, e interrompe o trabalho de Ayana, dizendo:
— Ei, Ayana! Os gêmeos encontraram algo, mas falaram que é segredo, espero que seja algo legal. Vem comigo conferir, estou curiosa para saber o que é.
Ayana sorri para Amelie, mas logo depois lembra que está ocupada, sua expressão muda drasticamente, agora é de seriedade. Ela responde para sua amiga:
— Amelie, eu não posso sair agora. Tenho que consertar isso aqui, estou trabalhando. Mas não fique triste, mais tarde vou brincar muito com você.
Amelie tem 15 anos, mas é imatura e se comporta de maneira infantilizada, sua estatura é baixa para sua idade, possui rosto arredondado e um pouco achatado, olhos pequenos, cabelos lisos negros num corte acima do ombro, as características típicas de uma garota com síndrome de down. Nesse momento está usando uma faixa na cabeça e um vestido remendado de tecido leve.
Ayana não quer que sua amiga fique magoada por não poder brincar naquela hora, mas aconteceu justo o que ela não desejava. Amelie havia ficado brava, cruzou os braços, saiu da oficina batendo os pés com muito barulho, e gritou:
— Não somos mais amigas! Eu te odeio! Você não gosta mais de mim, se gostasse, iria brincar comigo agora! Estou magoada!
O senhor Lynch estava trabalhando nos fundos da oficina, ao ouvir os gritos, veio o mais apressadamente que pôde e perguntou à filha:
— O que está acontecendo aqui? Algum problema?
— Nada, pai. Apenas Amelie que ficou emburrada porque não posso brincar com ela agora, e por isso saiu da oficina fazendo barulho. Você sabe como ela fica quando as coisas não acontecem do jeito que ela quer — disse Ayana, suspirando logo depois.
O senhor Lynch é alegre e gorducho, ele anda cambaleando, mas faz o seu trabalho por trás das bancadas da oficina tão bem que ninguém diria que possui qualquer tipo de dificuldade. Sempre mantêm as ferramentas por perto, guardando dentro dos bolsos das calças e macacões, assim não precisa se movimentar muito. Ele sorri para sua filha e diz:
— Ayana, tá liberada. Pode ir se divertir junto com Amelie, mais tarde você termina isso. E pode retirar sua prótese, sei que é pesada e isso te deixa cansada.
A garota não possui o braço direito, e por isso usa uma prótese metálica, que anteriormente era um braço de robô, só que foi consertado pelo senhor Lynch para servir como um braço artificial. Mas isso é apenas um mero detalhe, não muito importante. Ayana retirou sua prótese, correu na direção de Amelie e disse:
— Ei, o trabalho acabou. Podemos ser amigas de novo? Eu vou brincar com você agora. Onde estão os gêmeos?
Amelie sorriu, deu pulinhos de alegria, e apontou para uma direção, afirmando:
— Os gêmeos estão na lagoa, perto da escola. Vamos logo, amiga! Eles estão esperando por nós!
Logo eram amigas de novo, a amizade ia e vinha sucessivamente, quando Amelie estava chateada não eram amigas, só existia quando ela estava feliz. Amelie é um tanto imprevisível, muda de uma hora para outra, esses eram traços normais de sua personalidade, mas como estavam juntas a muito tempo, Ayana já havia se acostumado com isso.
A "lagoa" perto da escola é apenas uma cratera que às vezes fica inundada com as chuvas, mas nos períodos mais secos não tem qualquer vestígio de água ali. Os gêmeos estão do lado da cratera que agora está vazia, se encontram cercados por outras crianças e jovens, e atrás de um enorme objeto coberto por um lençol encardido.
Algumas pessoas são um tanto peculiares, a começar pelos próprios gêmeos. Rafael e Daniel parecem ter sido costurados em um corpo só, eles nasceram colados pelo tronco, e se pudessem fazer determinados exames médicos saberiam que compartilham alguns órgãos. Na plateia vemos Viktor, um garoto negro que por não conseguir andar, é transportado em um carrinho de supermercado. Elijah, um adolescente ruivo totalmente cego que usa uma venda preta nos olhos. Bryan, um menininho loiro de três anos que possui seis dedos nas mãos.
Nem todos que vivem no Depósito são tão diferentes assim, também vemos Kumiko, uma garota cuja única peculiaridade talvez seria sua aparência oriental. Ela está ali porque é filha de um casal de rebeldes que fugiram do Distrito após receberem uma condenação de morte.
Agora que já visualizamos as pessoas presentes, vamos retomar para o mais importante. Os gêmeos apresentam uma espécie de espetáculo, Rafael diz:
— Meninos e meninas! Imperfeitos e Rebeldes!
— Temos algo para apresentar ao público! Um objeto misterioso e surpreendente! — Daniel diz, intrometendo-se na fala do irmão.
A plateia está curiosa. Afinal, o que tem embaixo do lençol? O que seria tão surpreendente e misterioso? Rafael retira o lençol, e arranca suspiros de decepção.
Ué? Era apenas uma caixa metálica cúbica? Tudo bem que não é qualquer caixa, ela brilhava demais, deve ter chegado há pouco tempo para estar tão limpa. Também é toda cheia de detalhes elaborados, desenhos de padrões geométricos perfeitos e unidos para formar um desenho decorativo.
Elijah toca o objeto, é assim que consegue ter uma ideia do que está na sua frente, mas tudo o que percebe é um cubo sem graça. A plateia vai embora, se sentindo enganada. Os únicos que ainda ficam no mesmo local são Ayana, Viktor e os gêmeos.
Ayana diz, impaciente:
— Foi pra isso que interrompi meu trabalho na oficina? Uma maldita caixa de metal? Eu vou contar para o Ancião que vocês estão enganando as pessoas, vão ficar de castigo. Isso não foi legal, meninos!
Daniel responde:
— Ei! Não é qualquer caixa! Está vendo que tem um vão bem no meio? Parece um tipo de baú, nós tentamos abrir, mas não conseguimos. Aí tivemos que dar um jeito de fazer Amelie te chamar, porque você não deixaria um trabalho de lado por qualquer motivo. Como Amelie adora um espetáculo, fizemos isso.
Ayana quase se recusa a fazer o trabalho, não gosta de ser enganada, ainda mais para fazer algo tão tosco como abrir uma caixa de metal usando uma de suas ferramentas. Ela só não foi realmente embora porque Viktor pegou a única mão que a garota possui e disse:
— Acho que tem algo importante dentro daquela caixa. Eu sinto que é algo que devemos saber. Por que não tenta abrir? Posso te recompensar se fizer isso.
Ela quer saber que recompensa seria essa, mas pensou que se é Viktor quem está oferecendo, deveria ser algo bom. Ayana diz:
— Meninos, vou levar a caixa para a oficina. Acho que meu pai conseguirá abrir.
Oiiii, meus robozinhos incríveis!
Este livro possui pontos de vistas de dois personagens, Ayana e Joshua. Apenas o prólogo é narrado na terceira pessoa, os outros capítulos estão na primeira pessoa
Vamos interagir um pouquinho?
O que imaginam que tenha dentro da caixa? Tentem adivinhar
O que vocês acharam dos personagens? Gostaram? Odiaram? Quero motivos!
Imperfeitos? Rebeldes? Do que os gêmeos estavam falando?
Quando será que tudo começou?
Algumas perguntas não têm respostas ainda, mas não se preocupem
Logo vocês irão descobrir o que aconteceu
Beijinhos metálicos para meus robozinhos incríveis,
Jojo!
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