26 - Cada palavra
Naquela mesma noite, Duda recebeu a visita de sua mãe e seu irmão. Laura entrou primeiro, chorou aliviada ao ver a filha acordada. Perguntou como a filha estava, tentando esconder a emoção. Ela ainda falava pouco, sentia falta de ar constantemente, então sussurrou que estava bem.
Laura estava agoniada, queria fazer perguntas para Duda, perguntas dignas de um interrogatório, mas o médico do plantão pediu para evitar quaisquer assuntos que pudessem agitá-la. Saiu com o coração na mão por deixar sua filha ali.
Jonathan entrou em seguida, já emocionado por saber que sua irmã estava acordada. Sentiu todo o peso sair de suas costas quando ela sorriu ao vê-lo. "Me desculpa por não estar ao seu lado quando você precisou", sussurrou ao abraçá-la. "Você não teve culpa de nada", Duda respondeu com a voz abafada pelo abraço. Ele fazia carinho em seu cabelo sem saber o que dizer, só agradecia silenciosamente ao universo por vê-la bem.
A visita acabou e Jonathan encontrou sua mãe no saguão. Ela carregava uma sacola com o celular destruído e as roupas que Duda estava no dia do acidente. "Ela vai ficar bem", ele tentava consolar Laura, que não conseguia ver sua filha com tantos fios, furos e cortes.
Chegaram em casa e ela colocou a sacola em um canto, olhar para a roupa cheia de sangue só a fazia imaginar o estado que Duda ficou. O que os olhos não veem, a mente imagina três vezes pior.
***
Diego acordou mais cedo na quarta-feira, perdeu o sono quando o sol ainda saía. Se revirou para tentar dormir, mas a preocupação não o permitia pregar os olhos. Foi para a sala e ligou a televisão. Deixou no noticiário matinal, não estava muito interessado, mas queria uma distração. Desviou o olhar para aquela sacola no chão. Espiou por cima do sofá e reconheceu a blusa toda suja e amassada. Sua mente se voltou instantaneamente para o acidente, para a Maria Eduarda aparentemente sem vida no meio da estrada de terra. Se lembrou de como olhava fixamente para ela, ansiando por qualquer movimento que sugerisse uma respiração.
Laura levantou para tomar água e viu Diego sentado no sofá segurando a camiseta suja nas mãos. Ele nem percebeu que pegou, quando se deu conta, já estava contornando as manchas de sangue seco com a ponta dos dedos.
"Está tudo bem?", ela questionou, o tirando do poço de lembranças que entrou. "Sim, está sim. Me desculpa, eu só... só... Essa camiseta era minha, sabia?", respondeu, confuso. Laura se sentou ao lado dele e segurou a camiseta nas mãos. "Eu sei. Era a camiseta favorita dela", respondeu. Ela não se deu conta, mas falou com se Duda não estivesse mais ali. Diego engoliu seco, não conseguia aceitar essa hipótese.
"Por favor, não se desfaz dela. Era a minha camiseta favorita também", pediu. Laura concordou e entregou a camiseta de volta para ele antes de voltar para a cama. Ele continuou abraçado às lembranças até a hora de ir trabalhar.
***
Por volta das onze da manhã, Jonathan recebeu uma ligação do hospital. Antes mesmo que pudesse se desesperar, a atendente do outro lado da linha informou que Duda receberia alta da UTI e seria transferida para o quarto. As visitas seriam permitidas das duas da tarde às sete da noite, sendo até quatro visitantes por dia, porém só entrariam dois por vez.
Laura e Jonathan foram os primeiros a entrarem no quarto. Laura estava ansiosa para perguntar sobre o acidente e principalmente sobre a gravidez, mas Jonathan mudava de assunto todas as vezes que percebia que sua mãe tentava abordar um destes temas.
Duda estava um tanto quanto impaciente, ainda falava pouco, não aguentava mais aquele ambiente e evitava tocar no assunto do acidente até mesmo com os médicos, por mais que precisasse contar.
Mônica e Gabriela subiram para o quarto no revezamento das visitas. Perguntaram da cirurgia, se ela sentia dores, como estava fazendo para tomar banho, se haviam médicos bonitões, enfim, perguntas aleatórias que a fizeram se distrair.
Passaram mais de uma hora falando trivialidades na tentativa de animá-la. Funcionou, ela soltou alguns sorrisos até o fim da visita. Mônica se despediu e foi até a porta. Gabriela deu um beijo no rosto da prima e se virou para sair, mas Duda segurou sua mão. "Gabi... o Diego... por favor", sussurrou. Gabi assentiu e sorriu antes de sair.
***
Diego chegou em casa antes de todo mundo. Aliás, nem sabia onde estavam. Deitado no sofá, avistou a roupa de Duda no varal, ainda um pouco manchada, mas, ainda assim, ali. Ele estava cochilando quando chegaram do hospital, acordou com o barulho da porta.
Gabriela se sentou ao lado dele e encostou a cabeça em seu ombro. "A Duda foi para o quarto... e ela quer te ver", disse sem desviar o olhar da televisão. Ele passou o braço em volta da irmã, dando um abraço cúmplice, agradecido. Era tudo o que ele queria.
***
Duda aguardava ansiosa pelo horário de visitas. Será que Gabriela entendeu o seu pedido? Será que Diego queria vê-la? Sua ansiedade fazia seu estômago doer, mas perto das dores que sentia nos últimos dias, isso não era nada.
Olhou para o relógio em cima da porta, duas e meia e ninguém para vê-la. Sua companheira de quarto conversava animada com sua filha e sua irmã. Ela continuava sozinha. Só às três e quinze que duas pessoas se aproximaram do quarto. Ela sorriu ao ver tia Maria e tio Pedro entrarem pela porta.
"Minha menina, eu pedi tanto para Nossa Senhora Aparecida te curar!", Maria disse enquanto a abraçava. Pedro evitava falar, mas seus olhos brilhantes falavam por ele. Ele não costumava demonstrar suas emoções, mas só o fato de estar ali para vê-la já significava muito para ela. "Você vai sair logo daqui, menina", ele soltou de uma só vez, antes de se calar de novo. Maria contou como as coisas estavam no sítio, disse que estava com saudades das bagunças dos jovens na casa, saudades de Maria Eduarda elogiando todas as receitas diferentes que ela preparava todos os dias. Duda sorria a cada causo contado com o sotaque caipira de sua tia-avó.
Seus tios desceram para o saguão e ela ficou sozinha novamente. Encarou o teto com a certeza de que Gabriela não passou o recado. "Du?". Ela reconheceu a voz de Jonathan. Desviou o olhar do teto e viu seu irmão parado ao lado da cama. Correu os olhos por trás dos ombros dele e viu Diego entrando no quarto. Não conseguiu conter o sorriso.
"Eu só entrei para ver como você está, mas eu sei que não é comigo que você precisa falar... Eu vou deixar vocês sozinhos. Qualquer coisa, eu estou aqui no corredor", Jonathan beijou a testa da irmã e saiu do quarto. "Obrigada", ela respondeu antes que ele saísse.
"Du, como é bom te ver...", disse ao se apoiar na cama. "Me dá um abraço?", ela pediu baixinho. Diego se aproximou e a abraçou cuidadosamente, tinha medo de machucá-la. Ela parecia tão frágil, mas ao mesmo tempo tão forte por suportar tudo aquilo.
– Eu tive tanto medo de te perder... – enrola os dedos nos fios castanhos de Duda.
– Me desculpa... Eu... eu só não aguentava mais. – evita encará-lo.
– Mas agora você tem que aguentar firme. Por você e pelo... bebê.
Diego titubeou antes de concluir a frase, não tinha certeza se este seria um assunto propício para aquele momento. Duda sentiu o corpo formigar quando ele disse a última palavra. Ainda não havia conversado com ninguém a respeito disso, todos queriam saber, mas ninguém queria perguntar. Ficaram em silêncio por alguns segundos que mais pareciam uma eternidade. Diego se aproximou e segurou levemente seu queixo, a fazendo olhar diretamente para ele. "Se não quiser falar sobre isso, tudo bem.", murmurou.
– Não. Eu... Nós... precisamos falar sobre isso.
– Ele... é nosso?
– Sim. Você foi o único nos últimos meses.
Diego se sentou na cadeira ao lado da cama sem saber o que dizer. Jonathan já havia afirmado, porém ouvir diretamente de Duda tomou uma proporção maior do que ele imaginou. A felicidade que sentiu ao ouvir a confirmação de Maria Eduarda se esvaiu no momento que se lembrou de Nicole e o outro bebê. Eles não tinham culpa de nada. A ficha finalmente caiu. Vinte e dois anos, duas crianças de duas mulheres diferentes. Uma ele amava, a outra, ele casaria. Sua vida nadou totalmente contra a correnteza de seus planos.
– Diego... eu sei que a nossa situação não vai ser fácil, se você não quiser assu...
– Eu vou assumir, lógico que vou. – a interrompe.
– Eu só quis deixar claro que está tudo bem se você não quiser.
– Essa hipótese nem se passou pela minha cabeça. Eu só estou com medo...
– Eu também...
Duda estendeu a mão para fora da cama e Diego a segurou. Acariciou seu braço, passando a ponta dos dedos ao redor dos hematomas causados pelas frequentes agulhadas e pelos pequenos cortes do acidente. Deram as mãos e brincaram em silêncio com os dedos entrelaçados e inquietos. Parecia estar tudo bem, parecia que nada aconteceu. Tudo parecia estar de volta no lugar. Jonathan observou a cena da porta e precisou pigarrear para anunciar sua presença.
"Desculpa atrapalhar vocês... mas é que daqui a pouco a visita acaba e eu queria ver a minha irmã...", sorriu. Duda soltou a mão de Diego e abraçou o irmão. Ela questionou a felicidade estampada em seu rosto, o permitindo contar tudo sobre Daniela. "Ela é aquela moça que perdi naquela festa... Que a senhorita me disse que eu nunca mais veria!", brincou. Duda sentiu extrema felicidade ao ver o sorriso estampado no rosto do irmão. Os olhos dele brilhavam ao falar dela.
O horário de visitas acabou, Jonathan se despediu da irmã e saiu primeiro para deixá-los à vontade para se despedirem. Diego deu um beijo em sua testa e se virou para ir embora, mas voltou até o pé da cama para uma última pergunta.
– Você pediu para eu vir aqui hoje para me contar sobre o bebê?
– Não. Eu precisava te ver... e te dizer que... eu também amo você.
Um sorriso melancólico brotou no rosto de Duda. Queria dizer isso há muito tempo, mas agora já não fazia mais diferença. Ele se casaria com Nicole, isso já era certo. "Então você me ouviu", Diego murmurou e sorriu envergonhado. "Cada palavra", ela respondeu desviando o olhar para a parede. Diego continuou parado nos pés da cama por alguns segundos, mas ela não conseguia olhá-lo, inibida pela própria revelação. Suspirou e saiu do quarto, mas deixou um pedaço seu.
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Aceito críticas (construtivas, por favor rs)!
É isso, vejo vocês quinta-feira! ♥
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