ᴘᴀʀᴄᴏᴜʟ

     Atravessamos o oceano em meu jatinho, não estava pra brincadeira, eu queria estourar a cabeça de Michel a todo custo.
     Ele pagaria por meu pai, pelo meu povo, por Madalena, por Alicie, por Hope e por Jace.
     O faria sofrer e estava ansioso para me regozijar em sua dor, seu desespero.
     Sentia todos os poros do meu corpo clamar por vingança, por sangue, por fogo.
     Uma coisa que sanguíneos não levam em consideração é temos os mesmos poderes que eles e até alguns dons a mais, a mesma força e capacidade e não é porque não matamos humanos ou não nos alimentamos deles somos mais fracos, muito pelo contrário, a pureza também nos fortalece.
     Matá-los um por um nós podemos e eu teria o maior prazer.
     Ah sim, como eu teria.

— Estamos chegando? — Jace perguntou agoniado ao piloto.

     Era a vigésima vez, sem exagero, que aquela mesma pergunta fugia de seus lábios, depois daquele dia ele estava melhor, mais ainda tinha o semblante doente.
     Sua inquietação parecia o inferno do burro de shrek a caminho da terra do nunca.
     Maldição.
     Sinto meu peito se contrair em ira e dor, havia perdido as contas de quantas vezes Alicie me fizera assistir a todos os filmes da série com ela.
     Tantas lembranças com aquela pequena e inteligente garota, eu a amava tanto, amava tanto Cristian, lhe devia demais e eu deixei que eles a levassem, a matassem.

Inferno.

     Eu ia arrancar cada parte do corpo de todos os envolvidos, ia acabar com Lórion, não sobraria nada.
     Com pensamentos assassinos e planos de vingança, estratégias de tortura não percebo que ao meu lado a aeromoça me cutucava, eu mantinha sim humanos trabalhando para mim, não via a necessidade de me isolar do mundo, desde de que eles não soubessem o que eu era.

— Senhor, por favor, coloque seu cinto. — pede sorrindo quando finalmente a olho.

— Ah, claro. — mudo minha expressão e olho pro meu colo.

     Olho pra Jason ao meu lado que observava atento os movimentos do irmão, ele estava claramente preocupado e incomodado, seus dedos não paravam quietos na perna.
     Jason, assim como eu, sabia que Hope era responsabilidade integral do irmão, Aurora o separou para isso, a vida dele estava ligada a dela, se Hope morresse ele morreria junto, mas não era só isso que deixava Jace tão afoito.
     Não, o que o mantinha tão desesperado é que sua promessa a quem lhes salvaram estava prestes a ser quebrada.
     Ainda pequenos, os gêmeos adoeceram, os pais de ambos eram conhecidos dos Valentes, contataram Aurora que os intimou a atravessar o oceano para ter com ela e com sua curandeira na pequena cidade francesa.
     Era uma tacada promissora pra duas família eu diria.
     Aurora tinha duas opções a oferecer, benzê-los ou transformá-los, das duas maneiras eles sobreviveriam, porém ela queria algo em troca, claro e o casal escolheu mantê-los humanos, escolheram benzendo-os.
     Já grávida, Aurora sabia que seu bebê corria riscos, ter um benzido cuidando de sua segurança era algo viável, excelente.
     Sua família estava sob o alto escalão do conselho de Lórion apesar de seus antepassados terem sido convertidos.
     Darien, seu bisavô, desconvertera a família após ceder a maldade.
    Ele avassalou com, aproximadamente, cem pacientes de uma clínica de reabilitação, foi o maior massacre já visto na época.
     Não preciso dizer como foi que o mundo recebeu aquela notícia, a cidade fora evacuada após o segundo ataque em um motel* à beira da estrada.
     Darien matou e instruiu o filho, Zenon, a matar todos da família que se opusessem a sua ordem, inclusive a esposa e duas das cinco filhas, as que foram mortas por ele foram simplesmente esquecidas, ninguém fazia questão de lembrar seus nomes.
     Aurora, concebida por Aprea, a filha e neta mais nova foi obrigada a se tornar uma sanguínea ainda criança, na juventude descobriu sua verdadeira origem, mas temia se converter e acontecer com ela o que acontecera com suas tias, Agnes e Deise, no entanto sua alma era pura como a de Alicie.
     Ela lutou contra seus instintos letais com todas suas forças passando a ser regenerada no silêncio, e então conheceu John.
     Como costume as famílias poderosas do conselho concebiam a mão de seus filhos como alianças para obter ainda mais poderio.

Doentio.

    Aurora era prometida a Leopoldo Lee, filho de Gerald Lee, um dos anciãos de Lórion, mas ela se descobriu grávida.
     Isso pôs os planos da família Valente por terra, Leopoldo se negou a casar-se a partir de então, o que gerou grande fúria entre os membros das famílias levando os Valentes desejar sua morte.
     Entretanto, antes de expor sua atual situação Aurora propôs aos pais dos meninos um pacto de sangue.
     Aquilo exorbitou aos olhos de Kyle e Madson Walter, um pacto de sangue com uma Valente, eles eram uma das poucas famílias humanas que sabiam sobre a existência da raça, pois fornecia bolsas de sangue para Órion.
     Aurora sabia o que o futuro destino lhes preparavam, sabia que teria que se abster do seu bebê e por isso um benzido ligado a ela era uma ótima maneira de protegê-la.
     Afinal essa seria a profissão, a missão da vida dele a partir de seus vinte anos, quando a transformação de um híbrido, metade humano e a outra vampiro, deveria começar.
     Ele a ajudaria a lidar com a descoberta, com a adaptação e com o que mais fosse necessário, ele cumpriria o papel que era pra ser de Aurora, já que o pai da criança era humano.
     Para os Walter's estava muito bom para ser verdade, além da cura, dos poderes de um benzido, saúde eterna, Aurora ainda lhes oferecia um pacto com sua linhagem.
     Era como dizer quantos zeros na conta um milionário tinha, poder, status, reconhecimento.
     Não parecia ser uma troca injusta, muito pelo contrário, então porque não?
     O casal concordou, pois zelar pela vida do bebê Valente seria um privilégio, certo?

Certo.

     Os Walter's entregaram Jace, o mais velho por alguns minutos, sua idade era de cinco anos.
     Palavras e promessas foram lançadas, o feitiço saia em forma de frases em latim, uma picada na barriga de Aurora, uma no dedo de Jace e então a junção do sangue foi o suficiente pro pacto ser celado para sempre.
     Jace foi criado sendo ensinado a ser grato por aquilo e a como passar essas mesmas coisas à Hope, ensinar ela a aceitar e lidar com quem seria após o amadurecimento da fita do DNA de sua mãe, Jace sabia que a troca salvara sua vida e a do irmão, e por isso ele não podia falhar.

— Obrigado, comandante. — agradeço sério começando a descer as escadas da aeronave após o pouso.

     A alguns metros uma SUV nos esperava, preta como a madrugada, apesar de ser cinco horas da manhã ainda estava bem escuro, apertei a mão fechada em punho e senti o anel de ouro no meu dedo.
     Irônico, eu tinha que usar um anel pra não queimar no sol sendo eu o próprio fogo.
     Depois de doze horas de voo eu me sentia exausto psicologicamente, precisava fechar meus olhos por alguns segundos, mas eu sabia que não conseguiria descansar sem antes falar com Amira.

— Senhor. — uma das minhas três crias vivas me saúda quando me aproximo — Como vai? — Marceline sorri contida.

     Ela foi a última a quem transformei, tornando-se assim a mais nova entre minhas crias, foi logo após a morte de Trevis, saí pra caçar e me descontrolei levando ela a beira da morte, para que a jovem não morresse por culpa minha eu dei a ela meu sangue.
     Eu senti a morte de Trevis na minha alma, demorei a compreender que fora ele mesmo que escolheu trair a mim e a seus irmãos, enfrentei o luto por anos, por meus pais e por Trevis.
     Criei ele e a Vitor alguns séculos antes da morte dos meus pais, a transformação de Vitor foi em 1820 e tudo graças a minha falta de postura como herdeiro de Órion, eu estava rebelado e não queria saber de nenhuma responsabilidade, então meu pai me sentenciou a ser um criador e eu juro que eu tremi dos pés a cabeça, pois sabia que seria difícil a partir dali.
     Eu quis matar Vitor assim que ele abriu os olhos, nenhum dos outros que vieram depois, nem mesmo Marceline, superou o trabalho que o recém nascido meu deu, porém com ele eu aprendi a ter e a ser responsável, aprendi a ser cuidadoso com as palavras, a ouvir mais, pensar muito antes de falar e também a falar menos, o silêncio é a melhor respostas em certas ocasiões, também aprendi a aceitar o que era bom para o reino e a cumpri-lo mesmo que não fosse do meu agrado ou melhor para mim.
     Eu aprendi com ele para dar o exemplo a ele, Vitor era novo como vampiro, mas adulto na antiga vida humana, ele tinha seus princípios, mas eu tinha que ensiná-lo a viver, pensar e agir como um vampiro e eu lhe digo, foi difícil.
     Não tem como explicar como é ser um criador, não sei se posso comparar a ser pai apesar de parecer as vezes, mas é gratificante e estressante ao mesmo tempo.
    Já Trevis foi transformado em 1833, ele foi levado a Órion por meu pai, na época os portais estavam fechados e fazíamos ronda pra capturar os sanguíneos que espacavam, Trevis viu quando um vampiro atacou um humano e se alimentou dele.
     Não houve o que fazer senão levá-lo junto com o transgressor capturado.
     Meu pai iria apagar sua mente, mas ele pediu pra que ao invés disso ele o transformasse, por muito tempo o mantivemos conosco ainda humano, meu pai era muito rigoroso na questão de transformar pessoas, em quase quatro milênios de vida ele criou apenas cinco vampiros.
     Quando ele decidiu que não iria criar Trevis, eu decidi que iria, via várias vantagens em tê-lo conosco e após sua transformação nós três, ele, Vitor e eu, nos tornamos inseparáveis, parecíamos mais irmãos do que criador e crias.
     Quando ocorreu o atentado no halloween, que é o dia em que o nosso mundo e o dos humanos estão alinhados, separados por uma fina parede de magia e com as horas igualadas, eu e eles estávamos fora de Órion, lideravamos cada um uma equipe de busca, foi então que tudo aconteceu, vampiros, lobsomens e bruxas romperam os mundos com a luz negra e invadiram meu reino, mataram meus pais, os anciãos, destruiram meu lar e vieram pro primeiro plano.
     A primeira onda de matança não foi tão grande quanto a segunda, quando os portais foram abertos, mas muitas pessoas morreram.
    Naquela noite nós estávamos na Alemanha, cobririamos o país em duas noites, mas naquela fomos surpreendidos, segui o cheiro de lobos por uma mata e os vi atacando um grupo que acampavam, quase ninguém sobreviveu, apenas Seline.
     Lembro-me dela implorando pra que a ajudasse, ela tinha graves ferimentos, sabia que meu sangue poderia transformá-la, mas mesmo assim eu dei, eu a peguei no colo e saí da mata convocando os meus meninos em alerta, precisávamos voltar, eles me encontraram tão sujos de sangue quanto eu estava.
     O grupo de trangressores haviam se espalhado pela Europa, América e parte da Ásia através da magia das bruxas, o caos estava implantado.
     Quando voltamos pra Órion eu não pude acreditar no que via, minha casa estava completamente em ruínas, era muito difícil crer naquilo, só não impossível porque eu via.
     Lembro-me de entregar a garota a Vitor e entrar no clã em desespero, sentia a morte por ele.
     Encontrei na grande sala dos anciãos o corpo de meu pai caído em frente as portas de madeira e ouro, assim como os dos membros do conselho que estavam espalhados pela sala.
    Foi Trevis que encontrou minha mãe, estava caída no jardim, foi a primeira a ser morta. Lembro-me do pavor que vi nos olhos do jovem vampiro, naquela noite toda Órion foi feita em pedaços.
     Trevis, junto com outros vampiros, lobos, elfos, fadas e bruxas, era defensor da guerra como vingança e quando decidi manter a paz e seguir com o recrutamento ele pediu pra que cortassemos o laço de criação.
     Eu não o fiz, mas mesmo assim ele nos deixou juntando-se ao grupo inimigo, tudo indicava que teríamos que lutar com os que foram nossos, e quando eles invadiram o clã para tomar de nós o feitiço dos portais Solveig tentou me matar, porém antes de me atingir pelas costas Trevis entrou na frente sendo atingido em meu lugar.
    Minha cria morreu em meus braços enquanto dentro do clã travava-se uma luta sangrenta.
     A conta de pessoas importantes para mim que estavam morrendo só aumentava, mas ainda assim decidi não declarar guerra.
     Seline acordou vários dias depois de toda a confusão sem entender o que estava acontecendo, a transformação dela foi a mais demorada de todas, mas também durante todo o processo de adaptação ela se mostrou calma e muito comportada, diferente de todos.
     Eu estava lá quando ela abriu os olhos, fui eu a dar a notícia e as primeiras instruções, Vitor e ela, junto com meus amigos e aliados, era a causa d'eu não sucumbir ao caos que estava ao meu arredor e dentro de mim.
     Porém, mesmo com toda sua calmaria Seline não podia avistar ou sentir o cheiro de lobisomens pois se transformava imediatamente, ela não conseguia diferenciar santificados e transgressores por causa do trauma que sofrera no fim da vida humana.
     Aos poucos fomos trabalhando isso nela e hoje ela convive bem com lobisomens amigos, mas adora estrassalhar os inimigos.
     Nós a chamamos de caçadora e em todas as buscas era ela que sentia, perseguia e matava os cachorros.
     Já Marceline foi como Trevis, difícil, durante seu primeiro século ela não colaborou em nada conosco, por isso vivia sempre restrita a muitas coisas, inclusive a sair para as buscas comigo e com os outros.
     Jason era quem ficava com ela nas noites em que eu me ausentava, e em uma delas os dois se desintenderam e Marceline quase que perde a cabeça, literalmente.
     Após isso ela pareceu se conscientizar e aceitou amadurecer, graças a Deus.
     Eu me sentia feliz ao vê-la, fazia tanto tempo e eu nem sabia que estava com tanta saudade.

— Nada bem, mas é bom te ver. — olhei em seus olhos — E você? — perguntei sabendo que havia algo que estava fora dos trilhos.

— Bem... — fala e eu deito a cabeça no ar — Mais ou menos. —reformula e eu assinto com um suspiro.

     Eu sabia, eu os conhecia, muito bem aliás.

— Depois conversaremos sobre isso. — digo sério e ela concorda.

     Ao seu lado estava Bernard, um dos meus muitos homens, um dos meus mais confiáveis.
     Ele não era um original, mas era quem gerenciava as estratégias de guerra, analisava os desfalques do inimigo, conferia e testava as armas e os escudos e as colraças, era nele que eu confiava nossas vidas para a vitória.

— Bernard. — o cumprimentei com um abraço.

— Daio.

— Alguma novidade? — questiono esperançoso.

— Nada sobre a garota ou Alicie. — me desaponta.

— Então podemos deixar pra depois. — afirmo pegando a chave que Marceline me estendeu.

     Enquanto todos entravam no carro a vampira colocou a mão sob meu ombro, olhei pra ela que, como sempre, estava cheia de anéis e depois para seu rosto.

— É bom te ver de novo, Daio. — fala se afastando e eu assinto.

     Ainda tínhamos mais uma hora até Parcoul, uma comuna francesa localizada na região administrativa de Nova Aquitânia*, é pequena e muito conhecida por ser habitada pela influente família Valente.
     O grande casarão estilo vitoriano ficava no centro da cidade, no coração de Parcoul.
     Entrei no carro, ao meu lado Jace, atrás Jason e Bernard.
     Marceline seguiu em seu Sedã escuro atrás de nós, com ela estava Ryle, seu ombro direito e esquerdo ou, como ela prefere, noivo.
     Seguimos em total silêncio até a cidade, ouvia-se somente os suspiros inconformes de Jace, Bernard o observava atento quando isso acontecia, era notário a impaciência do humano e o estranhamento do vampiro.
     Combinamos de encontrar com a, até onde me lembrava, sanguínea em sua casa, arriscado?

Muito.

     Mas tratava-se de duas pessoas importantes para mim, eu não ligava se tivéssemos que matar um ou dois Valentes, estávamos em guerra da mesma forma.
    Apesar das hipóteses de atentado eu sabia que os únicos que estariam ali seria Amira e seu marido, Braux.
     O casal não tinha filhos, que eu soubesse.
     Assistimos o dia amanhecer enquanto avançavamos na estrada, eu já conseguia ver as construções arcaicas, lembrei-me da minha infância, senti saudade.
    Ah pai, mãe, eu me vingarei por suas mortes fatídicas, amaldiçoado seja Platon, Michel, Lórion e todos que os seguem.
    Com um suspiro, agora meu, continuo dirigindo, conforme mais próximos mais sentia o nervoso borbulhar no meu interior, dentro de mim meu coração batia gerando a vida, primordial para a minha existência, sem ele, assim como um ser humano, eu morreria.
     Estacionei na frente da grande e exorbitante construção com pressa, ágilmente todos descemos, Jace e Jason armados com seus poderes e armas bélicas na cintura.
     Uma Bereta 92, semiautomática, nove milímetros, cada uma carregadas com quinze projétil's feitos de uma mistura de madeira e verbena, fatal.
     Um tiro no coração de um vampiro e game over pra ele.
     Entraria eu Jace e Bernard, Jason, Marceline e Ryle ficariam fora caso precisarmos.
     Se mataram meus pais, com certeza iriam querer me matar também.
     Subimos os cinco degraus da entrada após o portão, alto e com pontas afiadas, ser destrancado com um click, a porta foi aberta sem que precisássemos tocar a campainha.
     Uma cabeleira loura surgiu a minha frente, os olhos claros de Amira trouxe a memória os de Hope, os incríveis olhos oceânicos de Hope.
     Ah, eu sentia sua falta.
     Amira me encarou por um período longo antes de ceder espaço pra que eu passasse.
     A casa estava escura, no entanto foi ouvir duas palmas que as cortinas se abriram com um "vump" rápido e mágico, claro, os imunes a luz gostavam de esbanjar isso.
     Eu sorri debochado.

— Aprimorando os poderes "buxelosos" para ver se assim consegue acabar com Órion? — questiono com Bernard e Jace ao meu encalço.

     A porta se fecha sozinha e então ela sorri, diabólicamente.
     Essa mulher é terrível.

— Não matarei minha própria raça Mollin, você deveria saber. — declara pretenciosa. — Por favor, sigam-me. — pede nos conduzindo pela ampla sala com móveis obsoletos, mais velhos que eu, com certeza.

     Nas paredes quadros da família, lá estava ela, Aurora, estampada na parede aonde a luz iluminava pouco, pelo menos não havia sido totalmente excluída da descendência.
     Pobre Agnes e Deise.

— A que devo a honra da visita de vocês em minha casa? — questiona apontado para o sofá.

     Amira se acomoda, logo depois de nós, em uma poltrona antiga.
     Exalava superioridade.
     Eu sorrio

— Hope Valente. — expeli o nome que me preocupava a dias e a vi estreitar os olhos.

     De repente, atenta e alerta, arregala os olhos, Amira se põe de pé, sua feição era de surpresa, mas ao mesmo tempo preocupação.

— O que vocês querem com minha sobrinha? — pergunta sobressaltada, era nítido sua desconfiança.

— Relaxe Valente, Hope estaria muito melhor se estivesse conosco, eu garanto. — observo — Porém, para sua infelicidade, ela está com Michel em Lórion. comunico e o olhar e semblante de Amira converte-se pra extremo terror.

     Ela cai sentada, seus olhos esbugalhados, a boca aberta em um semicírculo.

— Por Deus, não pode ser. — sibila com pavor — Mas como? falei com John a alguns dias, pedi pra me encontrar com ela, ele me disse que Hope pediu pra pensar... — seus olhos vagavam desconexos pelo chão.

— Hope está em Lórion tem um mês. — informo e ela me encara agora com os lábios em uma linha reta — Precisamos de você Amira, achamos que Michel lançou sobre ela algum feitiço, pois mesmo com a ligação de sangue entre ela e Jace, eles não conseguem se conectar e se comunicarem . — relato sóbrio.

     Os olhos ainda arregalados da vampira encontram-se com os meus.

— O que planeja? — se dispõe sem pensar duas vezes.

— Ligação parental. — revelo hesitante — Pressupomos que ela esteja no clã de Michel, mas não temos certeza, seria óbvio demais, se arriscarmos é como dar um tiro no pé. — digo olhando-a.

     Amira se cala, sua feição se endurece, seus olhos parecem navegar por mim, pelo meu âmago, eu sentia sua invasão.
     O que ela estava fazendo? Podia ler pensamentos? Ou a alma?

— Desde quando está apaixonado pela minha sobrinha Daio? — questiona arrancando meu ar, paralisando meu corpo, espantando minha alma.

     Mas o que...?
     Eu rio atônito.
     Ao meu lado sinto o olhar de Jace me queimar, seu sorriso convencido crescer no rosto.
     Eu tentava não pensar sobre isso, todos os dias era uma luta mais densa que a outra, mas de uma coisa eu tinha certeza, Hope subjugou-me para si.

— Eu... — ainda perplexo me perco nas palavras, meu olhar não foi capaz de sustentar o dela.

     Ele era austero, implacável.
     Estava desconcertado, ter meus sentimentos exposto fez-me sentir despido.
     Uma afronta a minha pessoa.

— Verídico ou não, pressuponho que isso não vem ao caso. — me recompondo sentindo minhas orelhas quentes, ela havia conseguido me constranger.

Infeliz.

     Amira sorriu, analisou-me meticulosamente, sentia o scanner que ela passava em mim.

— Pare! — ordenei sentindo as ondas frias por meu corpo, mas ela não o fez.

     Num instante toda calma que havia em mim evaporou.

— Eu mandei PARAR! — levanto-me num instante, balanço a mão no ar trazendo com vento o fogo.

     Branda, Amira observou minha mão fumegar, seu sorriso se alargou pelo rosto, a sensação fria de ser analisado dissipou-se.
     Otário, deixei que ela comprovasse sem que lhe respondesse com palavras.

— Desde o dia que a viu pela primeira vez Mollin? — provoca ainda plácida, seu sorriso não abandonava o rosto sereno.

     Fechei a mão em punho e o fogo cessou, ajeitei meu terno e sentei novamente me sentindo derrotado ao lado dos meus homens.
     Meu coração descompassado denunciava um sentimento no qual eu odiava, o constrangimento.

— Isso não é um pouco clichê? — indaga enquanto vejo ela erguer a mão e fazer um gesto rápido e sutil.

     Fiquei em alerta, os instintos tentando detectar todo e qualquer indício de perigo.

— Batizado? — oferece e vejo dois garçoms com bandeja na mão se aproximando calmamente, sob o objeto chapado e prateado estavam depositadas quatro taças de vinho, três delas batizadas.

     Eu peguei uma e cheirei com cuidado, Jace não esperou muito e virou de uma vez.
     Depois de Cristian, ele era o que estava mais doido com toda a situação.
     Bernard o seguiu sem hesitar enquanto Amira segurava a sua elegantemente.

— Como pretende achá-la Mollin? — pergunta cruzando as perna sob o vestido beje de botões e cinto fino, os saltos baixos e de camurça explicitavam mais um pouco sua elegância.

— Você irá senti-la, localizar aonde ela está. — explico após beber um gole do meu, não queria que acabasse depressa.

— Como isso? — inquire confusa.

     Meu celular no bolso notifica uma mensagem, eu a esperava.

— Com licença. —  peço o pegando.

Senhor, Ivana e Jales chegaram com Liandra

     Eu me levanto sob o olhar da mulher, sorrio e guardo o aparelho no bolso.

— Com uma bruxa, obviamente, Valente. — respondo-lhe a dúvida óbvia e ela se põe em pé.

— Não posso recebê-la, na minha casa não entram transgressores Daio, sou uma regenerada e ninguém pode saber. — profere austera, seu timbre era grave, alerta.

     Ergo as sobrancelhas em surpresa, regenerada, é?
     Seu pai e Darien odiariam saber disso.

— Não se preocupe, não faço negócio com sentenciados, minha convidada é Liandra, você a conhece, uma das mais poderosas de Ópreon. vejo ela respirar aliviada.

     A tensão atenuou-se.
     O som da campainha reverberou por toda a casa, fazendo-a olhar para a porta de entrada.

— Com licença. — pede indo até lá e abrindo-a.

     Pude ouvir a voz intensa de Liandra cumprimentando-a, eu me coloco de pé para receber uma das anciãs aliada a Órion, Jace e Bernard fazem o mesmo.
     A mulher morena, cuja pele resplandecia sob a luz natural que lhe beijava com devoção era mais velha que eu e Bernard juntos, dona de muito poder e detentora de um coração alvo e bondoso.
     Ela sorriu ao me ver e veio em minha direção circundada por um vestido amarelo, ela erradiava beleza e alegria.

— Daio. — chamou meu nome com carinho.

     Ela fora uma das responsáveis por adiar a guerra e acalmar os ânimos dos redimidos após a morte dos meus pais.

— Como está, Liandra? — cumprimento com dois beijos sua face.

— Muito bem, querido. — responde calma — E quanto a você? — me olha com atenção, havia se distanciado.

— Sombrio. — falo apenas e ela ri.

— Consegui sentir lá de fora sua áurea pesada Mollin, precisamos resolver isso. — afirma e cumprimenta Bernard e Jace que mais parecia um morto vivo.

     Se eu estava com a áurea pesada, imagina ele?
     Pensando bem, ainda não temos uma cidade para eles, seria engraçado se existisse uma quarta cidade de zumbis veganos, Jace iniciaria a geração.

— Está ciente Liandra? — Amira estava com olhos repletos de apreensão.

     Como ela mesma afirmou, conhecia a Bruxa, não existia quem não a conhecesse.
     Ela era como os Beatles, Bon Jovi ou então One Direction.
     Por que não Harry Potter?
     Enfim, ela era uma lenda real e viva.

— Sim, estou e sim, isso é possível. — assente sentando-se. — Mas preciso do seu total consentimento e entrega. — explica e a vampira fita o chão.

     Ela estava hesitante, e eu suspiro impaciente, até que ponto ela achava que estar com Michel não era perigoso para Hope, uma humana?

— Amira. — a chamo com a voz densa, estava apreensivo, temendo uma recusa — Hope irá se casar com Michel. — conto e seus olhos voltam a se alarmar. — Alicie foi sequestrada e até onde sabemos, está morta. — conto e a vejo respira assombrada. — Precisamos da sua ajuda, Amira. — suplico.

     Se tivesse que esfregar meu ego no chão, me humilhar diante dela perante todos, eu faria, Hope valia mais que isso, Alicie valia mais que meu ego esfolado.
     Eu precisava salva-las e ela era minha última esperança.

     Graças a Deus, depois de algum tempo, Valente concordou em nos ajudar, posso entender sua hesitação pois o procedimento era mesmo perigoso. Elas se retiraram pra sala de estar, fecharam a porta e estão lá a duas malditas horas.

Duas horas.

     Estava em pé, braços cruzados escorado no pilar que havia na sala, observava estafado Jace andar de um lado pro outro.
     Seus olhos estavam longe, via seu corpo presente, mas seu espírito estava distante, longe da sala.
     Jace não conversava muito sobre seus tormentos, só falava quando já não tinha mais escapatória.
     Lá fora meus aliados esperavam em seus carros.
     Suspirei resignado com a demora e mais uma vez pensei em Hope, em como ela estava.
     Teria sido ela enfeitiçada para se apaixonar por Michel? Ou ameaçada por aquele desgraçado sem escrúpulos?
     Perdido em pensamentos, as horas não perdeu tempo em avançar, já era nove horas quando ouvi o click da porta.
     Despertei, descruzei os braços, desencostei do pilar, olhei ansioso para Liandra que saiu primeiro, logo atrás dela veio Amira.
     Eu sabia o que estava por vir, esse método já fora usado por meus pais, mas eu nunca havia presenciado. Quando meus olhos encontraram a vampira eu me arrepiei, seus olhos estavam espantosamente brancos, virados para cima, seu corpo em pé, mas ela claramente nao estava aqui.
     Eu e Jace caminhamos apressados até elas.

— Aos cuidados de Frederik Pimpol e Sara Terye, Hope reside no clã de Michel, mas há dois dias ela está alojada na casa do vampiro filho de Karon Pimpol — Amira diz em sussurros de voz. — Hope será apresentada como noiva e futura senhora de Lórion na noite da posse de Michel, o casamento está marcado para a próxima lua cheia após a posse, Hope almeja e planeja a morte de Leopoldo Lee, Alicie será o sacrifício. — Quando ela disse a última palavra desabonou no chão como uma boneca de pano.

     Rápido, Jace segura a vampira desmaiada.
     Dei passos para trás aturdido com as informações.
     Posse, casamento, plano de vingança, Alicie viva e próxima a ser sacrificada, e quem raios era Frederik?

— O que faremos Liandra? — me sinto completamente sem chão, minhas pernas estão boambas e eu não sei o que pensar.

— Eu tenho uma ideia, é arriscada, mas mesmo assim é uma. — ganha a atenção dos meus olhos.

ᴇᴜ ɴãᴏ sᴇɪ ᴇᴍ ᴠᴏᴄês, ᴍᴀs ᴇᴍ ᴍɪᴍ ɴãᴏ ᴛá ᴘᴀssᴀɴᴅᴏ ɴᴇᴍ ᴜᴍᴀ ᴀɢᴜʟʜᴀ.
ᴍɪɴʜᴀ ɴᴏssᴀ sᴇɴʜᴏʀᴀ

ɢᴇɴᴛᴇ ᴅᴏ ᴄéᴜ, sᴏᴄᴏʀʀᴇ!


ᴠᴏᴛᴇᴍ ᴇ ᴄᴏᴍᴇɴᴛᴇᴍ.
ᴠᴀʟᴇᴜ ʜᴜᴍᴀɴᴏs.

ᴍúsɪᴄᴀ ᴅᴏ ᴄᴀᴘíᴛᴜʟᴏ: ɪɴғɪɴɪᴛʏ - ᴊᴀʏᴍᴇs ʏᴏᴜɴɢ

ᴅɪsᴘᴏɴíᴠᴇʟ ɴᴀ ᴘʟᴀʏʟɪsᴛ ᴅᴏ ʟɪᴠʀᴏ ɴᴏ sᴘᴏᴛɪғʏ, ʟɪɴᴋ ɴᴏ ᴘʀɪᴍᴇɪʀᴏ ᴄᴀᴘíᴛᴜʟᴏ.

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