Adeus Itália

c a p í t u l o c r o s s o v e r


Tenho que dar meus méritos para Chie, aos quinze primeiros minutos do primeiro set, a maioria de nós já tinha penalidades acumuladas. Eventualmente, o que era um jogo com um nível de dificuldade físico, ganhou uma segunda e terceira camada de desafio muito mais complexas do que apenas se mover.

Sei que tenho uma boa leitura espacial dentro da quadra, mas até mesmo aquela situação estava se provando ser desafiadora. Manter os meus movimentos, sincronizar com as garotas e ainda pensar no que as desafiantes do outro lado da quadra podiam estar tramando. Se tivesse que comparar com um computador, diria que minha mente está operando com quase 90% da capacidade.

— Droga — Hana disse durante a pausa —, nunca vi Sora fazer um bloqueio tão feliz. Se não tivéssemos você para furar o bloqueio já seria um jogo perdido.

— Furar o bloqueio não é o único jeito de pontuar — respondi —, vamos explorar as laterais e jogadas. Emi é boa, mas não consegue cobrir a quadra inteira e as trajetórias da bola sozinhas.

— E sobre a levantadora? — Aki questionou roubando um olhar lateral para o outro lado da quadra. — Não vamos conseguir fazer nada com ela solta desse jeito.

— Não sei se temos muito o que fazer com a italiana.

— Capitã — Chiasa pediu a voz —, e se ao invés de prender a levantadora. Mirar nas atacantes?

— Chiasa tem razão — Aya balançou a cabeça —, Emi e talvez a Chizue são as mais ágeis para acompanhar. Mas Sayu, Yumi e a Sora-senpai, são um pouco mais travadas, as reações delas são boas nos braços.

Sorri, e passei a toalha no rosto — Parece que criamos alguns monstrinhos. É uma boa estratégia, vamos seguir com ela. Aya e eu manteremos as posições para sempre ter uma boa defensora na linha do fundo. Podem atacar sem medo.

— Fim da conversa — Dan bateu palmas —, as penalidades vão voltar a ser contabilizadas a partir de agora.

Fechei a boca e voltei a me concentrar, trocando olhares com as meninas e batendo as mãos antes de tomar meu lugar na quadra. Nossa vantagem estava nos sinais de mãos que eram conhecidos, e planejava as jogadas mesmo que com a ausência de falas.

Contudo, a italiana era uma coisinha desprezível. No melhor dos sentidos.

Sora e o restante das meninas estavam tendo o melhor momento de suas vidas, não houve um levantamento que não foi absolutamente perfeito. Ajustado a cada uma e tirando o melhor da jogada, um set para cada lado e agora para o terceiro, ambos times voltavam com sangue nos olhos.

Se tinha qualquer animosidade entre Sora e a italiana, sumiu naquela quadra. Não foi uma ou duas vezes que peguei as duas trocando olhares e até mesmo comemorando jogadas. É como o ditado: o inimigo do meu inimigo é meu amigo. Pelo menos no que diz a respeito do jogo de hoje.

Minha vice-capitã tinha uma reserva de energia exclusiva para os dias em que nos enfrentamos. A levantadora estava tirando bom proveito dessa pré-disposição, não foi necessário palavras pare eu conseguir ler em seu olhar as provocações sutis. Sorrisos dados depois de boas jogadas e observação constante, tentando ler nos meus movimentos o que estava se passando na mente.

20 a 20 e uma frustração silenciosa de não conseguir abrir uma vantagem.

As adversárias do dia se prepararam para sacar, a bola veio direto para mim e Chiasa se adiantou para fazer o levantamento. Hana tentou tomar a vantagem fazendo uma largadinha, porém a reação foi rápida. Emi ajeitou a bola e Chizue se adiantou para cortar. Nesse momento Keiko e Aki se prepararam para bloquear, mas a altura do ataque deu o ponto da virada para elas.

Mais uma vez o saque veio forte, o ataque foi feito, mas a dupla de centrais do outro lado conseguiu interromper. Aya rapidamente fez o acompanhamento conseguindo manter a bola em jogo, Chiasa trocou um olhar comigo e propositalmente mudei minha postura, conseguindo nesse movimento fazer uma paralela e igualar o placar novamente.

— Isso! — Kei disse e imediatamente colocou a mão na boca.

— Mais uma penalidade para você, fóssil da peneira — Dan sorriu e apitou dizendo para Tom anotar no caderno dele.

Balancei a cabeça, tinha coisa que eu não podia fazer por elas.

O saque veio para nosso lado, e dessa vez Hana espalmou a bola num saque viagem poderoso. A bola foi recebida, mas Kei que estava nervosa por ter recebido mais uma punição, conseguiu matar a jogada de maneira fabulosa. Depois disso ela ainda teve a coragem de olhar na direção do juiz e mostrar a língua.

Enquanto ela não falasse, ele não podia dar o troco.

Viramos o jogo, porém não fora de perigo, os últimos três pontos precisavam ser conquistados com cuidado e precisão. Pelo cansaço, é natural que as garotas comessem a se desviar, a falta da fala também me impede de as puxar de volta para o jogo. Respirei fundo e bati duas palmas.

Não só aquelas que estavam jogando no meu time olharam, mas os estampidos ecoaram pela quadra me fazendo retomar a atenção. Na lateral vi que a treinadora Atena sorriu, e me deu um aceno de cabeça. Parece que eu atendi a uma das suas expectativas para a partida.

Em silêncio, as batalhas individuais eram mais presentes e a falta da fala elimina aquilo que faz um time, um grupo. Clamar o time de volta para a quadra, com um som que não foi a fala, virou o fim do jogo a nosso favor.

22 a 24 a nosso favor, bati o pé no chão antes de ir para o saque. Bati a bola duas vezes no chão e girei o pescoço.

Meu saque foi forte, tentei aproveitar o fundo pra conseguir um ACE, mas Emi conseguiu segurar, apesar de mandar a bola de volta para nossa quadra. Nos ajustamos para dar sequência na jogada, mas Sora e Sayu subiram conseguindo amortecer a bola e dando tempo para um contra-ataque.

A italiana olhou para Yumi, mas Chizue estava vindo para um ataque de fundo. Keiko não conseguiu ver a movimentação, portanto me posicionei para cobrir qualquer ataque. Quando elas perceberam que fiz a leitura correta do ataque, já era tarde demais, corri para pegar o block-out. Deslizei com o joelho e fiz e manchete, precisando trancar os dentes para não pedir cobertura.

Chiasa pulou, mas sua postura denunciou o levantamento falso, rapidamente me levantei para cobrir o buraco que tinha na quadra. Com habilidade, ou sorte, meu pé estava no lugar certo e manteve o rally correndo. Um resmungo deixou minha garganta involuntariamente, me ganhando uma punição.

Hana passou para o outro lado, nos dando tempo para reorganizar, sabia que lentamente as lobas do outro lado estavam se preparando para atacar. Aquele set precisava terminar ali de qualquer jeito.

Me recuando para me preparar para defender, coloquei a mão nas costas de Chia dizendo através de um gesto que o próximo ataque, é meu.

Imediatamente o time se posicionou me usando de referência, e nesse momento não importava se as adversárias soubesse que o ataque seria meu, tinha a certeza de que iria marcar.

Sora e a italiana subiram para me bloquear, a gerente da Nekoma um pouco mais baixa, mas fechando completamente a possibilidade de uma paralela na direita. Seria o meu ataque usual, principalmente depois da recepção sólida, porém o braço que girei foi o esquerdo. O cruzado de ângulo estreito e a rotação foi uma surpresa, a bola passou entre a rede e o braço de Sora caindo antes da linha.

— Fim de jogo — Atena aplaudiu —, estão liberadas para falar.

— Monstro — foi a primeira coisa que deixou a boca de Sora, enquanto ela levantava a manga da camisa para secar o próprio rosto. Me mirando com chamas atrás dos olhos.

— Igual você — retruquei e pulei para trás para desviar do chute que tentou me dar por debaixo da rede. — De qualquer forma, é mais uma vitória para mim.

— O que você fez no fim — a italiana perguntou quebrando a discussão com Sora. — Combinou alguma jogada com as palmas?

As duas passaram por debaixo da rede e eu dei espaço para se aproximarem — Não, foi mais um sinal para chamar o time para focar na quadra. Sem falar, tudo que pensamos fica na cabeça, gradualmente a visão vai se estreitando porque o barulho aqui em cima é alto demais.

— Vocês ganharam, mas não estão livres das punições — Dan ainda não tinha descido do banco do juiz, se aproveitando da altura para comandar as jogadoras.

No fim eu tinha 30 abdominais para fazer, parece que Thomas esteve me olhando com olhos de águia. Todas acabamos por ter que cumprir punições, algumas mais do que outras.

Nossa visitante se ofereceu para segurar meus pés, visto que Sora se juntou com Keiko e o resto das meias de rede para conversar sobre a partida.

— Está bem?

— Depende — respondeu a gerente —, está perguntando do meu joelho ou do meu coração?

— Os dois, se quiser me responder — cruzei os braços na frente do corpo olhando para o teto antes de começar a contar a série.

— Minha perna está boa, embora não dê para recuperar a confiança nela repentinamente. Já sobre meus sentimentos, você tem um bom time nas mãos — disse com um meio sorriso —, apesar de ser bem diferente do que estou acostumada. Foi um bom treino, não sei como agradecer pela oportunidade.

— Só de ter a sua presença já ajudou a inflamar um pouco o espírito de luta das minhas garotas e sei que faria o mesmo por mim em qualquer outra situação — me sentei após cumprir 10 dos meus abdominais —, mas tem algo que pode fazer por mim.

Os olhos dela ganharam um brilho afiado e sua boca se curvou — E o que seria?

— Me ensinar seu levantamento.

— Por quê? Você parece boa o suficiente sem ele.

Dei risada e voltei para o chão — Parece legal de fazer.

Minha resposta também veio em forma de um riso — Sora está certa quando diz que você é uma grande idiota do vôlei.

— Se é assim, somos duas.

Depois de zerar a minha penitência, e fazer o mesmo pela italiana que também tinha alguns movimentos para cumprir, nos juntamos ao resto do time para as considerações finais em relação ao treino. Treinadora Atena como sempre fez alguns apontamentos táticos, indicando sempre quais as ações que poderíamos ter realizado ou não.

— No geral, todas vocês se saíram melhor do que eu esperava — disse —, conseguiram se manter focadas e conduzir uma boa leitura da partida. Vamos continuar fazendo esse exercício para desenvolver essa capacidade. E uma estrela dourada para nossa capitã que recuperou o ritmo do jogo na reta final, também para Sora e nossa visitante por conseguirem forçar o ritmo desesperado do último set.

— Se não fosse aquele último ataque nojento, teríamos ganho.

— Como assim? — Aki questionou.

— A italiana montou a estratégia, ao pressionar com os ataques e fazer vocês correrem na quadra de um lado para o outro. Aumentamos o ritmo. Com isso os erros são mais propícios, principalmente com quem ataca. Logo as duas defensoras ficariam sobrecarregadas para cobrir essas falhas, a capitã ficaria fora da jogada e o caminho ia se abrir.

Sora deu a explicação inteira e em seguida se virou — Foi isso, não foi?

Com as bochechas coradas, ela acenou com a cabeça — Algo nessa linha.

— Bem, não temos mais nada no cronograma hoje. Estão liberadas — Dan anunciou e olhou para o relógio —, bem a tempo do fim do treino dos garotos. Acho bom ganharem o set hoje.

— Sim! — as segundanistas concordaram cheias de energia.

Por fim, arrumamos o ginásio rapidamente seguindo com os planos de invasão no treinamento masculino como de costume. Eles pareciam estar em pausa, e no placar haviam 6 sets marcados. Não sabia o resultado dos anteriores, mas aquele set tinha uma vantagem para as corujas.

Como eles ainda estavam em treino, apesar de finalizando, o time feminino aguardou na lateral.

Os jogos, mesmo de treino, entre Kuroo e Kou eram sempre interessantes de se ver. O capitão da Nekoma sabia lidar bem com Bokuto, mas Akaashi tinha um pouco de vantagem. Ele costumava a ser a chave que dá corda para o ACE, mas o time da Fukurodani no geral merece todos os louros por se manterem no mesmo nível do capitão.

Sentada, com as costas apoiadas na parede, não pude deixar de divagar sobre o passado. Quando Makoto era o capitão, as coisas eram tão diferentes. Kou era bem mais magricelo e menos confiante, com uma gama limitada de ataques e uma visão muito centrada. Ver agora ele jogando de uma forma mais livre e conseguindo controlar a quadra como um capitão fazia, gerava dentro de mim uma sensação de orgulho. Não apenas por ver o quão longe ele chegou, mas por conseguir ver essa evolução ao seu lado.

— Ela realmente gosta dele.

— Ela vai secar o Bokuto se continuar olhando para ele.

Mesmo sem virar a cabeça, soube dizer quem havia falado o quê, dito isso, me preocupei em responder minha nova amiga não a velha e rabugenta.

— Não sabia que meu rosto é mais interessante que um jogo — juntei as mãos no colo.

— Pelo que Kuroo me disse, vocês estão juntos de alguma forma, mas não são namorados?

— É um pouco complicado — respirei fundo —, estar num relacionamento sério com alguém pede por alguns sacrifícios. Nós dois temos obrigações como capitães, e queremos ganhar como qualquer outro time, vamos ter tempo para ser um casal depois que os campeonatos acabarem.

— Enquanto isso se esgueirar para dar uns beijos é o suficiente — Sora me provocou fazendo romper um calor no meu rosto.

— Inveja mata Sora — me inclinei para ver seu rosto — ligue para sua namorada hoje, quem sabe falar com Akemi tira um pouco dessa sua amargura.

Sem se importar com a italiana que estava entre nós a meio de rede se lançou na minha direção, segurei seu pulso rindo.

— Não se preocupe com isso, todas estamos na mesma situação, em algum nível — disse a italiana.

Troquei um olhar com minha vice-capitã — Imaginei que você e Kuroo já estariam juntos a essa altura.

A italiana que dessa olhou para o capitão da Nekoma — Talvez ele precise trabalhar um pouco mais para isso.

Logo em seguida o set foi dado por finalizado, os meninos se organizaram para receber as orientações e o treino livre começou. As meninas mais novas se levantaram para chamar os segundanistas para a revanche. Isso me rendeu de Sora uma careta.

Não demorou para que os terceiros anos se juntassem para conversar, nisso é claro que surgiu a oportunidade de jogar juntos enquanto os mais novos disputavam pela revanche. Dessa vez estava ao lado da italiana e não contra ela, e isso resultou em dois sets de completo massacre.

— Vocês tiveram tempo para descansar — Komi, o líbero da Fukurodani respondeu —, foi injusto.

— Vai chorar? — Hana provocou com um sorriso. — Deixe Dan ouvir isso e o treino físico de vocês vai aumentar.

Nossos colegas do time masculino reclamaram, aqueles que entraram da Nekoma não precisavam se preocupar com isso.

— Mais um! — Bokuto pediu, faminto por ganhar mais um set.

— Eles precisam voltar para a Nekoma — disse passando por debaixo da rede —, vamos finalizar por hoje.

Kou cruzou os braços na frente do corpo emburrado, mas em seguida levantou as mãos confuso contando nos dedos — Espera, com isso acumula quantos meses que preciso carregar sua bolsa?

Dei risada e coloquei a mão no seu braço — Dessa vez não apostamos nada.

— Ah, é verdade!

— Bokuto-san está tão acostumado a apostar com a capitã que faz inconscientemente — Akaashi comentou.

— Ele está mais acostumado a perder, pelo que parece — Kuroo provocou.

— Qual foi o placar mesmo? — rebati.

Gato preto não teve tempo de responder, pois os treinadores chamaram para dar um fim de vez.

Foi o momento das despedidas, juntos levamos a Nekoma de volta para o ônibus, entre algumas conversas soltas e Taketora prestando uma continência com lágrimas nos olhos.

— De volta a rotina normal — falei para a italiana —, boa sorte no seu jogo.

Estendi a mão para me despedir, porém, a gerente da Nekoma ignorou meu gesto e resolveu me dar um abraço.

Com força ela apertou meus ombros — Obrigada, capitã.

— Quando voltar, ensino meu levantamento para você — respondeu atendendo meu pedido anterior.

— Vou esperar ansiosa por isso — respondi seu abraço e então ela me soltou.

O ônibus da Nekoma partiu, e nisso nossos times também começaram a se desfazer para ir embora.

Sora levantou os braços se espreguiçando — Rumo ao torneio da primavera?

— Rumo a vitória.











N/A: Obrigada por ler até aqui!

Até a próxima!

Ps. Pessoal caiu tanto os comentários que eu não sei se estou fazendo algo de ruim. Me deixem saber se o negócio está ficando um lixo.

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