54

A Princesa sentou-se em seu trono, com o rosto em mãos.

Apenas uma outra vez ela se sentiu tão exausta, tão cheia de responsabilidades, e isso foi logo após assumir o principado de Seul. Ela achava estranho que seu problema atual a deixasse igualmente desgastada.

O Rei havia respondido diretamente à mensagem da Princesa, informando que manteria todo o seu apoio e suporte. O sucesso de Jimin em capturar os traidores e evitar um conflito aberto foi visto como uma resolução eficaz. A Princesa de Seul foi oficialmente reconhecida publicamente, o que significava que todos os principados da aliança do reino da Coreia estariam do lado dela.

Jimin conhecia em primeira mão o poder expansivo da sua criadora. Diante da captura de Hongjoog e do envio de uma incursão seulita a Busan para executar todos os traidores, ela havia feito o seu movimento e comunicado a Ordem dos Caçadores sobre o tratado.

A Princesa respirou fundo, ainda precisaria fazer um movimento importante, mas estava feliz por sua amada cidade.

Uma mão gentil pousou na dela, leve como o toque de um anjo.

– Você está mesmo disposta a ir ao encontro da Ordem dos Caçadores?

Jimin levantou a cabeça para olhar para Minjeong.

– O Rei garantiu que o meu tratado fosse aceito. Como Princesa, preciso comparecer pessoalmente para assiná-lo e entregar o traidor.

A musicista se inclinou contra o trono, sentindo um aperto no peito.

– Não estou muito confiante com esse cenário, mas irei apoiar sua decisão.

Os olhos castanhos de Jimin encontraram os dela por alguns instantes. Quase imperceptivelmente, ela assentiu.

Minjeong colocou os braços ao redor dela.

– Parece apropriado – murmurou Jimin, pressionando um beijo em seu cabelo.

– O que é apropriado?

– Que você seja a minha única esperança. – Ela segurou-a com força, como se por seu aperto pudesse garantir sua segurança.

Jimin inclinou o queixo e beijou-a, segurando o rosto dela com as duas mãos.

Um guarda entrou na câmara do conselho e caminhou pelo corredor.

– O comandante Seo solicita uma audiência, minha senhora.

– Traga-o aqui agora. – A Princesa soltou a mão de Minjeong.

O guarda curvou-se e voltou para a porta, abrindo-a e escoltando Changbin pela câmara. As duas figuras marcharam pelo corredor. O comandante vestia um colete de proteção sobre as vestimentas negras e carregava uma expressão séria no rosto.

A Princesa acenou para ele se aproximar.

– Perdão, minha Senhora. – Ele se curvou bruscamente. – Eu entreguei uma mensagem a Taeyong e ele me enviou para você.

– Qual é a mensagem?

– Nosso contato no Império enviou uma mensagem urgente avisando que uma incursão de caçadores está a caminho. Eles devem montar base na fronteira.

– Este relatório é uma referência ao meu encontro com o comandante da Ordem?

– Sim, Mestre.

A Princesa se inclinou para frente.

– As fontes são confiáveis?

– Nós verificamos com mais de um. Há relatos civis também.

A mão da Princesa se curvou em punho.

– Quantos?

– Pelo menos duzentos homens.

– Parece que eles estão preparados para um possível confronto.

Changbin abaixou a cabeça, fechando as mãos em punho.

– Quanto tempo antes de chegarem?

– Estamos rastreando seus movimentos, mas esperamos que em menos de três horas.

– Mande uma mensagem para a princesa de Icheon, avisando-a da incursão. Peça que ela envie tropas de Icheon para a fronteira em apoio à nossa aliança.

– Sim, minha senhora.

– Mande uma mensagem para o Império, ordenando que enviem tropas de apoio o quanto antes. E envie uma mensagem a Siwon na minha residência, ordenando-lhe que inicie o protocolo de defesa. Encontre Aeri, eu preciso falar com ela. Agora.

Changbin curvou-se mais uma vez e correu em alta velocidade até a porta, muito antes do soldado que deveria estar acompanhando-o. Ambos os vampiros desapareceram no corredor.

– Caçadores? – Minjeong sussurrou.

A Princesa assentiu com a cabeça.

– O general deve ter convocado um destacamento.

– Isso significa guerra?

Jimin se levantou, parecendo sombria.

– A Ordem não enviaria duzentos Caçadores da sua sede a menos que estivessem preparados para um conflito.

– O que faremos?

– Temos o apoio do Império. Vou enviar uma mensagem urgente pedindo reforços. Com sorte, Icheon e Busan também enviarão soldados. Mas o meu objetivo principal é assinar o tratado e evitar que uma guerra aconteça.

Minjeong encontrou seu olhar e ofereceu um olhar simpático, mas a palidez de sua pele desmentia a calma.

– Se a Ordem tem medo do Rei, por que o provocariam?

– Eu não sei. – Jimin estava pensativa. – Talvez seja uma demonstração de força para motivar a assinatura de um novo tratado. Os vampiros devem manter sua existência escondida. Hongjoog desrespeitou o tratado. – Ela tocou a mão dela, e Minjeong a agarrou com força.

– Perdão, minha senhora. – Aeri anunciou sua chegada, curvando-se quando entrou na câmara do conselho.

– Aeri, acabei de falar com o Changbin. Eu quero que você envie uma mensagem urgente para o Rei, solicitando que ele envie reforços imediatamente.

– Sim, minha senhora. – A Conselheira olhou para Minjeong quando se aproximou do trono. – Mas eu tenho novidades que você deveria ouvir.

– Prossiga.

– Aparentemente a situação em Busan foi controlada – Ela estendeu um pedaço de papel.

A Princesa arrancou-o da mão dela. Ela leu a mensagem rapidamente.

– Posso confiar nisso?

– Sim, minha senhora. Como você pode ver, Taeyong enviou a mensagem eletronicamente para que fosse recebido rapidamente.

– O remetente foi confirmado?

– Sim, chegou como uma comunicação segura.

A Princesa lhe devolveu o papel.

– Claramente, Busan ouviu falar que temos o apoio do Rei. Informe a Taeyong que em breve estaremos sob cerco e ele deve ordenar ao comandante busanita que mantenha o exército preparado.

Aeri assentiu com a cabeça.

– Estamos nos dirigindo para a fronteira nas colinas. – Continuou a Princesa. – Avise os membros do Conselho para se prepararem. Iremos partir em uma hora.

Sem pensar, Minjeong estendeu a mão e colocou sobre o braço dela.

– Sim, minha senhora. – Aeri voou pelo corredor e saiu da câmara.

Assim que a porta se fechou atrás da Conselheira de Seul, Minjeong se virou para Jimin.

– O que Taeyong disse?

A Princesa levou a mão ao queixo, pensativa.

– Ele disse que não teve dificuldade em encontrar os apoiadores de Hongjoog e os executar. Ainda temos aliados importantes dentro de Busan e estes auxiliaram a lidar com a situação em segredo.

Minjeong ficou em pé, parando em frente a Jimin.

– Você está carregando o peso do mundo nas suas costas.

Jimin respirou fundo. Então fechou os olhos e levantou o queixo, o corpo ainda parado.

Minjeong observou-a, imaginando o que ela estava fazendo.

Finalmente, ela abriu os olhos. Um olhar de resignação fria brilhou das profundezas castanhas.

– Desde que assumi o principado de Seul, esse é o momento mais decisivo da minha vida. Felizmente tenho como salvar a cidade. A Ordem dos Caçadores está irritada pelo que aconteceu com o humano, mas posso entregar Hongjoog para aplacá-los.

Minjeong envolveu sua cintura com os braços.

– Isso é mesmo possível? – sussurrou ela.

– Tudo vai depender da resolução dessa noite – Jimin apoiou a testa na dela.

\[...]

A jornada do submundo de Seul para o base de operações temporária da Ordem dos Caçadores não foi longa, apenas cerca de cinco quilômetros. Seojoon e alguns de seus soldados acompanharam os seulitas pelo bosque em direção à fronteira onde aconteceria a negociação. Além deste ponto, nenhum vampiro ousou ir, todo o território utilizado pela Ordem era consagrado.

Dentro desta base protegida, a Ordem treinou, traçou e conduziu sua estratégia em segredo, protegida pelas colinas da cidade.

Poucas horas antes do nascer do sol, e a cidade de Seul permanecia envolta na escuridão. A grande torre de Seul brilhava como um farol, enquanto os edifícios a sua volta pareciam menos iluminados.

Infelizmente para os vampiros que se aproximavam a pé, as sombras que os acompanhavam não eram suficientemente grandes para escondê-los.

A Princesa cheirou o ar, seu olhar atraído para o território a sua frente.

– Caçadores – ela sussurrou, apontando com o queixo para seus inimigos invisíveis.

Em reação, Seojoon rosnou:

– Levante o padrão.

O portador do padrão levantou a bandeira do Império, que apresentou um anel de folhas de louro em um fundo preto.

Seojoon dirigiu-se a Princesa.

– Nossa presença deve garantir sua segurança. Mas minhas ordens são para não avançar a menos que seja atacado.

– Então, observe. – A Princesa estendeu o braço em amizade, e Seojoon apertou-o, de mãos dadas para o cotovelo.

O capitão e seus soldados deram meia volta e ficaram parados a poucos metros de distância enquanto o destacamento seulita avançava. A cerca de cem metros da fronteira, a Princesa ordenou a seus soldados que parassem e ficassem a postos. Eles estavam expostos nesta posição, mas ela estava determinada a mostrar força.

Jimin se virou para olhar o padrão da bandeira imperial nas proximidades, sabendo que cada movimento dela estava sendo assistido. Seojoon a saudou em resposta.

Ela se virou para Minjeong, que estava ao lado de Ningning.

– O que quer que aconteça, não venha ao meu encontro – ela sussurrou para Minjeong. – Concordei que me acompanhasse, mas sua segurança ainda é minha maior prioridade.

A musicista relutou, mas acabou assentindo.

Jimin voltou sua atenção para Aeri, que se aproximava. Changbin vinha logo atrás, escoltando o traidor.

O som das botas atingindo pedregulhos foi ouvido a distância. Cerca de cem caçadores vestidos com uniformes pretos saíram da base de operações temporária e avançaram. Eles usavam crucifixos ao redor de seus pescoços e carregavam espadas.

– Caçadores de elite – disse a Princesa.

Aeri grunhiu.

– O que há com esse destacamento? Eu pensei que estivéssemos em uma missão pacifista.

– É melhor nos mantermos alertas – A voz da Princesa estava fria. – Duvido que a Ordem queira despertar a ira do Rei, mas mantenha sua posição por segurança.

A Conselheira assentiu.

Os caçadores marcharam em direção à fronteira e se espalharam, cem metros dentro da linha. Uma figura solitária surgiu, caminhando na direção dos seulitas.

– Aproxime-se lentamente. – Ordenou a Princesa a Changbin. Ela avançou em direção à fronteira, enquanto o comandante pairava atrás dela. A poucos metros da linha, Jimin parou.

O comandante Choi San olhou para a Princesa de Seul, o rosto impassível. Ele era alto, moreno e inteligente. Fazia mais de dez anos que servia a Ordem dos Caçadores, e tinha orgulho da recente promoção a comandante. Era uma honra alcançar posição tão elevada em tão pouco tempo.

Os dois líderes ficaram frente a frente em lados opostos da fronteira. O comandante trazia em mãos uma pasta com algumas folhas de papel impresso.

Ele já havia assinado o tratado, por ordem do Superior Geral.

A Princesa segurou a caneta na mão.

– Se este tratado for violado, minhas tropas têm ordens para atacar.

– Notei – o comandante respondeu bruscamente. – Você vai manter o seu domínio sobre o submundo de Seul, o que é muito mais do que você merece.

– A oportunidade para me matar não foi tirada de você completamente – a Princesa rosnou. – Eu revelei as identidades dos vampiros responsáveis pela morte do humano.

– Comandante... – interveio um dos soldados, aproximando-se. Ele parou, uma expressão calma no rosto. – A paz está em todos os nossos interesses. O supervisor geral fez questão de reforçar isso antes da nossa partida.

A Princesa baixou a voz, dirigindo-se ao comandante.

– Eu tenho a sua palavra?

Ele fechou as mãos em punhos. Sua real vontade era ordenar que o destacamento atacasse, mas San sabia, assim como seus concidadãos, que os membros da Ordem que fracassavam em suas responsabilidades eram banidos ou executados. Sendo que os banimentos eram extremamente raros.

Muito ciente da história da Ordem dos Caçadores (tema que havia estudado desde que lá chegara), ele conhecia sua responsabilidade como comandante. Queria provar seu valor ao supervisor geral e também tinha apreço pela própria cabeça, e gostaria muito de preservá-la.

E foi por isso que ele se resignou a responder:

– Com a minha alma.

A Princesa o encarou em silêncio. A relíquia que trazia no pescoço, disfarçava as emoções do comandante. Ela proporcionava uma proteção adequada contra os vampiros. Havia o pequeno problema de que isso não funcionava com Jimin, mas nenhum dos presentes ali precisava saber. Ela sentia o ódio que emanava do seu ser e reconhecia a validade daquilo que ele realmente desejava.

Diante do silêncio que se seguiu, uma movimentação começou a crescer. Tanto os caçadores de elite quanto o destacamento seulita começaram a se posicionar em estado de alerta.

A Princesa olhou para Minjeong. Então ela pressionou a caneta no papel e assinou.

– Eu reconheço a validade desse tratado. – O comandante inclinou a cabeça na direção da Princesa. – Seus soldados podem trazer o traidor.

A Princesa acenou para que Changbin se aproximasse, trazendo consigo um Hongjoog visivelmente desesperado.

– Preparem o prisioneiro – ordenou o membro da Ordem.

O soldado marchou para frente, segurando um par de algemas.

– O que vocês estão fazendo? – Hongjoog se dirigiu a Princesa e ao comandante.

Ambos permaneceram em silêncio enquanto ele tentava se desvencilhar.

– Onde está a honra entre vocês? – Hongjoog rosnou para o comandante. – Eu já me rendi. Você não precisa me acorrentar!

O soldado o ignorou, mantendo seus olhos treinados no traidor enquanto algemava seus pulsos e outro soldado algemava seus tornozelos.

Changbin impediu Hongjoog de tocar em Jimin.

– Soltem-me! – Gritou ele, tentando inutilmente avançar em direção à Princesa – Você não tem mesmo honra? Como pôde me entregar aos nossos inimigos? Eu servi Seul durante todos esses anos. Você não pode me condenar por causa de um único erro!

Tanto a Ordem dos Caçadores quanto os soldados seulitas se aproximaram, mantendo uma distância segura, mas empunhando armas.

O comandante olhou em volta, avaliando o perímetro.

Jimin aproveitou a oportunidade para se concentrar no destacamento a sua frente.

– Preparem-se para partir! – Ordenou o membro da Ordem, liderando quatro outros soldados que escoltavam Hongjoog em direção a base.

Com sua partida, a Princesa se virou para o capitão Seo e apertou sua mão.

– Obrigada pelo seu serviço. Reporte a Aeri para mais instruções. E ordene o exército a se preparar para retirada.

O capitão se curvou, a mão em sua espada. Ele e seus soldados marcharam em direção ao destacamento.

A expressão da Princesa suavizou quando Minjeong se aproximou, mas ela manteve o olhar atento.

– Você está bem?

– Estou, não precisa se preocupar.

Jimin chegou perto dela devagar, com os olhos cravados nos seus. Ergueu a mão para tocar seu rosto, como se quisesse se certificar da veracidade das duas palavras.

– Quando a trouxe para o meu mundo, eu não pretendia colocar você diante de tantas situações perigosas. Mas infelizmente a vida de uma princesa do submundo não é feita apenas de regalias.

Minjeong balançou a cabeça.

– Nada disso importa agora. Não quando minha real preocupação era que a Ordem pudesse tentar matá-la... isso tornaria as coisas ainda mais difíceis.

– Não acho que nada poderia ser mais difícil do que as últimas semanas. – A expressão dela foi grave.

A musicista arqueou uma sobrancelha para ela.

– Estou falando sério, Minjeong. Já vivi perdas, perdas incalculáveis. Tudo empalidece diante da possibilidade de perder você.

Ela estendeu a mão para tocar seu rosto.

– Jimin por favor, eu...

– É melhor partirmos agora, ainda preciso fazer uma reunião com o Conselho para discutirmos os próximos passos. Depois disso só quero ficar nos braços e me sentir como uma pessoa comum por algumas horas.

Surpresa, Minjeong prestou atenção no seu rosto. Tinha certeza de que era a primeira vez que ela falava algo assim.

Jimin a encarava com uma expressão que parecia de esperança. Apesar de contido, o sentimento ainda assim era visível.

Ela não podia matar esse olhar.

– Está bem. – Disse com um sorriso singelo.

A Princesa segurou sua mão e avançou pelo bosque, acompanhada da mulher que amava.

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