16
Jimin estava consciente da tensão no corpo de Minjeong, mas ela mesmo assim aceitou seu toque. A vampira tentou não se deixar distrair pelo calor e pela maciez de seu corpo, nem pelo deleite que sentiu ao se enroscar nela.
Nunca havia abraçado uma mulher daquela forma. Nunca havia pedido a uma mulher para lhe contar seus segredos ou compartilhar sua dor mais secreta.
Minjeong era diferente.
Ela fez força para se concentrar nas palavras dela sem se deixar distrair por seu cheiro.
– Não sou uma vítima. – Disse a musicista em voz baixa, mas firme. – Não estou lhe contando essa história para você sentir pena de mim. Não quero isso.
– Combinado – disse Jimin junto ao seu ouvido.
Minjeong balbuciou um palavrão, e ela quase se arrependeu de ter lhe pedido para contar a história.
Quase, mas não de todo.
– Tudo começou quando meu pai morreu. Eu tinha 11 anos e a nossa família morava em um bairro médio de Seul. Meu pai era professor de música. Um dia, teve um incêndio e ele tentou salvar o maior número de alunos possíveis. – Ela estremeceu. – Foi de repente, claro. Minha mãe ficou arrasada. Não tínhamos parentes próximos, então ficamos só ela e eu. Minha mãe não segurou as pontas sem meu pai. Nós íamos perder a casa. Não tínhamos dinheiro para comer. Então minha mãe arrumou emprego como recepcionista em um escritório de advocacia. Foi lá que ela o conheceu.
Minjeong teve um calafrio, e Jimin chegou mais perto, envolvendo seu corpo qual um escudo.
– Ele era de Busan e sócio do escritório. Gostou da minha mãe e a chamou para sair. Não ligou para o fato de ela ter uma filha. Na verdade, ele nos disse que adorava crianças. – Ela pronunciou essas palavras com desdém. – Os dois começaram a namorar. Ela logo engravidou, e eles resolveram se casar e que nós nos mudaríamos para a casa dele em um bairro nobre. No início, tudo correu bem. Mamãe estava feliz e grávida.
– E você, Minjeong? – Perguntou Jimin em voz baixa. – Você ficou feliz?
– Fiquei aliviada. Quando papai morreu, acabei tendo que fazer tudo: comprar comida, cozinhar e lembrar à minha mãe de pagar as contas. Depois do primeiro mês ou dois morando juntos, comecei a reparar em algumas coisas em relação ao meu padrasto. Ele mal falava comigo e, quando eu tentava conversar com ele, me dispensava. Uma noite, saí do meu quarto para ir a cozinha beber água e o vi sentado na sala. Me aproximei, mas ele parecia zangado e me dispensou. Tentei falar com minha mãe, mas ela não quis escutar. Estava toda feliz, preparando-se para o nascimento do bebê, e não quis ouvir o que eu tinha a dizer. Não queria admitir que seu novo marido na verdade me odiava.
– Ele tentou machucar você?
– Em mais de uma ocasião. Me batia sem motivo e convenceu minha mãe de que eu estava roubando dele. Os dois tentaram me trancar no quarto algumas vezes, mas aprendi a destrancar a fechadura com um grampo de cabelo.
Minjeong respirou fundo antes de se forçar a prosseguir.
– Não conseguia dormir à noite de tão apavorada que estava. Ia me deitar, mas punha o despertador para tocar depois que minha mãe fosse para a cama. Comecei a ter problemas na escola porque vivia pegando no sono. Os professores quiseram saber o que estava acontecendo em casa, mas meu padrasto disse que eu estava fugindo à noite para ficar com meus amigos. Uma noite, cometi o erro de sair do quarto. Ele estava no corredor e partiu para cima de mim dizendo que eu era um estorvo e não pertencia aquela família.
– Onde estava a sua mãe? – Interrompeu Jimin.
– Na cama. A porta do quarto dela estava fechada, mas sei que ela me ouviu. Sabia exatamente o que estava acontecendo, mas foi covarde demais para enfrentar meu padrasto.
Jimin sentiu os braços de Minjeong se contraírem quando ela cerrou os punhos.
– O que aconteceu depois?
– Ele me bateu. Eu nem senti, estava só tentando escapar. Comecei a engatinhar pelo chão na direção da escada, mas ele me agarrou. Eu chutava, gritava, e ele continuava a me bater enquanto me dizia para calar a boca. Minha mãe escolheu esse momento para abrir a porta do quarto e vir pelo corredor. Enquanto lutava com meu padrasto, eu gritava para ela pedindo ajuda. Como eu não calava a boca, ele me empurrou da escada.
O corpo de Jimin se retesou.
A musicista moveu a cabeça na sua direção.
– Está tudo bem?
– Não. – Pelo bem dela, Jimin tentou manter a voz calma. – E depois?
– Não me lembro. Na verdade, nem me lembro de ele me empurrar da escada. Só me lembro de lutar com ele, e depois me lembro de cair. Quando acordei, estava no hospital. Além de uma concussão na cabeça e um braço quebrado, os médicos disseram que eu havia sofrido uma fratura ocular. Uma assistente social veio falar comigo, e quando contei para ela o que tinha acontecido, eles me mandaram para morar com uma família de acolhida por um tempo.
Jimin a apertou de leve.
– O que é uma família de acolhida?
– É, ahn, quando uma criança está em perigo, às vezes o Estado intervém e a tira da própria família. A família de acolhida cuida dessa criança até ela poder ir para um lugar seguro.
– Então eles acreditaram em você.
– Eles acreditaram nos indícios: minha mãe recusava-se a falar sobre o que tinha acontecido. Eu estava no hospital, e meu padrasto na delegacia mentindo sem escrúpulos. Disse que tinha bebido e que era tudo um mal-entendido... que eu tinha tropeçado e caído. Minha mãe sabia. Ela sabia e não fez nada – sussurrou Minjeong. – Ela disse que eu estava mentindo porque sentia ciúmes da atenção do meu padrasto; que estava tentando estragar seu casamento. Ficou do lado dele.
Minjeong inspirou profundamente.
– Só uma vez, eu queria alguém para me defender. Quando me colocaram com a família de acolhida, essa hora já tinha passado.
Jimin levou a mão até o rosto dela e a fez deslizar logo abaixo do seus olhos.
– Isto foi uma consequência daquela noite?
Minjeong se retraiu, e Jimin sentiu um cheiro de sal. A musicista estava chorando.
Sem saber o que fazer, enterrou o rosto nos cabelos dela.
– Eu não devia ter saído do meu quarto aquela noite – lamentou-se Minjeong. – Talvez as coisas tivessem sido diferentes.
A vampira fez uma careta.
– Quantos anos você tinha?
– Doze.
Jimin se afastou para poder olhar para ela.
– Quantas meninas de 12 anos teriam coragem de enfrentar fisicamente um adulto? Muito poucas.
Minjeong enxugou os olhos.
– Então seu pai foi um dos motivos que fez com que você decidisse se tornar musicista?
– Sim. Queria provar a mim mesma que seria capaz de conquistar isso mesmo com a limitação visual. Queria manter a ligação que existia com meu pai.
Jimin aproximou os lábios de sua orelha.
– Eu não tenho dúvidas do quão talentosa você é, Minjeong. Ser qualificada para trabalhar no Teatro Nacional é a prova viva disso.
Ela a beijou de leve nos cabelos.
– E a sua visão? Não deu para tratar?
Minjeong tornou a se virar de lado.
– Eles tentaram, mas a lesão não sarou direito. Eu estava sob tutela do Estado na época. Acho que, se tivesse tido dinheiro para cirurgiões caros e várias operações, eles teriam dado um jeito. Mas a justiça tinha emitido uma medida cautelar de afastamento contra meu padrasto, e o dinheiro era todo dele. Minha mãe recebeu instruções para manter distância.
– E manteve?
– Sim. Quando tive alta do hospital, fui morar por vários meses com outra família. Meu padrasto foi indiciado, mas fez um acordo e recebeu uma pena atenuada. – Ela expirou bem alto. – Minha mãe perdeu o bebê, talvez por causa do estresse. Não sei. Depois de algum tempo, ela achou um apartamento e começou a trabalhar. Não tivemos mais contato desde então.
– O que aconteceu com seu padrasto? – Jimin cerrou o punho.
– Não sei. Teve problemas com a polícia porque tinha violado os termos da pena e a medida cautelar e foi preso. Não soube nada dele depois disso.
– Você vive atormentada?
– Todo santo dia.
– Proteger você era responsabilidade da sua mãe. E ela não fez isso. – Jimin aumentou a pressão em volta da cintura de Minjeong. Deu um profundo suspiro e quando falou foi com um tom permeado de arrependimento. – Eu não teria lhe pedido para falar sobre isso se soubesse.
– Eu culpo minha mãe, Jimin, acredite. Cortamos laços por causa disso.
– Tenho um poder considerável, Minjeong, e uma fortuna mais do que considerável. Posso usar as duas coisas para tentar consertar sua visão do ponto de vista médico, se for isso que você quiser. Se preferir usar alquimia, estou a disposição para o fazê-lo.
Ela se encolheu.
– Jimin, eu não sei...
– Pense um pouco – interrompeu a vampira. – Não precisa decidir hoje. Mas mais do que isso, vou lhe dar proteção.
– Proteção?
– Você disse que ninguém a defendeu. Eu vou defender. – O tom dela se fez sério. – A partir desse momento e por toda a minha existência eu irei proteger você.
Minjeong suspirou.
– Deve ser triste viver para sempre – falou, tocando a face dela. – Todo mundo de quem você já gostou morreu.
Jimin se deitou ao seu lado.
– Não amo ninguém desde que era humana.
– Nesse caso, sinto muito por você. O amor, mesmo o amor dos parentes e amigos, é uma luz que brilha na escuridão. Sem essa luz eu teria me matado.
Jimin franziu o cenho.
– Que conversa mórbida.
Minjeong sufocou uma risada.
– Que comentário engraçado, vindo de uma vampira.
Ela se encolheu, deitou de lado e enfiou as mãos debaixo do travesseiro. Em pouco tempo, sua respiração se regularizou e Jimin entendeu que ela estava dormindo.
A vampira precisava desesperadamente de algumas horas de meditação, só para clarear os pensamentos e conseguir relaxar. Mas tudo em que conseguia pensar era uma menina de 12 anos lutando com um adulto pela própria vida.
Podia vê-la, a menina de cabelos castanhos caída ao pé da escada, seu corpo contundido e desconjuntado.
Todo mundo de quem você já gostou morreu.
– Nem todo mundo – sussurrou ela, puxando-a contra o peito.
Embora não fosse conseguir meditar abraçada a Minjeong, Jimin se espantou ao descobrir que a posição a acalmava e relaxava. Fechou os olhos e descansou, permitindo que a mente ficasse à deriva como um barco a vela no mar.
Sentiu uma certa culpa pelo modo como a havia tratado: primeiro ao sugerir que ela trocasse a liberdade pela ajuda dela, depois ao extrair aquela dolorosa história em troca de nada.
Não está cansada? A voz melodiosa dela ecoava em seus ouvidos.
A verdade era que ela estava cansada, sim. Depois de séculos de existência, cansara-se da morte. Quando o antigo Príncipe havia permitido aos seus semelhantes matar sem limites, inclusive bebês e crianças, cansara-se da morte.
Havia superado o cansaço matando o Príncipe e assumindo o controle do principado. Acumulava riqueza e poder, permitia que seus apetites fossem alimentados e todas as suas atividades lhe proporcionavam uma certa satisfação.
Mas faltava-lhe esperança. Faltava-lhe paz. O único jeito de prosseguir era nunca, jamais pensar no futuro.
Minjeong, é claro, não podia saber que vampiros não viviam para sempre. Que a Ordem dos Caçadores os havia amaldiçoado com uma vida de apenas mil anos. Mesmo assim, levando em conta a sua idade, ela ainda tinha tempo, tempo de sobra.
Viveria mais do que ela.
Esse pensamento a queimou por dentro.
Ela a soltou com a maior delicadeza de que foi capaz, decidida a não acordá-la. Então foi até um dos quartos de hóspedes para tomar um banho e se vestir.
Seu considerável respeito por ela fora multiplicado por cem. Estava mais decidida do que nunca a torná-la sua.
Precisava apenas ser paciente, e isso ela sabia ser.
\[...]
– Bom dia. – Jimin encarou os belos olhos castanhos de Minjeong.
– Bom dia – respondeu ela, hesitante.
A vampira se inclinou para beijá-la.
– Dormiu bem? – perguntou, junto aos seus lábios.
Ela assentiu com a cabeça.
– Qual é o problema? – Jimin se sentou ao seu lado na cama.
– Não sei – confessou Minjeong, evitando encará-la.
– Você veio me procurar; nós chegamos a um acordo. Não vou fazer nada quanto ao seu passado e você está usando a minha proteção. – Ela indicou o colar em seu pescoço. – É um resumo adequado das atividades da noite?
Minjeong ergueu o colar na mão, e um leve sorriso se esboçou em seus lábios. Encarou os olhos de sua protetora.
– Quer dizer que você não vai se envolver?
– Decidi canalizar minhas energias em outras direções. – A boca dela se abriu em um sorriso provocante.
– E que direções seriam essas?
– Esta aqui.
Ela uniu seus lábios e dessa vez pôs a língua dentro da boca de Minjeong na mesma hora. A musicista retribuiu, segurando seu pescoço com a mão e puxando-a mais para perto.
Os lábios de Jimin insistiram, devoraram, provocaram.
Ela envolveu sua cintura com os dedos. Então os fez subir por dentro da blusa até os seios dela. Contornou a abertura antes de enfiar a mão por baixo do tecido e segurar com as mãos frias os seios cobertos pelo sutiã.
A musicista deu um pequeno gemido de satisfação, e ela começou a traçar círculos com os dedos, acariciando para lá e para cá.
Minjeong levou as mãos aos cabelos dela e pôs-se a torcer os fios. Inclinou a cabeça e explorou com determinação a boca dela, deliciando-se com a textura e o sabor.
Com um grunhido, Jimin mudou de posição à velocidade da luz. Puxou as cobertas de cima da parte inferior do corpo dela e posicionou o quadril entre suas pernas, arqueando-se por cima dela.
Desceu com a boca até seu pescoço, beijando e sugando a pele abaixo da orelha.
Minjeong gemeu, e ela baixou os lábios até seus seios, empurrando a blusa de lado e beijando a pele que saltava acima do sutiã.
– Jimin – sussurrou ela.
A vampira desceu a mão pela lateral de seu corpo, com um toque abrasador, e ergueu a perna dela para que envolvesse o seu quadril.
– Jimin – grunhiu a musicista.
Ela a encarou com os olhos iluminados e a linda boca entreaberta.
– Deixe eu lhe dar prazer – pediu, rouca, beijando-a com fúria.
– Não posso. – A voz dela saiu débil, e sua expressão denotava conflito. – O que aconteceu ontem à noite, o que contei a você... estou péssima.
Jimin ergueu uma das mãos até seu rosto; seu toque foi leve e tranquilizador.
– Venha para mim hoje à noite.
– Não prometo dormir com você.
– Por que não? – Ela tornou a beijá-la, dessa vez com delicadeza.
– Estou preocupada com meu coração.
Jimin arqueou uma das sobrancelhas na direção do espaço entre seus seios, e seus lábios se curvaram num meio-sorriso.
– Não esse coração. – Minjeong olhou para o lado. – Quando você se cansar de mim, vai doer.
A expressão dela ficou furiosa.
– Eu já dei alguma indicação de que isso é apenas um passa tempo?
– Não – sussurrou ela.
– O que mais quero neste momento é torná-la minha.
Minjeong a encarou depressa.
Um desejo cru transparecia nos olhos dela; sua pele parecia elétrica.
– Eu me conheço. – Ela tornou a desviar o olhar. – Conheço minhas falhas e meu destino. Fui feita para ficar sozinha.
– Não vejo como isso é possível, já que acredito que você foi feita para ficar comigo, nos meus braços, na minha vida.
Minjeong cravou nela os olhos castanhos.
– Jimin, transei com duas mulheres na minha vida. Nenhuma delas me fez sentir o que sinto quando estou nos seus braços. Se fizermos isso, vou me apegar a você.
Ela segurou seu pulso e empurrou para o lado.
– Você já está apegada a mim. – Começou a beijar seu pulso, puxando a pele para dentro da boca e sugando.
– Vampiros podem não ter sentimentos, mas humanos, sim. Você sabe disso.
Jimin parou o que estava fazendo.
– Não é correto dizer que vampiros são totalmente desprovidos de sentimento. Depende do vampiro.
– No seu caso?
– Falta-me apenas empatia, como à maioria dos vampiros. Exceto em relação a você.
A musicista levantou a mão e a pôs sobre o coração dela. Sentiu o que pensou serem seus batimentos cardíacos, mas foi uma sensação diferente. Eram mais fortes do que batimentos humanos, e uma pulsação era seguida por vários segundos de silêncio.
– Você tem coração.
– Assim me disseram.
– Não sabia que vampiros tinham corações funcionais.
– Precisamos que nosso sangue circule para manter o corpo funcionando. A vida está no sangue.
– Na outra noite, quando você me levou para casa, falou em esperança. Você tem esperança de quê, Jimin?
Ela franziu o cenho.
– Não ser condenada a uma eternidade de solidão vazia.
As palavras fizeram Minjeong se retrair.
– É isso que você vive?
– Não exatamente. – A expressão dela se tornou cautelosa. – De alguma forma, a solidão recua quando você está por perto.
– O meu alerta é esse – sussurrou Minjeong. – Meu coração faz parte do meu corpo.
Jimin tocou o espaço entre os seios dela.
– Tratarei você com cuidado, toda você.
Minjeong observou aquela mulher linda e perfeita curvada acima dela beijar seu pulso com total entrega e se espantou com as palavras que lhe saíram da boca.
– Irei ao seu encontro hoje à noite. Mas não prometo dormir com você.
Jimin abriu um sorriso vagaroso.
– Gosto de um desafio.
Ela a beijou mais uma vez, deu-lhe um abraço ardente de promessas e se afastou. Estendeu a mão para ajudá-la a sair da cama.
– Encontro você lá embaixo.
Minjeong se concentrou nas suas costas enquanto ela se afastava, e uma parte de si se perguntou por que havia resistido a ela.
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