05

Quando Minjeong entrou de volta no apartamento, seu coração batia em um ritmo furioso. Algo importante havia acontecido, tinha certeza, e estava com medo das consequências.

Um relâmpago resplandeceu no céu. Ela aproximou-se da porta de vidro da varanda e deslizou um pouco para trás, trancando-a. Caminhou até o pequeno corredor que dava acesso ao banheiro, depois de se despir, entrou debaixo do chuveiro e permitiu que um banho quente limpasse seus pensamentos conflitantes. A água quente desceu por sua pele, e ela recebeu com prazer os calafrios ao voltar a sair.

Vestiu seu pijama e estava prestes a ir dormir quando sentiu uma atmosfera estranha flutuar no ambiente. Algo exuberante e inquietante...

Encaminhou-se para a sala e estacou quando viu a figura sombria do outro lado da varanda. A porta deslizou para trás, ficando aberta por completo, apesar de que ela a tinha trancado.

E aquele atmosfera inquietante se fez mais evidente quando ela entrou em sua casa. Sentiu pânico, mas descobriu que não podia mover-se. Aquela desconhecida tinha uma presença surreal. Seu apartamento era pequeno, mas ela parecia reduzi-lo ao tamanho de uma caixa de sapatos. E o traje completamente negro contribuía para isso... O que estava fazendo?

Minjeong deveria estar saindo a toda pressa. Deveria estar tratando de chegar à outra porta, correndo com todas as suas forças. Mas estava como se hipnotizada, olhando-a.

A mulher a sua frente vestia um casaco de inverno, e suas longas pernas também estavam cobertas por jeans escuros. Usava botas, mas se movia com uma suavidade surpreendente. Minjeong ergueu o olhar para ver seu rosto. Ela tinha traços delicados e faces perfeitas. O cabelo, longo e escuro, cascateava pelos ombros e algumas mechas encobriam seus olhos. Estes eram marcantes, castanhos, intensos e completavam o visual de uma das mulheres mais lidas que a musicista já tinha visto.

Como se a aparência ameaçadora não fosse suficiente para fazê-la parecer uma assassina.

Pensou que certamente vinha para matá-la. Não sabia o que tinha feito para merecer aquele ataque, mas quando ela avançou em sua direção, Minjeong deu um grito e caiu de bunda no chão. Rastejou para trás em direção à única saída.

Viu a mulher passar depressa por ela, e suas mãos colidiram com os pés dela no caminho para a porta do apartamento.

– Se gritar de novo, vou silenciá-la. – Uma voz raivosa, suave como seda, ecoou pelos seus ouvidos.

– O que você quer? – Minjeong tentou manter a voz firme, mas não conseguiu.

– Que você responda a algumas perguntas. Sente-se aqui.

Minjeong observou ela puxar uma cadeira e indicar para que se sentasse.

Poderia tentar engatinhar até a mesinha de centro e pegar o celular, mas a chance de sucesso lhe pareceu remota. Ela provavelmente conseguiria agarrá-la.

Sentiu o coração acelerar.

– Como você subiu até o meu apartamento?

– Não me dê motivo para machucá-la. – Ela bateu com a cadeira no chão, como se quisesse dar ênfase ao que dizia.

Minjeong se sobressaltou.

Poderia gritar por socorro, mas a sua vizinha mais próxima provavelmente estaria dormindo. Em geral, o barulho do tráfego de carros na rua e arredores era tanto que ela nem sequer tinha certeza de que os seus gritos fossem ser ouvidos por mais alguém.

– Estou esperando – rosnou a intrusa. Ela era uma mulher jovem, mas seu coreano era claramente formal.

Minjeong se moveu devagar, tocou a cadeira com a mão hesitante e se levantou. Deslizou até o assento.

– Não tenho dinheiro.

– Uma pergunta melhor é se você tem algum bom-senso. – A mulher disse, postando-se atrás dela.

Ela se virou para acompanhar o som da sua voz.

– Quem é você? O que você quer?

– Quem faz as perguntas sou eu. Quem estava procurando quando ligou para a administração do Teatro Nacional?

Minjeong sentiu um peso na barriga. Talvez tivessem entrado em contato com ela, ou talvez tivessem hackeado sua ligação. De toda forma, quebraram o sigilo das suas informações pessoais já que ela sabia onde morava.

– Não abuse da minha paciência. – Seu tom se fez ameaçador. – Quem estava procurando?

A musicista hesitou, e a mulher aproximou o rosto até poucos centímetros do dela. Minjeong pôde sentir seu cheiro, um odor cítrico e de relva. Não era desagradável.

– Yu Jimin.

Se a intrusa reconheceu o nome ou ficou surpresa com ele, não deu qualquer sinal.

– Interessante. – O tom se tornou casual. – Ela é sua amiga?

– Não. Não a conheço.

– Então por que a estava procurando?

– Por nada.

A mulher pousou a mão em seu ombro.

– Essa não é uma resposta aceitável.

A mão flexionou de leve os dedos, e Minjeong cerrou os lábios para evitar um grito.

Um misto de antigas ansiedades e medos se agitaram em sua mente. Ela estava apavorada que a intrusa a matasse depois de ter conseguido a informação que buscava.

Os dedos tornaram a se flexionar.

– Eu, ahn, trabalho no Teatro Nacional e...

– Isso eu sei – interrompeu a intrusa.

– Sabe? – Indagou ela.

– Sei muitas coisas. Continue.

Minjeong se remexeu na cadeira e se perguntou por que, de repente, aquela voz lhe soava conhecida. Ela nunca tinha visto aquela mulher antes, disso tinha certeza. Mas em algum lugar nos recantos de sua memória sabia que já tinha escutado aquela voz antes. Não conseguia se lembrar quando.

– Hoje, no trabalho, ouvi dizer que essa Yu Jimin tinha ligação com o Teatro Nacional. Foi tudo o que escutei.

A mão largou seu ombro.

A mulher se inclinou por cima dela e aproximou o nariz do seu pescoço. O contato a fez se sobressaltar pois, assim como a mão, o nariz dela estava frio. A intrusa inspirou lenta e profundamente. Minjeong se afastou dela, desesperada para conter os batimentos acelerados do seu coração.

Ela grunhiu e deu um passo para trás como se tivesse sentido alguma coisa repulsiva.

– Sei quando você está mentindo. O que mais ouviu dizer?

– Ahn, que a Sra. Yu doou dinheiro para o Teatro para ser convidada para um evento especial uns dois anos atrás.

– Quem disse isso?

Quando ela não respondeu, sentiu um único dedo no pescoço, deslizando em direção à garganta.

Minjeong se contraiu.

– Alguém chamado Seokjin. Não vi com quem ele estava falando.

Ela aproximou os lábios do seu ouvido.

– Tente outra vez.

– Seokjin estava falando com o diretor Kim.

Isso fez a mulher se empertigar.

– Namjoon? Tem certeza?

– Tenho.

– Você falou com alguém sobre essa conversa? Com algum amigo ou familiar?

– Não.

A intrusa permaneceu em silêncio.

Minjeong esperou que ela fizesse alguma coisa. Mas ela não fez nada. Não se mexeu. Não suspirou. A musicista nem sequer conseguia ouvi-la respirar.

Remexeu-se e bateu com os pés no chão. Pensou se poderia usar a cadeira como arma, desferi-la na direção da cabeça dela e conseguir tempo suficiente para chegar até a porta. Sem dúvida a mulher seria mais veloz do que ela e, caso ela errasse, revidaria na mesma moeda. Ela bateu com os pés mais depressa, pensando se ousaria fazer
algum movimento.

Então a voz da intrusa soou junto ao seu ouvido.

– O que vou fazer com você? – Indagou ela baixinho.

– Me deixe ir embora. Já respondi às suas perguntas. Não sei de nada.

– Cometi um grave erro com você. E agora parece que estou fadada a pagar por ele. – O tom da mulher mudou e se fez baixo, pleno de resignação.

– Por favor, me deixe ir embora
– repetiu Minjeong. – Não vou causar nenhum problema.

– Infelizmente, não é o que você faz que constitui problema. O problema é o que você é.

A mulher suspirou e passou as mãos pelos cabelos.

– Você atraiu a atenção de um grupo bem mais perigoso do que imagina. Por enquanto, pelo menos, está segura. Quando eles perceberem quem você é, vão começar a caçá-la.

– Mas eu não fiz nada de errado, juro!

A intrusa deu uma risada sombria.

– Garanto que eles estão pouco se importando com esse detalhe. Não, o interesse deles por você vai ser algo pessoal.

Minjeong tensionou o corpo.

– Por quê?

– Quanto menos souber, melhor.

– Não entendo o que eles poderiam querer comigo. Não sou ninguém especial.

– É aí que você se engana. – A intrusa a segurou pelo pulso e puxou seu braço como se fosse um fruto no galho baixo de uma árvore. Levou dois dedos ao ponto de pulsação e apertou.

Minjeong foi dominada por uma súbita visão de estar imobilizada em uma cama de hospital, com um tubo intravenoso transferindo sangue para dentro do seu corpo. Só que o sangue que fluía pelos tubos era escuro.

Com um grito, levantou-se. Ergueu a cadeira da cozinha e a brandiu na direção da mulher antes de se virar para onde estava a porta. Só conseguiu dar dois passos antes de ela a segurar por trás.

Debateu-se aos chutes e gritos, mas os braços dela pareciam duas faixas de aço. Ela a puxou até deixá-la colada à frente de seu corpo, com os pés dependurados acima do chão.

– Silêncio! – sibilou.

O coração de Minjeong estava acelerado dentro do peito enquanto sua mente tentava freneticamente avaliar a difícil situação na qual se encontrava. Não era uma vítima fácil, nem mesmo permanecia parada em seus braços. Mesmo assim, ela a segurava acima do chão como se fosse uma boneca. E não parecia estar fazendo grande esforço.

– Vim aqui ajudar você – sussurrou ela. – E é assim que você me retribui?

– Você invadiu meu apartamento. Está me prendendo aqui contra a minha vontade! – Ela arranhou seus braços, mas as suas unhas tocaram o tecido grosso do casaco.

– Os outros a teriam matado, mas primeiro teriam brincado com você.

– Como sabe tanto sobre eles?

– Porque sou um deles.

Minjeong se imobilizou.

Sentiu o coração fazer uma pausa, e então começar a bater bem alto dentro do peito. Pensou se ela iria matá-la.

A intrusa soltou um palavrão e a colocou de modo brusco sobre outra cadeira, que então deslizou pelo piso até a parede.

Inclinando-se acima dela, falou com um sussurro ameaçador:

– Você pode acreditar em mim ou não, mas sou sua aliada. Agora fique sentada sem fazer barulho, caso contrário eu a deixo para eles. Entendeu?

Ela assentiu com a cabeça, tentando mais uma vez recuperar o fôlego.

– Ótimo.

Minjeong ficou em silêncio enquanto observava a intrusa começar a andar de um lado para outro na cozinha.

– Posso lhe dar dinheiro suficiente para sair de Seul, mas deve fazer isso no prazo de uma semana. Enquanto isso, estará segura neste apartamento, mas evite sair à noite.

Ela continuou sentada sem se mexer.

– Por quê?

– Em parte porque você é uma péssima detetive. E também porque os outros vão reparar em você. E você não quer chamar a atenção deles.

Minjeong voltou a ficar em silêncio, pois ir embora da cidade era a única coisa que ela não queria fazer.

Ouviu-a chacoalhar alguma coisa e dar alguns passos na sua direção.

– Posso ver que você é, no mínimo, teimosa.

A mulher colocou algo metálico e frio em volta do pescoço dela, e ali suspendeu alguma coisa pesada. A musicista ergueu a mão e tocou um crucifixo de metal que repousava entre seus seios.

– O que é isso?

– Uma relíquia. De agora em diante, você tem que usar isso sempre. Nunca tire.

– Pensei que estivesse segura contanto que saísse de Seul.

– Existem outros ao redor do mundo também.

Minjeong largou o crucifixo, e este bateu no seu peito.

– Como uma superstição boba vai poder me proteger da Máfia?

A intrusa deu um rosnado e agarrou o cordão.

– Humanos burros não merecem viver. Vou pegar meu presente de volta e não vou mais incomodá-la.

Em pânico, Minjeong fechou a mão por cima da dela.

– Não, por favor. Eu quero.

A mulher esticou mais o cordão até ela senti-lo puxar seu pescoço.

– Talvez, quando tiver tido tempo de refletir sobre a sua situação, você adote uma postura de gratidão.

– Obrigada – respondeu ela depressa.

– Esta relíquia oferece proteção contra aqueles capazes de matá-la. Ou coisa pior.

– E vai me proteger de você?

Ela desejou retirar o que tinha dito assim que as palavras saíram de sua boca. A intrusa largou o cordão.

– A relíquia não tem efeito sobre mim. É melhor não esquecer isso se ficar tentada a bancar a detetive outra vez – Seu tom se fez incisivo. – Você não me quer como sua inimiga.

Ela cerrou os dentes.

– Não vou fazer nada. Juro.

– Você tem uma semana. Ao final desse prazo, se ainda estiver aqui, vai ter que se explicar comigo.

Minjeong assentiu.

A intrusa tornou a grunhir, e a maior parte da sua raiva pareceu se abrandar.

– Vou me arrepender disso. Mas é tarde demais.

Minjeong ficou surpresa quando sentiu a mão dela segurar seu rosto. Seu toque era leve e surpreendentemente delicado. A mulher acompanhou a curva de sua bochecha com o polegar.

– Adeus, Minjeong.

Antes de ela poder reagir ao som de seu nome saído da boca dela, a intrusa já tinha se afastado. Seus passos ecoaram pelo apartamento, e ela abriu as portas da varanda.

Poucos segundos depois, estava sozinha.

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