JJ MAYBANK - OUTER BANKS (Parte 2)

O motor do barco rugia como uma fera indomada, cortando as águas com uma velocidade que fazia meu estômago revirar. O vento frio chicoteava meu rosto, e o cheiro salgado do mar se misturava com a adrenalina que pulsava nas minhas veias.

— Meu Deus, JJ! Você vai nos matar! — gritei, agarrando as bordas do barco com tanta força que meus dedos doíam. Meu coração estava prestes a saltar do peito, mas JJ parecia alheio ao meu pânico.

Ele apenas riu. Alto, despreocupado, com o cabelo bagunçado pelo vento e uma expressão de puro deleite estampada no rosto.

— Relaxa, você tá segura comigo! — respondeu sem sequer olhar para trás.

Segura? Com ele no controle, eu tinha certeza de que minha vida estava por um fio. Eu abri a boca para disparar alguma resposta sarcástica, mas antes que pudesse falar, JJ reduziu a velocidade. O barco diminuiu o ritmo, deslizando suavemente até parar em um vasto vazio de água. Não havia nada à nossa volta, apenas o reflexo do céu na superfície ondulante e o som distante das ondas quebrando ao longe.

— Chegamos. — Ele se virou para mim com aquele sorriso despreocupado e irritantemente charmoso que eu tanto conhecia.

Ainda tentando controlar minha respiração, soltei as bordas do barco e olhei ao redor, franzindo o cenho.

— No meio do nada? É sério isso? — perguntei, cruzando os braços.

— Exatamente no meio do nada. — Ele deu de ombros, levantando-se do banco do piloto com uma facilidade irritante. Em seguida, estendeu a mão para me ajudar a levantar, mas eu a ignorei, me pondo de pé sozinha, ainda tentando me equilibrar no barco que balançava levemente.

Meu pensamento voltou para o momento em que tudo isso começou. JJ tinha aparecido na minha casa naquela tarde para cortar a grama. O som da máquina ecoava no quintal quando ele me viu sentada no chão, com o rosto escondido nas mãos, tentando conter as lágrimas. Mais uma discussão com meu pai. Mais um confronto que terminava comigo me sentindo pequena, sufocada.

Ele desligou a máquina, jogou as luvas no chão e veio até mim. Não disse nada. Apenas me olhou, com aquela mistura de preocupação e determinação que ele sempre escondia por trás do jeito descontraído. Depois de alguns segundos de silêncio, falou:

— Vem comigo.

Algo no tom da voz dele me fez obedecer, mesmo sem entender o porquê. Antes que percebesse, estava neste barco, atravessando as águas e deixando tudo para trás.

Agora, no meio do nada, ele se sentou ao meu lado no banco de madeira, com os cotovelos apoiados nos joelhos e aquele ar despreocupado que fazia parecer que nada no mundo o abalava.

— Como você se sente? — perguntou, a voz tranquila contrastando com a energia caótica de minutos atrás.

Eu o encarei, tentando encontrar uma resposta. Pela primeira vez em horas, o silêncio ao redor não parecia opressor. O som das ondas, o cheiro de sal e a vastidão da água acalmaram algo dentro de mim. Respirei fundo antes de responder:

— Confusa, talvez? — admiti. — Irritada. Exausta. E ainda com medo de que você me mate com essas ideias malucas.

Ele riu, um som baixo e genuíno que, de alguma forma, parecia aquecer o momento.

— Tinha que ser algo extremo. Você estava tão tensa que parecia que ia explodir. Extravasou?

Eu pensei por um instante e, pela primeira vez no dia, senti meus ombros relaxarem.

— É... Talvez tenha funcionado. — As palavras saíram quase sem que eu percebesse.

JJ sorriu, satisfeito. Mas, claro, ele não sabia quando parar. De repente, levantou-se, tirou a camisa e a jogou de lado.

— Ótimo. — Ele se virou para mim, os olhos brilhando com aquela faísca de aventura que sempre me deixava apreensiva. — De zero a dez, o quanto você sabe nadar?

Meu queixo caiu.

— O quê? JJ, você tá brincando, né?

— Depende da sua resposta. — Ele já estava de pé, equilibrando-se com facilidade no barco que balouçava levemente.

— Ah, não. Nem pense nisso!

Ele deu um passo na minha direção, aquele sorriso travesso tomando conta de seu rosto.

— JJ, eu tô falando sério!

— Relaxa, você tá segura comigo. — Antes que eu pudesse protestar, ele me pegou no colo e se jogou do barco comigo, mergulhando na água.

— MAYBANK! — gritei assim que emergimos, o cabelo grudado no rosto e a água gelada me roubando o ar.

Mas, em menos de dez segundos, a tensão deu lugar a uma gargalhada inesperada, alta e sincera.

— Você é insuportável! — reclamei, mas o tom entregava minha diversão.

— Insuportavelmente charmoso, né? — JJ respondeu, nadando para mais perto, o sorriso arrogante em seu rosto fazendo meu coração tropeçar contra minha vontade.

Revirei os olhos, tentando manter a seriedade.

— Você tem noção de como é ridículo jogar essas cantadas baratas?

— Ridículo seria se você não risse delas. Mas você ri. Cem por cento das vezes. — Ele retrucou, o tom provocador e confiante de sempre.

Desviei o olhar, sentindo meu rosto aquecer. Decidi não dar mais corda e comecei a nadar de volta para o barco. Claro que ele me seguiu, como fazia sempre, insistente.

Quando subi no convés, me sentei no banco de madeira, torcendo os cabelos encharcados enquanto sentia as últimas gotas de água escorrerem pela pele. JJ subiu logo em seguida, sacudindo a cabeça como um cão molhado, espalhando água para todos os lados.

— JJ! — protestei, desviando dos respingos, mas ele apenas riu, como sempre.

— Relaxa, princesa. É só água. — Ele respondeu, sentando-se ao meu lado, próximo demais. O cheiro de sal e sol misturado ao dele era... perturbador de um jeito que eu não sabia explicar.

— Para de me chamar de princesa. — Resmunguei, tentando soar irritada.

— Mas você é. Só que das rabugentas. Tipo aquelas que brigam com todo mundo, mas no fundo só precisam de alguém pra roubar um beijo delas. — Ele disparou, seu sorriso torto e travesso deixando claro que a provocação era intencional.

Meu coração tropeçou, mas fiz o meu melhor para manter a compostura.

— Tá delirando agora? O sol fritou seu cérebro? — Retruquei, tentando esconder o desconforto.

JJ inclinou a cabeça de leve, analisando-me com aquela faísca de diversão nos olhos.

— Calma, [nome]. É brincadeira. — Ele disse, mas a suavidade no tom me fez questionar se era mesmo.

Antes que eu pudesse responder, ele se recostou no banco, lançando o olhar para o horizonte. O sol já começava a descer, tingindo o céu com tons de laranja e dourado, e o reflexo na água fazia tudo parecer surreal, como uma pintura viva.

— Você nunca para de falar, JJ. Algum momento de silêncio seria pedir muito? — provoquei, mais para mascarar o turbilhão interno que ele sempre parecia causar.

Ele me olhou de canto, sorrindo como se soubesse exatamente o que estava fazendo.

— Se quiser me calar, eu não protestarei. — Falou, lançando um sorriso de lado.

— Talvez um dia eu aproveite essa oferta. — Revirei os olhos, mas uma risada escapou, quebrando a tensão por um momento.

JJ virou-se para mim, inclinando-se ligeiramente. Seus olhos, brilhando com o reflexo do sol poente, pareciam hipnotizar os meus. O mundo ao redor parecia se dissolver, deixando apenas aquele instante.

— Você tem... alguma coisa aqui. — Ele apontou para o lado do meu rosto, franzindo a testa como se estivesse sério.

— O quê? — Instintivamente, levei a mão ao rosto, tentando limpar algo que nem sabia se existia. A leveza em seu tom não combinava com a intensidade de seu olhar.

— Espera, deixa que eu tiro. — JJ inclinou-se mais, sua mão pairando próxima à minha bochecha. Por um segundo, achei que ele fosse realmente remover alguma coisa. Meu coração acelerou, e eu tentei controlar a onda de antecipação que subia pelo meu peito. Mas, antes que eu pudesse reagir, ele se aproximou e roubou um beijo.

Foi breve, um toque suave que me deixou congelada no lugar. Meu corpo não sabia se recuava ou se se entregava àquela sensação inédita. Quando ele se afastou, sua expressão estava carregada de algo entre arrependimento e expectativa. Suas palavras saíram apressadas, como se tentasse dissipar a tensão que acabara de criar:

— Sempre que quiser me calar, é só... — Ele começou, mas antes que terminasse, minha mão já havia agarrado sua camisa, puxando-o de volta.

Dessa vez, o beijo foi mais longo, carregado de uma intensidade que eu nem sabia que existia em mim. Sua surpresa inicial deu lugar a uma entrega completa. Minha mão encontrou sua nuca, os dedos entrelaçando-se em seus cabelos úmidos pelo mar. O gosto de sal e sol em seus lábios parecia fazer parte do momento, deixando tudo ainda mais vivo, mais real.

O mundo desapareceu novamente, mas de uma forma diferente. Não era apenas ele e eu; era como se toda a energia do dia — o calor do sol, o aroma salgado do mar, o balanço suave do barco — conspirasse para nos manter ali, presos naquele instante. Sem perceber, meu corpo inclinou-se para trás, deitando-me parcialmente no banco, enquanto JJ não soltava o beijo, como se também estivesse se agarrando àquele momento único.

Finalmente, o fôlego nos obrigou a nos separar. JJ afastou-se apenas o suficiente para nos permitir respirar, mas seu rosto ainda estava próximo ao meu, seus olhos mergulhados nos meus, seu corpo em cima do meu.

Um sorriso leve curvou seus lábios, e sua voz saiu baixa, quase um sussurro:

— Ok... Primeira vez que eu aposto em algo e realmente funciona.

— E você devia ter pensado nisso antes de começar. — Respondi, minha voz também rouca, mas carregada de uma confiança que eu não sabia que tinha. Meu coração ainda batia em um ritmo frenético, e eu sabia que o dele também, pelo modo como sua respiração descompassada se misturava à minha.

Ele riu, baixinho, o som vibrando entre nós. Seus dedos deslizaram pela minha bochecha, um toque suave que fez minha pele formigar.

Agora você tá ferrada.

— Ferrada? — perguntei, arqueando uma sobrancelha.

— É. Porque eu não vou te deixar em paz depois disso.

Eu ri, meio sem graça, meio aliviada.

Eu acho que nunca vou conseguir tirar você da minha vida.

Saio dos meus pensamentos ao som da voz exaltada de Rafe. Ele andava de um lado para o outro no meu quarto como um leão enjaulado, cada passo ressoando sua frustração. Tentei ignorá-lo, enfiando o travesseiro no rosto e pressionando-o com força. Em outro universo, talvez isso fosse o suficiente para me sufocar e me devolver ao conforto dos meus sonhos. Mas sabia que não ia adiantar, então abandonei a ideia, retirando o travesseiro do rosto.

Ele estava há mais de 20 minutos reclamando sem parar. E contando.

— Esse imbecil ainda teve a audácia de roubar uma garrafa de vinho do seu pai, sabia?! — Rafe vociferou, claramente se referindo a JJ. Mordi o lábio, sabendo que, na verdade, eu tinha dado a garrafa. Ele descobrir isso só tornaria as coisas piores. — E, como se não bastasse, antes de ir embora ele olhou nos meus olhos e disse que você estava linda demais hoje pra estar com um imbecil como eu! — A veia em sua testa parecia prestes a explodir.

A festa do meu pai ainda não tinha acabado, mas depois de toda a confusão envolvendo a chave da despensa, ele decidiu que era melhor JJ ir embora mais cedo. Eu, por outro lado, vim direto para o meu quarto, buscando paz — até que Rafe invadiu com sua tempestade particular.

Enquanto ele despejava sua indignação, minha mente, traiçoeira, vagava até a despensa. Até o momento em que JJ me empurrou contra a prateleira, com aquele sorriso provocador, e seus lábios encontraram os meus. "Rafe nunca faria isso com você", ele murmurou, e eu sabia que estava certo. JJ sempre foi um louco, mas um louco com a coragem e paixão que Rafe jamais teve.

— Você devia ter visto a cara dele! — Rafe continuava, sua voz subindo uma oitava. Ele gesticulava como se quisesse socar o ar, e a cada palavra parecia mais indignado. — O JJ age como se fosse o dono do mundo! Eu sempre percebi o jeito que ele olhava pra você, mas nunca achei que teria a coragem de falar algo na minha frente!

Eu não disse nada. JJ realmente era maluco, e isso me divertia mais do que deveria.

— Você não vai dizer nada? — Rafe parou abruptamente, me encarando, esperando que eu alimentasse sua indignação.

— O que você quer que eu diga, Rafe? — perguntei, minha voz calma, quase apática. — Você está aqui reclamando de uma garrafa de vinho e de um comentário bobo. Não é como se o mundo tivesse acabado.

Ele me olhou como se eu tivesse acabado de proferir a maior heresia já dita.

— Um comentário bobo?! — Ele explodiu, os punhos cerrados ao lado do corpo. — Ele cantou a minha namorada, porra! Falou como se você não pertencesse a mim!

Meu coração deu um salto doloroso no peito. As palavras ecoaram no quarto como uma acusação disfarçada de desabafo.

— Eu devia ter imaginado que aquele idiota seria problema desde o momento em que começamos a namorar — ele completou, mais para si mesmo do que para mim.

Havia algo cruelmente revelador na forma como ele falava. Para Rafe, eu era uma posse, um troféu que ele precisava proteger da ameaça de JJ. E talvez fosse isso que me incomodava mais do que qualquer outro joguinho seu. Rafe era explosivo, egoísta e narcista.

Suspirei profundamente e fechei os olhos, pressionando os dedos contra a têmpora enquanto uma dor latejante começava a se formar. Não sabia se era resultado da gritaria de Rafe ou do vinho que bebi durante a festa. Talvez uma combinação dos dois.

— Não começa, Rafe — murmurei, tentando manter a calma, mesmo que minha paciência estivesse se esgotando. — Já faz mais de três anos. Namorei JJ por uns poucos meses antes de você. Ele provavelmente nem lembra mais disso.

Levantei o olhar lentamente, encarando-o. Seus olhos estavam fixos em mim, carregados de uma intensidade que eu conhecia bem — uma mistura de raiva e ciúmes que ele nunca conseguia controlar.

— Nem lembra mais? — Ele soltou uma risada seca, incrédula. — Você realmente acredita nisso? Acha que aquele imbecil não lembra de cada segundo que passou com você? Ele não só lembra como faz questão de me lembrar também. Toda vez que ele aparece, toda vez que ele abre a boca! — Ele apontou para a porta como se JJ estivesse parado ali, ouvindo tudo. — E agora ele passou dos limites, [nome]! Teve a cara de pau de me humilhar na frente de todo mundo!

— Humilhar você? — Interrompi, sem conseguir conter a irritação. — Tudo o que ele fez foi falar que eu estava linda! Não acha que está exagerando um pouco?

— Não, eu não acho! — Rafe retrucou, sua voz subindo ainda mais. — Isso foi um recado. Ele estava dizendo que eu não sou bom o suficiente pra você. E sabe o que é pior? — Ele deu um passo na minha direção, seu tom ficando mais sombrio. — Acho que você concorda com ele.

Fiquei imóvel por um momento, as palavras dele me atingindo como um golpe inesperado. Não era só ciúmes. Era insegurança, desespero. Ele não estava bravo porque JJ era provocador. Ele estava bravo porque, no fundo, temia que JJ estivesse certo.

— Você está me ouvindo, não está? — Ele insistiu, esperando que eu dissesse algo que pudesse aliviar sua paranoia.

Soltei o ar com força, levantando-me da cama.

— Ele está certo, você é um imbecil. — Falei calma, encarando ele sério.

Rafe ficou estático por um segundo, como se minhas palavras tivessem atingido um ponto mais profundo do que ele esperava. Sua expressão mudou rapidamente, passando da surpresa para a raiva, e então algo mais difícil de identificar — talvez mágoa.

— O quê? — Ele deu um passo para trás, quase como se precisasse de espaço para processar o que ouviu. — Você acha que eu sou um imbecil? Depois de tudo que eu faço por você?

Cruzei os braços, tentando manter a calma diante do tom explosivo que eu sabia que viria.

— Diga três coisas que você fez por mim, uma para cada ano que estamos juntos.

Rafe piscou, como se a pergunta tivesse sido um golpe baixo. Ele abriu a boca para responder, mas fechou novamente, parecendo procurar algo no ar.

— Eu... — Ele começou, a hesitação evidente. — Eu sempre estive aqui, sempre te defendi.

Levantei uma sobrancelha, impassível.

— Isso é uma coisa. Continue.

Ele balançou a cabeça, irritado, mas também perdido. Sua expressão se fechou, e percebi que ele estava se forçando a cavar algo mais.

— Eu... — Ele olhou para mim, quase suplicante. — Eu larguei aquela viagem com meus amigos pra passar seu aniversário com você no primeiro ano. Lembra disso? Eu perdi o fim de semana todo pra te fazer feliz.

Revirei os olhos, soltando um suspiro cansado.

— Ok, duas. Mais uma.

Rafe passou a mão pelo cabelo, claramente frustrado.

— Sexo bom? — Falou, quase se gabando.

Reviro os olhos, soltando uma pequena risada nasal.

— Só pode ser brincadeira...

— Isso é ridículo! Você quer me colocar numa prova agora? É isso? Como se o que eu sinto por você pudesse ser resumido em três exemplos idiotas!

— Não é sobre me provar nada, Rafe. — Minha voz saiu baixa, mas firme. — É sobre você perceber que está mais focado na porcaria do seu orgulho do que em mim! JJ fez em alguns meses bem mais do que você consegue listar depois de três anos comigo.

Rafe ficou estático por um momento, a mandíbula travada como se estivesse tentando conter algo que ameaçava transbordar. Quando finalmente se mexeu, foi para soltar uma risada curta e incrédula, balançando a cabeça lentamente.

— Você tá mesmo comparando três anos comigo com... ele? — A voz dele estava carregada de sarcasmo e dor misturados, como se fosse impossível acreditar no que acabara de ouvir. — É isso? JJ, o cara que só sabe se meter em confusão, conseguiu te dar algo que eu não dei? O que? O pau dele?

— Você sequer ouve as próprias merdas que você fala? — Pergunto brava. Eu estava cansada e irritada.

Rafe me encarou, como se minhas palavras tivessem vindo de outro mundo, algo tão distante que ele não conseguia sequer entender. Mas, ao invés de se acalmar, ele deu um passo em minha direção, como se estivesse pronto para continuar a discussão. Sua postura agressiva não diminuiu nem um pouco, e a frustração dele estava evidente, pulsando no ar ao nosso redor.

— Ah, claro, agora sou eu quem não ouve, né? — Ele respondeu, a voz tingida de escárnio. — Você me chama de imbecil, me diz que o JJ fez mais por você em alguns meses, e ainda quer me dar lição de moral? O que você espera, [nome]? Que eu aceite tudo isso como se fosse normal?

Eu senti um grande peso nos meus ombros. Eu realmente estava cansada. São três anos tendo as mesmas discussões. Não consigo evitar esfregar as mãos no rosto, controlando as minhas lágrimas. Eram lágrimas de exaustão, presas na garganta.

— Você realmente acha que eu te trato assim? — Ele sibilou, a voz carregada de algo entre a acusação e a dúvida. — Que eu não me importo com você? Não é isso que está acontecendo aqui, [nome]. Eu estou tentando salvar o que a gente tem. — Eu senti ele se aproximar mais calmo. Mas aquilo não era carinho, era manipulação.

Eu fiquei parada, os olhos fixos no chão, tentando controlar o turbilhão que se formava dentro de mim. As palavras de Rafe tinham esse jeito de afagar e, ao mesmo tempo, apertar, como se ele estivesse me fazendo acreditar que a culpa era minha por não entender o que ele estava tentando fazer. Mas eu sabia que não era assim. Eu já sabia o que ele estava fazendo, o que ele fazia. Ele sempre fazia isso.

— Você não está tentando salvar nada, Rafe — eu disse, com a voz embargada, tentando resistir à tentação de gritar. — Você só quer ter o controle. Sempre foi assim, e agora está me fazendo sentir que a culpa é minha por não aceitar tudo o que você faz.

Aquelas palavras me saíram com dificuldade, como se cada sílaba fosse uma batalha. Me sentia vazia, exausta, como se estivesse tentando lutar contra algo que não queria lutar. Mas, no fundo, eu sabia que precisava. Eu precisava dizer.

Ele fez uma pausa, como se tentasse processar o que eu disse. Sua expressão se suavizou por um segundo, mas logo ela se fechou novamente, como se o orgulho fosse mais forte do que qualquer vestígio de arrependimento ou compreensão.

— Você está sendo injusta, [nome]. — Ele quase sussurrou, como se aquilo fosse um segredo entre nós dois. — Eu estou aqui, todos os dias, tentando fazer você ver o quanto te amo, o quanto eu me importo. E você...

— Você não me ama, Rafe — eu disse, sem hesitar, e essa frase soou mais forte do que qualquer coisa que eu tivesse dito antes.

— O que você quer dizer com isso? — Ele perguntou, a voz mais baixa, mas o tom de ameaça ainda presente, como se qualquer outra palavra minha fosse a última.

— Quero dizer exatamente o que eu disse.

Rafe ficou em silêncio por um momento, seus olhos fixos em mim, buscando alguma explicação, algum sinal de que eu estava brincando, ou de que tudo aquilo não passava de uma conversa impensada. Mas eu sabia que ele não encontraria nada, porque eu estava falando sério. Cada palavra que saía da minha boca agora era a verdade, a verdade que eu já estava tentando esconder de mim mesma há tanto tempo.

— Você está brincando, né? — Ele disse, a voz agora mais tensa, o desespero começando a transparecer. — Não pode estar falando sério.

Eu balancei a cabeça lentamente, mantendo os olhos firmes nos dele.

— Não estou brincando. Eu não posso mais continuar acreditando no que você diz, nas promessas que você faz. — Levei a mão até o anel que estava em meu dedo e pude ver seu rosto se transformar em desespero — Eu não quero mais.

Rafe ficou imóvel, os olhos fixos no anel em meu dedo, como se isso fosse a confirmação de algo que ele temia, mas não queria aceitar. Sua expressão mudou, e o orgulho que costumava definir seus gestos se dissolveu, dando lugar a algo mais vulnerável, mais humano. Mas aquilo não era o suficiente. Não mais.

— Você... não pode estar dizendo isso. — A voz de Rafe falhou por um instante, um tom hesitante que não combinava com sua habitual confiança. Ele deu um passo na minha direção, mas seu corpo parecia carregado de uma insegurança nova, misturada à raiva que ainda borbulhava por trás de seus olhos.

Eu respirei fundo, sentindo a exaustão se acumular em cada fibra do meu corpo. Ele realmente achava que podia simplesmente ignorar o óbvio? Fingir que nada estava acontecendo? A raiva tomou conta, queimando mais forte do que a tristeza.

— Porra, Rafe! — Minha voz cortou o silêncio como uma lâmina. — Olha nos meus olhos e diz que você não tava flertando com a Sofia no começo da festa. Olha na porra dos meus olhos e me diz que você não me traiu com a sua ex nenhuma vez nesses três anos!

O silêncio dele foi ensurdecedor. Rafe congelou, como se minhas palavras tivessem acertado algo que ele tentava desesperadamente esconder. Seus olhos vacilaram, desviando dos meus, um movimento quase imperceptível, mas o suficiente para confirmar o que eu já sabia. Ele não precisava dizer nada. O silêncio dele dizia tudo.

— Foi o que eu pensei. — Minha voz saiu baixa, mas carregada com uma firmeza amarga. — Você não consegue nem olhar nos meus olhos, Rafe.

Ele balançou a cabeça, como se tentasse negar, mas sua expressão o traía. De repente, o orgulho ferido tomou o lugar da culpa.

— Eu te vi na cozinha com aquele idiota — ele rebateu, apontando o dedo como se estivesse tentando recuperar o controle. — Eu sei que você também me traiu. Não se faz de santa agora, [nome].

Aquilo me fez rir, uma risada seca e carregada de desprezo, porque era óbvio que ele estava tentando virar o jogo. Sempre era assim.

— A diferença, Rafe, é que antes eu ainda tinha alguma consideração por você. — Meu tom era firme, sem espaço para dúvida. — Mas hoje? Hoje eu vi você me trocando na minha própria casa pela sua ex. Você fez questão de mostrar quem você realmente é.

Ele abriu a boca para dizer algo, mas eu já não estava disposta a ouvir. Tirei o anel do dedo com calma, sem hesitar, e o estendi na direção dele.

— Você é um imbecil. — Minhas palavras saíram carregadas de uma amargura fria. Coloquei o anel na palma da mão dele e me afastei.

Rafe ficou parado, olhando para o anel como se ele fosse um peso que não conseguia carregar. Seus olhos voltaram para mim, cheios de arrependimento, mas não me afetou. Não dessa vez. Eu me virei e saí do quarto, incapaz de olhar para ele nenhum segundo a mais.

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