🪩 PEDRO (PIG)² - Especial Ano Novo

3000 Palavras

[Falta a fotinha do edit aqui]

As palavras de Pig ecoavam na minha mente como um refrão insistente. Não importava o que eu fizesse para me distrair: elas estavam lá quando voltei para casa naquela noite, pairaram sobre mim enquanto tentava dormir e me seguiram no dia seguinte, 31 de dezembro. Mesmo enquanto passava o rímel antes de sair para o churrasco da virada, elas ainda estavam lá, sussurrando no fundo da minha consciência.

Agora, na cozinha da casa do Maciel, com as mãos ensaboadas e um prato na mão, a sensação não tinha diminuído. Maciel, claro, estava debruçado sobre a bancada, com uma cerveja na mão, insistindo que eu largasse a louça.

— Lorena, você é a convidada. Não precisa fazer isso. — Ele repetiu pela terceira vez, mas eu apenas revirei os olhos, empilhando mais um prato limpo na bancada.

— E você é o anfitrião, então tecnicamente eu tô te ajudando. — Respondi, sem nem olhar para ele.

Ele resmungou algo sobre teimosia e voltou a beber, deixando-me sozinha com meus pensamentos.

A verdade era que Pig tinha mexido com algo em mim que eu preferia não encarar. "Você pode ser você mesma", ele tinha dito. Como se fosse uma escolha fácil, como se eu pudesse simplesmente decidir parar de tentar agradar todo mundo. Mas a verdade era que eu sempre vivi assim.

Desde que me entendia por gente, eu me moldava ao ambiente. Era a amiga compreensiva, a filha obediente, a colega prestativa. Sempre a pessoa mais fácil daquele momento. E isso funcionava... Ou pelo menos parecia funcionar.

— Tá pensando muito aí, hein. — A voz de Pig me tirou do transe. Ele estava parado na porta da cozinha, com uma expressão que parecia ao mesmo tempo despreocupada e curiosa.

Minha mão, que esfregava um copo na pia, hesitou por um momento antes de continuar.

— Só estou lavando os pratos. — Respondi, sem olhar diretamente para ele, tentando focar no copo em minhas mãos como se aquilo fosse a coisa mais interessante do mundo.

Pig arqueou uma sobrancelha, claramente não convencido, mas não insistiu. Ele deu alguns passos em direção à pia e se apoiou no balcão ao meu lado, pegando um pano de prato.

— Se eu fosse você, deixaria toda a louça pro Maciel limpar sozinho. Seria um castigo justo por ele ter enrolado tanto a Fernanda e ainda negar pra gente que tava com ela. — Disse, lembrando do momento mais cedo, quando Maciel finalmente admitiu que estava namorando, como se fosse uma revelação épica.

Uma risada pequena escapou dos meus lábios. Não porque a situação fosse incrivelmente engraçada, mas porque eu não queria responder. Então segui na minha missão de limpar toda louça que sujaram, antes mesmo da festa começar.

Ele começou a secar os copos que eu já havia lavado, o silêncio se acomodando entre nós por um instante.

— Achei que você ia deixar o Maciel fazer isso sozinho. — Comentei, tentando parecer casual.

— Você tá esquisita. — Ele finalmente disse, sem rodeios.

— Esquisita? — Rebati, levantando uma sobrancelha e tentando soar ofendida, mas a verdade é que ele tinha razão, e isso me incomodava.

— É. Meio distraída, meio... — Ele fez uma pausa, como se procurasse a palavra certa.

— Só tô cansada. — Murmurei, interrompendo-o, mas sabia que ele não acreditaria.

Eu queria que ele saísse. Não me sentia estranha perto dele, mas algo fazia com que eu me sentisse atraída, eu acho. A sensação era de que meu corpo, a qualquer momento, iria de encontro ao dele. Tenho certeza que foi pelo simples fato de ele ser o único a perceber a única coisa que eu escondia bem: minhas barreiras.

— Sei. — Ele respondeu, com aquele tom que indicava que sabia muito mais do que dizia.

Terminei de lavar o último prato e desliguei a torneira, secando as mãos na toalha pendurada ao lado da pia. Pig ainda estava ali, o pano de prato em mãos, mas os olhos presos em mim.

— Tá fugindo de alguma coisa? — Ele perguntou, sem rodeios, com a voz mais baixa, mas sem perder a firmeza.

— Não tô fugindo de nada. — Respondi, cruzando os braços, defensiva.

Pig soltou uma risada curta e balançou a cabeça, como se minha resposta só tivesse confirmado algo para ele.

— Você está fugindo. — Não era mais uma pergunta. Ele constatou, voltando a secar os copos.

— Já falei que não. — Respondi, tentando manter o tom firme enquanto cruzava os braços, mas a defensiva na minha postura entregava tudo. — Você não sabe nada sobre mim. — Falei, finalmente, a voz mais baixa do que pretendia, tentando soar dura, mas soando... cansada.

Pig não respondeu imediatamente. Ele colocou o pano de prato no balcão e apoiou as mãos nele, inclinando-se um pouco para frente, até que ficamos na mesma altura.

— Você tem razão. — Ele começou, os olhos fixos nos meus, sérios agora. — Não sei tudo sobre você. Mas sei o suficiente pra perceber que você tá sempre tentando se esconder, como se ninguém pudesse te alcançar. E por algum motivo isso me incomoda. Muito.

O tom na voz dele mudou, e algo sobre isso me deixou sem reação. Não era acusação, não era cobrança. Era quase como se ele estivesse frustrado por mim, e não comigo.

— Por que isso te incomodaria? — Perguntei, tentando soar indiferente, mas a pergunta saiu mais curiosa do que eu pretendia.

Pig segurou meu olhar por mais um momento antes de soltar um suspiro. Ele balançou a cabeça levemente, como se estivesse lutando contra algo, antes de responder.

— Porque você não precisa fazer isso. — Ele disse, finalmente. — Não precisa carregar isso sozinha, seja lá o que for.

Meu coração deu um salto no peito, mas me forcei a desviar o olhar, concentrando-me na toalha de prato esquecida no balcão.

— Eu não tô carregando nada. — Murmurei, quase mais para mim do que para ele.

Pig deu uma risada baixa, mas não havia humor nela.

— Você acha que engana bem, né? — Ele disse, cruzando os braços agora, espelhando minha postura. — Mas dá pra ver. Essa muralha que você construiu... Não é tão impenetrável quanto você pensa.

As palavras dele cortaram fundo, mais fundo do que eu esperava, e minha primeira reação foi me fechar ainda mais.

— Você tá exagerando. — Respondi, defensiva. — Não tem nada de errado comigo.

— Nunca disse que tem. — Ele retrucou, a voz calma, mas firme. — Só acho que seria bom você deixar alguém te alcançar de vez em quando.

Levantei o olhar para ele, surpresa pela seriedade em sua expressão. Não havia julgamento, só... preocupação. Sinceridade. E por algum motivo isso me irritava.

— Foi o Chico que mandou você falar comigo? — Falei meio irritada — O que ele te disse? Que eu tenho que ser menos solitária, crescer e parar de agir como uma adolescente emo? "Lorena, pelo amor de Deus você já tem quase trinta anos" — Imitei Chico falando, apenas engrossando a voz. Eu sei que estava sendo rude, mas ser vulnerável é uma merda e não quero que ele veja através de mim.

Pig ergueu uma sobrancelha, claramente surpreso pela minha explosão, mas não parecia abalado. Ele encostou no balcão, cruzando os braços e me encarando com aquele olhar calmo que só me irritava mais.

— Chico não me disse nada disso. — Ele respondeu, com a voz baixa e controlada, mas havia algo no tom dele, algo que me fez sentir pequena. — E, sinceramente, Lorena, acho que ele nem precisaria. Você já se critica o suficiente pra todo mundo.

Fiquei sem fala por um instante. As palavras dele me atingiram como um tapa, e eu sabia que ele estava certo, mas odiava o fato de que ele conseguia ver isso.

— Eu não me critico... — Comecei, mas minha voz vacilou e a frase morreu na garganta quando Pig inclinou a cabeça, me olhando com uma mistura de paciência e exasperação que só aumentava minha irritação.

— Não? Então por que você tá tentando me afastar agora? — Ele disparou, direto, sem rodeios. — Por que toda vez que alguém tenta se aproximar, você levanta essa muralha e finge que tá tudo bem sozinha?

Eu dei uma risada seca, cruzando os braços como se isso fosse me proteger das palavras dele. A única explicação plausível para aquela conversa era Chico. Claro que ele tinha falado com Pig. Ele sempre achava que sabia o que era melhor para mim.

— Tá bom, já entendi. Ele falou com você. — Falei com sarcasmo, balançando a cabeça. — Chico, né? Sempre ele. Não sei o que ele te contou, mas pode voltar e dizer que eu não vou aceitar o emprego, nem vou mudar de ideia.

Pig abriu a boca para responder, mas eu não deixei.

— Ele deve ter dito que eu sou teimosa, difícil, que eu nunca sei quando é hora de ceder. — Continuei, minha voz subindo um pouco. — Que eu "preciso ouvir mais os outros" e "parar de agir como se fosse a dona da verdade". Acertei? Ele sempre tem esses discursos prontos.

Pig começou a dizer algo, mas eu me adiantei mais uma vez, apontando para ele com o dedo.

— E, claro, agora ele te mandou aqui pra me dar uma lição de moral. Porque, sabe, "Pig tem jeito com as palavras", "Pig é mais paciente". Ótimo, tô impressionada. Mas, adivinha só, eu não tô interessada, ok? Então pode voltar lá e dizer que a operação "arrumar a vida da Lorena" fracassou.

Pig finalmente ergueu as mãos em um gesto de rendição, mas sua expressão era um misto de frustração e divertimento, como se ele estivesse tentando decidir se devia rir ou me sacudir.

— Lorena! — Ele falou, firme o suficiente para cortar minha avalanche de palavras.

Fiquei em silêncio por um momento, ofegante, percebendo tarde demais o quanto estava falando. Pig suspirou, passando uma mão pelo cabelo enquanto me olhava.

— Chico não falou nada comigo. — Ele disse, finalmente. — Isso aqui não tem nada a ver com ele. Sou eu, falando com você, porque eu me importo.

As palavras dele me acertaram como um balde de água fria. Minha raiva evaporou tão rápido quanto tinha surgido, deixando apenas um desconforto palpável. Desviei o olhar, mordendo o lábio, tentando processar o que ele tinha acabado de dizer.

— Você se importa? — Perguntei, quase num sussurro, sem conseguir encará-lo diretamente.

— É, Lorena. Eu me importo. — Pig respondeu, sua voz mais calma agora, mas ainda firme. — E não é porque alguém mandou, ou porque eu tenho alguma missão secreta pra te salvar de você mesma. Eu me importo porque vejo você se desgastando, se escondendo, se cobrando demais. E isso me incomoda.

As palavras dele pareciam ecoar na cozinha. O ar estava pesado, e eu sentia meu rosto quente, mas não sabia se era de vergonha ou algo mais.

— Por que você se importa? — Perguntei, ainda olhando para qualquer coisa que não fosse ele.

Pig deu uma risada curta, sem humor, e balançou a cabeça.

— Porque você é incrível, Lorena. Mas parece que você é a única que não consegue ver isso. — Ele respondeu, a sinceridade em sua voz me deixando sem palavras. — Eu estou convivendo com você há dias, desde o natal. Sempre vejo você fugindo de qualquer um que queira te ajudar e minha vontade de querer tirar esse peso de você só cresce a cada momento.

Eu fiquei em silêncio, as palavras dele pairando no ar, mais pesadas do que eu gostaria de admitir. Meu estômago apertava, a sensação de estar sendo vista de uma maneira tão íntima me incomodava de um jeito estranho. Não sabia o que responder, não conseguia processar tudo aquilo.

Pig suspirou, percebendo minha luta silenciosa. Ele deu um passo mais próximo de mim, como se quisesse diminuir a distância entre nós, mas sem pressionar. Sua presença parecia mais tranquila agora, mas ainda assim, havia algo em sua postura que me fazia sentir vulnerável.

— Você não precisa carregar o mundo nas costas sozinha. — Ele continuou, a voz mais suave, quase como se estivesse falando consigo mesmo. — Experimenta deixar alguém cuidar de você... — Ele se aproximou mais de mim — Me deixa tentar?

Aquelas palavras foram como uma lâmina afiada que cortou um pedaço da barreira que eu construí ao longo dos anos. Algo dentro de mim se apertou e eu senti as lágrimas ameaçarem sair. Pig levou a mão ao meu rosto e levantou, me fazendo olhar pra ele.

— Pode chorar... — Sua voz era como um sussurro bem vindo.

As palavras dele foram um convite silencioso para me entregar, para deixar que a vulnerabilidade tomasse conta de mim, algo que eu evitei por tanto tempo. Mas, ao invés de me afastar, como sempre fiz, eu fiquei ali, parada, sentindo o peso das emoções que finalmente pareciam encontrar uma brecha para sair.

Eu fechei os olhos, uma luta silenciosa dentro de mim. Mas não consegui impedir. As lágrimas começaram a cair, lentamente no começo, depois de forma mais intensa, como uma onda que finalmente se quebra na beira do mar.

Então ele me abraçou.

E ali, nos braços de Pig, parecia que eu não tinha mais como fugir. Ele me puxou para mais perto, como se soubesse que, naquele momento, eu não conseguiria me manter inteira por muito mais tempo.

Foi então que eu senti a necessidade de desabafar, de finalmente colocar para fora o que estava me corroendo por dentro, como um veneno lento e constante.

— Eu... — Minha voz saiu trêmula e rouca, interrompida pelas lágrimas, mas eu não consegui mais parar. — Meus pais... Eles... Sempre brigam, Pig. Não importa o que eu faça, não importa o quanto eu tente, eles não param de brigar. E eu fico aqui, no meio deles, tentando consertar as coisas, como se isso fosse meu trabalho, como se fosse minha culpa que as coisas estão assim.

Eu engoli em seco, o nó na minha garganta estava me sufocando. Nunca tinha falado sobre isso com ninguém, mas agora que estava começando, parecia que não conseguiria parar.

— E a pior parte é que eu não sou nem filha do meu pai, entende? Não sou filha dele de verdade, e mesmo assim, ele fica me dizendo que é porque ele me ama, que é porque me considera sua filha. Mas eu não sou! Eu sou só... uma peça quebrada. E eu fico aqui, tentando fazer eles pararem de brigar, tentando dar certo, mas nada muda. Eles continuam brigando e eu continuo aqui, achando que tudo é minha culpa.

Eu parei de falar, engolindo em seco, sentindo o peso da confissão que eu não sabia que estava carregando. Pig não disse nada, apenas me manteve perto de si, sua presença tranquilizadora, permitindo que eu continuasse sem pressa.

— Eu fico pensando que, no fundo, é por minha causa. Que se eu fosse diferente, se eu fosse mais... menos imperfeita, talvez eles não brigassem tanto. Talvez o divórcio deles não fosse culpa minha, mas no fundo, eu ainda tenho essa sensação de que, se eles se separarem, vai ser porque eu não consegui fazer as coisas direito. Porque eu não sou boa o suficiente, porque eu não consegui juntar tudo. Eu sou a razão disso tudo, e por mais que tentem me convencer de que não sou, eu ainda acho que é verdade. Eu sou a razão.

Eu olhei para ele, mas não consegui encará-lo de verdade. Eu me sentia tão pequena e fraca, exposta de uma forma que nunca imaginei que seria capaz de mostrar.

— E você... — Eu murmurei, ainda com a voz embargada, mas sentindo um aperto no peito que me fazia querer me afastar dele, mas, ao mesmo tempo, precisava dele ali. — Você consegue me ler tão bem, Pig, e isso me deixa tão puta! Como você sabe? Como você consegue ver através de mim, como se fosse fácil?

Eu queria que ele me dissesse algo, que me fizesse sentir melhor, mas ele não fez isso. E, de alguma forma, isso foi o que me fez me sentir mais aliviada.

Eu ainda estava chorando, e tudo o que eu queria era que esse peso desaparecesse, mas eu sabia que não iria desaparecer tão facilmente. Porém, ali, com ele, eu sentia que, pelo menos por um momento, eu poderia deixar de carregar esse fardo sozinha.

De repente, ouvimos passos se aproximando, mas eu estava tão imersa em minhas próprias emoções que não consegui olhar. Pig, no entanto, foi rápido em falar, antes que qualquer outra pessoa pudesse dizer algo.

— Tá tudo bem, a gente já vai. — Sua voz era suave, mas firme, e eu percebi que ele estava me protegendo da necessidade de me justificar para mais alguém. Ele não me pressionou a sair dali, nem me pediu desculpas por nada, apenas me manteve ali, onde eu estava segura.

Pig não me soltou, ainda me mantendo em seus braços enquanto o som dos passos se afastava. Eu sabia que alguém tinha se aproximado, mas não consegui me importar com isso. Eu só queria ficar ali, no silêncio da cozinha, longe de qualquer julgamento ou expectativa.

— Desculpa... — Eu murmurei, ainda sem olhar para ele, mas sentindo a necessidade de pedir desculpas. Eu não sabia se era pela vulnerabilidade que ele acabara de testemunhar, ou por toda a bagunça que eu era, mas as palavras escaparam de mim antes que eu pudesse controlar.

Ele se afastou ligeiramente, levantando o queixo para que eu o olhasse. Seus olhos estavam firmes, mas gentis, como se ele soubesse que ainda havia mais em mim, que havia camadas que eu não havia mostrado.

— Não precisa pedir desculpas. — Ele disse, a voz suave e tranquila. — Está melhor?

Eu respirei fundo, sentindo uma mistura de medo e uma necessidade repentina de não me afastar. Eu o abracei novamente, encostando a cabeça em seu peito. Por um momento, tudo ficou em silêncio, exceto pelo som de nossas respirações, que pareciam estar no mesmo ritmo.

— Não quero te deixar ir. — Eu murmurei, quase sem perceber, mas com um desejo que me surpreendeu.

Pig ficou em silêncio. Senti seu rosto encostando em meus cabelos, como se quisesse garantir que eu não me sentisse sozinha. Sua mão, que ainda estava ao meu lado, se estendeu mais, tocando minha mão com um toque tão leve quanto uma brisa.

— Eu não vou a lugar nenhum. — Ele respondeu, a voz agora mais suave.



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