∞ 8 - O ATAQUE

Avisos: violência mais descritiva. 

EM ALGUM MOMENTO AS BALAS HAVIAM ACABADO. Ativando a função de suas novas luvas na pulseira, Kensei desviou do segundo golpe destinado à sua cabeça e acertou seu oponente com um soco nas costelas.

Não fosse pelo fato de que Mashiro enfiara a arma sob o queixo do ninja que tentava acertá-lo pela esquerda, e disparara, teriam ouvido o som dos ossos se quebrando.

Kensei cuspiu no chão, vendo a cor rubra de seu sangue se misturando com o do cliente. Não se importou em limpar a boca com as costas da mão, mas podia jurar que o soco que tomara o deixara com ao menos um dente mole.

Atrás do balcão, Iba continuava a atirar e, de certa forma, oferecer a eles razoável cobertura. Quando as balas da Fechette Ingram acabaram, Mashiro alcançou a katana posicionada em suas costas e flexionou os dedos ao redor do tsuka esverdeado.

"Mas que merda, Tenente Kuna! Que tipo de gente você trouxe pro meu negócio dessa vez?"

A resposta veio num tom completamente irritado, "Eu não trouxe ninguém, seu otário." Ela voltou a se posicionar, ficando de costas para ele, e perguntou, num tom mais baixo, "Talvez você saiba me dizer quem são essas pessoas, Muguruma-san?"

Kensei não se dignou a responder — porque para ser bem sincero não sabia o que dizer. Era óbvio que aquelas pessoas estavam ali por conta dele — afinal, era ele quem estivera sendo seguido pelos últimos dias. Mas ao invés de perder tempo com uma conversa que só serviria para distrai-los, ele preferiu estalar os dedos e o pescoço, focando sua atenção no ninja que se aproximava pela esquerda. Dos seis que invadiram o cômodo, cinco jaziam no chão, desacordados ou mortos.

Outros quatro adentraram o cômodo, ostentando nodachi acinzentadas com uma linha avermelhada acompanhando o fio de corte.

"Cuidado com essas nodachi. Não importa o que aconteça, não deixe que ninguém te transpasse com uma dessas."

Kensei flexionou os ombros.

Não era como se estivesse em seus planos ser transpassado por algo ou alguém. No entanto — ainda que não soubesse precisar o motivo —, havia algo de sinistro na linha vermelha que percorria a nodachi de ponta a ponta.

Por um momento, Kensei sentiu falta de Tachikaze. Fosse na forma selada ou na costumeira forma de sua shikai, não podia negar que se sentia mais confortável segurando sua Zanpakutou.

Um segundo depois ele era engajado numa luta com dois ninjas. Um dos tiros de Iba passou zunindo por sua orelha, e por pouco ele não foi acertado. Com um chute desferido contra o plexo solar de um de seus oponentes, ele o colocou na linha do tiro. A bala o acertou na garganta, destruindo o cartucho cortical.

"Eu falei pra tomar cuidado com os cartuchos, seu idiota!"

Mashiro estava ofegante. Quando ele olhou para trás, ela deslizava por entre as pernas de um dos ninjas, rompendo o ligamento em seus tendões. Ele caiu no chão, de joelhos, exatamente diante de Kensei.

Após acertá-lo com um soco que o fez desmaiar, ele estendeu a mão para ela e a ajudou a se levantar.

Ainda restavam dois ninjas.

"Só pra constar, eu não fiz nada. Foi ele."

De trás do balcão, já sem forças para atirar, Iba pressionou a mão direita contra o ombro esquerdo e gritou, "Foda-se vocês dois. Eu vou cobrar por cada crédito que eu gastar nessa porra de reforma."

Mashiro deu de ombros.

"Ei, idiota, ele tá se referindo a você!"

O tom de voz dela, supreendentemente leve, o teria feito sorrir de canto, se no próximo segundo uma nodachi não fosse atirada contra os dois. Kensei usou o cotovelo esquerdo para golpear um dos ninjas, empurrando-o para trás, e com o braço direito a puxou contra si. Com a velocidade do movimento, ambos caíram no chão.

A nodachi passou pelos dois, atingindo o balcão. E, aparentemente, um corpo humano também.

Mashiro caiu por cima dele. Os dois se encararam por um momento, com os rostos extremamente próximos e suas respirações entrecortadas misturadas, mas não houve tempo para que nenhum deles analisasse a forma íntima como seus corpos estavam entrelaçados ou como seus corações dispararam — se pela proximidade ou pela adrenalina que corria em suas veias, ou ainda por um misto dos dois. Ela tentou se levantar, mas Kensei a impediu, pousando uma mão sobre a parte da coxa que a saia de cetim desnudara. Seus dedos ficaram manchados de sangue.

Ela olhou para baixo, para o corte horizontal que jazia embaixo do coldre que em que Tachikaze repousava. Sangue escorreu pelo comprimento da perna, ensopando o tecido verde e a camiseta que ele usava sob a jaqueta também.

Kensei pressionou os dedos sobre o corte, como se pudesse, daquela forma, estancar o sangramento. A ponta de seu polegar roçou contra sua Zanpakutou.

"Eu tô bem." Ela sacudiu a cabeça, dispensando o olhar conflituoso dele. "Isso não é nada."

Ainda havia dois ninjas de pé, um deles ferido na perna com um tiro que ela própria disparara minutos atrás. Não havia tempo para se preocupar com um corte tão pequeno em sua perna. Iba atirou contra um, acertando-o, sem muita precisão, na altura das costelas. Quando ela pressionou os lábios numa linha reta e inalou com força pelo nariz, ele removeu a Zanpakutou do coldre e a segurou entre os dedos...

...mas nada ocorreu.

A onda de reiatsu que deveria tê-lo dominado naquele momento, conferindo-lhe poder e ressonando com corpo não o atingiu.

Tachikaze jazia entre seus dedos, mas, como tudo nesse mundo, ela não tinha poder algum.

Mashiro o encarou com olhos semicerrados e pressionou a mão sobre a sua, movimentando seu braço na direção de um dos ninjas que se aproximavam.

A Zanpakutou — a faca, Tachikaze sem poderes não passava de uma faca — o atingiu na garganta, perfurando não apenas a coluna do pescoço e as cordas vocais, como também o cartucho cortical.

Kensei teria lançado um comentário mordaz, lembrando-a sobre manter a droga dos cartuchos intactos, se ela já não tivesse se inclinado para o lado e retirado a Zanpakutou da garganta do inimigo e começasse a se levantar.

Ele se inclinou sobre os cotovelos, prestes a se levantar também, quando ela foi forçada de volta contra seu corpo. Ele a estabilizou, colocando uma mão contra a coxa dela — só percebendo que pressionara o corte quando seus dedos ficaram umedecidos com o sangue novamente.

Um grunhido de dor escapou os lábios dela. Mas foi nítido que o som não tinha nenhuma relação com o fato de seus dedos pressionarem o corte. Kensei olhou para cima, apenas para encontrar o outro ninja atrás de Mashiro, puxando-a pelos cabelos esverdeados para trás e pressionando a lâmina da nodachi contra a garganta dela.

"Faça exatamente o que eu mandar, ou essa vadia morre."

O punho cerrado de Shuuhei atingiu a mesa holográfica com força, mas —felizmente para ele e pelo bem da dívida que assumira com seu novo apartamento — ele não a quebrara.

Urahara Kisuke acabara de ligar, a pedido de Mashiro — porque, aparentemente, ela estava ocupada na companhia daquele foragido — para informar sobre o desdobramento da situação do único cartucho intacto daquele maldito caso.

Infelizmente, apesar de sua genialidade, cirurgia psiquiátrica estava aquém dos talentos daquele cientista de chapéu listrado. O código Neo-C fora contornado com sucesso, mas o problema residia na debilidade psicológica causada pela virulência do crime.

Asano Keigo estava preso num loop de culpabilização e tudo que ele conseguia fazer era pedir desculpas por não ser capaz de proteger sua amiga, Honshō Chizuru.

Em nenhum momento ele pedira desculpas por não conseguir protegê-la de si mesmo. Até onde Urahara sabia — pelo que Mashiro e Shuuhei relataram —, ela fora estuprada por seus dois amigos, após fazerem uso da droga sinamorfesterona.

Urahara até tentara, mas havia limites até mesmo para alguém como ele. Seria necessário buscar ajuda externa e especializada.

No passado, ele também não conseguira ajudar Kuna Mashiro, que também ficara presa num loop psicológico que se deteriorava a cada dia. Na época, ele buscara ajuda da especialista Unohana Retsu, diretora geral do Hospital Psiquiátrico Rukongai.

Shuuhei soltou a caneta touch e correu as mãos pelo rosto. Suas articulações ainda jaziam esfoladas — cortesia de seu descontrole emocional naquela manhã.

Entendia muito bem que a culpa não era de Urahara, que ele sequer tinha obrigação de ajudá-los a contornar a lei — que se aquela história chegasse aos ouvidos do Comandante Geral ou ainda do público comum, seria um desastre. Para Mashiro e ele próprio e para aquele cientista com fama de preguiçoso; ainda assim, era frustrante saber que, caso quisessem resolver aquele caso — e ele queria resolver aquele caso mais do que ninguém —, teriam que buscar ajuda de uma quarta pessoa.

Havia um problema apenas.

A Doutora Unohana tinha uma reputação a manter.

Parecia-lhe improvável que ela fosse ajudá-los apenas porque conhecia Urahara Kisuke ou porque Mashiro fora sua paciente anos atrás.

"Hisagi-san?"

A voz de Urahara o fez suspirar.

Tinha se esquecido de que ele ainda estava na linha.

Shuuhei tirou as mãos do rosto e o encarou. A figura holográfica tremeu levemente, mas o olhar sério não deixava dúvidas de que o que viria a seguir seria um golpe doloroso. Seus próprios ombros estavam levemente abaixados, apenas explicitando o sentimento de derrota que o dominava.

"Eu sugiro procurar a ajuda da Doutora Unohana o quanto antes. A cada hora passada, as probabilidades de recuperar a consciência de Asano Keigo se tornam mais ínfimas."

Ele o encarou, incerto sobre que tipo de resposta a ocasião pedia, mas tão logo se decidiu por apenas balançar a cabeça positivamente e dizer que faria como recomendado, a tela presente na mesa holográfica piscou duas vezes e uma mensagem indicando um novo caso no Distrito 01 – Junrinan chamou sua atenção.

Do lado de fora de sua sala compartilhada com Mashiro, a confusão foi instaurada. Policiais da Nona Divisão disparavam — praticamente aos berros — que um grupo de ninjas atacaram a loja de armas no distrito central de Edo, provocando uma chacina. Aparentemente, de acordo com a denúncia, não havia sobreviventes.

Não demorou muito para que Shuuhei conectasse os pontos.

Loja de armas — Centro da cidade — Ninjas — Ataque — Foragido — Mashiro.

...Mashiro.

Pegou sua arma — uma Nemesis X, segunda série — e a jaqueta, antes de disparar para fora da Nona Divisão, sem se importar em trombar com o Vice-Comandante Geral Sasakibe, ou esperar por demais instruções. Lidaria com as consequências de suas ações depois.

A única coisa na qual conseguia pensar era que Mashiro decidira acompanhar Muguruma Kensei à loja de armas naquela manhã.

E que essa ajuda se tornara num banho de sangue sem sobreviventes.

...Mashiro.

Ele mal esperou fechar a porta do carro para ativar a sirene policial e iniciar a subida para a via aérea.

...Mashiro.

Se aquele foragido desgraçado tivesse colocado a vida dela em perigo, Shuuhei não responderia por suas ações.

O coração de Kensei parou por um momento.

Antes de começar a galopar com força total em seu peito, batendo com força contra suas costelas.

De sua posição — e por conta do rosto dela, levemente inclinado para trás — ele não conseguia ver a expressão de Mashiro, mas o filete de sangue que escorreu pela garganta alvíssima, até desaparecer sob o colar da camiseta preta, foi suficiente para que o Hollow dentro de si se rebelasse.

Seus olhos foram tomados pela cor enegrecida e sua respiração ficou mais pesada. Mas Kensei sabia que soltar as rédeas do monstro agora significaria condená-la à morte.

"Deixe-a ir." Seu tom de voz saiu baixo, rouco e tingido por uma sede de sangue que teriam feito o mais corajoso dos humanos se curvar.

O ninja a puxou pelos cabelos, forçando-a a ficar de pé. Sem muita escolha, ela o obedeceu com um grunhido de dor, mas a forma como Mashiro abriu as pernas levemente, como se pretendesse se desequilibrar e igualmente desequilibrar seu oponente, fez com que Kensei se preparasse.

De pé, ele a encarou por um segundo. O brilho de determinação nos olhos castanhos foi toda mensagem que ele precisava. Tão logo ela conseguisse o que planejava, ele deveria atacar.

Não havia chances para erros.

Mashiro estava arriscando a própria vida para lhe dar uma chance de destruir o oponente e ele não pretendia desperdiçá-la.

Não poderia desperdiçá-la.

Mas assim que ela deslizou o pé esquerdo mais um centímetro, o ninja percebeu suas intenções e a puxou pelo cabelo com mais força. Ela mordeu o lábio inferior para se impedir de grunhir, mas um grito foi arrancado de sua garganta quando um dos ninjas, que ambos acreditaram estar desmaiado, pressionou os dedos contra a ferida em sua coxa.

Não fosse pelo fato de ter a lâmina da nodachi pressionada contra sua garganta e ter os fios de cabelo firmemente presos no punho de seu oponente, Mashiro teria desabado no chão.

A fúria de Kensei era tamanha que ele não precisaria nem das luvas para saber qual ponto golpear. Se pudesse, quebraria todos os ossos presentes no corpo daquele desgraçado filho da puta. Flexionou a mão, tentando controlar o monstro dentro de si. Conseguia se vislumbrar arrancando aquele coração e o esmagando sob a ponta de seus dedos.

Mas tanto ele quanto o Hollow sabiam que não havia nada que pudesse fazer.

Tachikaze escorregou de seus dedos e caiu, tilintando, no chão.

Fosse a ocasião ligeiramente diferente, ele se arrependeria por tratar sua Zanpakutou de forma tão descuidada. Mas Kensei sabia que Tachikaze o compreenderia. Nada valia a vida e a segurança de Mashiro.

De seu lugar, ela sacudiu a cabeça, mas o movimento só fez com que a nodachi a cortasse mais ainda e o filete de sangue que escorria de sua garganta se alargasse.

Seu movimento fez com que os ninjas concordassem com leves movimentos de anuência. Um deles removeu os dedos da ferida presente da coxa de Mashiro, mas o outro não a soltou.

"O que vocês querem?"

Odiava se encontrar naquela situação. E mesmo que cada fibra em seu ser se rebelasse contra a condição que lhe fora imposta, o Hollow dentro dele silenciou.

Haveria um momento para desmembrá-lo. Quando Mashiro estivesse segura.

"O Primeiro Ministro Planetário—

Mas as palavras morreram em sua boca. Antes que pudesse terminar de falar, uma bala perfurava sua cabeça. Mashiro utilizou o momento para empurrar a nodachi para longe de sua garganta. Outro tiro — proveniente do balcão — acertou o ninja restante no peito, abrindo uma cavidade em sua caixa torácica.

Quando ela cambaleou para frente, sem forças — talvez pelo choque, talvez por esgotamento físico — para permanecer de pé, ele a segurou. Envolvendo um braço ao redor de sua cintura, Kensei pressionou os lábios numa linha reta ao observar a figura do antigo Tentente Omaeda adentrando a sala.

Não tinha certeza se ele mantinha a mesma personalidade de sua versão na Seireitei, mas o homem que conhecia era um ser intratável.

O sorriso que se delineou nos lábios grossos apenas confirmava suas suspeitas. Suas primeiras palavras, após chutar o corpo do antigo tenente Iba — que jazia estirado sobre o balcão após aquele último tiro — e se voltar para encará-los apenas ressignificaram sua aversão pelo homem.

"O que seria da Nona Divisão se não fosse a Segunda Divisão pra vir salvar vocês toda vez? Tsc. Tsc."

Arrogante de merda.

Kensei sequer tinha reparado que seus dedos se apertaram ao redor da cintura de Mashiro. Não fosse pelo fato de que sua respiração ficara mais pesada e ela tentara se afastar, ele não teria relaxado a mão.

Seus olhos se desviaram do tenente Omaeda e estacionaram na face da mulher em seus braços. O lábio inferior preso entre os dentes alvíssimos indicava mais um controle sobre seu temperamento do que uma tentativa de distração da dor.

"O que você veio fazer aqui, tenente Omaeda?" ela finalmente perguntou, enquanto tentava puxar a barra de sua camiseta ensanguentada para fora do cós da saia. Kensei a impediu, segurando suas mãos. Em seguida, ele a sentou sobre o balcão e retirou a jaqueta e a própria camiseta.

Se tivesse que rasgar algum tecido para fazer um curativo improvisado, que usasse suas roupas, não as dela. A última coisa da qual precisava era de um escroto como o tenente Omaeda — que ao que parecia, de acordo com o que ele próprio falara, pertencia à Segunda Divisão nessa realidade também — a olhar para Mashiro — ainda que ele soubesse que ela pouco se importava.

De costas para ele, Kensei rasgou o tecido de sua camiseta com um puxão e a amarrou em volta do corte horizontal na coxa. Seus olhos ficaram, a todo momento, treinados em sua expressão, mas fora o morder de lábios e o franzir de sobrancelha, ela não esboçou muita reação.

Ele tinha certa dificuldade para reconhecer a mulher com quem convivera por tantos séculos na mulher à sua frente. Na Seireitei de outrora, se algo do tipo lhe acontecesse, Mashiro choraria o resto da vida em sua orelha.

Mas talvez fosse só o fato de que estavam rodeados por pessoas em quem não confiava. Além do tenente Omaeda, o cômodo fora invadido por outros policiais. Um deles tirava fotos e outros isolavam o ambiente, colocando as típicas faixas holográficas do Departamento Policial.

"É assim que você agradece alguém que acabou de salvar sua vida?" Ele estalou a língua numa clara atitude de quem reprovava a pergunta que lhe fora feita. "Esperava mais humildade de alguém que não aderiu ao plano de reencapamento."

Kensei franziu as sobrancelhas.

Mas aquele não era o melhor lugar nem o momento para perguntar o que diabos as palavras de Omaeda significavam.

Mashiro afastou suas mãos com um cuidado atípico e desceu do balcão, ficando de pé. Quando ele se aproximou para ajudá-la, ela sacudiu a cabeça negativamente e se pôs a desamarrar o lenço que utilizava em torno do pescoço para amarrá-lo novamente sobre o corte.

A contragosto, ele fechou a mão em punho, mas deu um passo para o lado. Estava próximo o suficiente para ampará-la, caso fosse necessário.

"Você tem sorte de eu estar por perto, tenente Kuna." Omaeda cruzou os braços na altura do peito.

Kensei flexionou os dedos, controlando a vontade de socá-lo. O Hollow dentro de si rugia, clamando para ser solto.

"Engraçado que a Segunda Divisão em peso estivesse por perto no exato momento em que uma tentativa de assassinato ocorreu." Omaeda descruzou os braços diante de suas palavras. "Eu achei que morte real estava sob a jurisdição da Divisão de Dano Orgânico."

Suas palavras fizeram com que Mashiro se voltasse para encará-lo, uma expressão de surpresa em sua face. Ele podia não saber exatamente como tudo funcionava nessa realidade, mas ele conhecia a mulher ao seu lado como a palma de sua mão. E o fato de que ela detestava o tenente Omaeda dessa realidade era suficiente para ele.

Para qualquer estranho, ele soaria como um homem defendendo a honra de sua mulher, mas havia mais do que isso. Kensei era um líder. Como Capitão de uma Divisão, era seu dever tomar o lado de seus subordinados, mesmo que por vezes discordasse deles. Qualquer ataque a um oficial de sua Divisão era um ataque direto à sua figura. E antes de ser sua namorada, Mashiro era sua tenente — mesmo que por vezes seu desejo enquanto Capitão fosse sacudi-la até que ela percebesse a tolice de suas ações.

"E quem caralhos é você?" O homem de mais de dois metros se aproximou, inclinando-se sobre ele. Como se isso fosse suficiente para intimidá-lo. O Hollow ficou expectante. Tudo o que precisava era de uma desculpa para matar alguém. E o tenente Omaeda, para seu completo deleite, estava lhe fornecendo várias. "Um foragido que de repente virou especialista em jurisdição policial?"

Os dois homens se encararam intensamente. Apesar de sua estatura inferior, Kensei tinha plena noção de que suas habilidades eram incomparáveis. Só havia algo que sobrava no tenente da Segunda Divisão: sua arrogância. E Kensei adorava lidar com homens arrogantes que não sabiam seus lugares.

"Ei, chefe. Olha isso aqui."

O grito vindo do outro lado da sala fez com que Omaeda se afastasse a contragosto. Mashiro suspirou profundamente quando seu companheiro de trabalho se afastou e se voltou para encará-lo, com os olhos semicerrados.

"O que você acha que tá fazendo, Muguruma-san?"

Kensei a encarou, surpreso.

Ela se aproximou dele, batendo o dedo indicador em seu peito. O gesto fez com que ele desse um passo para trás enquanto ela avançava, com uma expressão de irritação em sua face manchada de sangue.

"Eu não preciso que você me defenda."

Outro toque em seu peito.

Mais um passo para trás.

"Eu posso me resolver com ele sozinha."

Outro toque.

Outro passo para trás.

As costas de Kensei se chocaram contra o balcão. Mas Mashiro pareceu não se importar com isso e invadiu seu espaço pessoal, continuando a bater em seu peito desnudo.

Por um momento, todos se voltaram para encarar a cena cômica da diminuta mulher que avançava, implacável, sobre o homem praticamente trinta centímetros mais alto do que ela e de proporções que fariam quase todos naquela sala se afastarem.

"Eu não preciso da sua ajuda."

Kensei pressionou os lábios numa linha reta. Entendia que talvez sua ação impensada refletisse porcamente sobre ela. No entanto, ainda que tudo fosse diferente nessa realidade, quando o Tenente Omaeda ofendera a Nona Divisão era como se tivesse lhe feito uma ofensa direta.

"Você me entendeu? Eu não preciso da sua ajuda! Não se atrev—

Antes que ela pudesse terminar de falar, ele segurou seu pulso. Seus olhos focados não nela ou em sua tentativa porca de intimidá-lo — era costumeiro de suas interações que ela o tratasse daquela forma, como se ele fosse seu subordinado e não o contrário —, mas no cartucho cortical que um dos policiais segurava entre as mãos.

"Outro cartucho Neo-C. Esses merdas tão se multiplicando aos montes!"

"Kensei, eu tô falando com você!"

Tanto o policial quanto ela falaram ao mesmo tempo. Uma careta de dor que dessa vez ela não conseguiu disfarçar contorceu sua face.

"Kensei!"

Ele sacudiu a cabeça e vestiu a jaqueta.

"Cala a boca, Mashiro." E antes que ela pudesse abrir a boca para responder, ele a levantou em seus braços. "A gente vai pro hospital agora."

Apesar de ter ativado as sirenes, Shuuhei não encontrou espaço livre na via aérea. O pouco humor que tinha foi se esvaindo completamente ao reparar que a Corporação para a qual trabalhava — para a qual dava seu sangue diariamente — era pouco ou nada respeitada numa cidade como Edo.

Por um momento, ele se arrependeu de não ter utilizado sua moto, mas rapidamente se livrou da ideia. A depender do estado de Mashiro, precisaria do carro para levá-la ao hospital e, dessa vez, ele não aceitaria nenhuma desculpa esfarrapada. Pagaria com seu próprio salário qualquer tratamento que ela precisasse.

Mas, primeiro, precisava chegar até ela. Era uma pena que o maldito trânsito não colaborasse.

Até alguns dias atrás, ele teria simplesmente se livrado do mau-humor de forma lógica: afinal era início da tarde de uma sexta-feira, considerando um próximo feriado prolongado na segunda-feira. Era normal que as pessoas tendessem a desrespeitar as regras sociais apenas para chegarem mais rápido em casa ou aonde quer que fossem.

E chegar ao centro — naturalmente um reduto histórico e boêmio na maior parte das cidades ao redor do planeta — seria, de fato, um pouco mais complicado.

Mas esse era o Shuuhei de poucos dias atrás. O Shuuhei que não via defeitos na Corporação Policial e que achava que Mashiro tinha raiva de seu Comandante Geral porque ele não lhe deixava dormir em horário de trabalho e exigia relatórios bem escritos.

Com o acúmulo de casos, a falta de respeito gritante reservada aos seus subordinados e aquela subserviência ao Primeiro Ministro Planetário, ao ponto de colocar um foragido — um assassino perigoso — para ter acesso a informações confidenciais, era difícil não ver que apesar de seu comportamento muitas vezes infantil, Mashiro estava certa.

Havia algo muito errado com a Polícia.

Não era o mesmo que dizer que policiais eram corruptos — havia muitos que, assim como ele e Mashiro, tentavam fazer valer a razão pela qual ainda existiam num mundo tão tecnológico em que muitas vezes sua ajuda se fazia desnecessária — mas a corporação em sua essência, certamente o era.

O Shuuhei de agora detestava o que a Corporação representava e não seria capaz de perdoá-la caso sua companheira fosse mais uma das vítimas de sua negligência e ganância.

Obviamente, o foragido — caso estivesse vivo — teria muito a responder, e ele faria questão de fazê-lo se arrepender de ter envolvido Mashiro em seus problemas. Mas ele sabia melhor do que ninguém que se o Comandante Geral não fosse um corrupto, eles nunca teriam sido forçados a se envolver com o novo... investigador particular do Primeiro Ministro Planetário.

Shuuhei olhou para o mar de carros diante dele e desligou a sirene. Poucas quadras o separavam da localização exata da chacina. Com os dedos firmemente pressionados sobre o volante, ele iniciou a descida da via aérea, decidindo percorrer o restante do caminho no solo.

Contudo, antes que pudesse se aproximar do chão, a figura holográfica do Comandante Geral chamou sua atenção. Com as janelas fechadas, Shuuhei não pode ouvir o que ele dizia, mas a julgar pelo tanto de pessoas se aproximando das janelas de arranha-céus, parando nas inúmeras passarelas que cortavam a cidade e mesmo aquelas que se aproximavam de terminais holográficos no solo, ele imaginou que aquela não fosse apenas mais uma gravação publicitária, mas um anúncio ao vivo.

Era complicadíssimo dirigir próximo do asfalto, sobretudo quando tanta gente se aglomerava num só lugar, ansiosas por ouvir um pronunciamento. Uma quadra antes de seu destino, ele preferiu abandonar o carro e percorrer o restante do caminho a pé.

Com a Nemex posicionada no coldre ao redor de seu quadril, Shuuhei abriu o porta-malas e encarou a arma que adquirira anos atrás, antes mesmo de adentrar a Corporação Policial, quando ainda era um estagiário em jornalismo. A Kusarigama, com duas foices, uma delas invertida, era conectada por uma corrente e apesar de não ser pesada e se encaixar em suas mãos como uma luva, olhar para ela muito tempo era quase macabro.

Era como se tivesse medo da arma branca, mas apesar do medo — talvez justamente por conta dele — Shuuhei tivesse se sentindo inclinado a comprá-la, há um bom par de anos, na mesma loja em que a chacina ocorrera.

Sacudiu a cabeça e fechou o porta-malas do carro, sem sequer tocar na Kusarigama. Estava ali por Mashiro, não para matar o foragido — embora a ideia tivesse passado por sua cabeça mais de uma vez.

"Você e o Aizen... Qual a história de vocês?"

Quando a cabeça de Mashiro recostou sobre seu ombro num gesto claramente involuntário e automático, Kensei quase se arrependeu de ter lhe dado ouvidos e desistido de ir ao Hospital.

Não que o argumento dela tivesse sido convincente — o poder de persuasão daquela marmota sem senso de moda raramente advinha de sua oratória —, mas ele estava cansado de brigar.

E ainda que nunca fosse admitir em voz alta — ou para si mesmo —, bater boca com Mashiro era um de seus passatempos favoritos. Ao menos, pensava, ninguém podia dizer que sua vida era entediante.

Mas quando ambos adentraram o autotaxi e ele informara como destino o Hospital mais próximo, ela o interrompera, dizendo o endereço de sua casa. Os serviços Urbiline novamente indicaram que aquela região era perigosa, mas nenhum dos dois lhe deram atenção, concentrados no rosto um do outro.

Para sua surpresa, o semblante que o encarava de volta parecia exausto.

"Eu não tenho plano de saúde," a voz que deu vida a essas palavras saiu completamente desprovida da costumeira energia que ele aprendera a associar a ela.

Kensei teria dito algo como ninguém pediu pra você pagar, mulher se a situação fosse outra. E se ela não tivesse lido seus pensamentos e emendado num tom cortante, ainda que sem a energia de sempre:

"E eu não aceito o dinheiro sujo do Aizen."

Por um momento, Kensei a encarou em silêncio, irritado com a falta de pragmatismo da mulher ao seu lado. No passado, Mashiro nunca se apegaria a esse tipo de moralismo barato.

Foda-se de quem era aquele dinheiro. Ele só queria que um médico a examinasse e lhe dissesse que estava tudo bem.

Ao menos, os curativos improvisados serviram para estancar o sangramento.

De todos os Vizards ela fora a única que embora não houvesse perdoado Aizen, nunca alimentara o rancor com a mesma intensidade. Faz mal pra pele, dizia ela, mais preocupada com a própria aparência do que em se vingar. Se um dia passara pela cabeça de Mashiro enfrentar Aizen na cidade falsa de Karakura para um acerto de contas, fora mais por lealdade ao grupo e a ele do que por vontade própria.

Se uma mudança tão radical lhe ocorrera nesses séculos, alguma justificativa plausível haveria de ter.

Kensei pressionou os lábios numa linha reta enquanto encarava seu perfil.

E uma onda de raiva o tomou. Raiva de si e daquele filho da puta do Aizen.

Antes de ser transpassado com o tiro de Omaeda, um dos ninjas havia começado a falar sobre o Primeiro Ministro Planetário, mas sua linha de pensamento nunca fora concluída.

Era óbvio que aquele ataque violento ocorrera porque alguém queria mandar uma mensagem.

Através dele e através de Mashiro.

Kensei se perguntava se seu interesse que a Tenente Kuna — como gostava de chamá-la — o acompanhasse não passava de uma armação para se livrar dela.

O mero pensamento fez com que seu sangue fervesse. O monstro dentro de si rugiu, mas ele apertou as rédeas. Deixaria para usá-lo depois, quando fosse acertar as contas com aquele desgraçado.

Se Aizen tivera a intenção de ferir Mashiro, Kensei não responderia por si.

Mas antes, havia algo que ele queria saber.

"Você e o Aizen... Qual a história de vocês?"

Não houve resposta. A cabeça de Mashiro pendeu sobre seu ombro, indicando que ela adormecera.

Com um suspiro cansado, ele viu o carro descer da via aérea e o holograma quebrado das duas mulheres seminuas ficar mais nítido.

Haviam chegado.

Kensei correu um dedo sobre uma mecha esverdeada e a afastou da face serena e completamente relaxada. Quando Mashiro piscou, ele se afastou, mantendo seu rosto distante do dela.

A última coisa que precisava era de ouvir naquele tom ensurdecedor — e mais uma vez naquele dia — que era um idiota pervertido.

"Huh? Já chegamos?"

Ele concordou com a cabeça e abriu a porta do autotaxi, estendendo a mão direita para ajudá-la a desembarcar. Dessa vez, ela aceitou sua ajuda sem discussão, mas se inclinou levemente para fora de seu alcance quando ele sugeriu carregá-la nos braços.

Então, ele apenas a apoiou pela cintura, respeitando, a contragosto, aquela decisão burra de não ir ao hospital.

O mesmo senhor da última vez estava sentado atrás de um balcão, dormindo. Mais adiante no hall, o elevador jazia parado, com uma faixa holográfica em que se lia:

ELEVADOR EM MANUTENÇÃO. FAVOR UTILIZAR AS ESCADAS.

Ele a encarou com os olhos semicerrados. Mashiro deu de ombros e dessa vez não se opôs quando ele a colocou sobre suas costas. As mãos e pernas dela rapidamente se entrelaçaram ao redor de seus ombros e cintura.

Kensei encaixou os dois abraços sob os joelhos dela, tomando cuidado para não tocar o corte em sua coxa, e olhou para o primeiro lance de escada. Quarenta e cinco andares o separavam de seu destino.

Suspirou.

Como detestava Mashiro.

E se detestava mais ainda por — mesmo após tantos séculos — continuar a lhe dar ouvidos.

Ver o carro de Mashiro estacionado diante da loja de armas fez com que o coração de Shuuhei quase parasse por um segundo e ele acreditasse que o pior tivesse acontecido. Ver as viaturas policiais com o número da Segunda Divisão o encheu de raiva — o que a divisão de Narcóticos fazia numa cena que claramente deveria ser conduzida pela Nona Divisão?

Mas ver que nenhum dos corpos conduzidos em macas para fora da loja era o de sua companheira o fez respirar, aliviado.

Sem sacar a arma, mas se posicionando de forma a ficar fácil sacá-la, caso fosse necessário, Shuuhei adentrou a loja, observando atentamente todos os corpos estirados no chão em busca de Mashiro. Um deles pertencia ao homem que lhe vendera sua Kusarigama anos atrás.

Uma nodachi atravessava seu estômago, mas estava claro que o ferimento por si só não seria suficiente para matá-lo — considerando que alguém como ele, dono daquele estabelecimento tinha dinheiro suficiente para pagar tanto por uma nova capa quanto por uma estadia de alguns dias num tanque preenchido com gel flutuante. Estreitou os olhos ao perceber que uma gosma azulada e preta saía por sua boca e nariz.

Tocou o cabo da nodachi e a puxou do corpo inerte. O oficial ao seu lado lhe lançou um olhar enviesado, mas Shuuhei o ignorou. Trouxe-a para a altura de seus olhos e com os dedos da mão esquerda percorreu a linha vermelha, com minúsculos caracteres intricados, que acompanhava o fio de corte.

Lembrava-se de ter aprendido naquela mesma loja sobre o código de arma biológica. Qualquer aço revestido com aquela linha e códigos era praticamente inofensivo em caso de corte, mas ao penetrar um corpo com sangue produzia compostos de cianureto. A dose de envenenamento em si não era exatamente letal para o corpo humano, mas derretia o cartucho cortical de quem por ela fosse atingido.

Merda.

Aquele homem era sua melhor chance de esclarecer aquele caso, pois ele sabia que o depoimento de Mashiro enquanto policial poderia muito bem ser ignorado se assim o Comandante Geral desejasse.

Entregou a nodachi para o oficial ao seu lado e observou o tenente Omaeda. De costas, ele apertava um cartucho entre os dedos e falava sobre destruí-lo antes que a maldita Nona Divisão pudesse chegar na cena. Com os olhos semicerrados, Shuuhei se aproximou pela lateral do homem ligeiramente mais alto e tomou o cartucho de sua mão.

"Vou ficar com isso aqui, tenente Omaeda."

Os oficiais da Segunda Divisão, que se dividiam entre tirar foto e remover cartuchos danificados, os encararam em absoluto silêncio.

Shuuhei encarou seu colega de trabalho com os braços cruzados na altura do peito e uma raiva porcamente contida.

"Veio atrás da sua namoradinha?" Os lábios de Omaeda se inclinaram num sorriso. Ele sabia se tratar de uma provocação barata. Já se tornara um clichê que as pessoas chamassem Mashiro de sua namorada no diminutivo, numa clara intenção de diminui-la enquanto policial não apenas por seu gênero, mas por seu comportamento de não aceitar ser subserviente a quem quer que fosse. Mas Shuuhei não sabia se ficara mais irritado pela forma de diminuir o laço entre eles e de diminui-la num geral, ou se pelas próximas palavras que deixaram a boca do homem à sua frente: "Ela já se mandou com o foragido."

Havia dois sentimentos, igualmente intensos e conflitantes a dominá-lo naquele momento. O alívio — afinal, se ela havia ido embora na companhia daquele homem era porque não estava em estado grave — e a frustração — justamente porque ela partira e não lhe dera nenhum aviso.

Mas havia ainda a preocupação.

As informações concernentes a esse caso que haviam chegado até ele eram bastante preocupantes. Era improvável que ninguém tivesse sido ferido.

Antes que pudesse se controlar — ou justamente porque não se preocupava com autocontrole; que se dane a opinião do tenente Omaeda e dos oficiais da Segunda Divisão, afinal todos eles já acreditavam que eles eram um casal de qualquer forma —, Shuuhei se viu perguntando, "Como ela está? Bem? Ferida?"

Omaeda atirou a cabeça para trás e uma gargalhada zombeteira lhe escapou. Sacudindo a mão em desdém, ele respondeu: "Vai sobreviver". E com os olhos semicerrados, como se estivesse extremamente atento às feições do homem à sua frente, acrescentou como se não tivesse intenção de provocá-lo, "Pensando bem, aquele foragido disse algo como levá-la pro hospital."

Quando Shuuhei não esboçou nenhuma reação verbal, ele chutou um dos oficiais que acessava o terminal de informações da loja ao seu lado, fazendo com que ele prontamente concordasse.

Ciente de que se respondesse, estaria caindo no joguinho psicológico do tenente da Segunda Divisão — mais do que isso, estava ciente de que não tinha inteligência emocional o suficiente para responder sem demonstrar o quanto aquela situação toda o irritava —, ele preferiu se aproximar do oficial que concordara a contragosto.

Saber que Mashiro estava viva e não precisava de um hospital — aquele foragido só conseguiria tal feito caso ela estivesse desmaiada — era o suficiente para ele. Lidaria com suas emoções depois. Agora, precisava trabalhar.

De braços cruzados, ele ativou seu ONI para copiar a gravação holográfica daquela manhã. Sua expressão era uma mescla de atenção e frustração ao ver sua companheira puxar o foragido pelo pulso. Expressão essa que só se agravou quando os ninjas invadiram a sala em que ela se encontrava na companhia dos dois homens.

Não fosse pela reação rápida de Mashiro e pela perfeita sincronia de seus movimentos com o foragido, os três estariam mortos. A forma natural como os dois se moviam, coordenando defesa e ataque, não era muito diferente da maneira como eles — companheiros de longa data — costumavam se comportar numa luta.

Tal percepção o incomodou mais do que deveria ser normal.

Continuou a assistir à gravação em silêncio — grato por ter chegado naquele momento, antes que o tenente Omaeda pudesse pensar em alterar os arquivos; tal ação definitivamente não estava abaixo dele —, sentindo que seu coração disparou quando Mashiro fora ferida.

O emaranhado de corpos quando o foragido a salvara de ser transpassada pela nodachi o incomodou menos do que ver um dos ninjas puxando seus cabelos verdes para trás e pressionando a lâmina contra sua garganta.

Engoliu em seco, sentindo raiva daquele homem.

Além de colocá-la em perigo, ele não fora capaz de salvá-la. E não fosse pela raiva e pela frustração que borbulhavam dentro de si, Shuuhei teria visto que havia algo errado com os olhos daquele tal de Muguruma Kensei.

Não fosse pelo dono da loja, Mashiro provavelmente estaria morta. Não fosse pelo tenente Omaeda — que agora mostrava todos os dentes numa espécie de sorriso contorcido e arrogante —, teriam ao menos mais um cartucho para esclarecer o caso.

Estava prestes a questioná-lo, quando a imagem do foragido colocando sua companheira sobre o balcão capturou sua atenção. Ciente de que era observado por todos os oficiais da Segunda Divisão, flexionou os dedos, tentando controlar o caldeirão de emoções que borbulhavam dentro de si.

"Volta."

As costas do Oficial se retesaram, mas diante da mão posicionada firmemente sobre seu ombro, ele fez como comandado, ainda que a contragosto.

"Acelera." Seus olhos acinzentados se estreitaram. A mão direita se fechou num punho dessa vez. "Para."

A cena que o encarava de volta foi como um tapa na cara de Shuuhei. Não fosse por estar cercado de pessoas em quem ele não confiava — e ele agradecia pelo Tenente Omaeda estar focado em outra coisa — teria tocado a própria bochecha esquerda.

Diante dele, a figura holográfica mostrava o foragido sem camisa e o número 69 tatuado em seu abdômen.

Shuuhei sacudiu a cabeça e deu dois passos para trás.

Quem diabos era aquele homem e por que os dois tinham a mesma tatuagem?

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