Capítulo 2 - Meu Ed Sheeran
"And you making me feel
That maybe I am somebody"
As palavras emitidas pelo rádio me fizeram espreitar para o homem sentado no carro ao meu lado. Ele estava ainda mais lindo naquela noite, em um smoking azul claro que combinava na perfeição com seus olhos hipnotizantes. Ele poderia ser meu Ed Sheeran (vamos ignorar os cabelos ruivos, que são um mero pormenor, na verdade, aí sou eu quem estou mais próxima do cantor pop).
"Será que ele sabe cantar bem? A voz grave dele deve ficar linda em uma canção! Talvez ainda ganhe uma serenata!". Deixei o entusiasmo tomar conta de mim enquanto a música continuava a preencher os espaços vazios entre mim e o meu príncipe.
"You can take me anywhere
And you make me feel like
I'm loved by somebody"
Olho para a estrada à nossa frente e me pergunto se o restaurante ficará longe.
Santiago fez questão de me ir buscar a casa como um verdadeiro gentlemen. Abriu a porta do carro para mim e tudo! Ao vê-lo plantando, direito e engomado, à porta do meu prédio com um Porsche atrás, que ainda que negro, não se conseguia fundir à escuridão da noite, eu vi o retrato do meu futuro tão sonhado e ambicionado.
− Estamos quase? – perguntei ansiosa.
Não gostava de surpresas. Não estar eu nas rédeas da situação me deixava desconfortável. Mas eu sabia como essas histórias de Edward e Bella funcionavam. O homem surpreende a mulher a todo o tempo com gestos românticos. Esse é um dos pilares de um romance clichê, por isso eu tinha de alinhar. Só rezava para que ele não me levasse para sua casa cheia de vampiros sedentos por meu sangue. Aliás, que não me levasse para sua casa, ponto. Toda a gente sabe que isso não é muito auspicioso para um primeiro encontro. Mas não envolver vampiros de todo, já estava de bom tamanho.
− Mais dois minutos e chegamos – assegurou-me, desviando os olhos da estrada para mim, por uns meros segundos. O sorriso que me lançou denunciava-o. Aquele homem estava caidinho por mim!
Decidi que tinha que me aproximar dele antes de sairmos do carro, ganhar um certo à vontade para descontrair o ambiente e nos deixar no clima de romance. E nada melhor do que a técnica de Twilight, já que era o romance que tinha tão presente na memória no momento.
Estremeci de frio exageradamente, quando até estava com um certo calor. Levei as mãos a envolver os meus braços desnudos, desprotegidos pelo vestido simples de alças. E já era audível o tremer de meus lábios.
− O ar condicionado está a incomodar-te? – Bang! Mordeu a isca, como eu sabia que faria.
Acenei brevemente com a cabeça em afirmativo, com ele a olhar-me de lado e, provavelmente, a questionar-se se eu teria algum problema de metabolismo, já que o carro marcava 21º Celsius. Ou até se estaria engripada em pleno mês de junho, com o Verão mesmo à porta. Ter um médico como príncipe não dava muito jeito nestas alturas, mas enfim, decidi continuar com meu plano.
Quando ele estendeu a mão para subir a temperatura do ar condicionado, eu me precipitei na mesma direção e nossas mãos chocaram uma na outra. Não foi tão romântico quanto imaginei que seria, mas já deu para sentir a pele dele novamente, e estava valendo.
− Quer ser você a regular? – Ele me olhava jocoso, sem conseguir evitar dar risada. "Agora eu era piada?"
− Não, deixa – respondi de supetão, recolhendo minha mão à sua simples insignificância. Era suposto ele ter-me olhado com desejo! Me olhado como se fosse a única mulher à face da terra, não como se fosse um palhaço!
Ele lá subiu a temperatura, deixando o ar dentro do carro a ponto de ferver. O que valia era que estávamos quase a chegar, senão o interior do carro se transformaria muito facilmente numa sauna. E eu ainda estava de vestido curto, mas Santiago estava vestido dos pés à cabeça, com um smoking!
"Porque é que eu não disse que estava com calor ao invés do frio romântico dos filmes clichês?" Ao menos que ele transferisse o calor que estava a sentir por causa do ar condicionado à minha pessoa. Que houvesse um processo psicológico qualquer inconsciente que o fizesse se sentir a arder por mim. "Porque é que eu não segui os conselhos de minha mãe para estudar psicologia?" Segundo ela, um curso que não garantindo futuro profissional, nos leva a um grande crescimento. Algo que eu sempre questionei, até porque, por mais que estudasse, sempre fui pequena. E a prova foi quando tive Psicologia no Secundário. Não me fez crescer nem um milímetro!
O carro parou junto a um belo edifício moderno, junto ao mar. As luzes que emanavam das paredes exteriores em toda a volta do restaurante, davam um brilho incontestável de dinheiro. Se eu tinha dúvidas que Santiago era rico, elas se dissiparam na hora. "Aposto que se tivesse de ser eu a pagar a conta, gastaria todo o meu simples e precioso salário". A preocupação começou a crescer-me no peito com o pensamento aterrorizador. Mas depois lembrei-me de que ele era um príncipe e que essa hipótese era totalmente descabida.
Um homem de fato escuro de qualidade contestável aproximou-se do carro e agarrou-se ao puxador da minha porta.
− É carjacking – gritei em pânico, fazendo força na porta no sentido contrário ao investido pelo homem suspeito.
As poucas horas de ginásio por semana, tiveram efeito, e o homem, do outro lado da janela fechada do carro, franziu as sobrancelhas grossas e contorceu o rosto num esgar de força.
− Não, ele é... − Santiago tentou falar, mas foi interrompido pelo som da porta a abrir-se e a me levar junto com ela.
Meus joelhos rasparam no chão de pedra e meu corpo todo foi jogado para a frente. Impulsionada pela força do homem, eu me senti voar (e não foi no bom sentido da palavra). Minhas mãos estavam a milímetros dos sapatos demasiado usados do imbecil e minha vontade foi esmigalhá-los apenas com as minhas mãos. Mas já estava mais do que comprovado que a minha força deixava um pouco a desejar.
− Flora, ele é apenas o arrumador de carros do restaurante – explicou Santiago entre risos.
Reuni todo o orgulho que me restava, que já não era muito depois de ter acabado com a cara quase espetada no chão, e me levantei lentamente, como uma lady, tentando manter a postura.
O homem era alto e tive de erguer bastante o rosto para o olhar nos olhos escuros como a noite. Juro que minha vontade era me desculpar, mas depois de ver a presunção colada no rosto dele, cerrei a boca de má vontade.
− O que a senhorita pensava que eu era? – O meio sorriso do sacana e a insinuação das suas palavras me revolveram as entranhas. Eu queria matar o idiota!
− Foi apenas um mal-entendido – disse Santiago se metendo na minha retaguarda. Ele passou seu braço sobre meus ombros desnudos e me puxou para junto dele. Eu sabia que ele me estava a proteger, e me senti vitoriosa por isso. Ter um homem nos defendendo fazia parte de um bom clichê.
Santiago esticou a mão e largou as chaves do carro, deixando a gravidade atuar. A palma do imbecil se fechou com as chaves em sua guarda. O cara nos contornou com o sorriso presunçoso ainda colado na face e, sem dirigir mais nem uma única palavra, se meteu no nosso carro (está, ele não era meu, mas era como se fosse) e zarpou estrada fora.
− Você não está preocupado por deixar o carro nas mãos de alguém como ele?
− Ele trabalha para o restaurante. Eu conheço este sítio há anos. É de confiança.
Eu nem sabia que havia restaurantes em Portugal com este tipo de serviço. A minha cabeça estava totalmente atordoada. Quando pedi para viver um romance clichê, nunca pensei que me iam enfiar em um filme americano com restaurantes chiques e arrumadores de carros grosseiros.
− Além do mais, o carro está ligado ao meu celular por GPS e eu até chaves suplentes tenho, para a eventualidade remota de o rapaz as perder. – Ele chacoalhou as chaves à minha frente. – Agora podemos ir para dentro? Pensava que você estava com frio.
Ri constrangida à insinuação de Santiago. Ele não era parvo nenhum! Mas isso só fazia com que ele somasse mais pontos na minha consideração. Sem hesitar, deixei-me conduzir por meu sábio Deus Grego.
Deixo abaixo, a música citada no capítulo. Até ao próximo capítulo!
https://youtu.be/y83x7MgzWOA
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