02 - Elvis, ame-me com ternura
Eu sou derretida pelo Elvis desde que me entendo por gente. Ai, meu coraçãozinho sofre.
Boa leitura! ♥
Louis poderia socar alguma coisa. Não, ele poderia socar alguém, quebrar o nariz da pessoa e sair andando sem nenhum resquício de culpa, porque aquele dia estava sendo um verdadeiro inferno. Sua cabeça doía como se alguém pinçasse suas têmporas com algo bem afiado, e as manchas desfocadas em sua visão atrapalhavam o seu trabalho para finalizar aquela tela. Louis precisava terminá-la porque, aparentemente, Jace preferia pressionar o prazo de entrega com a galeria do que deixá-lo fazer seu trabalho em paz e com tempo o bastante para não se estressar.
Uma parte de Louis queria apagar de sua mente que o motivo daquilo tudo era ciúme, como se Jace não tivesse arrastado para sua cama todo tipo de pessoa imaginável enquanto os dois estavam juntos. A outra parte queria usar isso como desculpa para que Jace fosse a pessoa de quem ele quebraria o nariz com um soco.
Além do mais, Louis realmente sentia falta da sua antiga companheira de andar e de seu sotaque eslovaco carregado, Mika Bosko.
Quando soube que quem passaria a ocupar o apartamento da senhora Bosko era o mesmo cara com quem tivera uma boa sessão de amassos na outra semana, Louis pensou que estaria tudo bem. É só alguém bonito com amigos bonitos. Não tem como ser ruim, não é? Bom, ele com certeza pagou com a língua depois do terceiro dia convivendo com Harry Styles como vizinho.
Geralmente, dois outros homens — um deles era o mesmo irlandês com queixo bonito que praticamente precisara forçar Harry a se apresentar — iam para lá quase sempre, e nos primeiros dias, os três apenas conversavam alto. Não era algo que incomodasse, Louis mal conseguia entender o que falavam e as paredes não eram tão finas. Mas, quando os primeiros acordes de uma bateria e outros instrumentos soaram, algo deixou claro que as coisas não seriam tão fáceis quanto antes.
Nenhum dos outros moradores do Blue Swallow parecia incomodado, por mais que a rotina quieta e antes impecável daquela vizinhança tivesse sido arruinada. Porque, honestamente, aquela situação não passava de uma tragédia na visão de Louis: suas manhãs não ficavam mais tão pacíficas até as dez como antes e, durante a tarde, o único momento em que Louis não ouvia nada além do canto dos pássaros era quando ele saía de casa para ir ao parque, para passear e brincar com Ozzy e Cuppa.
Mas, com certeza, as noites eram os seus piores pesadelos. Quando as conversas e risadas não eram altas como se um grupo de adolescentes universitários tivesse se mudado ao lado, a música era tão alta que os moradores do andar de baixo também conseguiam ouvir. E ninguém reclama, Louis bufou mentalmente. Isso parecia loucura para ele, principalmente depois de ele ter descoberto, em uma das reuniões dos moradores à qual Harry não tinha se dado o trabalho de comparecer, que eles gostavam da mudança de ambiente causada pelo recém-chegado e seus amigos barulhentos.
Gostavam. Da. Barulheira!
Para preservar a boa relação com todos os residentes, Louis colocou o melhor sorriso falso que tinha em seu estoque e forçou as palavras "ah, que maravilha! É bastante agradável, mesmo, tê-los no apartamento ao lado do meu". Judith Randolph, uma mulher escocesa de quase sessenta anos e viúva de três maridos e insuportavelmente carismática, dissera achar ótima a energia jovem que Harry e seus amigos traziam ao prédio.
Reprimindo a vontade de chacoalhá-la pelos ombros e perguntar como aquilo poderia ser ótimo, Louis abrira ainda mais seu sorriso para Judith.
Agora, fazia algum tempo desde que o andar parecia ter voltado aos velhos tempos, silencioso e em paz. Horas mais cedo, o barulho da porta ao lado sendo trancada e o apito suave do elevador tinha anunciado que Harry e os outros dois tinham saído para algum lugar. Seria melhor passar aquele tempo sozinho, ou com Zayn e Najla, mas é claro que Deus não daria tudo de mão beijada para Louis.
— Só estou dizendo que não entendo sua fissura por pinturas nudistas. — Jace resmungou, cruzando os braços rente ao peito como um garoto mimado.
— É porque eu sou um tarado infeliz, não te contaram? — Louis repuxou os lábios com escárnio.
As risadas contidas de Zayn e Najla soaram atrás de si, mas os dois voltaram a fingir que prestavam atenção nas fotos do último ensaio.
— Isso não tem graça. — Jace bufou, começando a se alterar. A falação alta não ajudou em nada a dor de cabeça de Louis. — Aqueles dois poderiam ter feito alguma coisa com você e...
— E eu teria amado! — Louis berrou, ao mesmo tempo em que a campainha tocava. — Inferno.
Ele largou os pincéis dentro de um pote com amolecedor de tinta e se esforçou para limpar as mãos imundas de verde e laranja. Zayn resmungou para Najla que fariam uma pausa também, e pegou um pouco de chá para todos. Louis não se importou de ter sujado a xícara, seria mais fácil de limpá-la do que sua própria pele. Ao abrir a porta, ele quis gritar.
Os olhos verdes de Harry transpareciam a energia que uma pessoa da idade dele normalmente teria e isso serviu de combustível para a vontade de Louis de socar alguém.
— Hum, olá.
— Oi. — Louis respondeu, sorrindo. Teve a certeza de que tinha parecido um animal irritado quando o irlandês ao lado de Harry arqueou as sobrancelhas.
— Louis, quem são esses? — Jace indagou, surgindo atrás de si.
— Harry, o novo vizinho. E os amigos dele, Neil...
— Niall. — O loiro corrigiu, sorrindo sem se sentir ofendido.
— Niall. — Louis concordou. — E eu não conheço você. — Apontou com o queixo para o homem com uma pinta no pescoço.
Antes que qualquer um dos três pudesse falar algo, Zayn e Najla chegaram e cumprimentaram eles com carisma, compensando toda a antipatia de Louis. Jace ficou quieto enquanto isso, e então disse:
— Ah, entendi. — Ele estendeu a mão para Harry, encarando-o de uma forma estranha. — Eu sou Jace Davis, namorado de Louis.
Aquele foi o suficiente para Louis mandar tudo à merda.
— Não fode, porra. — Ele esbravejou, afastando a mão de Jace da frente de Harry antes que se cumprimentassem. — Você é meu assessor, nada mais que isso.
O pintor teve a breve impressão de ver Harry segurar o riso, mas a raiva o fez pensar que não era nada demais.
— Com licença. — Najla disse, suavemente. Ela segurou o braço de Jace e começou a levá-lo para dentro do apartamento, deixando os quatro a sós.
Vou levá-la para jantar em algum lugar caro, mais tarde, Zayn pensou. Niall seguiu Najla com o olhar até que ela sumisse no apartamento, sentindo seu coração bater um pouco mais rápido.
— Foi mal por vir aqui desse jeito. — Harry enfiou as mãos no bolso. Tinha sido uma evolução lenta até que ele conseguisse falar com Louis sem gaguejar, e alguns tiques de nervosismo ainda apareciam. — Eu quero te apresentar a um amigo que te admira muito.
— Meu nome é Liam Payne. — Falou o desconhecido, e Louis só então reconheceu ser o homem que Zayn havia arranjado no pub de Najla. — É muito bom te conhecer, eu sou seu maior fã!
Foi um pouco estranho escutar aquilo. Ouvir que gostavam do seu trabalho era mais do que comum, mas alguém dizer com todas as letras que era seu fã? Realmente existia uma primeira vez para tudo. De toda forma, Louis apertou a mão de Liam sentindo-se um pouco mais calmo, até mesmo conseguindo sorrir de verdade.
— É bom ouvir isso, cara. — Respondeu, nem um pouco constrangido. — Venha às exposições, quando possível.
— Eu nunca perco as datas! — Liam riu, torcendo os dedos. — É incrível saber que Hazz é vizinho de alguém como você.
Louis arqueou uma sobrancelha discretamente, ainda com seu sorriso pequeno. Eles eram bem próximos mesmo. De qualquer forma, ele precisava voltar ao trabalho e, se não concluísse aquela tela, teria novos motivos para suas enxaquecas.
— Isso é muito bacana, mas eu e Zayn estamos um pouco ocupados. Temos que trabalhar.
— Você também é artista?! — Indagou Liam, parecendo ter selecionado a frase de Louis.
— Sou estilista de moda. — Zayn respondeu, sorrindo com toda graça que conseguia.
Conhecendo o amigo melhor que qualquer um, Louis sabia que Malik estava preparando um bote. Liam parecia interessado em uma outra dose do que ambos viveram noites antes, porque projetava-se com tantos flertes quando o outro.
— Sério? Que incrível. Eu não conheço ninguém que faça isso.
— Bom, este é o novo projeto que estou trabalhando. — Zayn constou, erguendo o caderno de esboços que segurava.
Nele, Najla estava perfeitamente desenhada com traços pontiagudos e colorida em aquarela, modelando uma das novas criações da marca Malik. Era um vestido leve, meio transparente e com desenhos florais em um tom bonito de azul.
— Uau. — Liam disse em um suspiro.
— Isso é lindo. — Harry concordou.
— Ela é quem estava aqui antes? — Niall perguntou, descontraído.
— Sim, é Najla.
— Entendi... — Um sorriso galanteador apareceu na boca do irlandês, que perguntou. — Ela está com algum de vocês? Ou está solteira?
Um aperto acometeu o interior de Louis e, por um instinto de proteger a amiga, seu tom de voz foi grosso e simplório ao que ele respondeu:
— Não é da sua conta.
Não foi inesperado quando o ambiente foi inundado por um silêncio mais do que desconfortável. O único que não estava estagnado pela resposta repentina era o próprio Louis, com um olhar impassível e mórbido sobre Niall.
— Sabe, hum... — Zayn disse, limpando a garganta em seguida. — Eu acho que deveríamos voltar ao trabalho. É melhor.
— Ah, é claro. — Harry respondeu, tão atônito quanto os outros. — Desculpe por isso. Até mais.
De volta ao apartamento de Louis, Zayn fechou a porta e encostou o ouvido na madeira para saber quando os três tivessem ido embora. Ao ouvir a porta do apartamento ao lado ser fechada, ele olhou pelo olho mágico para ver se o corredor estava livre, e então virou-se para Louis com as sobrancelhas franzidas.
— Que porra foi essa?
— O quê? Nós nem conhecemos aquele cara, não dá para confiar.
Louis recuou um pouco em sua pose quando viu o pescoço de Zayn ruborizar.
— E quem você acha que é para decidir algo assim da vida dela?
— Você e eu sabemos o que aconteceu com Najla e...
— E é claro que, se fosse alguém rude ou um imbecil, eu concordaria com você. Mas Niall parece ser alguém legal, e a única pessoa que pode decidir se vale ou não a pena é Najla. Se ela se arrependesse, estaríamos aqui por ela como sempre estivemos.
Louis não conseguiu responder, e mesmo que quisesse, Jace não demorou a aparecer junto a Najla. Nenhum deles ouviu a conversa, ou era o que parecia, pelo menos, então voltaram a trabalhar como se nada tivesse acontecido. As reclamações sobre os modelos nus voltaram, o barulho dos cliques no mouse e das teclas do computador de Zayn invadiram a sala e o cheiro de tinta e removedor queimou as narinas de Louis.
Horas mais tarde, as costas de Louis queimavam de dor e sua cabeça estava tão pesada que ele tinha certeza que poderia desmaiar se tomasse um banho quente. Jace e Najla foram embora primeiro, deixando que a bagunça de um dia inteiro de pinturas e fotografias fosse arrumada pelos outros dois. Eles não conversaram muito mais que o necessário durante a limpeza, e quando Zayn colocou sua jaqueta para ir embora, ele parou na porta e disse que era melhor Louis consertar as coisas com o amigo de Harry o quanto antes.
Mesmo com a possibilidade de apagar no meio do banho, não foi tão difícil para Louis encher a banheira com água quente e colocar alguns sais de banho calmantes após tomar uma chuveirada. Submerso, ele chorou pela dor de cabeça e pelo péssimo temperamento de mais cedo. Louis não costumava chorar, mas estava exausto; dormir na água não parecia má ideia, mas sabia que acordaria com frio depois.
Por isso, ele se enrolou em um roupão quente depois de esvaziar a banheira, escovou os dentes para afastar a sensação de fome e deitou-se no sofá, observando a noite londrina por sua janela. Em algum momento, Ozzy e Cuppa resolveram fazer companhia, deitando sobre o seu corpo. O pelo curto de Cuppa estava macio pelo banho recente, e o condicionador que o veterinário recomendara era realmente cheiroso.
Louis lembrou-se que senhora Bosko dissera-lhe que o bull terrier gostava de ser chamado de bom menino. "Ele sabe poucas coisas em inglês", ela explicara. "Eu e minhas filhas o ensinamos em eslovaco".
— Dobrý chlapec. — Louis disse, vendo o rabo fino do cão balançar. — É, você é um dobrý chlapec.
Senhora Bosko era uma boa vizinha. Saía duas vezes na semana, de manhã, para ir ao clube do livro organizado por uma de suas amigas, e pedia para que Louis cuidasse de Cuppa; ele sempre aceitava, pois nunca tinha conhecido um cachorro tão comportado e doce. No resto dos dias, ela ficava fora por algumas poucas horas para resolver suas pendências pessoais, e não via problema nenhum em deixar uma cópia da chave com Louis para que ele pudesse brincar um pouco com Cuppa.
Ah, eu acho que ainda estou com a cópia, ele pensou. Preciso entregá-la a ele...
Como se o mínimo pensamento a respeito de Harry pudesse invocá-lo, um arranhar baixo ecoou do lado de fora e, logo, a voz de Doris Day acompanhada de um piano banhou seu apartamento.
Estrelas brilhando sobre você, e a brisa da noite parece sussurrar "eu te amo", pássaros cantam na árvore de sicômoro. Sonhe um pequeno sonho comigo.
— Que garota de ouro você é, Harry Styles. — Zombou em tom azedo, antes de se levantar.
A música não estava alta, mas Louis queria um pouco de silêncio depois de um dia como aqueles. Por isso, ao bater na porta de seu vizinho, suas mãos apertaram involuntariamente o cinto felpudo do roupão roxo escuro e um suspiro saiu por seus lábios. Ele precisou bater novamente na porta até que ouvisse alguma movimentação dentro do apartamento, e logo Harry surgiu, parecendo surpreso por ver Louis ali. Ele também vestia um roupão e era lilás.
— Oi, Louis. Está tudo bem?
Ignorando a maneira bizarra com que acabaram combinando roupas, Louis respondeu:
— Oi. Você pode abaixar o volume?
— Oh. — Harry disse. Louis achava irritante como ele sempre parecia surpreso com tudo. — Na verdade, é uma vitrola clássica. Este é o volume mais baixo que dá para pôr. — Apontou com o dedão por cima do ombro.
Pela primeira vez após Mika Bosko se mudar, Louis reparou no apartamento. A mobília de madeira pura e escura tinha sido substituída por móveis mais coloridos e requintados, e alguns aparelhos de som estavam dispostos organizadamente em um canto da sala de estar. Louis arqueou as sobrancelhas ao reparar que, realmente, Harry tinha uma preferência maior pelas relíquias do que pelos aparelhos mais modernos, e a vitrola que estava tocando aquelas músicas tinha letras douradas gravadas na lateral formando a marca Victor. Louis não entendia muito de música, mas sabia que aquela era uma marca famosa e aquele parecia ser um modelo caro.
De toda forma, ele insistiu que o som fosse abaixado, só um pouquinho. Harry disse que sentia muito, mas não tinha como colocar um volume mais baixo do que aquilo e nenhum outro morador tinha reclamado. Na verdade, quem emprestara o disco de vinil cheio de clássicos tinha sido Judith Randolph. A vontade de rir em desespero brotou na boca do estômago de Louis, mas ele se segurou.
É claro que ela emprestaria. Ela é a melhor pessoa que poderia existir, pelo visto.
— Certo. Boa noite. — Foi o que Louis disse antes de girar sobre seus calcanhares e voltar para dentro de seu próprio apartamento, esquecendo-se de devolver as chaves para Harry.
Enquanto mais músicas iam tocando, ele se ocupou em arrumar algumas coisas pequenas para não precisar cuidar daquilo na manhã seguinte, rendeu-se à fome e comeu um pequeno sanduíche de rosbife antes de escovar os dentes e, sem nem perceber, seus nervos se acalmaram. Se não fosse pelas dores em seu corpo, ele mal lembraria que tinha sentido raiva de qualquer coisa que respirasse na sua frente.
Louis desejou boa noite a Ozzy e Cuppa, os ajeitando com seus cobertores e brinquedos no quarto de hóspedes, e decidiu que ainda era cedo para ir para cama. Assim, sem quase perceber, ele voltou à sala e arrastou o sofá até mais perto da varanda, abriu a porta de vidro e deitou-se confortavelmente, sentindo a brisa noturna enquanto observava as estrelas que enchiam o céu. Era difícil conseguir uma vista daquelas em Londres.
Ainda sem reparar, Louis cantarolou com a música que tocava agora:
— Leve-me ao seu coração, pois é aí que pertenço e nós nunca nos separaremos. Ame-me com ternura, ame-me de verdade, todos os meus sonhos realizados.
Assim, a noite entrou e embalou-o num sono tranquilo.
Esse foi mais curtinho, mas o que acharam?
Não se esqueçam de VOTAR e COMENTAR, tudo bem? Não custa nada e me ajuda demais ♥
Nos vemos no próximo capítulo!
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